ESPERANÇA
Capítulo 27
Novela criada e escrita por
Wesley Franco
CENA
1. EXT. PRAÇA – DIA
A
praça está repleta de pessoas em trajes brancos e dourados, refletindo a
energia festiva do Ano Novo. Luzes piscam entre as árvores, e uma banda toca
músicas animadas no palco. As crianças correm ao redor, soltando risadas, enquanto
os adultos conversam. No meio da multidão, Matteo está com Rodolfo, Flávio,
Magali, Martina e Jerônimo. Eles conversam animadamente, mas Matteo mantém o
olhar inquieto, olhando ao redor da praça. Patrícia e Flora estão por perto,
observando discretamente.
FLÁVIO – Está
procurando alguém, Matteo?
MATTEO –
Ninguém em especial, padrinho.
De
repente, Matteo vê Camila chegando de mãos dadas com Inácio. Ela está
deslumbrante em um vestido branco. Matteo se mostra claramente incomodado por
ver Camila com Inácio. Camila percebe, troca um breve olhar com ele, mas vira o
rosto e continua andando com Inácio.
RODOLFO (PARA MATTEO) –
Parece que o noivado entre os dois é coisa séria.
Matteo
balança a cabeça, tentando se recompor. Do outro lado da praça, Almeida chega
com Dorotéia, Marcos, Helena, Ezequiel e Nina. O coronel observa a multidão com
um ar altivo.
ALMEIDA (SORRI) –
No próximo ano estarei nessa festa na condição de prefeito eleito desta cidade.
Quando eu for prefeito será bem menor, porque isso aqui é um grande desperdiço
de tempo e dinheiro.
DOROTÉIA –
Deixe o povo aproveitar, Almeida. É uma vez por ano esse tipo de festa.
Enquanto
isso, perto do palco, Robervaldo, Isabella, Teodora, Mara, Carolina e Florzinha
observam a festa. Carolina, ao avistar Rodolfo, sorri e pede licença ao grupo
antes de ir até ele. Isabella permanece, em silêncio, mas Robervaldo a cutuca.
ROBERVALDO –
Você deveria ir falar com seu irmão. O Matteo está bem aqui na sua frente, e
essa é a chance perfeita de vocês se reconciliarem.
ISABELLA –
Ainda não é o momento, Robervaldo.
O
Prefeito Fontes sobe ao palco, ajustando o microfone. Ele levanta a mão,
pedindo silêncio, e a multidão gradualmente se aquieta.
FONTES – Boa noite,
povo de Esperança! Estamos aqui reunidos para celebrar o fim de mais um ano e o
início de um novo ciclo.
Aplausos
ecoam, e Fontes continua, com um sorriso caloroso.
FONTES – Mas hoje,
além da celebração, temos uma mensagem especial. É com muito orgulho que convido
ao palco um homem que tem lutado pela nossa cidade: Matteo Bellini!
O
nome de Matteo é recebido com aplausos. Almeida, visivelmente irritado, fala
com Dorotéia.
ALMEIDA (ENFURECIDO) –
Mas o que está acontecendo aqui?
Matteo
sobe ao palco, ele ajeita o microfone e respira fundo antes de falar.
MATTEO – Boa noite,
Esperança! Hoje, mais do que um momento de celebração, é um momento de
reflexão. Por muito tempo, nossa cidade viveu sob o domínio de poucos, enquanto
muitos sofriam em silêncio.
A
multidão fica em silêncio absoluto, ouvindo atentamente.
MATTEO – Chegou
a hora de pôr fim a esses abusos. Chegou a hora de Esperança brilhar com o progresso
e a igualdade.
A
multidão começa a murmurar palavras de aprovação. Matteo olha diretamente para
Almeida.
MATTEO – Eu anuncio
hoje, aqui, diante de todos vocês, que sou candidato à prefeitura de Esperança!
A
praça explode em gritos de apoio. Pessoas batem palmas, levantam os braços e
gritam o nome de Matteo repetidamente.
ALMEIDA –
Fontes...traidor! Eu acabo com você.
Os
músicos voltam ao palco e um deles vai até o microfone.
MÚSICO
– Está quase na hora pessoal, 1955 está chegando ao fim. Vamos todos juntos
celebrar a chegada de 1956.
SONOPLASTIA: SPERANZA
– LAURA PAUSINI
A
praça inteira começa a ecoar a contagem regressiva.
TODOS – Dez...nove...oito...
Matteo
observa a multidão, e observa Camila e Inácio ao longe. Camila o percebe, mas
desvia o olhar, apertando a mão de Inácio.
TODOS –
Três...dois...um...Feliz ano novo!
Fogos
de artifício iluminam o céu de Esperança. Pessoas se abraçam, riem e comemoram.
Fernando ao lado de Homero, Constância e Dirce abre uma garrafa de champanhe
para comemorar a chegada do novo ano. Matteo permanece pensativo, enquanto
Almeida se retira com Dorotéia, visivelmente irritado.
SONOPLASTIA
OFF
Flora
abre uma garrafa de champanhe e serve duas taças, entregando uma delas a
Patrícia que retira um pequeno frasco do vestido e coloca algumas gotas dentro
da bebida.
PATRÍCIA –
Vá e entregue essa taça ao Matteo.
FLORA (CURIOSA) –
O que você colocou nessa bebida, mamãe?
PATRÍCIA (SORRINDO)
– É um remédio que vai fazer o Matteo sentir sono, quando ele estiver dormindo
você se deitará com ele e no dia seguinte ele pensará que vocês tiveram uma
linda noite de amor.
FLORA – Mas
como eu vou ficar grávida depois sem nunca ter me deitado com ele?
PATRÍCIA –
Deixe comigo, que eu resolverei isso. Agora vá e entregue essa taça ao Matteo e
faça com que ele beba.
Flora
vai até Matteo que ainda observa Camila com Inácio, ela entrega a taça a ele e
ele pega.
FLORA (BRINDANDO) –
Feliz ano novo. Que 1956 seja um grande ano para todos nós!
MATTEO –
Feliz ano novo, Flora!
Matteo
brinca com Flora e os dois bebem o champanhe.
FLORA – Eu sei
que a minha chegada foi conturbada e talvez você desejasse que eu nunca tivesse
chegado, mas eu jamais quis te causar mal, Matteo.
MATTEO – Você
não me causou mal algum, Flora. Você não teve culpa de nada. A culpa foi toda
minha e eu estou pagando por um erro exclusivamente meu.
FLORA – Eu te
amo, Matteo, mas se você ama a Camila, eu não me colocarei no meio de vocês
dois. Eu desejo que você seja muito feliz com ela.
MATTEO – Obrigado,
Flora. Mas eu acho que perdi a Camila para sempre.
Matteo
demonstra uma tristeza em seu olhar.
CORTA PARA:
CENA
2. INT. CASA DE LEDA – SALA – NOITE
A
sala é modesta, com móveis antigos e poucos adornos. Mariana, está de pé junto
à janela, observando a queima de fogos que ilumina o céu da cidade. Do lado oposto
da sala, Leda, está sentada em uma cadeira de balanço, segurando um rosário e
murmurando orações. Marina suspira profundamente, sua frustração é evidente.
MARIANA (OLHANDO PARA JANELA) – Mãe, por que a gente não foi para a festa?
LEDA (FIRME) –
Porque aquela festa é um ninho de perdição. Música alta, bebida, dança...isso é
coisa de gente que perdeu o caminho de Deus.
Mariana
vira-se para Leda, com tom de indignação.
MARIANA –
Mas todas as minhas amigas foram. É ano novo, mãe, a gente precisa se divertir
um pouco. Não tem nada demais em dançar e conversar com as pessoas.
LEDA – E é
assim que começa! Uma dança inocente aqui, uma conversa ali, e quando você
percebe, está nas garras do demônio!
MARIANA –
Isso não faz sentido! Não é porque alguém vai a uma festa que está fazendo algo
errado.
Leda
se levanta, com o rosário ainda na mão.
LEDA – Você
acha que essas suas amigas são moças direitas? Moças que se dão ao respeito não
se misturam com aquele tipo de gente.
MARIANA –
E quem é aquele tipo de gente? São só pessoas da nossa cidade, mãe.
LEDA – São pessoas
fracas de espírito. E eu não vou deixar que você, minha única filha, caia no
mesmo caminho. As outras mães podem ser cegas e deixarem suas filhas serem
levadas pelo pecado, mas eu não.
Mariana
desvia o olhar, com os olhos cheios de lágrimas. Leda segura o queixo dela com
força, obrigando-a olhar em seus olhos.
LEDA – Você
é minha responsabilidade. E eu vou proteger sua alma, nem que tenha que lutar
contra você mesma.
Mariana
recua, assustada com as palavras da mãe. Leda volta para sua cadeira de balanço
e retoma suas orações, enquanto Mariana olha para os fogos, com as lágrimas
escorrendo pelo seu rosto.
CORTA
PARA:
CENA
3. INT. MANSÃO DE MATTEO – QUARTO DE HÓSPEDES – NOITE
Flora
entra no quarto usando um roupão de seda, e encontra sua mãe, Patrícia, sentada
na cama. Flora fecha a porta e fala em um tom baixo.
FLORA –
Matteo está dormindo.
Patrícia
se levanta com uma expressão determinada.
PATRÍCIA –
Ótimo. Agora vá até o quarto dele, tire a roupa dele e a sua, e deite-se ao
lado dele.
FLORA (HESITANTE) –
Mãe, isso é arriscado...
PATRÍCIA –
Flora, ou você faz isso, ou perdemos tudo. Se ele acreditar que você passou a
noite com ele, quando você aparecer grávida ele não terá outra escolha a não
ser casar com você.
Flora
pensa por um momento e então sorri, como se tivesse tido uma ideia brilhante.
Ela sai do quarto sem dizer nada. Patrícia a observa confusa.
CORTA PARA:
CENA
4. INT. MANSÃO DE MATTEO – COZINHA – NOITE
Flora
entra na cozinha e abre uma gaveta, pegando uma faca. Ela olha para o objeto
por alguns segundos, decidida, antes de retornar ao quarto.
CORTA PARA:
CENA
5. INT. MANSÃO DE MATTEO – QUARTO DE HÓSPEDES – NOITE
Patrícia
ao ver Flora entrar no quarto com a faca na mão, arregala os olhos.
PATRÍCIA (ASSUSTADA) –
O que você vai fazer com isso?
FLORA –
Tornar tudo mais convincente.
Flora
se senta na beira da cama, levanta o robe e faz um corte superficial em sua
coxa. O sangue começa a escorrer lentamente. Patrícia, inicialmente
horrorizada, começa a entender o plano da filha.
PATRÍCIA (SORRINDO) –
Isso é genial.
Flora
se levanta com cuidado e pega um lençol branca da cama.
FLORA – Com esse
sangue, ele não vai duvidar de que se deitou comigo durante a noite.
Flora
suja o lençol de sangue, criando manchas que simulam a perda de virgindade.
PATRÍCIA –
Você é mais esperta do que eu pensei.
Flora
sorri levemente, mas há uma frieza em seus olhos. Ela sai do quarto com o
lençol ensanguentado, pronta para executar o plano.
CORTA PARA:
CENA
6. INT. MANSÃO DE MATTEO – QUARTO DE MATTEO – NOITE
Matteo
está deitado na cama, devido ao remédio administrado anteriormente. Flora entra
no quarto com passos silenciosos, fechando a porta. Ela coloca o lençol
ensanguentado sobre a cama, ajustando-o cuidadosamente. Flora então começa a
tirar a roupa de Matteo, que permanece imóvel. Quando termina, tira seu próprio
robe, ficando completamente nua, e se deita ao lado dele.
FLORA – Você
será meu, Matteo. Querendo ou não.
CORTA PARA:
CENA
7. EXT. PRAÇA DA CIDADE – NOITE
Rodolfo
segura uma taça de champanhe, enquanto Carolina, de vestido dourado está
abraçada a ele. Ambos riem casualmente. Do outro lado da praça, Isabella
conversa animadamente com Robervaldo, que gesticula com entusiasmo. Rodolfo a
observa de relance, mas rapidamente desvia o olhar, voltando-se para Carolina.
CAROLINA –
Por que você não vai falar com ela?
RODOLFO –
Com quem?
CAROLINA –
Com sua irmã, Rodolfo. Faz anos que vocês não se falam. Não sente vontade?
RODOLFO (RÍGIDO) –
Não. Ela deixou de ser minha irmã no dia que resolver virar...aquilo.
CAROLINA –
Aquilo?
RODOLFO –
Uma puta. Trabalhar em um bordel? Aquilo não é lugar para uma mulher que
presta.
Carolina
solta o abraço e o encara, ofendida.
CAROLINA –
Então eu também não presto, é isso? Porque, caso tenha esquecido, eu trabalho
no mesmo bordel que ela.
RODOLFO –
Não é a mesma coisa. Você não é minha irmã.
CAROLINA (INDIGNADA) –
E isso faz diferença? Isabella é sua irmã, Rodolfo. Sangue do seu sangue. E
quer saber? Ela nunca se deitou com nenhum homem naquele bordel.
RODOLFO (CONFUSO) –
O quê? Como assim?
CAROLINA –
Todos lá dentro sabem disso. Desde que a Isabella chegou, ela sempre foi
protegida por Madame Yvette. Ninguém nunca tocou nela. Você nunca se perguntou
por quê ela foi parar lá?
RODOLFO –
Eu era só uma criança quando ela saiu de casa e foi para o bordel. Em casa, ninguém
falava sobre isso.
CAROLINA –
E você nunca teve curiosidade?
Rodolfo
hesita, olhando novamente para Isabella ao longe. Seus olhos revelam um misto
de raiva e saudade.
RODOLFO –
Talvez...mas nunca vou procurá-la.
Carolina
suspira, frustrada. Ela olha para Isabella e depois para Rodolfo.
CAROLINA –
Você prefere guardar o rancor do que buscar a verdade. E isso, Rodolfo, não te
torna melhor do que quem você julga.
CORTA PARA:
CENA
8. INT. MANSÃO DE MATTEO – QUARTO DE MATTEO – DIA
O
sol começa a entrar pelas frestas da janela. Matteo acorda lentamente, ainda
desorientado. Ele esfrega os olhos e percebe que não está sozinho. Ao virar-se,
vê Flora, deitada ao seu lado, sorrindo. Matteo se afasta rapidamente,
assustado.
MATTEO (SURPRESO) –
Flora? O que você está fazendo aqui?
FLORA – Bom dia,
meu amor. Você não se lembra?
MATTEO (CONFUSO) –
Lembrar do quê?
FLORA (SORRINDO) –
De ontem à noite. Você me chamou aqui, disse que queria que ficássemos juntos.
Matteo
passa a mão pelo rosto, tentando processar.
MATTEO – Eu...eu
não lembro de nada.
Flora
se inclina, fingindo tristeza.
FLORA – Como
não se lembra, Matteo? Uma noite linda que passamos juntos. Eu entreguei a você
minha virgindade.
Ela
puxa o lençol, mostrando uma mancha de sangue. Matteo olha, incrédulo.
MATTEO (EM CHOQUE) –
Isso...isso não pode ser.
FLORA – Você
disse que me amava. Que queria que eu fosse sua novamente.
Matteo
se levanta da cama e percebe que está nu. Ele começa a procurar suas roupas,
nervoso.
MATTEO – Eu devia
estar bêbado. Isso não devia ter acontecido.
FLORA (FINGINDO CHORAR) –
Mas aconteceu! Eu me entreguei a você.
MATTEO –
Flora, sinto muito. Eu não amo você, isso que aconteceu não muda nada entre
nós, não voltaremos a ser noivos.
Flora
se levanta da cama, ainda nua, e tenta tocá-lo.
FLORA (IMPLORANDO) –
Matteo, agora eu sou inteiramente sua. Me entreguei a você! Precisamos voltar a
ser noivos.
MATTEO – Não!
Isso não vai acontecer. Eu amo a Camila e sempre amarei.
Flora,
frustrada, desaba em lágrimas.
FLORA – E o
que vai ser de mim agora? Desonrada!
Matteo
pega suas roupas e se veste rapidamente, tentando manter a calma.
MATTEO – Isso
não deveria ter acontecido. Eu assumo meu erro, mas não posso me casar com
você.
Ele
caminha até a porta, abrindo-a.
MATTEO (FIRME) –
Vista-se e vá embora do meu quarto.
Flora
tenta argumentar, mas Matteo interrompe.
MATTEO – Vou esperar
lá fora. Quando você estiver pronta, saia.
Ele
sai, deixando Flora sozinha no quarto. Ela encara o lençol manchado e, sorri levemente.
CORTA PARA:
CENA
9. INT. BORDEL DE MADAME YVETTE – QUARTO DE ROBERVALDO – DIA
A
cama está desfeita, lençóis bagunçados, e Robervaldo está deitado, ainda enrolado
nos lençóis. Ele olha para alguém que está dentro do quarto.
ROBERVALDO (SORRINDO) –
Eu não vou mentir, foi uma das melhores noites que já tivemos em muito tempo.
Uma
pessoa misteriosa responde algo inaudível. Robervaldo ri baixinho, sentando-se
na beira da cama.
ROBERVALDO –
Fique aí. Eu vou dar uma olhada lá fora para garantir que o caminho esteja
livre antes de você sair.
Robervaldo
pega um roupão do chão, se veste e sai do quarto.
CORTA PARA:
CENA
10. INT. BORDEL DE MADAME YVETTE – CORREDOR – DIA
Robervaldo
caminha silenciosamente pelo corredor, verificando se há alguém por perto. O
bordel está tranquilo. Satisfeito, ele retorna ao quarto.
CORTA PARA:
CENA
11. INT. BORDEL DE MADAME YVETTE – QUARTO DE ROBERVALDO – DIA
Robervaldo
entra novamente, acenando com a cabeça.
ROBERVALDO –
Está tudo tranquilo. Pode ir agora.
O
amante sai do quarto, sem que seja revelado seu rosto.
CORTA PARA:
CENA
12. INT. BORDEL DE MADAME YVETTE – SALÃO – DIA
Robervaldo
fecha a porta do bordel. Ele olha ao redor para garantir que ninguém tenha
visto, mas quando se vira para voltar ao interior, encontra Teodora descendo as
escadas com os braços cruzados.
TEODORA –
Era o seu amante, não era?
ROBERVALDO –
Era sim.
TEODORA –
Ele tem vindo cada vez menos. Já reparou nisso?
ROBERVALDO –
Já. Parece que ele está tentando se fastar aos poucos. Sempre tem uma desculpa
para não vim. Hoje ele só veio porque estava bêbado, não deve ter conseguido
coisa melhor.
Teodora
desce o resto da escada e para ao lado de Robervaldo, cruzando os braços.
TEODORA –
E até quando você vai continuar aceitando isso? Vivendo no anonimato, escondido
como se fosse um criminoso?
ROBERVALDO –
Você sabe como as cosias são, Teodora. Dois homens juntos? Isso seria um
escândalo. Ele tem um emprego a zelar. Eu nunca pediria para ele arriscar tudo
por mim.
TEODORA –
Mas ele arrisca tudo quando quer se satisfazer, não é? Só aparece quando quer
alguma coisa com você. Isso não te incomoda?
Robervaldo
fica em silêncio, olhando para o chão.
ROBERVALDO –
Incomoda muito. Tem vezes que sinto que só sirvo para isso, para os momentos em
que ele quer ter prazer. Mas eu gosto dele, são anos vivendo dessa forma.
TEODORA –
Você merece mais, Robervaldo. Não deixe que ele te trate como se você fosse um objeto.
Robervaldo
suspira profundamente, olhando para o vazio.
CORTA
PARA:
CENA
13. EXT. RUAS DE ESPERAÇA – DIA/NOITE
SONOPLASTIA:
QUEM SABE ISSO QUER DIZER AMOR – MILTON NASCIMENTO
A
praça principal está cheia de movimento, crianças correm entre os adultos. O
dia passa, o céu está cheio de tons alaranjados. As ruas começam a ficar mais tranquilas.
As luzes das casas se acendem. As estrelas brilham no céu, até que um novo
ciclo recomeça e os primeiros raios de sol começam aparecer na cidade de
Esperança e seus moradores se preparam para mais um dia.
SONOPLASTIA OFF
CORTA PARA:
CENA
14. INT. PREFEITURA – RECEPÇÃO/SALA DO PREFEITO – DIA
Hismeria
está sentada à mesa, revisando papéis. De repente, a porta da prefeitura é
aberta com força, e Coronel Almeida entra, com sua presença imponente e um
chapéu de couro que ele remove ao cruzar o saguão. Sem ser anunciado, Almeida
atravessa a sala e empurra a porta da sala de Fontes. Hismeria o segue
imediatamente, aflita. Fontes, sentado em sua mesa, olha surpreso para Almeida entrando
abruptamente em sua sala.
HISMERIA (NERVOSA) –
Desculpe, senhor prefeito. Ele invadiu, eu tentei...
ALMEIDA (RÍSPIDO) –
Saia daqui! Eu preciso falar a sós com o Fontes.
FONTES – Está
tudo bem, Hismeria. Pode nos deixar sós.
Relutante,
Hismeria sai, lançando um último olhar preocupado para Fontes.
ALMEIDA (FIRME) –
Traidor!
FONTES – É assim
que vamos iniciar nossa conversa? Com insultos?
Almeida
se aproxima da mesa e aponta o dedo para Fontes.
ALMEIDA –
Você deve sua carreira política a mim, Fontes! Cada voto que você recebeu foi
porque eu permiti. Se não fosse por mim, você jamais teria se sentado nessa
cadeira.
FONTES – E eu
já paguei caro por isso, Almeida. Por anos, obedeci a suas ordens, fechei os
olhos para suas atrocidades. Mas acabou.
Almeida
com raiva, bate na mesa.
ALMEIDA –
Exijo que você se explique e retire imediatamente seu apoio à candidatura
daquele moleque. Isso é uma afronta a mim e a minha família!
Fontes
se levanta e encara Almeida.
FONTES – Eu não
vou retirar meu apoio ao Matteo. Estou farto de ser sua marionete! Você trata
essa cidade como se fosse uma extensão da sua fazenda, querendo que todos se dobrem
à sua vontade. Mas eu não vou mais me submeter a isso.
ALMEIDA –
Você é um ingrato! A minha família construiu essa cidade, fiz você ser quem
você é, e é assim que você me paga?
FONTES – Você
construiu uma cidade com medo e controle. As pessoas estão cansadas de você.
Matteo é a esperança de um futuro melhor, e eu acredito nisso.
ALMEIDA –
Você vai pagar caro por essa traição. Eu vou te tirar dessa prefeitura a pontapés,
e você vai se arrepender de ter cruzado o meu caminho.
FONTES – Eu não
tenho medo de você. O movimento que existe na cidade para derrota-lo é maior do
que você imagina. Seus dias de glória estão contados.
Almeida
fica vermelho de raiva, sua expressão muda para algo ainda mais sombrio.
ALMEIDA –
Sabe o que me arrependo? De não ter aproveitado a guerra para enfiar você em um
navio e mandar de presente para os Alemães.
Fontes
arregala os olhos, surpreso, mas mantém sua postura firme.
ALMEIDA (COM ÓDIO) –
Judeu asqueroso!
Almeida
cospe na mesa de Fontes, que não reage.
ALMEIDA –
Eu vou acabar com você, Fontes. Aguarde.
Almeida
ajusta o chapéu e sai batendo a porta com força. Fontes suspira, passando a mão
no rosto, visivelmente abalado, mas determinado.
CORTA PARA:
CENA
15. INT. CASA DE CANDOCA – SALA – DIA
Candoca
está de joelhos ajustando a barra do vestido de noiva que Camila está experimentando.
Dorotéia está sentada em uma cadeira próxima, admirando a filha.
CANDOCA –
Nunca costurei um vestido de noiva tão rápido em toda minha vida. Mas devo
dizer, ficou uma cobra de arte, se me permitem a modéstia.
DOROTÉIA (SORRINDO) –
Camila, você está linda.
Camila,
olhando para si mesma no espelho, tenta sorrir, mas há um olhar melancólico em
seus olhos.
CAMILA – O vestido
é perfeito, Candoca. Você fez um trabalho incrível.
Candoca
para por um momento e olha para Camila
CANDOCA (BRINCANDO) –
Está perfeito? Só isso? Achei que eu ouviria que é o vestido dos meus sonhos.
CAMILA (SORRINDO) –
É o vestido dos meus sonhos. Eu só estou ansiosa com o casamento.
A
campainha toca e Chandra Dafni que estava ajudando Candoca a ajustar o vestido,
se levanta para atender. Ela abre a porta. Patrícia e Flora estão do lado de
fora, ambas bem vestidas, com um ar de superioridade.
PATRÍCIA (SORRINDO) –
Boa tarde. Esta é a casa da modista Candoca?
CHANDRA DAFNI –
É sim. Por favor, entrem.
Elas
entram, olhando ao redor com curiosidade. Quando chegam à sala, veem Camila
vestida de noiva. Patrícia e Flora trocam olhares rápidos.
CHANDRA DAFNI –
Podem ficar à vontade.
O
olhar de Flora é calculista, enquanto Camila tenta manter a compostura.
PATRÍCIA (SORRINDO) –
Que vestido lindo. Você está radiante.
CAMILA –
Obrigada.
Flora
também se aproxima, olhando para o vestido com admiração.
FLORA – É realmente
um vestido belíssimo.
CANDOCA –
Ah, obrigada. Mas o mérito é todo da noiva. Ela tem uma beleza que realça
qualquer coisa.
CHANDRA DAFNI –
E vocês? O que trouxe vocês aqui hoje? Também querem encomendar um vestido de
noiva?
FLORA – Não,
não, o meu vestido de noiva virá diretamente de São Paulo.
Camila
ouve o que diz Flora e fica levemente incomodada. Patrícia retira um tecido da
bolsa.
PATRÍCIA –
Trouxemos este tecido de Genebra, na Suíça. Queremos fazer dois vestidos com
ele.
CHANDRA DAFNI –
Já tem algum modelo em mente?
FLORA –
Ainda não.
Chandra
Dafni pega uma revista de moda e entrega a Patrícia e Flora.
CHANDRA DAFNI
– Nessa revista temos vários modelos. Fiquem à vontade para escolher.
As
duas se sentam em um canto, folheando a revista. Enquanto isso, Flora continua
lançando olhares rápidos para Camila, que tenta ignorar, mas está visivelmente
desconfortável.
CORTA PARA:
CENA
16. INT. FAZENDA DOS ALMEIDA – CASA DOS ALMEIDA – ESCRITÓRIO – DIA
Homero,
Delegado Afrânio, Inácio e outros fazendeiros estão reunidos no escritório do
coronel. Almeida, imponente, caminha de um lado para o outro, segurando o
charuto.
ALMEIDA –
Eu chamei os senhores aqui hoje para tratar de um assunto de grande importância
que interessa não só a mim, mas a todos vocês.
Ele
para ao lado da mesa, apoiando as mãos nela.
ALMEIDA –
A candidatura do Matteo à prefeitura é um golpe direto contra nós. E o Fontes...aquele
traidor...resolveu apoiá-lo.
HOMERO – Uma candidatura
reforçada pelo prefeito que controla a máquina pública é um desafio. Isso pode
se tornar um problema sério para você Almeida.
AFRÂNIO –
A prefeitura tem muita influência sobre o voto do povo. Isso pode complicar as
coisas contra o senhor, Coronel, e facilitar para o caminho para o Matteo.
HOMERO –
Precisamos trazer o Fontes de volta para o nosso lado.
ALMEIDA (IRRITADO) –
Já conversei com o Fontes. Ele não está disposto a mudar de ideia. Diz que vai
apoiar o Matteo até o fim.
AFRÂNIO –
Vai ser difícil, coronel. Mas eu farei tudo que estiver ao meu alcance para
ajudar a sua candidatura.
ALMEIDA –
Precisamos trabalhar com o que temos, e para isso, precisaremos de mais
palavra.
INÁCIO –
Conte comigo, coronel. Eu ajudarei financeiramente no que for necessário. Além
disso posso convencer os funcionários da minha fábrica a votarem no senhor.
Homero
sorri, concordando.
HOMERO – Eu farei
o mesmo. Meus funcionários do banco e até alguns clientes, irei fazê-los
votarem em você, Almeida.
Os
outros fazendeiros ali presentes na reunião assentem com a cabeça. Almeida
sorri, satisfeito, e levanta o charuto como se brindasse.
ALMEIDA –
Senhores, eu agradeço o apoio de todos. Vai ser uma jornada difícil, mas
juntos, venceremos o Matteo e seus apoiadores.
Todos
murmuram em concordância.
CORTA PARA:
CENA
17. INT. FAZENDA DOS ALMEIDA – DEPÓSITO – DIA
Marcos,
de camisa dobrada nos cotovelos, segura uma prancheta enquanto inspecionada os
sacos de café que são carregados pelos peões. De repente, Helena entra no
depósito, trajando uma calça e uma camisa de mangas dobradas. Marcos a ver,
claramente surpreso.
MARCOS –
Helena? O que você está fazendo aqui? E de calça?
HELENA (FIRME) –
A partir de hoje, vou trabalhar aqui com você, Marcos.
Os
peões olham discretamente, cochichando entre si. Marcos faz um gesto para que
voltem ao trabalho.
MARCOS (INCRÉDULO) –
Trabalhar? No depósito? O que deu em você?
HELENA – O Coronel
Almeida me autorizou. E fui eu que quis, cansei de ficar dentro de casa sendo
uma inútil. Aqui ajudando você na administração do depósito, posso me sentir
mais útil.
MARCOS – Você
nunca trabalhou, Helena. Esse lugar não é para você.
HELENA – Você
pode me achar inútil, mas eu quero provar que posso ser mais do que uma esposa
decorativa. Quero ser útil, Marcos. Ter o meu próprio dinheiro.
Marcos
suspira, passando a mão na testa.
MARCOS – Tudo
bem, então. Mas não espere moleza.
HELENA (SORRI) –
Nem quero.
Marcos
olha ao redor, pensando, e finalmente aponta para uma pilha de papéis em uma
mesa.
MARCOS – Ali estão
os registros de peso e qualidade das sacas. Comece revisando aqui. Veja se o
que os peões estão anotando bate com as entradas.
HELENA –
Entendido.
Helena
vai até a mesa, se senta e começa a trabalhar. Marcos a observa de longe, ainda
cético, mas curioso.
CORTA PARA:
CENA
18. EXT. RUAS DE ESPERANÇA – DIA
SONOPLASTIA ON: BOOGIE WOOGIE BUGLE
BOY – CLUSTER SISTERS
Tomada
de vários pontos da cidade de Esperança mostrando o dia a dia das pessoas na
cidade. Os dias amanhecem e anoitecem na cidade, mostrando a passagem de tempo.
SONOPLASTIA OFF
CORTA PARA:
CENA
19. INT. ESTAÇÃO DA LUZ – PLATAFORMA – DIA
A
plataforma está movimentada, com passageiros carregando malas. Flora, elegante
em um vestido de verão claro e chapéu, espera ansiosamente por sua mãe. O apito
do trem soa ao fundo, anunciando que a partida se aproxima. Patrícia surge
entre a multidão, apressada.
FLORA (ALIVIADA) –
Achei que você não iria chegar a tempo, mamãe. O trem está prestes a sair!
PATRÍCIA –
Teve um acidente próximo a estação, o trânsito está um caos. Mas consegui.
Patrícia
retira um envelope de dentro da bolsa e entrega a Flora.
PATRÍCIA (SORRINDO) –
Aqui está o que eu fui procurar.
Flora
curiosa, abre o envelope e lê rapidamente, e um sorriso triunfante surge em seu
rosto.
PATRÍCIA –
Um exame falso, com seu nome, atestando que você está grávida.
Flora
guarda o envelope cuidadosamente na bolsa, ainda sorrindo.
FLORA –
Agora o Matteo não terá escolha. Ele vai ter que se casar comigo.
PATRÍCIA –
Ele não poderá fugir da responsabilidade.
O
apito do trem soa novamente, mais alto desta vez.
PATRÍCIA –
Vamos. Não podemos perder o trem.
Elas
caminham rapidamente até a entrada do vagão e entram. O som da locomotiva se
intensifica enquanto o trem começa a se mover.
CORTA
PARA:
CENA
20. INT. IGREJA – DIA
A
igreja está decorada com flores brancas e amarelas. O coro da igreja canta
suavemente enquanto os convidados conversam animados. Entre os presentes estão
Candoca, Angislanclécia, Chandra Dafni, Hismeria, Delegado Afrânio, Homero,
Fernando, Cândida, Dirce, Leda, Mariana, Nina e Ezequiel, todos atentos ao
altar. No altar, Dorotéia, Marcos, Helena, Leonora e Inácio, aguardam.
LEONORA (SORRINDO) –
Você está um pão, meu filho.
INÁCIO (SORRINDO) –
Obrigado, mãe.
As
portas da igreja se abrem, e todos os convidados se viram para olhar. A marcha
nupcial começa a tocar. Camila aparece, vestida em um lindo vestido de noiva,
segurando o braço de seu pai, Coronel Almeida. Camila tenta esconder a tensão
no rosto, mas sua postura é firme. Almeida, imponente, caminha ao lado dela com
um sorriso orgulhoso.
CANDOCA (SUSSURRANDO) –
Ela está deslumbrante.
CHANDRA DAFNI –
Sim, mas parece tão distante.
Camila
e Almeida chegam ao altar. Almeida olhara para Inácio com um sorriso amigável
antes de entregar a mão de Camila ele.
ALMEIDA –
Cuide bem dela.
Inácio
acena, pegando a mão de Camila com delicadeza.
PADRE OLAVO –
Estamos aqui hoje reunidos para celebrar a união de Camila Almeida e Inácio
Carvalho, diante de Deus e de todos vocês.
A
cerimônia prossegue, com a troca de votos e alianças.
PADRE OLAVO (SORRINDO) –
Eu os declaro marido e mulher.
Inácio
inclina-se e beija a testa de Camila. Eles se viram de mãos dadas, e caminham até
a saída da igreja, onde são recebidos por uma chuva de arroz lançada pelos
convidados.
CORTA PARA:
CENA
21. INT. MANSÃO DE MATTEO – SALA – DIA
Matteo
está parado olhando para fora da janela, com os braços cruzados. O som distante
dos sinos da igreja ecoa. Flávio, está sentado em uma poltrona próxima, lendo
um jornal. Matteo suspira profundamente, atraindo a atenção de Flávio.
MATTEO (TRISTE) –
Os sinos da igreja...devem ser do casamento. Camila, a essas horas, já deve
estar casada com o Inácio.
Flávio
abaixa o jornal e o observa.
FLÁVIO –
Matteo, você precisa aceitar isso. Foi uma escolha dela.
MATTEO – Ela é
o grande amor da minha vida, padrinho. Como eu vou superar isso?
Flávio
se levanta e vai até Matteo, colocando uma mão no ombro dele.
FLÁVIO – Você
não tem outra escolha. A vida continua, e o tempo vai curar essa ferida.
MATTEO – Eu ainda
a amo. Não sei como vou viver sabendo que ela está com outro.
Antes
que Flávio possa responder, a porta se abre. Firmino entra com pressa.
FIRMINO –
Desculpa interromper, Matteo, mas preciso falar com o senhor.
MATTEO – Venha
Firmino, vamos conversar no escritório.
CORTA PARA:
CENA
22. INT. MANSÃO DE MATTEO – ESCRITÓRIO – DIA
Matteo
fecha a porta enquanto Firmino o aguarda.
MATTEO –
Agora pode falar.
FIRMINO –
Os homens que colocamos de tocaia na fazenda descobriram que toda a safra de
café foi colhida e está armazenada no depósito. Amanhã começa o transporte para
a fábrica.
Matteo
anda de um lado para o outro, pensativo. Ele para, olhando diretamente para
Firmino.
MATTEO –
Então precisamos agir hoje à noite.
FIRMINO –
O que você quer que façamos?
MATTEO – Reúna
os homens. Toquem fogo em todo o café.
FIRMINO –
Entendido, patrão.
MATTEO – Mas ouça
bem: não quero que ninguém morra.
FIRMINO –
Pode deixar, patrão. Ninguém vai se machucar.
Firmino
sai rapidamente para organizar os homens. Matteo permanece parado com os olhos
brilhando pela vingança que fará contra o Coronel Almeida.
FIM DO CAPÍTULO
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