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A Promessa - Capítulo 16


A Promessa
CAPÍTULO 16

webnovela de
FELIPE LIMA BORGES

escrita por
FELIPE LIMA BORGES

livre adaptação do livro de Rute

No capítulo anterior: Neb conta para Tamires que o motivo de seu trauma de casamento foi ela. Iago provoca Quiliom e Malom, e esse e Iago brigam, até que Maya chega e leva seu marido embora. Os moabitas retornam do campo de batalha para Moabe. Orfa diz a Rute que ela não parece alegre, e que está distante, e Rute desconversa. Myra diz a elas que a seleção da nova oferenda vai começar no dia seguinte. Noemi repreende a atitude dos filhos e diz que não se importa com o que Iago diz, pois já tem tudo de que precisa, a não ser sua descendência. Elimeleque diz que talvez os filhos não tenham tempo para isso, pois, em decorrência da situação das plantações, podem precisar ir embora de Belém.

FADE IN:

CENA 1: INT. CASA DE NOEMI – SALA – NOITE

Malom, Quiliom e Noemi não esperavam ouvir aquilo de Elimeleque.
QUILIOM
Deixar Belém?!
MALOM
Como assim, meu pai?!
NOEMI
Do... Do que você está falando, meu amor?...
ELIMELEQUE
Eu sinto muito, mas é isso mesmo. Se as coisas continuarem assim, nós teremos que partir daqui em busca de um lugar melhor.
MALOM
Mas pai, nós não podemos simplesmente ir--
ELIMELEQUE
(interrompendo) Se não quiserem ir embora, então dobrem os joelhos e orem. Orem muito, peçam a Deus que tenha misericórdia dessa terra. (para Noemi) E que você e Tani continuem a pregar nas ruas como começaram. Se possível, com a ajuda de outros que já abriram os olhos.
QUILIOM
Mas caso realmente formos sair daqui... para onde iríamos? Outra tribo israelita?
ELIMELEQUE
Israel inteira está sendo afetada. É o que dizem os rumores. (respira fundo) Nossa nação jaz no pecado.
Todos ali se entreolham tristes e preocupados.
ABERTURA

CENA 2: EXT. BELÉM – TRIGAL – DIA

Os dias se passam e as plantações só diminuem mais e mais e mais...
Um grupo de homens preocupadíssimos discute entre si sobre o que fazer. Entre eles está Yuri.
YURI
A única solução possível é estocarmos o que ainda nos resta...
Aqueles homens balançam a cabeça concordando e se dispersam.

CENA 3: INT. CASA DE NOEMI – SALA – DIA

Noemi, Elimeleque, Malom e Quiliom comem sentados à mesa. Malom e Quiliom terminam e se levantam para ir servir mais, um tentando passar na frente do outro.
NOEMI
Meninos...
Eles param e olham para sua mãe.
NOEMI
(lamentando) Não adianta disputarem quem chegará primeiro até à comida, porque... isso é tudo o que tínhamos para hoje.
Malom e Quiliom decepcionados, mas não reclamam.
MALOM
Tudo bem.
Tristonhos, os dois saem para a rua. Elimeleque observa Noemi fechar os olhos com tristeza.
ELIMELEQUE
Meu amor...
NOEMI
(chorosa) É difícil, Elimeleque... É muito difícil! Meu coração se parte ao ter que dizer para os meus filhos que não há mais o que comer...
Elimeleque sai do seu lugar e se aproxima da esposa. Abraça-a encostando a cabeça dela em seu peito. Lágrimas brotam dos olhos de Noemi e riscam seu rosto. Elimeleque extremamente preocupado...

CENA 4: EXT. CASA DE NOEMI – RUA – DIA

Tristes e preocupados, Malom e Quiliom caminham de um lado para o outro na frente de casa.
QUILIOM
Está pensando o que estou pensando, Malom?
MALOM
Vamos--
QUILIOM
(interrompendo) Orar.
MALOM
Sim.
QUILIOM
Vamos.
Meio sem jeito, Malom e Quiliom se ajoelham ali mesmo. Se olham e então fecham os olhos.
MALOM
Ó Senhor, nosso bom Deus! Aos teus pés viemos para... para te pedir... que tenha misericórdia de nós... Tenha misericórdia de nosso povo, Senhor...
Eles continuam em oração...

CENA 5: INT. HOSPEDARIA – DIA

Escorada no balcão, Tamires olha para o DONO (87 anos, baixinho, barbudo, carrancudo) com um olhar mandão.
TAMIRES
Eu quero bastante comida, está entendendo? Muita! Eu tenho ouro, estou pagando, portanto o senhor deve me atender. E agora!
DONO
Não adianta ficar falando e falando e repetindo a mesma coisa, porque não tem comida, e não tem mesmo e não adianta bater o pé porque não vai brotar comida do nada!
TAMIRES
Eu sempre achei esse lugar uma espelunca, mesmo! Não aguento ficar nem mais um dia nesse chiqueiro!
DONO
Olha o respeito, hein! Olha como fala! Olha o respeito, minha senhora!
TAMIRES
Que respeito o quê! É a verdade! Não, é pior! Porque num chiqueiro ainda tem comida!
DONO
Ah, vá pra lá então! Suma da minha frente, tenho mais o que fazer!
O homem dá as costas para Tamires e ela cospe no chão. Nesse momento, Maya e Iago entram na hospedaria e ela reconhece Tamires.
MAYA
Espera, quem é aquela? Tamires?!
Tamires olha para a entrada e vê o casal.
TAMIRES
Finalmente pessoas que valem alguma coisa nessa cidade!
MAYA
Tamires! É você mesma?!
Maya corre até Tamires.
MAYA
Não estou acreditando que estou te vendo aqui!
TAMIRES
Maya, minha amiga... Pode ter certeza que sou eu.
MAYA
Ah, que alegria!
Maya abraça Tamires.
MAYA
Minha amiga querida... Quanto tempo...
TAMIRES
25 anos...
Maya e Tamires se soltam.
MAYA
Lembro que foi embora por causa do Neb, mas... desistiu da ideia de manter distância? Superou? Não é pra menos, ahn? 25 anos... Ou está aqui apenas de passagem?
TAMIRES
Vim de definitivo, mas já estou começando a me arrepender, vide essa hospedariazinha que não tem mais comida alguma.
IAGO
Então acabou aqui também? Viemos justamente para ver se podíamos comprar algo.
MAYA
Há quanto tempo está na cidade, Tamires?
TAMIRES
Hum, algumas semanas...
MAYA
Semanas?! E como não nos procurou? Por que está hospedada aqui?
TAMIRES
Nesses anos em que estive em Hebrom, meu velho pai morreu e a casa foi comprada. Vocês devem saber. Quanto a procura-los, agradeço a preocupação, minha amiga, mas eu não queria incomodá-los.
IAGO
Sabe bem que não é incômodo algum.
MAYA
Ao menos costumava saber, quando éramos todos jovens.
TAMIRES
(sorrindo) É... Bons tempos.
MAYA
Bons tempos...
IAGO
Que não voltam mais.
Os três fazem que sim.
MAYA
Bem, não pense que vou deixar minha amiga continuar a viver em uma hospedaria. Ainda mais em uma que não tem comida. Venha ficar conosco, Tamires.
TAMIRES
Ah, Maya, não sei... Sinto que estarei incomodando.
MAYA
Pare com isso, Tamires. Pegue logo suas coisas e vamos.
TAMIRES
(sorrindo) Tudo bem, então. Mesmo depois de todo esse tempo, você continua sendo a mesma Maya de sempre.
Maya sorri.
MAYA
Agora vá logo pegar suas coisas. Vamos te esperar para irmos.
TAMIRES
Certo!
Tamires vira para subir a escadaria que leva aos quartos, mas para, vai até o balcão e pigarreia chamando o dono, que está em um canto. Ele vira para ela, já bravo.
DONO
O que é?!
TAMIRES
Eu quero meu ouro de volta. Vou embora dessa coisa que você chama de hospedaria.
DONO
Ah, graças a Deus! Em qualquer outra ocasião, eu protestaria e tentaria convencer o hóspede a permanecer aqui. Mas no seu caso, eu faço questão de que vá!
Sorrindo, o velho pega algumas moedas e faz que vai entregar na mão dela, mas despeja no balcão.
DONO
Até nunca, minha querida.
Com raiva, Tamires pega as moedas no balcão.
TAMIRES
Pensando bem, acho que isso aqui é sim um chiqueiro! E você é o porco! Velho porco! Nojento! Até nunca pra você também!
Pisando duro, Tamires vai para a escadaria. Maya e Iago ficam ali achando graça da situação. Sem ser afetado pelas ofensas, o dono fica rindo de alegria. Minutos depois, Tamires volta com suas coisas.
TAMIRES
(sem parar) Nojento!
Tamires sai acompanhada de Maya e Iago. Muito feliz, o dono continua a rir.
DONO
(mais para si; ainda rindo de alegria) Vai encher a botija de outro...
E ri...

CENA 6: EXT. TEMPLO – PÁTIO – DIA

Um grande pátio ao ar livre, com jardins e esculturas ao redor. Nas principais entradas, soldados em forma.
No meio do pátio, dezenas de meninas entre 6 e 10 anos estão reunidas em pé e alinhadas, à espera. Aos seus pés, um tapete e uma mesinha de madeira.
Rute e Orfa chegam ali. Rute caminha com a graciosidade que o cargo de sacerdotisa lhe exige. Passa pelas primeiras meninas observando-as. Ao chegar no meio, à frente de todas, Rute para e vira de frente para elas. Orfa fica logo atrás. Escondida atrás de uma coluna, a Sacerdotisa Myra observa Rute.
RUTE
No dia em que vocês nasceram, já haviam sido escolhidas para essa missão há muito tempo. Logo após seus olhos enxergarem a luz do mundo pela primeira vez, vocês foram consagradas nas águas de Tiamat, Mot e Baal. E tudo isso para que, um dia, a paz e a prosperidade alcancem nosso reino por meio do sacrifício de seu puro sangue.
As meninas olham Rute atentas.
RUTE
Vocês já passaram por várias etapas na seleção da próxima oferenda de Moabe, mas agora os testes serão mais dificultosos. Além de estar à altura de tal honra, a escolhida precisa também estar muito bem preparada para servir a Moabe, assim como a anterior serviu na guerra contra os amorreus, livrando nossas vidas da morte certa. E na primeira parte dessa nova fase, vocês deverão provar que ainda retém todo o conhecimento que lhes foi passado desde sua mais tenra infância. A candidata que não atingir a pontuação mínima, estará eliminada da seleção e voltará vergonhosamente para suas famílias.
Leve apreensão em algumas meninas.
RUTE
Orfa, por favor.
Orfa traz alguns papiros e penas e entrega metade para Rute, que vai distribuir de um lado enquanto ela distribui de outro. Myra continua escondida, observando-as. As sacerdotisas terminam de distribuir os papiros e voltam para a frente das garotas.
RUTE
Podem começar a prova.
As meninas sentam no tapete, à frente da mesinha onde estão o papiro e a pena com tinta, e começam a fazer a prova. Rute e Orfa as observam. Nesse instante, Myra sai de trás da coluna e se aproxima caminhando majestosamente. Rute e Orfa se surpreendem com a presença de sua superior.
RUTE
Sacerdotisa!...
Myra chega ali e para. As meninas deixam de fazer a prova para olharem, admiradas, a Sacerdotisa.
MYRA
(sorridente) Rute. Estive observando-a escondida, espero que não se importe.
RUTE
Imagine, senhora. Claro que não.
MYRA
Você tem jeito com as meninas. Na verdade com tudo que tange a arte de adorar e servir aos deuses. Sabe que um dia pode vir a ser a Sacerdotisa de Moabe em meu lugar, não sabe?
RUTE
(humilde) Agradeço a confiança, senhora.
MYRA
Bom, agora vou deixa-las continuar. Com licença.
Rute e Orfa fazem uma reverência com a cabeça e a Sacerdotisa Myra sai sob os olhares das meninas. Rute então olha para Orfa.
RUTE
Vi como olhou, Orfa. Não tenha ciúmes, não almejo o cargo de Sacerdotisa. Se quiser, deixo o caminho livre.
ORFA
Não, ouvir isso da própria Sacerdotisa é uma honra sem tamanho, Rute. E essa honra é toda sua.
A contragosto, Rute faz que sim e volta a observar as meninas realizando a prova.

CENA 7: INT. CASA DE IAGO – SALA – DIA

Maya, Iago e Tamires estão chegando na casa.
MAYA
Não se engane, entendeu, Tamires? Apesar de ainda termos comida, não é muito, não. A crise é em todo lugar.
TAMIRES
Eu entendo. Mas precisamos pensar em um jeito de resolver isso.
IAGO
Já foi pensado e já começará a ser feito. Construiremos alguns lugares para guardar o trigo que ainda resta.
TAMIRES
Mas pelo andar da carruagem, essa praga não vai acabar na próxima lua, e o trigo estocado findará. Nós precisamos fazer outra coisa.
MAYA
Que outra coisa poderíamos fazer, Tamires?
TAMIRES
Não sei ainda. Não sei...
Tamires permanece pensativa.

CENA 8: EXT. BELÉM – TRIGAL – DIA

Mais dias se passam, e encontramos Elimeleque, Yuri e outros homens no trigal que já não tem trigo algum. Eles observam um outro homem que vem dos lados mais distantes do campo.
ELIMELEQUE
E então?
O recém-chegado faz que não com a cabeça.
HOMEM
Acabou. Acabou tudo.
Uma sombra de tristeza cai sobre todos aqueles rostos.
YURI
Agora só temos o trigo armazenado...
ELIMELEQUE
Amigos, antes de irmos mexer com a estocagem, orem comigo. Vamos pedir a Deus que não deixe que a miséria nos destrua...
Aqueles homens, revoltados, fazem gestos grosseiros se negando e saem pisando duro, ficando apenas o que acabou de chegar e Yuri. Elimeleque olha para eles e se ajoelha. Eles o imitam.
ELIMELEQUE
(choroso) Senhor... Senhor... Misericórdia, Senhor...
Eles continuam a orar.

CENA 9: EXT. BELÉM – RUA – DIA

Uma confusão generalizada! Tumulto!
Dezenas e dezenas de belemitas furiosos expulsam Noemi e Tani dali. Devido ao número de pessoas, elas nem mesmo conseguem ir embora; cercam-nas de todos os lados.
NOEMI
Precisamos chegar em casa!
TANI
Se conseguirmos sair vivas daqui, posso tentar!
Homens e mulheres com semblante de ódio gritam com elas e as empurram para todos os lados.
HOMEM FURIOSO
Não vamos nos voltar para Quem nos fez isso!
MULHER
Vão embora! Não queremos saber de suas palavras!
MULHER 2
Preguem uma para a outra! Miséria para nós, não!
HOMEM 2
Miséria nunca! Nossos deuses nos salvarão! Fora, vocês!
MULTIDÃO
Fora daqui! Vão embora! Sumam! Vão! Fora! Fora daqui!
De longe, Tamires observa a situação de Noemi e Tani com um sorriso no rosto. As duas mulheres finalmente conseguem sair do aperto ao serem empurradas e caírem no chão.
MULTIDÃO
Vão embora! Sumam da nossa frente!
Caídas no chão, Noemi e Tani ouvem um forte barulho, mas um tanto diferente. Elas olham para o céu, e toda a multidão também percebe: vagarosamente, uma grande e escura nuvem se aproxima, cobrindo Belém. Outro trovão, dessa vez mais alto. Alguns da multidão olham para o céu com estranheza.
TANI
Por que o céu está se fechando dessa forma?
NOEMI
Deus está decepcionado com Seu povo.
Ao longo do dia, mais e mais nuvens escuras e pesadas se ajuntam sobre Belém e arredores, e trovões e relâmpagos são ouvidos e vistos por todo lado.
Os belemitas passeiam pelas ruas olhando aquela situação inédita, e muitos param para observar as nuvens sinistras.
Mais para o fim do dia, uma discreta brisa aumenta até se tornar um vendaval. As pessoas começam a correr e a tentar salvar seus pertences. O forte vento varre tudo que está solto nos campos e nas ruas de Belém.

CENA 10: EXT. CAMPOS – DIA

Um grupo de homens no campo está desesperado com o vendaval.
HOMEM NO CAMPO
Precisamos nos abrigar!
HOMEM NO CAMPO 2
Mas precisamos salvar o trigo! Se não fizermos isso, todo o estoque irá pelos ares.
HOMEM NO CAMPO 3
Vamos!
Aqueles homens então vão na direção do monte de trigo, mas o vento contrário aumenta e eles não conseguem nem mesmo andar.
HOMEM NO CAMPO
Não conseguiremos a tempo! Precisamos ir embora!
Os três desistem e correm a direção contrária, rumo à cidade.
Escondidos atrás de uma árvore estão Malom, Quiliom e Elimeleque.
QUILIOM
Nunca vi tamanho vento em toda a minha vida!
MALOM
E que nuvens pesadas são essas! Parece que o céu está desabando sobre nossas terras!
ELIMELEQUE
Isso, meus filhos, é a mão do Senhor pesando sobre Israel!
Malom e Quiliom se encaram preocupados.
ELIMELEQUE
Se continuarmos aqui, seremos carregados pelo vendaval! Vamos! Precisamos chegar em casa!
Os três saem de trás da árvore e correm em direção ao portão da cidade. As nuvens mais escuras, sobre Belém, relampejam sem parar. IMAGEM CONGELA
CONTINUA...
FADE OUT:


No próximo capítulo: O caos é instaurado em Belém quando raios caem do céu e destroem tudo o que restava de comer, e uma das meninas se destaca na seleção da próxima oferenda moabita.

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