Débora
CAPÍTULO 30
uma novela de
FELIPE LIMA BORGES
escrita por
FELIPE LIMA BORGES
baseada nos capítulos 3 a 5 do livro
de Juízes
FADE
IN:
CENA 1: EXT.
BETEL – RUA – DIA
Lapidote caminha pela rua quando
Aliã o intercepta.
ALIÃ
Lapidote!
Shalom, meu filho.
LAPIDOTE
Senhor
Aliã, que boa surpresa! Shalom!
ALIÃ
Como vai?
LAPIDOTE
Bem... na
medida do possível. Sempre sobra um pouco de preocupação.
ALIÃ
Eu posso
imaginar... Mas que bênção, hein! Os relatos sobre o que ela está fazendo se
espalharam por todos os cantos! Não há um hebreu que não saiba que Débora de
Efraim está lutando por nossa liberdade!
Lapidote sorri.
LAPIDOTE
É verdade,
senhor. Verdadeiramente Deus está com minha esposa, mas... eu já não aguento de
tanta saudade!
ALIÃ
Lapidote...
Eu vim te procurar para falar justamente sobre isso. Vim ver como está indo...
sem ela.
LAPIDOTE
Então,
senhor, estou levando... Se não fosse por Deus e por minha fé eu estaria muito
pior. São as minhas proteções.
ALIÃ
Há muitos
riscos... Perigos no fato de estar temporariamente sozinho... Você
entende o que eu quero dizer.
LAPIDOTE
Eu só penso
em Débora, senhor. Acredito que não há esse tipo de risco para mim. Se não for
ela, não está bom. Não está completo. Minha vida não tem muitas cores sem
ela... Só Débora pode satisfazer o meu coração... e a minha carne também.
ALIÃ
Que bom.
Isso é bom. Então... que continue assim, orando e tendo fé de que ela voltará
para casa bem e vitoriosa.
LAPIDOTE
(sorrindo) Claro,
senhor. Agradeço.
ALIÃ
Até outra
hora, Lapidote. Shalom.
LAPIDOTE
Shalom,
senhor.
Aliã então toma seu caminho.
Lapidote vira e continua sua caminhada. Pouco depois, um homem o para.
HOMEM
Senhor
Lapidote!... Senhor...
LAPIDOTE
Sim?
HOMEM
É verdade
que sua esposa não está em Betel? É verdade que ela está guerreando pelas
tribos afora?
LAPIDOTE
Sim... É
tudo verdade.
HOMEM
Mas que
pena... Pois eu precisava muito dela para resolver uma questão de meus
negócios... Tenho certeza de que os conselhos de sua esposa, inspirados por
Deus, me ajudariam e me salvariam.
LAPIDOTE
Eu... sinto
muito, senhor. E infelizmente ainda não sei ao certo quando ela retornará.
O
homem lamenta com o olhar. Faz um aceno com a cabeça e sai. Lapidote fica
pensativo por alguns instantes... até retomar sua caminhada.
CENA
2: INT. FORTALEZA – SALÃO DE VISITAS – DIA
É um grande salão lotado de
pequenas mesas com duas cadeiras, uma de frente para a outra. Ao lado de cada
mesa um soldado faz a vigilância.
Um guarda abre a porta do fundo e
Sama vem. Logo ela localiza, em uma das mesinhas, seu marido Iru com uma
menina: MELISSA (3 anos).
SAMA
Melissa!!!
MELISSA
Mãe!!!
Sama corre e Melissa pula nos
braços da mãe. Abraçando-a, Sama gira a filha no ar.
SAMA
Meu amor!!!
Que saudade!!!
Logo o soldado se aproxima e as
separa.
SOLDADO
Sem
contato.
Com os olhos marejados, Sama
observa a filha, que volta para o lado de Iru. Sama senta de frente para eles.
O soldado presta atenção na conversa.
SAMA
Graças a Deus
vocês vieram...
Iru apenas a encara.
SAMA
Por que não
veio antes, Iru?
IRU
Não pude.
SAMA
Iru, uma
mãe não pode ficar tanto tempo sem ver a filha...
Sama sorri para Melissa, que olha
para a mãe com carinho. Mas logo mais lágrimas surgem dos olhos dela.
SAMA
Se bem...
Se bem que não é muito bom... trazê-la nesse lugar.
O soldado olha ameaçadoramente para
Sama.
IRU
Por que
não? (olha rápido para o soldado) Aliás, o que eles querem com vocês
aqui?!
SAMA
Eu... não
posso dizer. Não tenho o que dizer... Só não quero que ela tenha essa visão da
mãe.
Enquanto Sama derrama mais lágrimas
e as limpa, Iru umedece os lábios e se prepara para falar.
IRU
Sama... Eu
vim hoje apenas para me despedir. Não voltarei mais aqui.
SAMA
O quê? Como
assim?! Do que você está--
IRU
(interrompendo) Eu não
posso ser casado com uma mulher que não posso ver todos os dias, e muito menos
tocá-la...
SAMA
Iru!...
IRU
Eu sou
homem, Sama. Eu tenho necessidades...
SAMA
Iru, por
favor!... O que está fazendo?! E Melissa?! O que vai fazer com ela?!
IRU
Vou
deixa-la com a vizinha.
SAMA
Não, por
favor!!! Por favor, me visite aqui, Iru!!! Traga-a ao menos lua sim, lua não!!!
Preciso ver minha filha!!!
IRU
Já está
decidido...
SAMA
Iru, eu
preciso ver minha filha!!!
Incomodado, o soldado agarra Sama
pelos braços e a levanta.
SAMA
Não!!!
SOLDADO
O tempo de
visita acabou!
SAMA
Não!!! Me
solta!!! Deixem-me ver minha filha!!! Deixem-me ver minha filha, me solta!!!
Sama é levada pelo soldado.
IRU
Vamos,
Melissa.
Iru
se levanta e sai andando com a filha. A menina, triste e um tanto assustada,
ainda olha para trás e vê a mãe, chorando e esperneando, ser carregada pelo
soldado e sumir na porta do fundo. Iru e Melissa vão embora.
CENA
3: EXT. HAROSETE – RUA – DIA
A porta de uma casa de bebidas se
abre e sai de lá um homem bêbado com as vestes surradas e a barba crescida: é
Jaziel, em Harosete.
Ele caminha pela rua cambaleando.
JAZIEL
(murmurando) Sua filha
do cruel destino... Doce e amargo vinho no copo da vida... Sama... Sua
desgraçada...
Um homem trompa nele, fazendo-o
quase cair. Mas ele se ajeita e continua a andar e a falar sozinho.
JAZIEL
Mulher é
tudo igual! Só nos leva pro fundo do poço. Sama, sua ingrata!...
Um soldado que passa por ali,
desconfiado, se aproxima.
SOLDADO
Ei... Você.
Qual é o seu nome?
JAZIEL
O meu
nome?...
SOLDADO
Sim, seu
nome!
JAZIEL
Meu nome é
Jaziel, o desgraçado, o iludido, o lascado, o idiota, o--
SOLDADO
(interrompendo) O hebreu?
Jaziel para e franze a testa.
JAZIEL
Hebreu?...
SOLDADO
Sim. Suas
vestes, seus traços... Está me parecendo um hebreu.
JAZIEL
Hebreu?! Está
louco, amigo!... Eu odeio aqueles hebreus, todos eles. Principalmente as
mulheres! São umas desgraçadas! Onde já se viu entregar uma romã para um
porco?! Um porco, acredita, amigo?! Um porco criado para o abate. Os
boatos são terríveis, eu quero é passar longe daquelas cachoeiras...
SOLDADO
Está
dizendo nada com nada... Você está bêbado. Saia da minha frente!
O soldado então passa por Jaziel e
vai embora. Ele ainda observa o hazorita se afastar... então sorri e continua a
andar.
JAZIEL
Idiota...
Sou hebreu mesmo. Mas não queria ser... Aí nunca conheceria aquela desgraçada
da Sama!...
E
segue caminhando.
CENA
4: EXT. HAROSETE – ARREDORES – DIA
Pérola cavalga a toda velocidade
pela gigantesca planície...
Por fim ela para e Débora observa um
morro com uma grande cidade fortificada ao seu redor e um imponente palácio em
seu topo: a cidade de Harosete.
DÉBORA
(NAR.)
Ali estava
aquele que eu pensava ser o meu destino final. O lugar onde finalmente eu
olharia nos olhos do Capitão Sísera e do rei Jabim e lhes cobraria todo o mal
que fizeram ao meu povo durante 20 anos.
Débora então nota logo ali uma
formação de grandes rochas encaixadas e empilhadas; guia Pérola até lá e desce.
DÉBORA
Você deve
esperar aqui, Pérola. Escondida. Vou deixar um pouco de pasto e água. E você se
comporte, hum? Sua menina...
Débora
sorri, faz um carinho em Pérola e pega suas coisas. Então começa a trocar suas
vestes.
CENA
5: INT. CASA DE ADÉLIA – LOJA – DIA
No lugar da antiga sala agora está
a convidativa loja de Adélia e Laila. Um balcão de madeira na direção da
entrada chama a atenção de quem entra para a parede ao fundo onde há uma
prateleira lotada de doces. Nas outras paredes da loja, bolos, cremes, frutas
enfeitadas e pães doces colorem as prateleiras e espalham uma fragrância doce
mas agradável entre as várias meses dos clientes.
A loja foi aberta recentemente, e nesse
momento há ali alguns clientes sentados à mesa e comendo. Porém são todos
mulheres e homens casados. Adélia, parada na porta, anuncia para quem passa
pela rua. Laila, ao seu lado, espera pelos clientes.
ADÉLIA
Doces!!!
Olha os doces!!! Doces da Adélia, agora com loja própria!!!
Duas moças empolgadas entram ali.
ADÉLIA
Shalom!
Sintam-se à vontade, tudo bem? Essa é a minha irmã Laila, ela vai atende-las.
As duas moças entram e Adélia olha
para a irmã.
ADÉLIA
Cadê os
moços?! Até agora não apareceu um! (vira para a rua) Doces!!! Doces da
Adélia!!! Venham todos!!!
LAILA
Eu não sei!
ADÉLIA
Pois eles
deveriam estar aqui! Doces!!!
LAILA
Tenha calma,
Adélia, eles virão.
Então Mireu chega ali.
MIREU
Adélia,
Laila... (olhando para a loja) Sempre que chego fico admirado com o trabalho
que fizeram aqui.
LAILA
Venha,
Mireu, entre. Vou atender você e aquelas duas moças.
MIREU
Certo.
LAILA
Escute, e
os seus amigos, hum? Sabe se eles virão?
Adélia olha atenta para ele.
MIREU
Bom, eu...
não tenho muitos amigos, mas posso ver depois com os poucos que tenho.
ADÉLIA
Isso,
menino, veja sim. Doces!!! Vamos entrando, meu povo, que o doce da Adélia é sucesso
em toda a Betel!!!
CENA
6: INT. CASA DE TAMAR – SALA – DIA
Tamar e Elian estão em seus
afazeres quando alguém bate na porta. Ele larga suas coisas, vai até lá e a
abre; é Lapidote. Elian, frustrado, volta.
LAPIDOTE
Shalom,
senhor Elian e senhora Tamar.
TAMAR
Shalom,
Lapidote. Entre, entre...
LAPIDOTE
Com
licença.
Lapidote fecha a porta e entra.
LAPIDOTE
(sorrindo) Vim até
aqui com muita alegria.
TAMAR
(ansiosa) É notícia
boa de Débora?!
LAPIDOTE
Sim. Ela
não só está vivíssima como também está lutando por toda parte. Não há um lugar
em que não se fala de seu nome e de seus feitos. De como luta, de como enfrenta
os soldados. Já seria surpreendente se fosse um só homem, mas o povo está
encantado por ser uma mulher.
Tamar sorri alegre. Elian, porém,
ri em tom de zombaria; os dois olham para ele.
ELIAN
Vocês
realmente são tão tolos a ponto de acreditar nessa baboseira toda?
LAPIDOTE
O senhor
não acredita?
ELIAN
É claro que
não! Está claro como o dia que isso é obra de Débora. Não os feitos, mas as histórias
dos feitos. Débora disseminou essa história para poder fazer o povo acreditar
naquilo que ela sempre quis que acreditassem. Não está lutando coisa nenhuma,
deve estar construindo toda essa narrativa dentro de alguma caverna por aí.
TAMAR
Você nunca
acredita, mesmo. Faz um esforço tremendo para ser aquele que vai contra tudo!
ELIAN
Os
diferentes, Tamar, os que questionam, esses incomodam a manada. Não há novidade
alguma na sua reação.
LAPIDOTE
Boato algum
se espalharia dessa forma se fosse mera criação de alguém, senhor Elian. Se
chegou até aqui da forma como chegou, mesmo com os hazoritas espalhados ao
nosso redor como pragas, é porque de fato aconteceu. Vilarejos salvos, mulheres
salvas, crianças protegidas... Débora se tornou uma guerreira. Solitária, mas
guerreira. E muitos dos hazoritas estão temendo sua figura.
Elian ri.
ELIAN
Quem dera
um filho meu realmente estivesse por aí tendo peito de verdade para enfrentar
esses hazoritas e dar uma lição neles. Eu teria o maior orgulho! Sairia por
essas ruas todas apregoando que eu sou o pai do grande e temido
guerreiro! Mas isso aí... disso aí eu tenho é vergonha. Na melhor das
hipóteses, me faz rir...
LAPIDOTE
Com todo o
respeito, mas o senhor é um negacionista. Não acredita nem com as evidências em
sua frente.
TAMAR
Não se
preocupe, Lapidote. Não tem jeito.
Elian dá de ombros.
TAMAR
Agora que
ela está lutando por nós e fazendo tudo o que está fazendo... você acha que a
liberdade pode chegar?
LAPIDOTE
Bem, senhora
Tamar, eu não quero ser precipitado, nem tendencioso para um lado ou outro,
mas... Apesar do que ela está fazendo ser ótimo, não é o suficiente para
derrubar Hazor. A missão de Débora, bem sucedida por sinal, está sendo salvar
por partes. E isso já faz sim uma grande diferença.
Cuidando
de suas coisas, Elian ri do que ouve. Tamar e Lapidote trocam olhares de
reprovação.
CENA
7: INT. PALÁCIO – SALA DO TRONO – DIA
Sísera se aproxima apressadamente
do trono, onde Jabim, sentado, parece inconformado.
JABIM
Espero
muito que o que tem a me dizer é o que estou pensando, Capitão. Porque senão o senhor
terá que rever todos os seus conceitos!
Sísera para aos pés do trono e faz
uma longa reverência com a cabeça.
SÍSERA
Perdão, meu
senhor... Perdão. (olha para Jabim) Mas vim falar sobre aquilo. A
ameaça... hebreia. O tal guerreiro solitário. O justiceiro.
JABIM
(raivoso) Vamos
tratar as coisas como elas realmente são! Os boatos dizem que se trata de uma
mulher. Não é?
Sísera faz que sim.
SÍSERA
É sim. Ao
que parece ela se chama... Débora. Ou algo assim.
JABIM
Débora.
Como consegue se manter de pé diante da loucura que está sendo dita por nossas
bocas, Sísera?! Uma mulher! Uma mulher, Sísera! O que é que está
acontecendo, ahn?! O que é que isso aqui virou?! Depois de duas décadas de uma
gestão incrível, como você deixou as coisas chegarem a esse ponto?!
SÍSERA
No início,
os boatos pareciam lendas. Depois soavam como uma tentativa frustrada dos
miseráveis colocarem medo em nós. Só agora os nossos homens que testemunharam
algum caso conseguiram chegar a Harosete e nos relatar o que viram.
Jabim, sentado, ouve com raiva e
indignação.
JABIM
Eu mal
consigo acreditar... Se for um pesadelo, já passou da hora de amanhecer o dia!
É muito absurdo! Uma mulher... Uma hebreia... sozinha... matando
nossos homens um a um como se fossem todos raposas covardes e não os guerreiros
do exército mais poderoso de Canaã!!!
SÍSERA
Senhor, já
mandei homens para os locais a fim de averiguar os tais estragos que a tal
Débora fez, mas, ao que parece... se trata de uma exímia guerreira.
JABIM
E você
ainda reconhece a grandiosidade dessa mulher?! Diante do meu trono?! Diante de
mim?!
SÍSERA
Meu rei...
Eu disse “ao que parece”. Segundo o povo. Mas o povo é fraco. Inocente. Eu mesmo
investigarei o caso e irei atrás de Débora. Eu a capturarei e a trarei para
Harosete para que sirva de escárnio e zombaria para o povo. E vou mostrar ao
meu inigualável soberano que mulher alguma nessa vida é capaz de sustentar uma
história como essa. Vou humilhá-la. Eu a colocarei nua na rua, entre o povo,
até não lhe restar um pingo de dignidade, se é que tem alguma. E depois... eu a
matarei com minhas próprias mãos.
Jabim finalmente esboça um traço de
satisfação.
JABIM
Agora sim
eu ouvi o meu verdadeiro Capitão Sísera.
Sísera
faz uma discreta reverência com a cabeça.
CENA
8: INT. PALÁCIO – CASA – SALA – NOITE
O dia passa e anoitece.
Eloá, Danilo e Darda, sentados,
apreciam ELISA (a moça cega) cantando. Ela não utiliza de palavras, apenas
melodias que fazem os 3 viajarem em pensamentos e lembranças...
Quando ela acaba, eles batem palma.
ELOÁ
Que lindo!
DANILO
Até me
emocionei aqui...
DARDA
Não à toa
venci a competição e me tornei serva. Nada poderia embelezar essa casa mais do
que a sua voz, Elisa.
ELISA
Obrigada...
Então a porta se abre e Sísera
chega.
DARDA
Senhor...
SÍSERA
Os 3,
saiam. Deixem-me a sós com Elisa. Preciso ouvir um pouco de música para
relaxar.
Eloá, Danilo e Darda fazem uma
reverência e saem. Sísera ainda observa Elisa por alguns segundos... Então se
joga em uma descansadeira e relaxa.
SÍSERA
Vamos,
Elisa. Cante para mim.
Elisa pigarreia.
ELISA
Sim, meu senhor.
Ela
então começa a cantar a mesma canção que cantava logo antes. Sísera pega uvas
na mesa ao lado e come enquanto ouve e observa o corpo de Elisa de cima a
baixo.
CENA
8: EXT. HAROSETE – ENTRADA – NOITE
Débora, em vestes diferentes das hebreias,
se aproxima da entrada de Harosete. Dá uma olhada na muralha que se estende
para os dois lados e no monte adiante, sobre o qual está o palácio com suas
janela iluminadas.
Ao chegar no portão aberto, os
guardas, olhando-a, fazem sinal.
GUARDA
Ei, parada
aí mesmo.
Ela engole em seco.
DÉBORA
Sim?
O guarda se aproxima e a olha de
cima a baixo.
GUARDA
Quem é
você?
DÉBORA
Sou...
apenas uma serva. Por que, senhor?
O guarda dá uma última olhada nela.
GUARDA
Pode
seguir.
Débora
faz que sim, passa pelo portão e entra em Harosete.
CENA
9: INT. PALÁCIO – CASA – SALA – NOITE
Elisa continua a cantar...
SÍSERA
Chega.
Ela para. Ele se levanta.
SÍSERA
Vou sair,
vou à Casa do Amor. Se minha mãe perguntar, avise a ela.
ELISA
Certo.
Enquanto pega algumas coisas,
Sísera dá uma observada na moça... Então, por fim, vira para ela.
SÍSERA
Elisa...
Levante-se.
Não entendendo muito bem, a moça
põe-se de pé.
SÍSERA
Dê uma
volta.
ELISA
Co-Como,
senhor?
SÍSERA
Gire. Dê
uma volta.
Um tanto receosa, Elisa então gira
em torno de si sob os olhares de Sísera. Os olhos dela, apesar de nada verem, aparentam
seu desconforto.
SÍSERA
Hum. Até
mais tarde.
Sísera
então vira, vai para a porta e sai. Elisa fica ali, sozinha e preocupada.
CENA
10: INT. CASA DE ADÉLIA – LOJA – NOITE
Adélia e Laila limpam a loja após
mais um dia cumprido.
LAILA
Ai, minha
irmã, foram um sucesso esses primeiros dias! Nunca pensei que ficaria tão
empolgada com nossa lojinha...
ADÉLIA
É, você tem
razão. O único problema foi a quase completa falta de moços. Eu não esperava
por isso, não...
LAILA
É, tenho
que concordar com você.
ADÉLIA
Nós teremos
que fazer algo, Laila.
LAILA
E a sua tal
receita? A do amor... De fazer os moços se apaixonarem... A quantas anda?
ADÉLIA
Poderia
estar melhor... Mas prometo me dedicar ainda mais.
Laila
faz que sim.
CENA
11: INT. CASA DO AMOR – NOITE
Sentados em uma das mesas, Sísera e
Bogotai bebem vinho.
SÍSERA
Sabe,
Bogotai, eu estava observando uma das moças novas lá de casa, a Elisa. Se você
quer saber, vou te dizer que até que ela renderia, hein... Se não fosse o fato
de ser cega, seria aproveitável. Se bem que não tenho certeza se dá pra se
descartar um corpo daquele só por ela ser cega... (fazendo desenho de
nádegas com as mãos) Você tinha que ver, Bogotai. Pelos deuses...
Bogotai ri. Nesse instante, Jaziel,
bêbado, entra ali. Tropeça e quase cai... Sísera o nota.
SÍSERA
Aquele ali
entrou bêbado e vai sair são.
Jaziel adentra mais, mas logo
tropeça em um hazorita que acompanhava uma mulher.
HAZORITA
Qual é o
seu problema?! Quer morrer aqui mesmo?!
JAZIEL
Você é
muito mal educado! Eu não o vi, idiota!
HAZORITA
Ah,
“idiota”? É isso então?
JAZIEL
É sim, foi
o que eu disse!
Sísera então se levanta e vai até
lá.
SÍSERA
Ei, ei! O
que está acontecendo aqui? (para Jaziel, tocando em seu ombro) Qual é o
seu problema?
JAZIEL
Nenhum. E
tire a mão de mim que você não sabe quem eu sou!
SÍSERA
Mas sei
quem eu sou. Sísera, o Capitão.
JAZIEL
(em tom de
zombaria) Hummm... E agora eu deveria estar com medo?
SÍSERA
Escute,
senhor, não quero problema aqui na Casa e sei que está muito bêbado, mas estou
prestes a afundar minha mão em você.
JAZIEL
Pois então
tenha muito cuidado, pense, e não faça isso. Não acabaria nada bem. Pra
você, no caso.
Sísera olha para o casal e faz
sinal para eles saírem. Depois olha para as pessoas ali perto e de volta para
Jaziel.
SÍSERA
Está me
ameaçando?
JAZIEL
Não. Mas é
natural, afinal... hebreu nenhum está desprotegido mais. Não ouviu que há uma
guerreira agora?
Sísera franze a testa.
SÍSERA
Você é hebreu?
JAZIEL
Sim! Sou
hebreu sim! Assim como minha amiga.
SÍSERA
Amiga...
JAZIEL
É.
SÍSERA
Quanto
vinho tomou, homem?
JAZIEL
Muito! Mas,
infelizmente, não o suficiente para me destruir...
Sísera, estranhando, olha para sua
mesa: Bogotai ainda está bebendo. Então agarra Jaziel pelo braço e o arrasta
até lá.
SÍSERA
Sente-se.
Jaziel se assusta ao ver os
músculos imponentes de Bogotai e sua sinistra máscara, mas senta-se ao lado do
Primeiro Oficial.
SÍSERA
Um copo!
Logo uma das que servem traz um
copo a mais.
SÍSERA
Vamos, beba
um pouco mais de vinho. Está perfeito, especialmente hoje.
JAZIEL
(rindo) Claro...
Pode encher esse copo!
Sísera
enche o copo de Jaziel, que o vira quase de uma vez. Sísera presta muita
atenção nele.
CENA
12: EXT. HAROSETE – RUAS – NOITE
Débora caminha pelas ruas. Logo à
frente, numa das regiões mais movimentadas, soldados gargalham numa espécie de
festa ao ar livre. Meretrizes e outros homens os acompanham na algazarra.
DÉBORA
(NAR.)
Nesse exato
momento, meu instinto foi arrancar a espada escondida na lateral da minha perna
e ir até eles. Mas precisava me controlar... Precisava me concentrar. Meu objetivo
era Sísera, não podia me deixar distrair.
Débora desvia e vira em outra rua,
mas alguns da multidão esbarram nela, que tenta seguir assim mesmo. Logo outros
homens, interessando-se por ela, tentam se aproveitar da movimentação para
tocá-la.
HAZORITA
Oi,
docinho... Que tal irmos para o meu quarto?
Raivosa, Débora mete-lhe um chute
no estômago e um soco no nariz.
DÉBORA (NAR.)
Infelizmente
nem sempre era possível...
O povo ao redor se assusta e o
homem, furioso, agarra um pedaço de pau que encontra ali. Débora não se aguenta
e finalmente arranca a espada escondida em suas vestes, fazendo todos se
assustarem e recuarem um pouco. O hazorita então a ataca, mas ela não tem
nenhuma dificuldade em bloquear, desarmá-lo e desferir um corte em seu peito,
fazendo-o cair fraco. Dois amigos do homem se aproximam e tentam encurralá-la,
mas ela luta contra os dois e também não demora muito para ambos ficarem caídos
e com cortes nos braços.
As pessoas a observam
estupefatos...
MULHER
Mulher
lutando... Essa... só pode ser... a tal Débora!
HOMEM 2
O quê?!
MULHER 2
A guerreira
hebreia está aqui! Débora está aqui!
O povo se assusta e começa a se
dispersar. Débora teme o que pode acontecer. Devido aos gritos de que ela está
ali, alguns soldados da festa ali perto começam a olhar para lá. Um vai na
direção dela. Débora então vira e corre pela rua.
SOLDADO 1
Por ali,
por ali! Vai! Ela está fugindo!
Os soldados se dividem pelas ruas e
a perseguem. Ela corre incansavelmente. Vira de esquina em esquina, quase
tropeçando e esbarrando nas pessoas. Os soldados a perseguem a toda velocidade.
De repente, ao virar em um beco que
pensava ser uma rua, Débora trompa em uma mulher, de modo que as duas caiam. É
Eloá, acompanhada de Danilo.
Débora levanta-se e tenta correr,
mas vê que não há saída. Vira para voltar, mas escuta os soldados se
aproximando. Faz sinal de silêncio para Eloá e Danilo.
Escondidos na penumbra do beco, os
3 observam os soldados passarem e sumirem. Débora então expira aliviada. Eloá e
Danilo, porém, olham espantados para ela e para sua espada.
ELOÁ
O que é
isso?!
Débora olha para o fundo do beco.
DÉBORA
Não há
nenhuma pequena saída por ali?
O casal franze a testa.
DANILO
Não. Porém,
se pular a parede, dará para uma passagem pouco usada para o palácio. Para os
fundos.
Débora, cansada, olha para os dois.
DÉBORA
Como sabem?
ELOÁ
Nós moramos
no palácio. Servos cozinheiros do Capitão Sísera e de sua mãe Najara.
Débora fica surpresa.
DÉBORA
Mesmo?! (pequena
pausa, se ajeita) Por favor, me salvem. Levem-me para sua casa... Por
favor. Eu preciso de ajuda...
DANILO
Por que
estão perseguindo-a?
ELOÁ
Você é
mesmo Débora, como estão gritando por aí tudo? A guerreira hebreia?
Débora faz que sim, deixando Eloá e
Danilo impressionados.
DÉBORA
Me
ajudem...
Eloá
e Danilo se entreolham preocupados.
CENA
13: INT. CASA DO AMOR – NOITE
Jaziel vira mais um copo de vinho.
JAZIEL
Há tempos
não tomo um vinho tão bom como esse. Os nossos lá de Israel são ótimos, mas
esse... tem um gostinho de... de... de depravação... De perigo... Isso é
bom. Obrigado, Capitão. Você é realmente um bom amigo. Coisa rara hoje em
dia...
SÍSERA
Tem razão.
Sísera e Bogotai trocam olhares de
cumplicidade sobre Jaziel.
JAZIEL
Eu só tive
uma amizade verdadeira em toda minha vida...
SÍSERA
Sua amiga
de que comentou há pouco?
JAZIEL
Sim.
SÍSERA
Já que
vocês têm uma amizade tão bonita, conte-me mais de sua amiga. Fiquei
interessado...
JAZIEL
Bom... Eu
também fui mestre de Débora. Ensinei a ela quase tudo o que ela sabe hoje como
guerreira.
Sísera fica muito impressionado, e
quase não consegue disfarçar. Olha para Bogotai, que permanece estático. Então
se ajeita, coloca mais vinho para Jaziel e se inclina.
SÍSERA
Jaziel...
Diga-me apenas mais uma coisa.
JAZIEL
(tomando o
vinho) Hum.
SÍSERA
Onde Débora
mora?
Jaziel toma o vinho, coloca o copo
na mesa e lambe os beiços.
JAZIEL
Em Betel, é
claro. Tribo de Efraim! A mais honrada de Israel!
Jaziel ri e Sísera, satisfeito, volta
a sentar normalmente. Em seu sorriso maldoso, IMAGEM CONGELA
CONTINUA...
FADE OUT:
No próximo capítulo: Eloá e
Danilo levam Débora para o palácio, para a casa de Sísera e Najara. E Sísera prende
Jaziel e envia Bogotai para Betel.
Obrigado pelo seu comentário!