ESPERANÇA
Capítulo 17
Novela criada e escrita por
Wesley Franco
CENA
1. INT. BORDEL DE MADAME YVETTE – SALÃO – DIA
O
bordel está mais calmo, com as cortinas parcialmente fechadas e um ar de luto
no ambiente. Gustavo, o seminarista, entra apressado, atravessando o salão
vazio. Isabella, ainda abalada, está no fundo da sala conversando com
Robervaldo. Ao vê-lo, ela se aproxima.
ISABELLA –
Você por aqui?
Gustavo
abaixa a cabeça por um momento, depois a ergue novamente.
GUSTAVO (HESITANTE) –
O padre Olavo decidiu que não poderá mais rezar a missa de Madame Yvette.
Isabella
sente o impacto das palavras, mas ainda tenta entender a situação.
ISABELLA –
Por que? O que aconteceu?
GUSTAVO –
A viúva Leda e algumas outras senhoras fizeram pressão sobre ele. Ameaçaram
cortar as doações à paróquia se ele realizasse a cerimônia.
Isabella
aperta os punhos e tenta conter a raiva, mas Gustavo continua acrescentando a
última parte com dificuldade.
GUSTAVO –
E... também mandaram avisar que o enterro de Yvette no cemitério está proibido.
Leda disse que vai falar com o administrador para garantir que isso aconteça.
Isabella
leva a mão ao rosto, incrédula e revoltada. Gustavo, sem ter mais o que dizer,
faz uma breve reverência e sai, sentindo-se impotente. Zuleika, Florzinha,
Mara, Teodora, Carolina e Robervaldo, que escutam a conversa de perto, se
reúnem em torno de Isabella.
ROBERVALDO (PERPLEXO) –
Isso é uma crueldade sem tamanho. A Yvette merecia ser enterrada como qualquer
outra pessoa.
ZULEIKA –
Depois de tudo que ela fez por essa cidade, é uma injustiça!
FLORZINHA (INDIGNADA) –
É um absurdo que isso esteja acontecendo.
Isabella
respira fundo e seu olhar se torna determinado. Ela levanta o queixo, ergue a
voz e fala com firmeza.
ISABELLA (DECIDIDA) –
Elas podem até obrigar o padre a não rezar a missa, mas não vão impedir que
Yvette seja enterrada no cemitério. Aquele lugar é público, e ninguém tem o
direito de negar um enterro digno a ela.
As
meninas e Robervaldo observam com atenção, enquanto Isabella continua.
ISABELLA –
Espalhem pela cidade que se essa proibição continuar, o bordel vai entrar em
greve por tempo indeterminado. Não vai ter bebida, dança, nem companhia para
ninguém. E avise aos clientes que não aparecer no cortejo do enterro de Yvette,
nunca mais vai pisar aqui.
Teodora
olha para Isabella com surpresa e admiração. Carolina se aproxima e coloca a
mão sobre o braço de Isabella.
CAROLINA –
Estou com você, Isabella. Vamos lutar por Yvette.
TEODORA –
Nunca pensei que fosse dizer isso, mas você está certa. Não podemos aceitar
essa humilhação.
ROBERVALDO –
Vou espalhar o recado para todos. Eles vão ter que nos ouvir!
CORTA PARA:
CENA
2. INT. PREFEITURA – SALA DO PREFEITO – DIA
Homero
e Fontes estão sentados em poltronas confortáveis, esperando Almeida. O clima é
de descontração enquanto conversam.
FONTES (SORRINDO) –
Então, Homero, tem novidades? Você parece diferente, está com um brilho no
olhar. Há muito tempo não lhe vejo assim.
HOMERO (SORRI) –
Na verdade, tenho sim. Vou me casar novamente.
FONTES (SURPRESO E CONTENTE) – Meus parabéns! É uma grande notícia, meu amigo. Quem é a
felizarda?
HOMERO (ENTUSIASMADO) –
É uma bela mulher, muito elegante e charmosa, me conquistou de imediato. A
conheci no Rio de Janeiro, mas ela vive em São Paulo. Pedia-a em casamento e,
para minha felicidade, ela aceitou. Em breve, ela virá para Esperança e vamos
nos casar.
FONTES – Fico
muito feliz por você, meu amigo. Já faz tanto tempo desde que a Natália se
foi...Você merece ser feliz novamente.
Homero
sorri em agradecimento.
FONTES – E o
Fernando, como ele reagiu à notícia?
HOMERO (PENSATIVO) –
Desde que a mãe morreu, ele se afastou de mim, nunca mais quis voltar à cidade,
nos falamos tão pouco, mas ele já está sabendo que irei me casar. Ele está bem,
se formou em direito e prestou concurso para juiz. Agora, só falta a nomeação.
FONTES – Você
sabe que o juiz da comarca está para se aposentar, não sabe? Por que não fala
com o Coronel Almeida para usar sua influência e conseguir a nomeação do
Fernando para essa comarca? Assim, ele pode ser o novo juiz da nossa cidade e
vocês ficariam mais próximos.
HOMERO (SURPRESO) –
Confesso que não tinha pensado nisso, mas é uma ótima sugestão. Vou conversar
com Almeida sobre o assunto.
Nesse
momento, Almeida entra na sala, acompanhado de seu filho, Marcos. Ele
cumprimenta os dois amigos com vigor e toma seu lugar na cabeceira da mesa,
enquanto Marcos se senta ao lado.
ALMEIDA –
Bom, senhores, o assunto que reúne vocês aqui é a sucessão à prefeitura. No
próximo ano, haverá eleições, e precisaremos de um nome forte para substituir o
Fontes.
FONTES – Você
já tem alguém em mente?
ALMEIDA (LEVE SORRISO) –
Eu mesmo. Depois de tanto tempo, acho que chegou a hora de voltar a governar
essa cidade.
Homero,
Fontes e Marcos trocam olhares surpresos. Almeida tinha preferido cuidar dos
negócios nos últimos anos.
HOMERO (SURPRESO) – Você
tem certeza, Almeia? Nos últimos anos, você esteve mais focado no café.
ALMEIDA (BALANÇANDO A CABEÇA) – O Café não dá tanto lucro como antes, e o Marcos tem
conseguido administrar sozinho toda essa parte. A prefeitura, com todas as suas
oportunidades, e agora com o JK disposto a despejar dinheiro para
industrializar o país, parece um caminho mais vantajoso.
FONTES (PENSATIVO) –
Entendo...mas talvez seja a hora de uma renovação na política da cidade, nomes
mais jovens, quem sabe? Marcos, por exemplo.
MARCOS (INTERROMPENDO RAPIDAMENTE) – Agradeço a confiança, prefeito, mas não tenho interesse na
política. Prefiro continuar cuidado da administração das fazendas.
ALMEIDA (FIRME) –
Não, Fontes. Já está decidido, eu serei o candidato e espero contar com o apoio
de vocês.
HOMERO – É
claro que você terá meu apoio, meu amigo. Conte comigo e com o meu banco, para
o que você precisar.
Nesse
momento, Augusto entra na sala, com uma expressão de urgência.
AUGUSTO –
Perdão pela interrupção, mas temos um problema.
FONTES (CURIOSO) –
O que aconteceu?
AUGUSTO –
As beatas da cidade, lideradas pela viúva Leda, proibiram o enterro de Madame Yvette
no cemitério da cidade. E Isabella, uma das meninas dela, mandou avisar que o
bordel entrará em greve até que o enterro seja autorizado. E mais, quem não
comparecer ao cortejo, será banido do bordel.
Homero
e Almeida ficam surpresos com a situação inusitada, Fontes fica claramente
intrigado.
ALMEIDA –
Com que autoridade a viúva Leda proíbe o enterro de alguém no cemitério da
cidade? Isso é um absurdo!
HOMERO – Concordo,
Almeida. Yvette, apesar de ser uma meretriz, sempre trouxe alegria para muitos
nesta cidade. Foi uma figura importante para Esperança.
ALMEIDA –
Fontes, resolva essa situação imediatamente, antes que a situação piore. O
funcionamento do bordel garante o funcionamento dos casamentos e da boa convivência
entre os homens.
FONTES –
Augusto, providencie imediatamente que Madame Yvette seja enterrada no
cemitério, independente do que as beatas pensam. O cemitério é público e
qualquer cidadão esperancense pode ser enterrado lá.
AUGUSTO –
Sim, senhor. Irei cuidar disso agora mesmo.
Augusto
sai apressado para cumprir a ordem. Almeida, Homero e Fontes se entreolham,
cientes de que as tensões na cidade estão aumentando. A decisão de Almeida de
voltar à política ganha um novo contexto, e todos entendem que manter o
controle será mais desafiador do que imaginavam.
CORTA PARA:
CENA
3. INT. BODEGA – DIA
A
bodega é simples, com prateleiras cheias de produtos e um balcão de madeira no
centro. O cheiro de café, tabaco e álcool é presente no ar. Bastião, um jovem negro
de 20 anos, trabalha atrás do balcão, limpando copos. Ele veste roupas simples,
com um avental amarrado na cintura.
Henrique,
um homem charmoso por volta dos 32 anos, entra na bodega e se dirige
diretamente ao balcão. Ele é alto, de cabelo bem penteado e usa um terno
alinhado.
HENRIQUE (CORDIAL) – Boa
tarde, rapaz. Me vê um copo de água, por favor.
BASTIÃO (SERVINDO O COPO) – Boa tarde. Aqui está.
Henrique
toma o copo de água com calma, observando os arredores. Nesse momento, Mariana
entra na bodega, com um ar tímido e com roupas que escondem sua silhueta. Ela
evita os olhares de Henrique, mas ele a segue com os olhos.
MARIANA (FALANDO BAIXO) –
Bastião, você tem farinha?
Bastião
balança a cabeça positivamente enquanto pega um pacote da prateleira.
BASTIÃO –
Tenho sim, aqui está.
Mariana
pega o pacote, coloca o dinheiro no balcão e se apressa para sair. Henrique a
observa atentamente enquanto ela deixa o local, seus olhos brilham com uma
mistura de admiração e curiosidade.
HENRIQUE (SORRINDO) –
Moça bonita, essa. Quem é ela?
BASTIÃO (SÉRIO) –
Essa é a Mariana, filha da viúva Leda. Melhor você não se meter com essa
menina. A mãe dela é fogo.
HENRIQUE (RINDO) –
Eu gosto de brincar com fogo.
Bastião
estreita os olhos, desconfiado, mas antes que possa responder, Henrique muda de
assunto.
HENRIQUE –
Acabei de chegar na cidade, não conheço nada aqui. Sabe me dizer onde fica o
jornal “O amigo do povo”?
BASTIÃO (APONTANDO PARA O LADO DE FORA) – Siga pela rua principal até a praça, depois vire à
direita. O jornal fica numa esquina, não tem como errar.
HENRIQUE (ACENA COM A CABEÇA) – Obrigado, rapaz. Você foi muito prestativo.
Henrique
se despede com um leve sorriso no canto da boca e sai da bodega, enquanto
Bastião o observa com uma mistura de curiosidade e apreensão.
CORTA PARA:
CENA
4. INT. SÃO PAULO – CONFEITARIA – DIA
Constância
e Fernando estão sentados lado a lado em uma mesa, continuam conversando, agora
já com bastante intimidade. Os dois estão claramente encantados um pelo outro.
O garçom se aproxima discretamente com a conta. Fernando a pega e, sem hesitar,
paga a quantia. Ele então se volta para Constância, com um sorriso intrigante
nos lábios.
FERNANDO –
Quero te ver mais vezes, gostei muito da sua companhia.
CONSTÂNCIA (SORRINDO) –
Não quer continuar nossa conversa em um lugar mais reservado? Seu apartamento,
talvez.
Fernando
fica surpreso com a franqueza de Constância, mas se recupera rapidamente,
gostando do desafio. Ele se levanta e estende a mão para ela.
FERNANDO (SORRINDO) –
Será como você quiser.
Os
dois saem juntos, de braços dados, trocando olhares cúmplices.
CORTA PARA:
CENA
5. INT. APARTAMENTO DE FERNANDO – DIA
SONOPLASTIA:
E DAÍ? (PROIBIÇÃO INÚTIL E ILEGAL) – GAL COSTA
O
apartamento de Fernando é um local elegante e bem decorado. Fernando e
Constância estão na sala, envolvidos em um beijo intenso. Ele a puxa para mais
perto, enquanto suas mãos começam a deslizar para os botões do vestido dela. À
medida que vão se beijando, Fernando retira lentamente as peças de roupa de
Constância, revelando sua pele aos poucos. Constância sorri e se deixa conduzir
pelo corredor até o quarto. No quarto, os dois se jogam na cama, ainda aos
beijos. As mãos de Fernando exploram o corpo de Constância com desejo, enquanto
ela o segura com firmeza.
SONOPLASTIA OFF
CORTA PARA:
CENA
6. INT – JORNAL O AMIGO DO POVO – REDAÇÃO – DIA
Angislanclécia
está sentada à mesa, revisando alguns papéis para a próxima edição do jornal,
seu cabelo está preso em um coque bagunçado. Eriberto, trabalha em sua própria
mesa, o lado de Angislanclécia. O ambiente é cheio de prateleiras com jornais
empilhados e máquinas de escrever. De repente, a porta se abre e Henrique
entra, atraindo a atenção de Eriberto.
ERIBERTO (LEVANTANDO-SE E SORRINDO) – Henrique! Que bom te ver, rapaz! Finalmente chegou!
Henrique
sorri e caminha até Eriberto. Os dois se cumprimentam com um aperto de mão firme,
seguido de um abraço amigável.
HENRIQUE –
Demorei, mas cheguei! Vim para ajudar com o jornal e, claro, preparar o terreno
para a nossa rádio.
ERIBERTO (RINDO) –
Estamos precisando mesmo de reforço. Deixa eu te apresentar à Angislanclécia,
ela é uma das nossas melhores jornalistas.
Angislanclécia
se levanta e vai até Henrique, estendendo a mão para cumprimenta-lo.
ANGISLANCLÉCIA (SORRINDO) – A única também. Muito prazer, Henrique. Seja bem-vindo.
HENRIQUE –
O prazer é meu, Angislanclécia. Espero que possamos fazer um bom trabalho
juntos.
Eriberto
coloca a mão no ombro de Henrique e o puxa em direção ao fundo do jornal.
ERIBERTO –
Deixa eu te mostrar como estamos organizados aqui. Não é uma redação grande,
como você está acostumado no Rio de Janeiro, mas conseguimos fazer muito
barulho na cidade com essas máquinas.
Os
três caminham enquanto Eriberto apresenta a estrutura, explicando sobre os
setores do jornal, e os projetos para a rádio que Henrique vai ajudar
implantar.
CORTA
PARA:
CENA
7. EXT. RUAS DA CIDADE DE ESPERANÇA – DIA
Um
cortejo fúnebre avança pelas ruas da cidade, liderado por Isabella, vestida com
um longo vestido preto. Ela caminha com postura ereta, o rosto sério e os olhos
determinados. Atrás dela, uma multidão de homens segue o caixão de Madame
Yvette, carregado por quatro homens. Entre os presentes no cortejo estão Augusto,
Homero, o delegado Afrânio, Dr. Romeo e todas as meninas do Bordel (Zuleika,
Florzinha, Teodora, Mara, Carolina) e Robervaldo. Enquanto o cortejo avança, o
som dos passos e murmúrios ecoa pelas ruas. Quando passam pelo prefeito Fontes
e pelo Coronel Almeida, ambos tiram os chapéus em sinal de respeito. Isabella faz
uma leve reverência com a cabeça, mas mantém o olhar fixo em frente. O cortejo
se aproxima da entrada do cemitério, onde um grupo de beatas liderado por
Chandra Dafni e a viúva Leda bloqueiam a entrada, com expressões de reprovação
e braços cruzados.
LEDA (ERGUENDO A VOZ) –
Não permitiremos que uma meretriz seja enterrada junto com as pessoas de bem!
CHANDRA DAFNI (COM TOM GRAVE) – Esse lugar é sagrado! Não se pode profana-lo com os restos
de uma pecadora.
Isabella
avança até ficar cara a cara com Leda, seus olhos demonstram revolta.
ISABELLA (FIRME) –
Nós vamos entrar, nem que eu tenha que passar por cima de vocês.
Zuleika,
Florzinha, Mara, Teodora, Carolina e Robervaldo se posicionam ao lado de
Isabella, formando uma linha de apoio.
LEDA (EXALTADA) –
Essas meninas e esse desviado acham que podem desafiar as leis de Deus! Vocês
todas vão queimar no inferno!
CHANDRA DAFNI (FAZENDO O SINAL DA CRUZ) – São a própria tentação. Deus nos proteja.
Augusto
se adianta, tentando apaziguar a situação.
AUGUSTO – Leda,
deixe o cortejo passar. Não torne isso mais difícil do que já é.
LEDA – Não vou
permitir que essa sem vergonhice ocorra no cemitério da nossa cidade!
Augusto
respira fundo, mantendo a calma.
AUGUSTO (OLHANDO PARA ALGUNS HOMENS DO CORTEJO) – Então não teremos outra escolha. Tirem-nas do caminho!
Alguns
homens começam a carregar Leda, Chandra Dafni e outras beatas para fora da
entrada, apesar da resistência delas. O cortejo retoma o movimento, entrando no
cemitério enquanto os portões são fechados. Do lado de fora, Leda e Chandra
Dafni continuam a gritar em protesto.
CORTA PARA:
CENA
8. INT. APARTAMENTO DE FERNANDO – QUARTO – NOITE
Fernando,
deitado na cama, se move lentamente, acordando ao ouvir o som de Constância
pegando suas roupas. Ela está enrolada no lençol, caminhando pelo quarto
enquanto recolhe as peças espalhadas pelo chão. Fernando se apoia nos
cotovelos, observando-a com curiosidade.
FERNANDO (BOCEJANDO) –
Já vai embora? Nem vai me dizer o seu nome?
Constância
para, já vestida, e se vira para ele com um sorriso misterioso.
CONSTÂNCIA –
Você não precisa saber o meu nome. Isso é irrelevante.
Fernando
fica intrigado.
FERNANDO –
E eu vou ter a sorte de te ver de novo?
Constância
se aproxima de Fernando, e o beija nos lábios enquanto ele ainda está deitado.
CONSTÂNCIA –
Talvez. Ainda vou ficar alguns dias na cidade...E agora já sei onde você mora.
Ela
se afasta e caminha até a porta, deixando Fernando sozinho, com um sorriso
surpreso no rosto e um brilho de fascínio nos olhos. Ele fica deitado por
alguns momentos, como se tentando compreender o que acabou de acontecer.
CORTA PARA:
CENA
9. INT. CASA DE MARTINA – SALA – DIA
Martina,
vestida com um vestido simples e avental, está de pé perto da porta, segurando
uma carta que acabou de ser entregue pelo carteiro. Sua expressão de ansiedade
se transforma em alívio e alegria conforme lê a carta. Na sala, Rodolfo, está
sentado folheando um jornal.
MARTINA (ENTUSIASMADA) –
Rodolfo, você não vai acreditar! É uma carta do Matteo! Ele está voltando para Esperança
dentro de alguns dias!
Rodolfo
levanta os olhos do jornal, surpreso, e imediatamente se anima.
RODOLFO –
O Matteo vai voltar? Depois de tanto tempo, que notícia boa, tia! Há tantos
anos que eu não vejo meu irmão.
Martina
concorda com a cabeça, ainda com o olhar fixo na carta. Os dois trocam um
sorriso de cumplicidade. Nesse momento, Jerônimo, vestido para o trabalho,
desce as escadas e percebe a animação na sala.
JERÔNIMO (CURIOSO) –
O que é que está acontecendo?
MARTINA –
Jerônimo, o Matteo mandou uma carta. Ele vai voltar para Esperança em poucos
dias!
Jerônimo
pega a carta das mãos de Martina e lê rapidamente. Sua expressão permanece
neutra.
JERÔNIMO (DEVOLVENDO A CARTA) – É uma surpresa que ele queira voltar depois de tantos anos,
e depois de já ter se estabelecido muito bem em São Paulo.
Ele
veste o chapéu, ajeita a gravata e se prepara para sair.
JERÔNIMO –
Eu já estou atrasado, preciso ir trabalhar.
Jerônimo
sai, deixando Martina e Rodolfo trocando olhares. Martina parece um pouco
desapontada pela falta de entusiasmo do marido, mas rapidamente volta sua
atenção para Rodolfo, que sorri com empolgação.
CORTA PARA:
CENA
10. INT. BORDEL DE MADAME YVETTE – SALÃO – DIA
Jerônimo
entra pela porta principal, carregando uma pasta de couro, ele é recebido por
Robervaldo.
JERÔNIMO –
Bom dia! Estou aqui como tabelião para a leitura do testamento deixado por
Madame Yvette. Por favor, chame Isabella e as outras meninas, todos citados no
testamento devem estar presentes para a leitura.
Robervaldo
acena com a cabeça e sai para chamar as mulheres. Há um corte na cena, quando
volta, todos estão reunidos: Isabella, Florzinha, Mara, Carolina, Teodora e Robervaldo.
Eles se sentam em círculo, aguardando com expectativa. Jerônimo abre a pasta,
retira o testamento e começa a ler.
JERÔNIMO –
“Eu, Yvette Oliveira, em plena consciência e com livre vontade, declaro os meus
últimos desejos...”
Ele
faz uma pausa, olhando para todos. Os rostos estão tensos, atentos.
JERÔNIMO –
“Deixo uma quantia de dez mil cruzeiros para cada uma das meninas – Zuleika,
Florzinha, Mara, Carolina e Teodora – por todo esse tempo de trabalho e para
que possam decidir se querem continuar a trabalhar aqui ou seguir outro
caminho.”
As
meninas se olham, surpresas e emocionadas. Ele continua a leitura.
JERÔNIMO –
“Para Robervaldo, meu fiel escudeiro, deixo também dez mil cruzeiros em
reconhecimento por sua lealdade. E para Isabella...”
Ele
faz uma pausa, encarando Isabella com intensidade.
JERÔNIMO –
“Para Isabella, minha amiga e filha que nunca tive, deixo todo o dinheiro
restante no banco, o imóvel onde funciona o meu bordel, e o meu automóvel.”
Há
um momento de silêncio. Isabella fica boquiaberta, desacreditada no que acaba
de ouvir. Carolina a abraça com entusiasmo, enquanto Zuleika, Florzinha e Mara
sorriem, ainda chocadas. Teodora, no entanto, mostra um certo desagrado.
CAROLINA (SORRINDO) –
Parabéns, Isabella! Yvette sabia o quanto você significava para ela. Você
merece!
Jerônimo
fecha o testamento e se levanta.
JERÔNIMO –
Isabella, preciso falar com você em particular.
Todos
saem da sala, deixando Isabella e Jerônimo sozinhos. A expressão de Isabella
muda para uma mistura de nervosismo e irritação.
ISABELLA (FIRME) –
O que você quer, Jerônimo?
Jerônimo
caminha lentamente até ela, mantendo um olhar intimidador.
JERÔNIMO –
Matteo vai voltar para a cidade dentro de alguns dias. E vou ser claro,
Isabella. Se você contar para ele o que aconteceu para você ter vindo parar
aqui, vou garantir que sua tia, Martina, sofra as consequências.
Isabella
fica pálida e tensa. Ela respira fundo, mantendo o olhar fixo em Jerônimo.
ISABELLA –
Eu não vou dizer nada ao meu irmão.
Jerônimo
sorri, satisfeito com a resposta. Ele segura o queixo de Isabella, forçando-a a
olhar para ele.
JERÔNIMO –
Boa menina. É assim que eu gosto.
Isabella
se desvencilha e dá um tapa na mão de Jerônimo, afastando-o. Ele a olha por um
instante com um sorriso de deboche antes de se virar e sair do bordel. Isabella
permanece na sala, respirando fundo, tentando recuperar a calma.
CORTA PARA:
CENA
11. EXT. ESPERANÇA
SONOPLASTIA ON: QUEM
SABE ISSO QUER DIZER AMOR – MILTON NASCIMENTO
Vista
panorâmica da cidade de Esperança, uma pequena cidade do interior, com suas
ruas de paralelepípedo, casas coloniais e praças arborizadas. Uma sequência de
imagens mostra a vida cotidiana se desenrolando: um grupo de crianças corre
pela praça brincando; senhoras varrem a calçada em frente às suas casas; na
bodega de Bastião, os clientes discutem animadamente enquanto bebem. Em
seguida, uma série de tomadas mostra a passagem do tempo com amanheceres e
entardeceres que indicam o transcorrer dos dias.
DIAS DEPOIS
SONOPLASTIA OFF
CORTA PARA:
CENA
12. EXT. RUAS DE ESPERANÇA – DIA
Vários
carros avançam pelas estradas de terra que levam à cidade de Esperança. São
veículos luxuosos, com bagageiros carregados de malas e móveis cobertos. À
frente, um Rolls-Royce preto, reluzente, segue em ritmo constante. O carro é
dirigido por Tássio, o motorista, com Matteo e Flávio sentados no banco
traseiro, e Magali ao lado do motorista. Matteo, observa a paisagem pela
janela, a expressão em seu rosto é séria e pensativa.
FLÁVIO (DESCONTRAÍDO) –
Por aqui, parece que nada mudou. Mesmas árvores, mesma estrada esburacada....
Matteo
continua com o olhar fixo na estrada que leva à cidade. Ele vê a distância, o
carro se aproximando da cidade.
MATTEO – Talvez
a cidade não tenha mudado nada, mas eu já não sou o mesmo menino que saiu daqui
há quase dez anos.
O
Rolls-Royce passa pelas ruas da cidade, chamando a atenção de todos, e para em
frente a uma grande e luxuosa casa. Os outros carros estacionam atrás, e homens
começam a descarregar as malas e os móveis. Tássio desce rapidamente e abre a
porta traseira para Matteo e Flávio. Matteo sai do carro com elegância,
vestindo um terno bem cortado. Ele para diante da casa e observa atentamente
cada detalhe da fachada.
MATTEO (FIRME) –
Voltei!
Matteo
olha ao redor, como se estivesse se preparando para enfrentar o passado e tudo
que o espera em Esperança.
FIM DO CAPÍTULO
Obrigado pelo seu comentário!