Júlia
Capítulo 03
Novela criada e escrita por Ramon Fernandes
CENA 01. ASSUNÇÃO ENGENHARIA. PRESIDÊNCIA. INTERIOR. DIA
Continuação imediata do capítulo anterior.
ROBERTO SORRI PARA ARTHUR, TENTANDO DISFARÇAR O DESCONFORTO.
ROBERTO — Sabe que eu sempre admirei isso em você, Arthur? Você é direto! Chega logo ao ponto!
ARTHUR — Roberto, eu não vim aqui pra/
ROBERTO — Calma, Arthur. Tudo vai dar certo, você vai ver. O Davi e a Vitória ainda vão voltar e vão se casar. Tudo como o previsto!
ARTHUR — Eu fico preocupado, Roberto. Falo isso como pai. A Vitória gosta muito do seu filho, e nós... Bem, nós temos um trato. Um trato de amigos.
ROBERTO — É claro. Fique calmo e confie. Quando você menos esperar, os dois vão subir no altar.
ARTHUR — Assim espero. O problema é que eu não sei ser tão paciente quanto gostaria.
ARTHUR COM AR DE COBRANÇA PARA ROBERTO, QUE O ENCARA. ROBERTO SORRI AMARELO.
CORTA PARA
CENA 02. MANSÃO ASSUNÇÃO. ESCRITÓRIO. INTERIOR. DIA
ROBERTO DE FRENTE PARA MARIA EDUARDA E LEANDRO.
ROBERTO — (Exaltado) Aquele moleque não pode abandonar tudo assim. Ele tem que voltar com a filha do Arthur. Se não, tá tudo acabado.
LEANDRO — Calma, pai! O Davi não é burro. Ele não vai querer ficar na pobreza.
M. EDUARDA — Vocês tratam isso como se só tivesse o Arthur e a financeira Bacelar para prestar serviço para a construtora.
ROBERTO — Desculpa te desapontar, querida, mas no momento sim. É só o Arthur que pode nos ajudar. Nós estamos afundados em dívidas até o pescoço. Que outra financeira nos emprestaria o que precisamos no momento e não nos cobraria juros?
MARIA EDUARDA PENSATIVA, COMEÇA A ANDAR PELO ESCRITÓRIO, NERVOSA. LEANDRO ENCARA O PAI.
LEANDRO — Nós vamos ter que falar com o Davi. Ele vai ter que virar homem, por bem ou por mal!
ROBERTO — Se eu bem conheço o filho que tenho, por bem não será, Leandro!
ELE RESPIRA FUNDO.
CORTA PARA
CENA 03. MANSÃO ASSUNÇÃO. COZINHA. INTERIOR. DIA
FELIPE TOMANDO UM CAFÉ, DE PÉ, PRÓXIMO DA PORTA. PAULINA NA PIA, LAVANDO LOUÇA. JÚLIA VEM DO INTERIOR DA MANSÃO, AR ALEGRE, SORRINDO À TOA.
JÚLIA — Bom dia.
FELIPE — Júlia, de onde você tá vindo?
JÚLIA NÃO SABE O QUE DIZER. ENCARA O PAI.
PAULINA — Deve ter ido já ver o Davi. Não sai de perto dele, parece enfermeira.
JÚLIA — Um dia você ainda engole o próprio veneno e morre, Paulina!
PAULINA — (Furiosa) Como é?
JÚLIA RI. FELIPE DESCONFIADO.
JÚLIA — Mas eu fui ver o Davi mesmo, pai. Ver se ele estava bem. Se havia se recuperando bem.
FELIPE — E onde você passou a noite passada? Porque eu vi sua cama arrumada quando acordei.
JÚLIA — (Sorri amarelo) Dormi na casa de uma amiga. O senhor não a conhece.
ELA DÁ UM BEIJO NO ROSTO DO PAI E SAI. FELIPE DESCONFIADO. EM PAULINA, NEGANDO COM A CABEÇA.
CORTA PARA
CENA 04. MANSÃO ASSUNÇÃO. ESCRITÓRIO. INTERIOR. DIA
JÁ ABRE A CENA EM DAVI ESTUPEFATO.
DAVI — Isso só pode ser piada! Piada péssima pra se fazer de manhã, aliás!
ROBERTO — Piada?! Você é um moleque mesmo, Davi! Um moleque irresponsável, que precisa aprender uma lição!
ROBERTO PERDE A PACIÊNCIA E FAZ MENÇÃO DE TIRAR O CINTO PARA BATER EM DAVI, MAS MARIA EDUARDA INTERVÉM, SE COLOCANDO ENTRE OS DOIS.
M. EDUARDA — Pelo amor de Deus, Roberto, não é pra tanto!
ROBERTO — Maria Eduarda, não é pra tanto? Vocês por acaso, tem noção da gravidade da crise que nós estamos passando?
DAVI — Ok, mas o que eu tenho a ver com isso?
LEANDRO — Tudo a ver! Você também ajudou a gastar o tanto que nós estamos devendo, Davi.
DAVI — Eu?!
LEANDRO — Acorda, Davi! A nossa empresa tá afundando, o Arthur ficou de nos ajudar, mas com a condição que você volte com a filha dele, que você case com a Vitória!
DAVI DÁ UMA GARGALHADA. ROBERTO FURIOSO.
DAVI — Agora eu virei moeda de troca, é isso?
M. EDUARDA — Meu filho, seja razoável/
DAVI — Razoável, mãe? Razoável? Vocês sejam razoáveis! É com a minha vida que vocês estão querendo brincar.
ROBERTO — Quem brinca aqui é você, garoto!
LEANDRO — Sabe essa vidinha de playboy que você conhece? Gastar sem ver o extrato bancário, as garotas que você banca nos motéis, os seus amiguinhos em baladas, as viagens sem ter data de volta? Pois é! Isso tudo vai acabar! Pode dando adeus a essa vida que você conhece, porque ela não vai existir muito em breve!
DAVI NERVOSO, PASSA A MÃO PELOS CABELOS.
ROBERTO — Você vai casar com essa garota, Davi. Já está decidido!
DAVI — Você tá acabando com a minha vida!
ROBERTO — Não, Davi. Eu estou é salvando o seu futuro, meu filho. O seu e dessa família inteira. Um dia você vai me agradecer!
DAVI — Nunca!
E DAVI SAI DALI FURIOSO, BATENDO A PORTA. TODOS SE ENTREOLHANDO.
M. EDUARDA — Eu não sei se isso é o mais correto.
ROBERTO — (Ri) Não sabe? (Sério) Quer pedir esmola com o seu filhinho no sinal? Eu não quero!
ROBERTO SAI NERVOSO DO ESCRITÓRIO. LEANDRO ENCARA A MÃE E SEGUE O PAI. EM EDUARDA, NERVOSA.
CORTA PARA
CENA 05. MANSÃO BACELAR. SALA. INTERIOR. DIA
VITÓRIA DEITADA NO SOFÁ, MEXE NO CELULAR, VENDO FOTOS DE DAVI EM UMA REDE SOCIAL. VÊ ALGUMAS FOTOS DOS DOIS JUNTOS. ELA CHORA COPIOSAMENTE. ARTHUR ENTRANDO EM CASA.
VITÓRIA — Pai...
ARTHUR OLHA PARA A FILHA, PERCEBE O SEU OLHAR TRISTE.
ARTHUR — Calma, minha filha. Essa situação vai se resolver. Eu garanto pra você.
VITÓRIA — O que você quer dizer com isso, pai?
ARTHUR — O Davi vai voltar. Antes mesmo do que você pensa, minha princesa.
VITÓRIA ENCARA O PAI E SORRI. ELE RESPIRA FUNDO.
CORTA PARA
CENA 06. MANSÃO ASSUNÇÃO. JARDIM. EXTERIOR. DIA
MÚSICA: “Velha Infância” – Melim
JÚLIA VIRA DE COSTAS PARA DAVI, CHOROSA. ELE EM SEGUNDO PLANO, CHATEADO.
JÚLIA — Então quer dizer que nós vamos terminar, antes mesmo de começar alguma coisa, Davi?
DAVI — Ei, eu não disse isso! Olha pra mim.
DAVI VIRA JÚLIA E ELA NÃO CONSEGUE ENCARÁ-LO.
JÚLIA — (Chorando) Eu te amo.
DAVI — Júlia, eu... Eu também te amo.
JÚLIA E DAVI SE OLHANDO. ELA COM OS OLHOS MAREJADOS. ELE COM NÓ NA GARGANTA.
DAVI — Eles não vão conseguir separar a gente. Eu não vou deixar isso acontecer. Eu quero lutar por você!
JÚLIA — Davi, não dá pra ser hipócrita. A sua família não vai deixar isso acontecer. E não é só porque eu sou a filha do motorista, e sim, porque se você não se casar com a Vitória, a família Assunção vai falir! O seu pai nunca vai permitir isso.
DAVI — Eu tô pouco ligando pro que o meu pai vai fazer da vida dele, Júlia. Eu não quero é ficar longe de você Tô disposto a ser um novo homem por você!
JÚLIA SORRI EMOCIONADA. ELE PASSA A MÃO PELO ROSTO DELA. OS DOIS VÃO SE APROXIMANDO.
JÚLIA — Não desiste de nós!
DAVI — Eu não vou!
OS DOIS SE BEIJAM APAIXONADOS. DO PV DE ALGUÉM: O BEIJO DO CASAL. MÚSICA OFF.
CÂM REVELA ROBERTO, EM SEGUNDO PLANO, OLHANDO A CENA. ELE EXULTA. AO LADO, LEANDRO APARECE.
LEANDRO — Aquela é a/
ROBERTO — Aquela é a razão para o seu irmão querer jogar a nossa família no fundo do poço. (Com ódio) A maldita filha do motorista!
LEANDRO — (Surpreso) Júlia...
ROBERTO ESPUMANDO DE RAIVA. NO BEIJO DE DAVI E JÚLIA, APAIXONADOS.
CORTA PARA
CENA 07. MANSÃO ASSUNÇÃO. ESCRITÓRIO. INTERIOR. DIA
JÁ ABRE NA EXPRESSÃO CONTRARIADA DE DAVI SE ERGUENDO EM FRENTE A MARIA EDUARDA.
DAVI — O quê?! Do papai eu até previa uma coisa dessas, mas da senhora, mãe?
M. EDUARDA — Eu não queria chegar nesse ponto, meu filho, mas infelizmente, eu não me vejo em outra circunstância. O seu pai já sabe que você e a filha do motorista. (Faz cara de nojo/ Vira os olhos) Eu não consigo nem falar de tão absurda essa situação.
DAVI — Absurda, porque? Posso saber? Desde quando duas pessoas que se gostam, é absurdo?
M. EDUARDA — Eu só posso estar delirando pra ouvir uma coisa dessas. "Duas pessoas que se gostam". Ela é a filha do motorista! Vocês cresceram juntos nessa casa, Davi!
DAVI — (Ri) Agora só falta dizer que crescemos como irmãos.
M. EDUARDA — Irmãos nunca. Só se for um irmão que cresceu dentro da mansão e a outra que cresceu no quartinho dos fundos.
DAVI — Só que é por essa menina que cresceu no quartinho dos fundos e que virou uma mulher, que eu estou apaixonado.
MARIA EDUARDA FAZ UMA EXPRESSÃO ARRASADA, QUASE TEATRAL. COLOCA AS DUAS MÃOS NA CABEÇA.
M. EDUARDA — Eu não posso estar ouvindo isso mesmo. É horrível demais pra mim!
DAVI — Para de teatro, mãe!
M. EDUARDA — (Encara) Teatro? Então tá bem. Se é um teatro, eu sou a vilã da peça.
MARIA EDUARDA SE APROXIMA DE DAVI E OS DOIS SE ENCARAM.
M. EDUARDA — Se você não desistir de ficar com essa pé-rapada, e não se afastar de uma vez dela, eu demito o pai dela.
DAVI — (Chocado) O que?!
M. EDUARDA — É isso! Se você não terminar o que quer que você tenha com a Júlia, eu demito o Felipe dessa casa hoje mesmo. Demito agora! Sem direito a nada! Esses dois vão pro olho da rua! Aliás, não só pro olho da rua, eu mesma, faço questão de não recomendar o Felipe pra arrumar emprego em lugar algum.
DAVI — Eu não tô acreditando nisso.
M. EDUARDA — Eu acabo com a vida do pai e da filha! E aí? O que me diz?!
DAVI ESTARRECIDO DIANTE DE EDUARDA, QUE O CONFRONTA.
DAVI — Eu não posso acreditar nisso, mãe. Eu nunca esperaria isso vindo de você.
M. EDUARDA — Eu só estou querendo defender a minha família.
DAVI — Da Júlia? Mas o que ela te fez? Ela é só uma garota!
M. EDUARDA — Uma aproveitadora, meu filho! Será que só você não enxerga isso? Essa garota cresceu nessa casa, vendo tudo o que nós tínhamos, invejando o que nós temos, e decidiu fisgar o filho do patrão pra se dar bem, Davi! Acorda, meu filho!
DAVI — A senhora acha por acaso que eu tenho cara de pato?
M. EDUARDA — Pra ela, sim. Pra ela, você foi o pato conveniente, meu filho.
DAVI VIRA AS COSTAS PARA EDUARDA, PASSA A MÃO PELO ROSTO. ELE SE VIRA PARA ELA.
DAVI — Eu não vou fazer isso com ela!
M. EDUARDA — (Concorda) Muito bem! Eu vou colocar ela e o pai fora dessa casa agora!
MARIA EDUARDA VAI EM DIREÇÃO A PORTA DO ESCRITÓRIO E QUANDO VAI ABRIR, DAVI INTERCEPTA.
DAVI — Espera!
M. EDUARDA — (Sem se virar) O que foi?
DAVI — (Respira fundo) Eu não vou deixar que você faça isso com a Júlia e nem com o pai dela. Eles não merecem essa sacanagem!
MARIA EDUARDA RESPIRA ALIVIADA. SE VIRA PARA DAVI.
M. EDUARDA — Você ainda vai me agradecer por isso, Davi!
DAVI — Eu duvido!
E DAVI SAI DO ESCRITÓRIO, PISANDO FIRME. BATE A PORTA. MARIA EDUARDA ALIVIADA, MAS CHATEADA COM A SITUAÇÃO.
CORTA PARA
CENA 08. MANSÃO ASSUNÇÃO. ÁREA DE EMPREGADOS. QUARTO DE JÚLIA. INTERIOR. DIA
JÚLIA APREENSIVA, ANDA DE UM LADO PARA O OUTRO. FELIPE ENTRA NO QUARTO.
FELIPE — Eu já fiquei sabendo pela fuxiqueira da Paulina, Júlia. Ouvi, mas não quis acreditar. Eu vim saber da sua boca.
JÚLIA ENCARA FELIPE, COM OS OLHOS MAREJADOS.
JÚLIA — Eu sempre fui apaixonada pelo Davi, pai. Sempre! Desde criança em que eu sonho que o Davi é o príncipe encantando da minha vida.
FELIPE — Minha filha, pelo amor de Deus!
FELIPE NERVOSO, ANDA DE UM LADO PARA O OUTRO.
FELIPE — Esse garoto, ele... Júlia, ele é filho dos patrões. Você sabe que isso nunca deu certo. Nunca dá certo em filme, livro, novela/
JÚLIA — Acontece pai que isso aqui não é um filme ou uma novela/
FELIPE — (Por cima) Não vai dar certo mesmo assim! Júlia, coloca a mão na consciência, pensa bem, minha filha. Pra ele, você não passa de uma aventura, um casinho. Esse garoto é rico, é filho do doutor Roberto Assunção, um dos maiores empresários do país.
JÚLIA — Eu não me importo de quem ele é filho. Eu amo o Davi! É com ele que eu quero ficar!
FELIPE VAI ABRIR A BOCA PARA FALAR, MAS ALGUÉM BATE NA PORTA. JÚLIA E FELIPE SE ENTREOLHAM.
JÚLIA — Será que é ele?
FELIPE ABRE A PORTA E DÁ DE CARA COM ROBERTO, COM CARA DE POUCOS AMIGOS. JÚLIA ENGOLE SECO.
FELIPE — Doutor Roberto?!
ROBERTO E FELIPE SE ENCARAM, DEPOIS ROBERTO FUZILA JÚLIA COM O OLHAR. ELA INTIMIDADA.
ROBERTO — Eu gostaria de falar com a sua filha em particular, Felipe.
FELIPE — Seu Roberto/
JÚLIA — Deixa, pai. Pode ir.
FELIPE HESITA, MAS SAI DO QUARTO. ELA ENCARA O EMPRESÁRIO.
JÚLIA — Doutor Roberto/
ROBERTO — (Por cima) Eu vou ser muito direto como eu costumo ser nos negócios que eu faço.
JÚLIA — Negócios?
ROBERTO — Eu não te quero perto do meu filho, nem da minha família.
JÚLIA — Eu amo o seu filho!
ROBERTO — Um amor e uma cabana não se sustentam em meio a dificuldade financeira.
JÚLIA — Eu não quero ficar com o Davi por dinheiro, se é isso que o senhor tá querendo insinuar!
ROBERTO — Por favor, não vamos ser hipócritas. O amor floresce melhor em meio ao dinheiro, vamos convir.
ROBERTO TIRA DO BOLSO UM PAPEL E ENTREGA A JÚLIA, QUE FICA O ANALISANDO, AINDA NAS MÃOS DE ROBERTO.
JÚLIA — O que é isso?
ROBERTO — É uma passagem pra você. Uma passagem para você ir embora do Rio de Janeiro, aliás, do Brasil. É uma passagem para Paris. Seu pai comentou uma vez que você gostaria de cursar Fotografia. Eu dei meu jeito, mexi meus pauzinhos e consegui uma vaga em um curso conceituado na França para você.
JÚLIA — Mas eu/
ROBERTO — (Incisivo) Eu te quero fora dessa casa, fora desse país, mas principalmente, fora das nossas vidas!
JÚLIA OLHA PARA ROBERTO E PARA A PASSAGEM EM SUA MÃO. SUA EXPRESSÃO ATURDIDA. CLOSE FINAL EM JÚLIA.
CORTA PARA
FIM DO CAPÍTULO 03
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