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LÁGRIMAS EM SILÊNCIO - Capítulo 04

 



Novela de Adélison Silva 

Personagens deste capítulo

JANA
LAURA
GIOVANA
BEATRIZ
ELIETE
PAULO
RAIMUNDA
RAVENA
REBECA
CÁSSIA
MACIEL
MAURÍCIO
RATO
JORGE

 


aCENA 01/ EXT/ CASA DOS FERNANDES/ JARDIM/ NOITE 

É claro que a gente se engana, se surpreende, se decepciona. Por um instante Jana se alegrou achando que Paulo fosse lhe ajudar. Mas não foi o que aconteceu. Agora ali diante dela um ultimato, ou ela escolhia matar o seu filho, ou ficar com o homem que amava. E essa escolha seria bem óbvia. Tomada pela a raiva, ela dá a reposta que ele esperava com um tapa bem cheio em seu rosto.  

                      

JANA

(furiosa)

- Se saia Paulo, some da minha frente! Como ouça me fazer esse tipo de proposta?

 

Paulo acaricia o rosto, sentindo a dor do tapa recebido.

 

PAULO

(sereno)

- Eu amo muito você, viu Jana. No entanto cê tem uma forma de romantizar as coisas. Essa sua obsessão em querer ser mãe não faz cê enxergar a situação direito. Veja bem, se põe em meu lugar. Vou olhar pra essa criança e vou lembrar daquele dia que cê chegou em casa, toda ferida, toda arrasada. Por culpa do maldito do pai dela. 

JANA

(determinada)

- Ele é meu filho. E não interessa quem é o pai, não interessa como ele foi gerado. Tá entendendo? O que interessa que ele tem mãe. Uma mãe para proteger ele de gentinha, mesquinha e egoísta como você. Que acha que a vida é algo que pode ser descartada e jogada em uma lata de lixo. 

PAULO

(tentando argumentar)

- Não viaje Jana! Tenha a gentileza de me escutar. Essa criança só vai nos trazer desgraça meu amor. 

JANA

(decidida)

- Cê me pediu pra escolher, não foi Paulo? E eu escolhi. Vou ficar com meu filho. Se você não é capaz de entender isso, pega a reta e se saia de vez da minha vida! 

PAULO

(resignado)

- Só espero que você não se arrependa, viu.

 

Paulo começa a se afastar, deixando Jana para trás. Enquanto ela fica observando Paulo partindo. Uma onda de tristeza e melancolia a envolve, e ela desaba em lágrimas, sentindo-se completamente sozinha. Ela cai de joelhos no jardim, desamparada, chorando inconsolavelmente.

 

CENA 02/ INT/ SHOPPING/ NOITE 

Cássia anda pelo Shopping Iguatemi, saboreando um milk shake enquanto observa as vitrines. Maurício a ver de longe e se aproxima, com um sorriso no rosto.

 

MAURÍCIO

(entusiasmado)

- Cássia!

 

Cássia se vira ao ouvir seu nome, surpresa ao encontrar Maurício ali.

 

CÁSSIA

- Oxe, mas é Dr. Maurício! Como vai? 

MAURÍCIO

- Vou bem. Mas não estamos na clínica, né mesmo. Vamos dispensar essas formalidades. Me chame só de Maurício. 

CÁSSIA

(sorrindo)

- Como o senhor preferir. 

MAURÍCIO

(sorrindo)

- Sem o senhor também, né Cássia? 

CÁSSIA

- Tá certo, me desculpe. Como você preferir, viu. Não sabia que o senhor...

(corrigindo)

- Digo, que você gostasse de vir ao shopping. 

MAURÍCIO

- Eu gosto muito, vim pegar um cineminha. E você? 

CÁSSIA

- Eu vim aproveitar a lotérica daqui pra pagar umas contas que tão atrasadas. 

MAURÍCIO

- Humm! Massa, viu! E já pagou as contas? 

CÁSSIA

- Já sim, agora pegar o ônibus pra ir pra casa. 

MAURÍCIO

- E tá com pressa? Poderia me fazer companhia. Havia convidado uma amiga pra assistir um filme, mas ela não vem mais. Cê bem que poderia assistir o filme comigo. Prometo lhe levar em casa depois. 

CÁSSIA

- Oxe, pois eu adoraria. E que filme pretende assistir? 

MAURÍCIO

- Um drama nacional que tá em cartaz, “Dois filhos de Francisco”. Eu ouvi dizer que é um filme muito bom. É baseado na história da dupla Zezé de Camargo e Luciano. 

CÁSSIA

- Sei! Eu vi o trailer dele na televisão. Parece ser muito bom. 

MAURÍCIO

- E então o que é que tamos esperando? Vamos logo pra fila comprar os ingressos. 

CÁSSIA

(animada)

- Verdade vamos lá!

 

Juntos, eles caminharam em direção à fila de ingressos, animados para aproveitar a noite no cinema. 


CENA 03/ EXT/ PLANO GERAL 

Do horizonte escuro ao amanhecer, cores rosadas e laranjas tingem o céu sobre o mar calmo de Ondina. Banhistas aparecem na praia, enquanto pássaros marinhos voam em busca de comida. Coqueiros balançam suavemente, e o som suave das ondas se mistura às melodias dos pássaros. O sol sobe, transformando cores e revelando detalhes da paisagem.

 

CENA 04/ INT/ BOUTIQUE DA RAVENA/ DIA 

Laura está terminando de atender uma cliente, entregando uma sacola com um sorriso educado. 


LAURA

- Aqui está, muito obrigada por escolher a nossa loja.

 

Maciel chega à loja, chamando a atenção de Laura.

 

MACIEL

- E aí minha linda!

 

Laura suspira, e se aproximou de Maciel.

 

LAURA

- Olhe Maciel! Agora não dá pra conversar, viu. Tô aperriada aqui de serviço. 

MACIEL

- Tá certo, te entendo. Tô com saudades de cê, sabia?

 

Laura cruza os braços, olhando-o com desconfiança.

 

LAURA

- Qualé Maciel? Cê gosta mesmo é de brincar com os meus sentimentos, tá sabendo? 

MACIEL

- Oxe, deixe disso! Cê sabe que não. Eu sumi porque tava meio enrolado com a polícia.

 

Laura fica mais tensa, suas sobrancelhas se franzem.

 

LAURA

- E vai ser sempre assim, cê sempre vai tá enrolado. Porque vive fazendo coisa que não deve. 

MACIEL

- Não mais. Tô dando um jeito na minha vida. Vou encontrar um emprego, vou voltar a estudar. E aí minha linda, a gente vai casar, vamos morar juntos. E finalmente poder ter quantos filhos a gente quiser. 

LAURA

- Como eu queria acreditar nisso,viu Maciel. 

MACIEL

- Mas não acredita por quê? O que lhe digo é a verdade, e vou provar pra ti.

 

Ao longe Ravena observa os dois conversando. Ela resolve então intervir chamando a atenção de Laura.

 

RAVENA

(chamando)

- Venha cá Laura! 

 

Laura, compreendendo a situação, pede um momento a Maciel e se dirige a Ravena. 

 

LAURA

- Só me espere um tiquinho aqui Maciel. 

 

Laura se afasta de Maciel e vai até onde está a Ravena. 

 

RAVENA

(depois que Laura se aproxima)

- Não quero esse rapaz aqui na loja. Se cê quer arruinar sua vida faça isso bem longe daqui. Tá certo?

 

Laura olha para Ravena, assentindo com seriedade.

 

LAURA

- Tá certo, entendi direitinho. 

 

Laura volta para onde Maciel está, enquanto Ravena continua observando os dois. 

 

LAURA

(depois de se aproximar de Maciel)

- Acho melhor cê ir embora, nego. 

MACIEL

- A dona lá encrencou, não foi? 

LAURA

- Aqui é o meu local de trabalho, depois a gente conversa. 

MACIEL

- Então vamos nos encontrar depois que tu sair daqui? 

LAURA

- Pode ser, então. Agora cê tem que ir. 

 

Maciel sai da loja, mandando um beijo para Laura enquanto se afasta. 

 

MACIEL

- Te amo muito, viu? Esteja certa disso. 

LAURA

- Também te amo! 

 

Maciel se despede de Laura e saiu da loja. Laura observa-o se afastando. Ao longe Ravena fica reparando nos dois.

 

CENA 05/ INT/ APT DA BEATRIZ/ SALA/ DIA 

Beatriz entra na sala segurando uma xícara de chá, caminha até o sofá e se acomoda confortavelmente. Ela pega o controle remoto e liga a televisão, mas seu olhar é atraído pelo cartão da oficina do Jorge que está sobre a mesinha de centro. Curiosa, ela pega o cartãozinho e começa a relembrar o seu encontro com ele. 

 

[FLASHBACK ON] 

Capitulo 03/ CENA 16/ EXT/ RUA/ NOITE

Beatriz está dentro do carro, e Jorge do lado de fora apoiado na janela que está aberta. 


JORGE

- Poderia me passar o número do seu telefone. Vai que acontece alguma coisa com o carro, né mesmo.

 

Beatriz sorri, olhando diretamente nos olhos dele.

 

BEATRIZ

- Nesse caso, sou eu que terei que ligar. Não acha? Eu já peguei um cartãozinho da loja, qualquer coisa eu entro em contato.

(tirando os braços de Jorge do seu carro)

- Tenha uma excelente noite! 

JORGE

- Boa noite! E tenha cuidado na estrada.

 

Beatriz brinca, provocando-o levemente.

 

BEATRIZ

- Mulher no volante perigo constante, né isso? 

JORGE

- É barril viu. Foi isso que eu disse, não.

 

Beatriz levanta uma sobrancelha, desafiando-o com um sorriso divertido.

 

BEATRIZ

- Não disse, mas pensou, né.  Passe bem! 

[FLASHBACK OFF]   

 

Continuação/ CENA 05/ INT/ APT DA BEATRIZ/ SALA/ DIA 

Beatriz olha para o cartão em suas mãos, balançando a cabeça.

 

BEATRIZ

- Que mecânico mais abusado, viu! Mas trabalha bem, né. Vou salvar esse número em meu telefone.

 

Ela percebe a dinâmica desafiadora entre eles, o jeito machista de Jorge contrastando com sua própria atitude empoderada. Beatriz sabe que o lugar da mulher era onde ela quisesse, e o jogo de poder entre eles a excitava. Era uma atração baseada em opostos que os mantinha envolvidos em um flerte provocador.




 

CENA 06/ INT/ CASA DOS FERNANDES/ QUARTO DA GIOVANA/ DIA 

Jana está no quarto de Giovana, organizando suas coisas no armário da irmã, quando Eliete entra no cômodo, já lançando críticas.

 

ELIETE

- Olhe só! Pelo o que tô percebendo resolveu voltar pra cá de mala e cuia. 

JANA

- Naturalmente,né. Não sei se tu lembra, mas essa casa é de painho. 

ELIETE

(sorri com deboche)

- Tá certo né, tá certinho. Obviamente que seu painho não iria se opor a isso, né mesmo?

 

Jana para o que está fazendo e olha para Eliete, confusa.

 

JANA

- Onde cê quer chegar, Eliete? Ainda não tô entendendo. 

ELIETE

- Essa história de que cê engravidou de um estupro tá muito mal contada, não sabe. A mim cê não engana, Janaína. Tenho certeza de que essa criança que cê tá esperando é do seu amante. Mas o que fazer, não é? Tá no seu sangue, O pecado corre nas suas veias. 

JANA

- Não posso acreditar no que tô ouvindo! Sua opinião não me interessa nem um pouco, viu.

 

Jana volta a guardar suas roupas, tentando ignorar Eliete.

 

ELIETE

(provocando)

- Talvez não a você, mas tenho certeza que Paulo tá pensando a mesma coisa. Por isso mesmo ele acha inaceitável criar esse filho. E eu não o culpo, viu. Se eu tivesse em seu lugar, também não aceitaria criar o filho de outro homem.

 

Jana encara firmemente Eliete com agressão em suas palavras.


JANA

- Escute aqui Eliete! Lave bem essa sua boca ao vim falar do meu filho. Tá me entendendo bem, sua insuportável? 

ELIETE

- Falo o que vejo. O pecado tá reinando na tua vida e cê parece que não percebe. Não tô falando do seu filho, tô falando das suas atitudes. 

JANA

- Ó pai! Falou a santa, a imaculada. 

ELIETE

- Imaculada não, pois imaculado é só o nosso Senhor Jesus Cristo. Sou apenas uma serva, e tô aqui para espalhar a palavra de Deus nesse mundo corrompido pelo o pecado. Deus tem planos para a sua vida, viu Janaína. Mas pra isso cê tem que abandonar o pecado. Sair dessa imundice que cê se enfiou. 

JANA

- Outra hora, vá bem Eliete?

(expulsando Eliete do quarto)

- Me dê licença, preciso terminar de arrumar minhas coisas. 

ELIETE

- Não precisa empurrar que já tô saindo. A ira de Deus ainda vai se revoltar contra você. Convertei enquanto há tempo. 

JANA

- Amém e aleluia! Agora se saia e me deixa em paz.

 

 

CENA 07/ EXT/ BOUTIQUE DA RAVENA/ TARDE 

Raimunda vai até a loja da Ravena se encontrar com a Laura.

 

RAIMUNDA

(se aproximando da loja)

- Ande logo Rebeca! 

REBECA

- Calma mainha! A senhora tá andando muito rápido e as minhas perninhas são pequenininhas. 

RAIMUNDA

(já diante da loja)

- É aqui!

 

Raimunda e Rebeca vêm chegando e param na porta da loja. Ao avistar as duas Ravena se aproxima.

 

RAVENA

(se aproximando)

- Pois não, em que posso ajudar?

 

Raimunda olha Ravena de cima abaixo com desdém.

 

RAIMUNDA

- Eu gostaria de falar com a minha filha.

 

Rebeca está olhando um manequim que usa uma camisola sensual.

 

REBECA

- Mainha olha essa belezura. Que vestido mais lindo, compra pra mim. 

RAIMUNDA

(repreendendo)

- Misericórdia menina, isso é coisa de Belzebu! 

REBECA

(confusa)

- Oxente! Não sabia que ele usava vestido. 

RAVENA

(estranhando)

- Não entendi bem. A senhora disse que gostaria de falar com sua filha?

 

Laura, ao longe, ver a sua mãe e vai se aproximando.

 

 

RAIMUNDA

- Isso mesmo, sou mãe de Laura. Poderia ter a gentileza de me chamar ela? 

LAURA

(chegando)

- Minha mãe, mas o que a senhora faz aqui? 

REBECA

(animada)

- Oi Laura! E aí cê falou com Xuxa? 

LAURA

- Falei, ela mandou um abraço pro cê. 

REBECA

(emocionada)

- Olhe isso, que coisa linda! Ela é minha fã. 

RAIMUNDA

- Te aquiete, Rebeca! 

REBECA

- A Laura é amiga da Xuxa, mainha. 

RAIMUNDA

- Vá bem, agora fique quieta. Podemos conversar, minha filha? 

RAVENA

- Acho bom você conversar com sua mãe, Laura. 

LAURA

- Vamos sentar ali dentro. A gente fica mais a vontade.

 

Laura leva Raimunda para uma sala reservada dentro da loja.

  

CENA 08/ EXT/ PLANO GERAL 

Na tarde em Salvador, o bairro de Calabar revela uma paisagem marcada por casas empilhadas umas em cima das outras, formando uma comunidade periférica densamente habitada. As construções, em sua maioria de alvenaria, carecem de reboco, exibindo as marcas do tempo e da falta de recursos. As fachadas das casas são simples e desgastadas, revelando as dificuldades enfrentadas pelos moradores. Maciel caminha pelos becos estreitos e apertados, porém conhece cada curva e cada esquina, pois esse lugar é seu lar desde a infância. Os sons das crianças brincando e dos vizinhos conversando preenchem o ambiente, enquanto roupas penduradas nas janelas colorem a vista.


CENA 09/ EXT/ CALABAR/ BECO/ TARDE 

Maciel se depara com RATO, um homem de 23 anos, magro e com um olhar astuto. Rato é um traficante de drogas e amigo de infância de Maciel. Sua aparência transmite uma mistura de desconfiança e ambição desmedida. Com uma postura firme e decidida, Rato leva a vida fazendo pequenos tráficos, mas anseia por algo maior. Está disposto a tudo para se dá bem na vida, mesmo que isso implicasse em assumir riscos cada vez maiores.

Enquanto se encontram no beco, Maciel e Rato trocam olhares que transmitem uma compreensão mútua, como se estivessem conectados por uma história compartilhada e por um futuro incerto.

 

RATO

- E aí meu brother! Qualé, sumiu por quê? Nunca mais lhe vi. Pensei até que tivesse preso, pae. 

MACIEL

- Quase, viu? Mas cê sabe que sou malandro e sempre dou um jeito de escapar. 

RATO

- Tá certinho, é desse modelo. Foi bom te encontrar por aqui, viu. Tem uma parada maneira pra ti. Coisa de responsa, tá sabendo? 

MACIEL

- É barril, quero não! 

RATO

- O que é, moço? Nem te falei ainda do que se trata. 

MACIEL

- Seja o que for tô fora, viu Rato. Quero mexer com coisa errada mais não. Tô amarrado em uma nega aí. Quero um compromisso sério, não dá mais pra levar a vida em alto risco não. 

RATO

- Acho que tô ligado qualé. É aquela nega que tu disse que tava grávida, né mesmo? Diga aí, a mina tá prenha mesmo? 

MACIEL

- É ela mesmo. Mas ela tirou. Não dava pra ter menino agora, né mesmo? Só que tô querendo construir minha vida e aí, sim, ter o nosso bacurizinho. Pô, nego véi, te dá a real. Fiquei sentido, viu! Eu queria o menino. Mas a realidade é que não tenho nenhuma condição de ter filho agora. Tá sabendo? Quero melhorar a minha vida, pra depois pensar em filho. 

RATO

- Tô ligado meu mano. Mas confia no pai aqui, viu. A parada que tenho pra ti é de responsa. Pega a visão. Tu vai trabalhar numa loja de queijo, coisa séria. Vai trabalhar lá com o seu Valdomiro, cê já conhece. Ele é aqui mesmo de Calabar. 

MACIEL

(desconfiado)

- Massa! Sei quem é, sim. Mas conheço ele e te conheço também, tá? Diga logo aí, qual é o recheio desse queijo? 

RATO

(dando uma risada)

- Nego esperto! Cê tá certo, viu. Tem mesmo uma coisinha no meio. Mas não é em todos, não. É um em cada dez queijos. A grana é boa, cinquenta por cento em cada queijo recheado. Os clientes já são certinho, pae. Não tem erro. 

MACIEL

- Tá certo, então. Tô dentro. 

RATO

- É isso mesmo, nego véi! Agora sim, tô falando com um homem de negócio. 

MACIEL

– Mas presta atenção, viu Rato. É só até eu conseguir uma grana, tá entendendo? 

RATO

– Pode crê, rei. Fique frio! 

 

CENA 10/ INT/ BOUTIQUE DA RAVENA/ SALA/ TARDE 

Raimunda e Laura estão sentadas em uma sala a parte, dentro da boutique. Laura está visivelmente frustrada, enquanto Raimunda tentava convencê-la a voltar para casa.

 

LAURA

- Não tem como eu voltar pra casa, não minha mãe. Painho é um machista, preconceituoso e misógino. Não tem como nós dois convivermos na mesma casa, né. 

RAIMUNDA

- Oh filha, procure entender. Tudo o que seu pai faz é para o seu bem. Ele se preocupa muito com cê, Laura. 

LAURA

- Meu bem? Painho implica com minha roupa, implica por eu pintar o meu cabelo, implica com os meus piercings, minhas tatuagens. Oxe, será quando que ele vai entender que o corpo é meu, eu faço o que eu quero! 

RAIMUNDA

- Deus não gosta dessas coisas não, minha filha. Olha bem pra você, o estado que cê se encontra. Se brincar deve tá se drogando, se prostituindo. Oh Laura, cê tá no fundo do poço. Deixe mainha te ajudar meu amor. 

LAURA

- Mas não preciso de ajuda, gente. E outra não tô usando droga nenhuma, não, viu?  E nem me prostituindo também. E se eu fizesse isso, o corpo é meu o que cês têm com isso? 

RAIMUNDA

- Misericórdia Laura, as coisas que cê fala minha filha. Escute sua mainha, que lhe ama tanto. Volte comigo pra casa. Eu vou conversar com seu pai, vou pedir para ele ter um pouco mais de paciência, ser mais tolerante. Mas cê também tem que se esforçar, né minha filha. Vamos procurar harmonizar mais a nossa família. Não dá pra gente continuar vivendo assim. 

LAURA

- Custa cês entenderem que penso diferente de vocês, que quero uma vida diferente das que cês querem me impor? Pelo o gosto de painho, eu estaria casada um daqueles carinhas da igreja, que ele tava querendo empurrar pra cima de mim. 

RAIMUNDA

- Kaleb, filho do irmão Osvaldo, um menino tão bom. Eu fazia gosto desse casamento. 

LAURA

- Bom para a senhora, minha mãe. Bom para o meu pai. Mas entenda, não é bom para mim. 

RAIMUNDA

- Tá certo Laura. Deus é testemunha de como eu tenho tentado. Eu ainda vou orar muito pro cê, viu minha filha. Tenho fé que a sua vida será transformada. Que Deus te abençoe, vá bem! Agora preciso ir, antes que seu pai venha atrás de mim. 

LAURA

- Pois vá minha mãe, antes que seu marido venha atrás da senhora e te leva pra casa pelo os cabelos. Afinal a senhora é uma propriedade dele, né? 

RAIMUNDA
- Não fale besteira, menina! Seu pai jamais levantaria a mão contra mim. Seu pai é um homem temente a Deus. Eu vou embora sim, mas porque respeito o marido que Deus me deu, um dia cê vá entender isso. Pense bem minha filha, essa sua rebeldia tá acabando comigo.

 

CENA 11/ EXT/ PLANO GERAL 

Imagem panorâmica acompanha a transição de cena. Capturando as paisagens pitorescas. Fitinhas coloridas adornam a Igreja de Nosso Senhor do Bonfim. A cena muda para o letreiro "Uma Semana Depois", mostrando a agitação da cidade e esportistas à beira-mar. A cena termina com um panorama da Baía de Todos os Santos ao nascer do sol. 

 

CENA 12/ INT/ CLÍNICA BIO IN VITRO/ RECEPÇÃO/ DIA 

Cássia e Jana estão na recepção da clínica, cuidando de suas tarefas diárias. Maurício, chega e cumprimenta as duas.

 

MAURÍCIO

(chegando)

- Bom dia meninas! 

JANA

- Bom dia doutor! 

CÁSSIA

(sorridente)

- Bom dia! 

MAURÍCIO

- Cássia, não se esqueça do nosso cineminha mais tarde, viu? 

CÁSSIA

- Esqueço não, pode deixar.

 

Maurício segue para o seu escritório, enquanto Jana observa o clima descontraído entre os dois.

 

JANA

- Olhe só, outro cineminha? Isso tá virando rotina, hein? Pelo o jeito cê conseguiu fisgar o gatão do Dr. Mauricio. 

CÁSSIA

- Tô investindo, viu nega. Mas ainda não tive muito êxodo. 

JANA

- E por que, não? Ele não tá interessado? 

CÁSSIA

- Olhe Jana, eu até tentei forçar a barra pra ver se rolava pelo menos uns beijinhos. Mas ele ficou se esquivando, não sabe. Fingindo que não tava entendendo as minhas reais intenções. Resolvi então ser direta, falei pra ele que tava afim dele, e tal. 

JANA

- E aí, e ele? 

CÁSSIA

- Aí ele falou que tava com medo de me machucar com essa história toda. Falou que gostava muito de tá comigo, que a minha companhia era muito agradável, que eu era isso que eu era aquilo. Mas que ele era apaixonado por outra mulher. 

JANA
- Ave Maria, Cássia! Então o homem é comprometido?
 

CÁSSIA

- Parece que não, a mulher não quer saber dele. Só que ele arrasta uma asa pra ela de dá dó. Mas eu não perdi a esperança não, viu meu bem. Se ela não quer, tem quem queira. 

JANA

(sorri)

- Tá certa, viu nega! Boa sorte pro cê, então. 

CÁSSIA

- Obrigada. E venha cá. Cê e Paulo, não se entenderam mesmo? 

JANA

- Como eu posso me entender com uma pessoa que quer matar o meu filho, me diga? 

CÁSSIA
-
Matar é um termo bem pesado, né Jana? Não é bem isso, viu. Tudo bem se cê não quiser tomar o remédio, afinal, cê foi estuprada e, legalmente, cê pode fazer o aborto. 

JANA

- Não é matar? Oh Cássia, se eu vou interromper uma vida que nome se dá a isso, a não ser matar, assassinar? Não importa se tá dentro de mim ou fora, é uma vida em desenvolvimento, e ninguém tem o direito de interromper, não. Nem mesmo eu, viu. 

CÁSSIA

- Cê tá certa. Não vou discutir com cê sobre isso. O importante que cê vai ser mãe, e isso te faz feliz. 

JANA

(animada)

- Virgem Maria, que tô é rachando de felicidade! Já te mostrei o último ultrassom que fiz?

 

Cássia balança a cabeça negativamente, Jana pega o envelope com o ultrassom e mostra para Cássia.

 

JANA

- Olhe só, já dá pra ver a mãozinha, o pezinho. Esse aqui é o coraçãozinho, pensa num coração agitado, Cássia. Parecia um trio elétrico, menina. 

CÁSSIA

- É baiano, então! Mas venha cá, já deu pra ver o sexo? 

JANA

- Ainda não deu pra ver. Ainda é pequeninho, né. Mas também pra mim o sexo não interessa, o importante é que tenha saúde. 

 

CENA 13/ EXT/ CENTRAL/ PORTÃO/ DIA 

Giovana e Laura saem juntas do colégio, engajadas em uma conversa animada.

 

GIOVANA

- Precisamos marcar alguma coisa, viu.A gente nunca mais saiu, não fizemos mais nada juntas. 

LAURA

- É verdade, temos que marcar algo. Só que agora minha vida anda tão arrochada, menina. Trabalhando lá na boutique da Ravena quase não me sobra tempo pra nada. 

GIOVANA

- E cê tem falado com sua mãe, com seu pai? 

LAURA

- Mainha agora que descobriu onde é a boutique da Ravena, sempre aparece por lá. Já painho, esse nem faço questão, viu. Não suporto. Já suportei a minha vida toda, agora chega. 

GIOVANA

- Chato essa situação entre cês dois. 

LAURA

- Nada nega, nem me faz falta. Acho que meu pai tem é vergonha de mim. Fico mais sentida por causa de mainha, né. A coitada fica querendo apaziguar as coisas, mas é só meu pai falar mais alto que ela corre e faz as coisas do jeitinho que ele quer. 

GIOVANA

- Eu e painho nos damos tão bem. Dá nem pra imaginar eu sem falar com ele. 

LAURA

- Oxe, mas aí também não tem nem como comparar, tio Genivaldo com cavalo do meu pai, né. Oh nega, o papo tá bom mas depois a gente conversa mais, viu. Preciso ir, o trabalho me espera. 

GIOVANA

- Tá certo, vá lá viu!Bom trabalho pro cê. Nos vemos depois para marcar algo, vá bem? 

 

CENA 14/ INT/ CLÍNICA BIO IN VITRO/ RECEPÇÃO/ DIA

Beatriz chega na clínica eufórica e apressada.

 

BEATRIZ

(chegando)

- Bom dia meninas! 

JANA

- Bom dia doutora! 

CÁSSIA

- Bom dia Dr. Beatriz! 

BEATRIZ

- Sei que já tô bem atrasada. Vocês acreditam que meu carro estragou de novo? Tive que deixar novamente lá na oficina daquele mecânico indecente. Fica me olhando de cima a baixo. Ele acha que por eu ser mulher ele pode me passar pra trás. 

JANA

- Coitado, escolheu a mulher errada pra isso, hein doutora? 

BEATRIZ

- Cê que acha? É ruim, dou mole para homem nenhum. E como tá a lista dos meus pacientes? 

CÁSSIA

- Vou levar a agenda pra senhora.

(mostrando a agenda para Beatriz)

 - Aqui está a lista. Começando com a Sra. Abigail...

 

Cássia sai com Beatriz, Paulo chega logo em seguida adentrando a clínica.


PAULO

- Oi! 

JANA

- Oi!

(irônica)

- Veio fazer algum exame? 

PAULO

- Você sabe que não, né Jana. Vim conversar com cê. 

JANA

- Olhe, Paulo, tô no meu ambiente de trabalho não quero confusão aqui. 

PAULO

- Também não quero confusão. Só vim te avisar que tô indo embora para o Mato Grosso. Quero conversar contigo direitinho pra ver como vamos fazer com a casa, né.

 

Jana se entristece ao ouvir o marido dizendo que iria embora.

 

JANA

- Então é isso, acabou de vez, foi?

 

Parece que é o fim. O casamento de dez anos entre Paulo e Jana termina ali.





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