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ESPERANÇA - CAPÍTULO 14

 


ESPERANÇA

Capítulo 14

Novela criada e escrita por

Wesley Franco

CENA 1. INT. BORDEL DE MADAME YVETTE – SALÃO – DIA

O som de risadas e conversam enchem o salão. Robervaldo está sentado em uma poltrona com as meninas – Zuleika, Florzinha, Mara e Teodora – todas reunidas em volta, conversando e rindo.

FLORZINHA (RINDO) – Vocês não acreditam! Ontem à noite, um dos meus clientes tirou o sapato e quase me matou sufocada com o cheiro que saiu daquele sapato. Quando aquele fedor invadiu o quarto, foi quase uma tortura!

Todos caem na gargalhada, divertidos com a história.

ZULEIKA – Acho que a gente deveria começar a cobrar taxa extra por suportar certos odores.

De repente, a porta se abre e Isabella entra. Ela olha ao redor com um misto de timidez e vergonha, claramente deslocada naquele ambiente. Os risos cessam e todos a encaram, sem entender o que ela está fazendo ali.

ROBERVALDO – Acho que a mocinha entrou no endereço errado...

ISABELLA (HESITANTE) – Não, eu vim ao lugar certo...Aqui é o bordel de Madame Yvette, não é?

MARA (CONFUSA) – Sim, é. Mas o que você quer aqui, menina?

Nesse momento, Madame Yvette desce lentamente as escadas, e olha para Isabella de cima a baixo com um olhar cauteloso.

YVETTE – O que você deseja?

ISABELLA (ERGUENTO O OLHAR) – Quero ser uma das meninas do bordel!

Há um murmúrio de surpresa e descrença entre os presentes. Madame Yvette caminha em direção a Isabella, parando a poucos passos dela, analisando-a com um olhar penetrante.

YVETTE – Tem certeza do que está falando? Sabe onde está se metendo?

ISABELLA – Sim. Eu não tenho outra saída, ou eu fico aqui, ou vou para a rua.

Madame Yvette cruza os braços, ponderando por um instante.

YVETTE – Você é muito jovem...Não deveria estar aqui. Este não é o seu lugar.

ISABELLA (DESESPERADA) – Eu não tenho para onde ir!

Madame Yvette observa a vulnerabilidade de Isabella e faz um gesto para que a jovem a acompanhe.

                                                         CORTA PARA:

CENA 2. INT. BORDEL DE MADAME YVETTE – QUARTO DE MADAME YVETTE – DIA

Madame Yvette, sentada em uma cadeira de frente para Isabella, que está em pé, com as mãos trêmulas, ainda emocionada.

YVETTE – Agora, me diga, o que aconteceu com você?

ISABELLA (CHORANDO) – Eu fui abusada pelo meu tio Jerônimo. E a minha tia Martina, ela acha que fui eu que o seduziu, ela nos flagrou dentro do meu quarto, e ele começou a me acusar de ter dado em cima dele e ela acreditou.

YVETTE – E por que você não contou a verdade para ela?

ISABELLA – Ele me ameaçou! Disse que se um dia eu contasse a alguém o que ele fazia comigo, ele mataria meu irmão, mataria a minha tia e depois me mataria. Eu não posso voltar para aquele lugar e eu não tenho para onde ir. Eu estou perdida! E o bordel é a minha única saída.

Madame Yvette olha para Isabella com uma expressão de compaixão e dor silenciosa. Ela se levanta e se aproxima da jovem, colocando uma mão gentilmente sobre o ombro dela.

YVETTE – Quando eu tinha mais ou menos a sua idade, aconteceu a mesma coisa comigo. Um vizinho abusou de mim, eu contei a verdade, mas ninguém acreditou, me acusaram de ter seduzido ele, sendo que eu era apenas uma menina como você, e eu fui colocada para fora de casa e também não tive outra saída a não ser me tornar uma mulher da vida.

Isabella olha para Yvette com um olhar de compreensão pelo que ela passou, e lágrimas continuam a descer pelos seus olhos.

YVETTE – Você vai ficar aqui! Mas você não precisa trabalhar como as outras meninas, ainda é muito jovem, pode ajudar na limpeza, na cozinha...até que você tenha idade para decidir por si mesma.

ISABELLA (EMOCIONADA) – Muito obrigada...eu não sei como agradecer...

YVETTE (ABRINDO OS BRAÇOS) – Venha cá...

Isabella abraça Madame Yvette, chorando nos ombros dela, enquanto Yvette a acaricia nas costas, mostrando o primeiro gesto genuíno de acolhimento que Isabella sente em muito tempo.

                                                         CORTA PARA:

CENA 3. INT. FAZENDA DOS ALMEIDA – CASA DOS ALMEIDA – SALA DE JANTAR – DIA

Coronel Almeida, Dorotéia, Camila e Eulália estão reunidos em volta da mesa de café. Nina, a empregada, serve o café com discrição e precisão.

ALMEIDA (PEGANDO O JORNAL) – Eulália e Camila, é bom que terminem logo esse café. O trem que irá leva-las de volta para o Rio Grande do Sul parte daqui a pouco.

EULÁLIA – Mal vejo a hora de voltar ao Rio Grande do Sul, o clima lá é muito mais agradável do que o calor infernal que faz nessa cidade.

CAMILA – Pois, eu não vejo a hora de poder voltar a morar aqui em Esperança. Estou detestando tudo no Rio Grande do Sul!

Nesse momento, Marcos entra na sala, ainda sonolento.

MARCOS (BOCEJANDO) – Bom dia a todos.

DOROTÉIA – Bom dia, meu filho. Passaram bem a noite? Onde está a sua esposa, a Helena?

MARCOS (SENTANDO-SE À MESA) – Ela ainda está se arrumando no quarto. Dormimos um pouco mais, o dia ontem foi muito cansativo.

Nina sai discretamente em direção ao quarto para verificar a situação da filha.

CAMILA (CURIOSA) – Eu espero muito que vocês sejam felizes nesse casamento.

ALMEIDA – E irão ser! Eles formam um lindo casal.

Marcos olha para o Coronel Almeida, mas fica em silêncio.

ALMEIDA (IMPACIENTE) – Vamos, Eulália e Camila, vamos nos apressar. Vocês não podem perder esse trem.

                                                         CORTA PARA:

CENA 4. INT. FAZENDA DOS ALMEIDA – CASA DOS ALMEIDA – QUARTO DE MARCOS E HELENA – DIA

Helena está de pé em frente ao espelho, vestindo uma camisola leve, com um olhar distante e triste. Ela se observa, como se procurasse respostas em seu próprio reflexo. A porta se abre suavemente, e Nina, sua mãe, entra no quarto.

NINA – Helena, querida, você está bem? Como foi a noite de núpcias?

HELENA – Não houve noite de núpcias, mamãe. O Marcos nem me tocou, ele se deitou na cama, virou para o lado e dormiu, como se eu nem estivesse lá.

Nina fica surpresa e ligeiramente desconfortável. Aproxima-se mais da filha e tenta consolar.

NINA – Minha filha...talvez ele estivesse nervoso ou cansado. Ontem foi um dia longo para todos.

HELENA – Não é isso, mãe. Eu senti, ele não tem desejo por mim. Tenho certeza que ele não gosta de mulher, um casamento não ia resolver esse problema que ele tem. Ele nunca vai me tocar, eu vou morrer seca e sozinha nesse casamento.

Nina abraça Helena com força, enquanto a filha desaba em lágrimas.

NINA (SUSSURANDO) – Vai ficar tudo bem, querida. Vamos encontrar uma solução.

                                                         CORTA PARA:

CENA 5. INT. MANSÃO DE FLÁVIO – JARDIM – DIA

Flávio está sentado em uma cadeira, com o olhar perdido, observando o refluxo da luz na superfície da água da piscina. A expressão em seu rosto é uma mistura de dor e saudade, enquanto reflete a recente perda de seu filho, Ernesto. Matteo se aproxima.

MATTEO – Padrinho, está tudo bem?

FLÁVIO – Estou...aprendendo a lidar dia a dia com a ausência, mas não tem sido fácil.

Matteo se senta ao lado de Flávio.

MATTEO – Sei o tamanho da dor que você está sentindo, passei pelo mesmo quando perdi as pessoas que eu tanto amava...

FLÁVIO (OLHANDO PARA MATTEO) – Eu agradeço a Deus por ter você ao meu lado aqui neste momento. Há algo em você que me lembra muito do Ernesto, talvez seja isso que tem me ajudado a preencher esse vazio deixado por ele.

MATTEO (EMOCIONADO) – E o senhor, padrinho, é a figura mais próxima que tenho de um pai. Em muitos momentos, o senhor preenche o vazio que o meu pai deixou.

FLÁVIO – Que bom que temos um ao outro.

Os dois se abraçam, compartilhando o consolo mútuo em meio à dor.

                                                         CORTA PARA:

CENA 6. INT. PREFEITURA – SALA DE AUGUSTO – DIA

Augusto está sentado em sua mesa, trabalhando. Pedro entra cantando animadamente, sua expressão é de pura alegria.

AUGUSTO (LEVANTANDO O OLHAR E RINDO) – Mas o que é essa animação toda? O que aconteceu?

Pedro com um sorriso travesso, retira uma calcinha do bolso do paletó e joga na direção de Augusto, que a pega no ar.

AUGUSTO (RINDO E BALANÇANDO A CABEÇA) – Isso é sério? De quem é?

PEDRO – É da Hismeria! Consegui, como eu disse que conseguiria.

Augusto ri alto.

AUGUSTO (PROVOCANDO) – E como foi isso?

PEDRO – O ex-marido dela deve ser o maior imbecil do mundo por ter se desfeito de uma mulher assim. Ela é um verdadeiro furacão na cama, melhor do que todas as mulheres daquele bordel juntas.

AUGUSTO (AINDA RINDO) – Então é tão bom assim? Está apaixonado é?

PEDRO (SORRINDO) – Quem sabe...talvez eu esteja.

Os dois riem juntos.

                                                         CORTA PARA:

CENA 7. INT. CASA DE MARTINA E JERÔNIMO – QUARTO DE MARTINA E JERÔNIMO – DIA

Martina está sentada à escrivaninha, concentrada enquanto escreve a última linha de uma carta, com lágrimas discretas escorrendo. Ela coloca a carta em um envelope e começa a fechá-lo. Nesse momento, a porta se abre bruscamente, e Jerônimo entra.

JERÔNIMO (DESCONFIADO) – Para quem é essa carta?

MARTINA (ENCARA) – É para o Matteo. Achei que ele devia saber de alguns últimos acontecimentos que ocorreram por aqui.

Jerônimo se aproxima rapidamente, arrancando o envelope das mãos dela.

JERÔNIMO – Deixe comigo, eu mesmo colocarei nos correios.

Martina se levanta e pega sua bolsa.

MARTINA – Vou até a polícia para saber de notícias da Isabella. Ela pode ter feito algo terrível comigo, mas ainda é minha sobrinha. Não posso deixa-la na rua.

Jerônimo a encara.

JERÔNIMO – Esqueça essa garota! Depois do que ela fez, ela não merece nunca mais por os pés nesta casa.

MARTINA – Ela é só uma menina, e é minha sobrinha, eu não posso deixa-la sozinha sem ter nenhum tipo de auxílio. E além do mais, eu começo a me questionar se você não foi o culpado de tudo isso, se não foi você que a seduziu e depois colocou a culpa nela.

O rosto de Jerônimo se transforma em um retrato de fúria. Em um movimento rápido, ele atinge Martina com um tapa violento, que a faz cambalear para trás e cair no chão. Ele continua com a violência, chutando-a enquanto ela está caída, ofegante e chorando.

JERÔNIMO (GRITANDO COM RAIVA) – Nunca mais repita isso! Eu juro que se disser isso de novo, eu te mato!

Martina tenta se proteger dos golpes, gemendo de dor e com lágrimas escorrendo pelo rosto. Jerônimo a encara com desprezo antes de sair do quarto, deixando-a a caída no chão, soluçando em meio ao medo e à humilhação. Do lado de fora do quarto, ainda no corredor, Jerônimo rasga a carta escrita por Martina e guarda no bolso.

                                                         CORTA PARA:

CENA 8. INT. VAGÃO DO TREM – DIA

                              SONOPLASTIA: CLOSE TO YOY – CIDIA E DAN

Camila entra no vagão carregando uma pequena mala de mão, ela a coloca no compartimento de bagagem acima dos assentos e se senta perto da janela. O trem começa a se movimentar, e ela olha pela janela, vendo a paisagem rural se transformar gradualmente.

A vista pela janela começa a se modificar, e a imagem vai ficando mais desfocada, sinalizando a passagem de tempo. Camila, agora é uma mulher de 27 anos, usando uma linda saia rodada, típica da década de 1950. Ela continua sentada no mesmo lugar, mas sua postura e expressão refletem os anos que se passaram.

                                                         CORTA PARA:

CENA 9. EXT. ESPERANÇA – CAMPOS ABERTOS – DIA

Rodolfo, corre alegremente pelos campos, com o vento batendo em seu rosto. Ele se aproxima de um rio e, sem hesitar, mergulha na água.

O som do mergulho e o movimento da água são interrompidos por Rodolfo emergindo do rio. Agora, ele é um jovem de 22 anos, com traços mais maduros e expressão decidida. Ele sai do rio, sem camisa, vestindo apenas um calção e com os cabelos molhados.

                                                         CORTA PARA:

CENA 10. INT. GRUPO MATARAZZO – SALA DE REUNIÕES – DIA

Matteo está sentado em uma longa mesa de reuniões, com um ar sério e atento. Flávio, ocupando a cadeira central como presidente do grupo, guia a reunião com autoridade, enquanto Matteo o observa com admiração e respeito.

A mesa de reuniões permanece a mesma, mas agora Flávio não está mais presente. Matteo, ocupando a cadeira central, fala com confiança e determinação, guiando a reunião como o novo presidente do grupo Matarazzo. Os outros membros da mesa o escutam coma tenção, marcando a transição de poder e o amadurecimento de Matteo, que agora é um jovem de 27 anos, com barba e exibe uma expressão serena e segura.

                                                     SONOPLASTIA OFF

                                                         CORTA PARA:

CENA 11. INT. CASA VAZIA – SALA - DIA

A imagem abre mostrando o interior de uma sala modesta, próximo a janela e ao lado de uma poltrona se encontra um rádio sobre uma mesa de madeira. O rádio está tocando “Olhos Verdes” uma canção de Dalva de Oliveira que preenche o silêncio da sala vazia. A música continua a tocar até que é interrompida por uma interferência brusca do jornalismo da rádio. A vinheta do repórter Eso surge no rádio, anunciando que ele irá falar.

REPÓRTER ESO – Amigos ouvintes aqui quem fala é o repórter Eso, testemunha ocular da história. Atenção, atenção, ouvintes, o senhor Juscelino Kubitschek acaba de ser eleito com 35,68% dos votos e se tornará o 21º Presidente da República do Brasil.

                                                    CORTA PARA:

CENA 12. EXT. RUAS DE SÃO PAULO – DIA

As ruas de São Paulo estão tomadas por uma multidão em festa, celebrando a vitória de Juscelino Kubitschek nas eleições. Pequenos pedaços de papel, como uma chuva de confetes, são jogados das janelas dos edifícios, transformando o cenário em uma verdadeira comemoração de rua. Algumas pessoas dançam e se abraçam, enquanto outras balançam bandeiras do Brasil. O som de buzinas, risadas e cantos preenche o ambiente, mostrando a empolgação e o entusiasmo do povo.

                                                         CORTA PARA:

CENA 13. INT. CONSULTÓRIO MÉDICO – DIA

Matteo entra apressado na sala, onde Flávio já está sentado, aguardando. Dr. Josias está sentado em sua cadeira, olhando para os papéis.

MATTEO – Desculpe o atraso. A cidade está um caos com o resultado da eleição do JK, tive uma dificuldade de chegar até aqui.

FLÁVIO (SORRINDO) – É um bom motivo para o atraso, Matteo. O povo comemorando a festa da democracia.

DR. JOSIAS – Realmente, é um dia histórico e olha que eu votei no Távora. Mas, voltando o motivo de estarem aqui.

Dr. Josias ajusta os óculos e coloca os exames sobre a mesa, encarando Flávio com uma expressão séria.

DR. JOSIAS – Os resultados dos exames mostraram uma pequena lesão no pulmão direito. Ainda está em fase inicial, mas é grave.

MATTEO (PREOCUPADO) – O que isso significa? É algo que pode ser tratado?

DR. JOSIAS – Com o tratamento adequado, podemos evitar o pior. Porém, além das medicações que deverão ser seguidas rigorosamente, seria adequado considerar mudanças no estilo de vida. Recomendo que o Flávio deixe São Paulo e vá para um lugar com um clima mais ameno e menos poluído.

FLÁVIO (SUSPIRA) – Deixar São Paulo? Mas aqui sempre foi a minha cidade, nunca pensei em deixar de viver aqui.

DR. JOSIAS – Entendo, Flávio, mas pense nisso como uma medida temporária, ou até mesmo uma oportunidade de viver em um ambiente mais tranquilo. Talvez o interior seja uma boa opção.

                                                         CORTA PARA:

CENA 14. INTERIOR DO CARRO – DIA

Flávio e Matteo estão no banco de trás de um Cadillac Eldorado. O motorista dirige pelas ruas ainda movimentadas de São Paulo, com resquícios da festa popular.

FLÁVIO (PENSATIVO) – O que você acha das recomendações do Dr. Josias?

MATTEO – Há tempos venho pensando em voltar para Esperança, padrinho. Foi lá que minha família construiu suas raízes, e eu sempre quis retomar a vida por lá. Talvez essa seja a hora certa, e a gente possa encarar isso como uma nova fase.

FLÁVIO – Mas e o grupo Matarazzo, como vamos administrar estando em Esperança?

MATTEO – Vamos expandir a empresa para a cidade, será benéfica para nós e para toda a região, uma empresa do porte do nosso grupo trará um enorme desenvolvimento para toda aquela região. Mas não pense só nisso, a cidade tem ar puro e o senhor precisa cuidar da sua saúde.

FLÁVIO – Você tem razão quanto a isso.

MATTEO – Então está decidido, vamos para Esperança.

FIM DO CAPÍTULO

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