Débora
CAPÍTULO 43
Últimos Capítulos
uma novela de
FELIPE LIMA BORGES
escrita por
FELIPE LIMA BORGES
baseada nos capítulos 3 a 5 do livro
de Juízes
CENA 1: INT.
CASA DE ADÉLIA – LOJA – DIA
Atrás do balcão, Adélia entrega um
cesto para uma moça.
ADÉLIA
Leve para a
senhora Débora. Diga que eu disse o seguinte: “Com muito carinho, à juíza de
Israel”. E fale para ela que ainda vou fazer a receita inspirada na pessoa dela,
que não me esqueci não.
A moça faz que sim e sai. Laila,
vinda de outro cômodo, chega ali.
LAILA
Enviou os
doces para a senhora Débora?
ADÉLIA
Sim...
LAILA
Então que
cara é essa, minha irmã?
Adélia encosta na parede, está
frustrada.
ADÉLIA
Não sei o
que aconteceu com o bolo, o do amor... E estou sem ânimo para testar receitas
novas. Talvez seja hora... de aceitar que não vou me casar.
LAILA
Oh, Adélia,
não fique assim, irmãzinha... Apenas tenha paciência. Nós duas. Tudo bem? Por
enquanto, apenas tenhamos paciência.
Adélia
apenas a olha...
CENA
2: EXT. CAMPO – PALMEIRA – DIA
Débora está na tenda quando o
ancião Aliã se aproxima com um sorriso jovial.
ALIÃ
Shalom...
DÉBORA
Senhor
Aliã... Shalom! Que prazer receber a sua visita logo cedo.
ALIÃ
Eu queria
ser o primeiro do dia na tenda.
Débora sorri.
ALIÃ
Vim para
contemplar com meus olhos onde você chegou... Sabe, minha filha, eu sinto sim
que contribuí um pouco para isso, e por essa razão, estou muito satisfeito. A
minha missão está cumprida. Se Deus me levasse hoje, eu iria feliz. Tenho muito
orgulho de você, Débora. Minha juíza...
Débora o escuta e, pela sua
expressão, é claro o tamanho da alegria em seu coração.
ALIÃ
Muitos já
devem ter dito isso pra você... “Minha juíza”.
DÉBORA
(rindo) Sim... É
sim. (respira fundo) Ah, senhor, confesso que sinto muita falta dos
tempos em que ia até o templo aprender com o senhor... Bons tempos. Mas agora
sou tão ocupada... A todo instante gente de toda Israel chegando... (sorrindo)
Mas num dia desses nós nos encontraremos e conversaremos tudo de novo.
Aliã ri.
ALIÃ
Sim...
Tenho fé que sim.
CENA
3: INT. CASA DE ADÉLIA – LOJA – DIA
Umas 5 pessoas chegaram ali na loja
e agora reclamam com Adélia e Laila.
HOMEM 1
Fiquei mal
a noite toda, você não imagina o prejuízo que foi!
MULHER 1
Tomei três
copos de chá, e nem adiantou foi nada!
HOMEM 2
Minha
mulher me fez dormir com as ovelhas!
MULHER 2
Como vocês
podem vender essas coisas com tanta irresponsabilidade?!
E mais gente vai chegando na loja e
reclamando aos gritos. As duas, assustadas, pedem calma com as mãos.
ADÉLIA
Nós pedimos
desculpas a todos! E prometemos que vamos revisar todo o processo de confecção
dos bolos e doces para ver o que pode ter acontecido!
O povo, ainda bravo, se dispersa, e
a maioria vai embora.
LAILA
O que deve
ter acontecido, Adélia?!
ADÉLIA
Só pode ter
sido meu ingrediente novo...
LAILA
Muito bem.
Agora quero que me conte que ingrediente é esse! Vamos, Adélia, fale de uma
vez!
ADÉLIA
É um pó com
base de casca e semente de romã torradas, com clara de ovo em pó e um pouco de
cinzas para fogo...
Laila arregala os olhos.
LAILA
Quê?!
ADÉLIA
O mercador
que me vendeu disse que as comidas que usam esse ingrediente causam na nossa
barriga uma sensação esquisita, mas gostosa... Um negócio diferente, sabe?... E
ele disse que poderia usar em quase qualquer receita. E todas as massas em que
utilizei ficaram deliciosas!
LAILA
Adélia,
pelo amor de Deus!
Adélia abaixa o rosto.
LAILA
Mas se for
assim, a juíza Débora também comerá e passará mal!
Adélia levanta o rosto subitamente,
arregala os olhos e empalidece... Cambaleia e quase cai num início de perda dos
sentidos. Laila a ampara.
LAILA
Adélia!
Você está bem?!
ADÉLIA
Eu... fazer
mal à juíza... Não...
De repente Adélia sai a toda
velocidade: dá a volta no balcão e corre para a saída.
LAILA
Adélia!
Adélia!!!
Adélia dispara e some.
LAILA
Sua louca!
CENA
4: EXT. CAMPO – PALMEIRA – DIA
A moça entrega o cesto de doces a
Débora e fala as palavras que Adélia ordenou.
DÉBORA
Muito
obrigada!
A moça faz um aceno com a cabeça.
MOÇA
Com
licença, senhora.
Ela sai. Débora abre o cesto e vê
os doces.
DÉBORA
Senhor
Aliã, o senhor aceita?
ALIÃ
Não, minha
filha, obrigado. Estou cheio... Hoje o desjejum do templo foi ainda melhor que
o de costume.
Débora coloca o cesto num banco.
DÉBORA
Senhor...
Quero agradecê-lo pela visita... É muito importante para mim.
Sorrindo, Aliã a abraça como um pai
abraça sua filha...
ALIÃ
Então vou
indo... Tenha um dia abençoado, filha.
Pouco depois, Débora recebe um
hebreu e pede que ele se sente.
DÉBORA
Vou apenas
experimentar esse doce que me mandaram e já conversaremos. Aliás, o senhor
aceita?
HEBREU
(recusando) Obrigado,
senhora.
A algumas dezenas de metros dali,
Adélia sai de entre as árvores e vem correndo desesperada. Débora nota-a e
sorri. Então olha para dentro do cesto e analisa os diversos doces.
DÉBORA
Hummm...
Bonitos.
ADÉLIA
Não pegue!
Não pegue, senhora! Não pegue!
Ao ouvir os gritos de Adélia,
Débora a olha novamente, mas o que ela diz ainda é incompreensível. Então leva
a mão ao cesto e pega um doces.
ADÉLIA
Não!!! Não,
não pegue nada, senhora!!! Não pegue!!!
Adélia se aproxima da tenda a toda
velocidade e Débora aproxima o doce da boca.
ADÉLIA
Não coma!!!
Senhora Débora, não coma!!!
Débora finalmente entende, e para a
mão com o doce bem próximo de sua boca. É quando Adélia chega ali. Porém,
devido à velocidade e ao desespero, ela tropeça no tapete da tenda e cai em cima
de bancos, derrubando diversos objetos, entre eles copos, pratos e jarros.
Assustada
e caída, ela vira no chão e, receosa, olha para Débora.
CENA
5: EXT. BETEL – ARREDORES – DIA
Três cavalos param quando seus
cavaleiros avistam, logo à frente, a cidade de Betel. No do meio está Elói, e
nos cavalos dos dois lados estão os soldados hazoritas.
ELÓI
Chegamos.
Vão, escondam-se atrás daqueles arbustos. E não se esqueçam de seguir o plano à
risca.
SOLDADO 1
Não
precisamos receber instruções suas.
SOLDADO 2
Conhecemos
o plano.
Elói fica quieto, mas os dois
soldados cavalgam até sumirem atrás de alguns arbustos ali perto.
Elói
então olha para Betel... e avança.
CENA
6: INT. PALÁCIO – CASA – QUARTO DE SÍSERA – DIA
Segurando firmemente o cabo com
suas duas mãos, Darda mantém a espada acima do pescoço de Sísera, e apontada
para o mesmo. Mas, seja pela força que emprega no cabo, seja por algum motivo
emocional, Darda treme bastante...
De repente, os olhos de Sísera se
abrem, o que faz com que Darda, até então concentrada, se assuste e tropece
para trás. A espada em suas mãos cai no chão.
Sísera logo se levanta, senta na
beirada da cama e a observa, assustada e com a espada jogada aos seus pés.
SÍSERA
O que
estava fazendo?
Darda,
com os olhos um tanto esbugalhados, o encara sem saber o que dizer.
CENA
7: EXT. CAMPO – PALMEIRA – DIA
Débora estende as mãos para Adélia
e a ajuda a se levantar.
DÉBORA
Adélia...
Você está bem? Se machucou?
ADÉLIA
Não...
Estou bem... (põe-se de pé) Senhora, por favor, mil desculpas! Mil vezes
mil desculpas, senhora! Eu sou uma desastrada, uma peste! Sou a décima primeira
praga do Egito! Senhora, eu prometo que vou doar metade dos meus doces para as
crianças! Não, metade dos meus lucros! Serei sua serva, senhora Débora! Não,
serei sua escrava! Para sempre escrava sua!
DÉBORA
(sorrindo) Adélia,
Adélia!... Adélia... Acalme-se, menina.
Adélia, aflita, tenta se acalmar
respirando fundo. Passa as mãos pelo rosto, pelo cabelo...
DÉBORA
Explique.
ADÉLIA
Senhora, eu
não queria fazer mal, não era a minha intenção!... Recentemente adicionei um
ingrediente novo em várias de minhas receitas, mas hoje descobri que o povo
tudo passou mal... Senhora, estou lhe dizendo, não era minha intenção fazer mal
a ninguém! Tanto que quando entendi que o ingrediente era o motivo de todo o
imbróglio, vim correndo impedir que a senhora comesse e também passasse mal.
Imagine só se eu fosse a responsável por adoecer a juíza, meu Deus do Céu...
DÉBORA
Eu sei que
não tinha intenção, Adélia, eu acredito em você. Porém, nem preciso dizer que
você deve retirar esse ingrediente de sua cozinha imediatamente, não é?
ADÉLIA
Claro,
farei isso sim, senhora.
DÉBORA
Pois bem.
ADÉLIA
Para
compensar esse meu desastre na sua tenda, vou acelerar a criação daquela minha
receita inspirada na senhora.
Débora sorri e acaricia a testa
suada e o cabelo bagunçado de Adélia.
DÉBORA
Não se
preocupe com isso, Adélia. Não é necessário.
ADÉLIA
Não,
senhora, eu preciso!... Por favor, não ordene que eu pare...
DÉBORA
Tudo bem,
menina... Se você quer, tudo bem.
ADÉLIA
Ai, que
bom... Que alívio... Obrigada, senhora. (pequena pausa) Essa bagunça...
vou arrumar rapidamente, senhora. Nem parecerá que alguém derrubou as coisa
todas...
DÉBORA
Não, não,
Adélia, pode ir, pode ir tranquila. O servo que cuida da tenda limpará. Não se
preocupe.
ADÉLIA
Bom, então
está bem... (constrangida) Então... eu vou voltar. Vou indo...
Senhora... Shalom.
DÉBORA
(sorrindo) Shalom,
Adélia.
Adélia
vira e, devagar, vai indo embora, porém toda desconcertada.
CENA
8: INT. PALÁCIO – CASA – QUARTO DE SÍSERA – DIA
Sísera, sentado na beirada da cama,
encara Darda, de pé e sem saber direito como reagir.
SÍSERA
E então,
Darda?! Diga-me! O que estava fazendo com minha espada?! Por que a vi com ela
acima de mim?!
DARDA
Senhor...
Perdoe-me... É que acordei, me levantei e vi a espada aqui no chão... Fiquei
curiosa, nunca vi uma de perto, nunca toquei... Não resisti... Talvez eu tenha
colocado ela em cima do senhor, mas foi por inexperiência... Eu queria apenas
visualizá-la melhor nos raios de sol acima da minha cabeça...
Sísera se levanta e, com raiva,
pega a espada e a bainha.
SÍSERA
Isso aqui
não é coisa de mulher! Nunca mais ouse tocar em uma espada! Muito menos em uma
minha!
Ele coloca a espada na bainha e
joga ali ao lado.
SÍSERA
Vá, suma
daqui!
Darda
então pega umas coisas suas, vai para a porta e sai. Sísera esfrega o rosto com
as mãos.
CENA
9: INT. PALÁCIO – CASA – SALA – DIA
Logo que chega na sala, Darda é
interceptada por Elisa, que a toca no braço.
ELISA
Darda!...
Darda, você não devia ter feito aquilo!
DARDA
E devia
fazer o quê?! Deixar ele abusar de você?! Olha, esqueça isso. E não conte a
ninguém.
Elisa respira fundo.
ELISA
Está bem...
É o mínimo que posso fazer. Mas... você está bem?...
DARDA
Ninguém
pode ficar bem depois disso...
ELISA
Você fez
isso por mim... Obrigada, Darda.
Darda
apenas a olha e respira fundo.
CENA
10: INT. HOSPEDARIA DE QUEDES – QUARTO – DIA
Sama, em lágrimas e sentada na
beira da cama, observa Melissa brincando no chão com seus brinquedos de
madeira. A menina então olha para a mãe.
MELISA
Mamãe...
Por que você está chorando?
Sama funga e limpa as lágrimas.
SAMA
Filha...
Venha aqui.
Melissa se levanta e vai até Sama,
que a envolve em seu braço.
SAMA
Melissa,
minha filha... Nunca pense mal da mamãe. Nunca pense coisas erradas sobre
mim... Você é muito importante para mim. A mamãe te ama muito! Você... é o meu
tesouro, Melissa. Na verdade... você é tudo o que eu tenho nessa vida. E é a
única coisa boa vinda de mim...
Sama
então beija a filha e a abraça bem forte. Apesar de seus olhos fechados, muitas
lágrimas são derramadas...
CENA
11: EXT. BETEL – PRAÇA – DIA
Aliã, voltando da tenda de Débora
rumo ao templo, atravessa a praça quando um homem o toca no ombro. Ele para,
vira e vê: Elói é quem lhe chamou.
ALIÃ
Pois não?
ELÓI
Senhor... O
senhor é o ancião daqui de Betel?
ALIÃ
Sim. Meu
nome é Aliã. Shalom.
ELÓI
Shalom,
senhor Aliã.
ALIÃ
No que
posso ajudá-lo?
ELÓI
Bem, senhor
Aliã... Eu vim de mui longe, de uma cidade chamada Meroz, na tribo de Naftali.
Não sei se o senhor já ouviu falar...
ALIÃ
Já, já...
ELÓI
Pois bem.
Acontece que tenho uma causa urgente, e preciso de uma resposta de Deus para
logo!
ALIÃ
Procure
Débora, é ela quem resolve essas coisas.
ELÓI
Senhor, eu
já fiz isso. O problema é que a fila para falar com a juíza está enorme! Minha
causa é gravíssima, não posso esperar... Há vidas em jogo, senhor.
Aliã franze a testa e observa Elói
por alguns segundos...
ELÓI
Apesar da
gravidade, acredito que não seja necessário Débora me atender. A ajuda do
ancião da cidade me basta.
Aliã então se ajeita.
ALIÃ
Certo...
Então vamos, diga qual é a sua causa.
ELÓI
Senhor...
Olhe isso aqui. Essa cidade está lotada, como posso falar no meio de tantos?
ALIÃ
Quer ir até
o templo?
ELÓI
Na verdade
eu prefiro que vamos juntos até lá fora da cidade. Inclusive podemos orar embaixo
de alguma árvore. O silêncio das pessoas, o som do vento... Será mais fácil de
nos achegarmos a Deus em oração.
Aliã respira fundo.
ALIÃ
Sei...
Certo... Então vamos.
Elói sorri.
ELÓI
Agradeço
por aceitar, senhor.
Elói
e Aliã então cruzam a praça de volta para o portão da cidade.
CENA
12: INT. PALÁCIO – CASA – SALA – DIA
Sísera e Najara estão sentados à
mesa; é hora do desjejum. Porém, ao invés de comer, ele está com o pergaminho
de Darda em mãos.
SÍSERA
(lendo) “...essa
menina. Qual é o meu nome? Não importa. Mas o de minha mãe, sim: Nira. Importa
pois essa palavra será a última que você ouvirá, sua assassina maldita. ‘Por
Debir e Nira’. Prepare-se, porque eu estou chegando. Quando menos esperar, a
flecha da minha vingança cravará no seu coração podre e escuro. Em breve
haveremos de nos encontrar. Até lá, Najara. Enquanto isso, tenha ótimos
pesadelos”. Pelos deuses! Pelos deuses, mãe!!! Isso é terrível!!! Vou
investigar imediatamente!
Sísera enrola o pergaminho e guarda
em um bolso da veste.
SÍSERA
Por
enquanto, a senhora só sai do palácio com pelos menos 2 soldados escoltando-a.
NAJARA
Tudo bem.
SÍSERA
Naquele dia
que fomos até Nira... Eu sabia que devíamos ter procurado e dado cabo da
criança.
NAJARA
Agora me
arrependo profundamente de ter deixado isso pra trás... Pensei que a pirralha,
seja lá onde estivesse, não sobreviveria sozinha... Ledo e maldito engano!
SÍSERA
Farei essa
filha de Nira pagar caro pela ousadia!
NAJARA
Rum... Mesmo
depois de muitos anos morto, Jeboão continua a me dar problemas!
Sísera
apenas a olha.
CENA
13: EXT. QUEDES – ARREDORES – DIA
De pé e abraçados embaixo de uma
grande e frondosa árvore, Baraque e Sara observam o vasto campo à frente. Atrás
deles está a cidade de Quedes.
BARAQUE
Eu prometo,
Sara, que cuidarei mais de você e de nossa família... Principalmente agora, na
gravidez...
SARA
Finalmente
abriu os olhos!...
BARAQUE
No tempo
certo voltarei atrás do tesouro.
SARA
Baraque--
BARAQUE
(interrompendo)
Sara,
olhe! Veja esse campo, todo esse espaço, essas árvores... Imagine nosso filho
correndo por tudo isso aí. Forte, valoroso...
SARA
Guerreiro...
Igual ao pai.
Baraque sorri. Eles aproximam os
rostos e trocam um delicado beijo...
Porém são interrompidos por um
barulho nas árvores à lateral: viram e veem dois homens com as vestes surradas
se aproximando com um semblante malicioso.
HOMEM 1
Ora, ora, e
o encontramos bem aqui! Nem mesmo precisaremos entrar na cidade.
Baraque coloca Sara um pouco para
trás de si.
BARAQUE
Quem são
vocês?
HOMEM 2
Você por
acaso não é Baraque, filho de Abinoão, da família do lendário tesouro hebreu?
SARA
“Lendário
tesouro hebreu”?
Ela começa a se desesperar.
BARAQUE
Sara, meu
amor, acalme-se. Fique tranquila... Pense em nosso filho. E, por favor, se
afaste. Vá para perto da árvore, meu amor. Não corra para a cidade, pode ser
pior para o bebê. E um pode ir atrás de você se o outro me segurar... Vá para a
árvore, Sara.
Sara, devagar, vai até a árvore
atrás deles e fica ali clamando angustiada.
Baraque olha para os dois homens.
BARAQUE
(cerrando os
punhos) Venham, venham logo! Sem enrolação!
Então cada um dos dois homens sacam
um punhal e se aproximam de Baraque. Porém, no último instante, um deles desvia
de Baraque e corre até Sara. Ela grita, mas o homem a agarra, a prende em seu
braço e coloca seu punhal no pescoço dela.
Desesperado e furioso, Baraque luta
contra o primeiro homem. Se afasta e desvia de cada golpe de punhal, e mete um
soco no homem sempre que pode. Então, sem muita dificuldade, ele agarra o braço
do homem, torce-o com toda sua força, o que faz o homem gritar, e dá um soco no
estômago, e outro, e mais outro! Agarra-o pelo pescoço e lhe dá um soco no
nariz. O homem cai. Baraque então mete-lhe um chute com toda sua força,
fazendo-o ficar ali caído.
Baraque vira e corre até a árvore,
onde o outro mantém sua esposa como refém.
HOMEM 2
Não se
aproxime!!! Fique aí!!! Fique aí ou eu mato ela!!!
Baraque para e levanta as mãos em
sinal de rendição.
HOMEM 2
No chão!!!
No chão ou corto fora a garganta dela!!! Agora!!!
Devagar, Baraque se abaixa... se
baixa... se abaixa... até tocar o chão. Porém, sua mão direita se fecha em uma
pedra e, num movimento rápido e preciso, ele se levanta e atira a pedra na
direção dos dois com toda sua força. A pedra corta o ar a toda velocidade e
atinge em cheio a testa do homem, fazendo-o cair secamente no chão.
BARAQUE
Hazorita
maldito!
Sara, assustada, corre para o
marido. Eles olham e o outro, derrotado na luta, se levanta e foge tropeçando.
BARAQUE
Vamos, vou
te levar pra casa, você precisa...
Ele limpa o rosto dela, que soluça
assustada.
BARAQUE
Vamos...
Eles
viram e vão.
CENA
14: EXT. BETEL – ARREDORES – DIA
Elói chega com Aliã no mesmo local
em que se separou dos dois soldados hazoritas, próximos aos arbustos. Os dois
viram um de frente para o outro.
ALIÃ
Aqui está
bom pra você?
ELÓI
(sorrindo) Está
perfeito.
ALIÃ
Pois bem,
meu filho. Pode me contar.
Nesse momento, atrás de Aliã, os
dois soldados saem de trás dos arbustos e se aproximam em silêncio.
ELÓI
Senhor, o
que tenho para contar é que, há alguns dias, lá na minha cidade, um homem muito
bravo chegou em minha casa com uma conversa estranha... uma conversa sobre
grãos roubados... algo assim.
Aliã presta atenção sem perceber
que os dois soldados estão mais perto dele.
ELÓI
E eu
confesso que não entendi muita coisa. Além do mais ele estava alterado,
provavelmente embriagado... Foi então que--
Ele para quando um soldado agarra
Aliã com um braço e lhe tampa a boca com a mão. O outro puxa os braços do
ancião para trás e cobre sua cabeça com um saco de pano preto.
ALIÃ
(abafado) O que é
isso?! O que é isso?! O que está acontecendo?!
Elói assiste os soldados levarem o ancião,
amarrarem-no pelo pulsos e o colocarem montado em um dos cavalos.
Em
seguida Elói monta em seu cavalo, um dos soldados no que está Aliã e o outro no
seu próprio; os 4 partem em cavalgada, distanciando-se cada vez mais de Betel.
CENA
15: INT. PALÁCIO – CASA – COZINHA – DIA
Na cozinha, Eloá, Danilo e Elisa
ficam muito impressionados com tudo o que Darda acabou de lhes contar.
ELOÁ
Darda,
pelos deuses! Mal consigo assimilar que você passou perto de matar o
Capitão! Imagine só se uma mulher fizesse o que tantos homens tentarem no campo
de batalha e não conseguiram!
DARDA
Agora terei
que pensar em outra forma de acabar com esses dois malditos.
DANILO
Débora e os
hebreus... Eles podem fazer o serviço por você caso nossos reinos entrem em
confronto.
DARDA
Não. Não
quero isso. Principalmente a Najara! Essa mulher precisa ouvir, logo
antes de morrer, o nome dos meus pais... O nome da minha mãe.
Eloá
e Danilo se entreolham preocupados...
CENA
16: EXT. BETEL – ARREDORES – DIA
Éder, chegando com Isabel, franze a
testa ao ver vários homens em seu terreno. Eles estão arrancando as árvores
jovens, quebrando as ferramentas e espalhando e destruindo o conteúdo das
carroças ali estacionadas. Entre eles, Josafe, que assiste aquilo com um
sorriso de satisfação.
Desesperado, Éder dispara.
ÉDER
JOSAFE!!!
Josafe vira e olha para ele.
JOSAFE
Eu lhe
avisei, Éder.
Éder passa correndo por Josafe e
tenta parar os homens.
ÉDER
Pare!!!
Largue isso!!! Saia daí!!! Vamos, pare!!! Tire isso daí!!! Não, não arranque!!!
PAREM!!!
Mas suas tentativas são todas em
vão. Ele então corre até Josafe e agarra seus braços.
ÉDER
Josafe!
Mande eles pararem! Mande!
Josafe se desvencilha de Éder.
JOSAFE
Afasta-se,
Éder! Estou apenas tomando o que é meu!
Éder então cerra o punho para dar
um soco em Josafe, mas Isabel chega ali correndo e segura o marido.
ISABEL
Éder!!! Não
faça isso! Pare!
ÉDER
E agora,
Isabel?! Veja o que esse maldito fez! Pagou homens para destruírem nossas
coisas!
Isabel olha aflita para os homens.
ÉDER
E
agora???!!!
ISABEL
Éder!...
Éder, minha prima! Débora, Éder! Débora!...
Éder não gosta. Fecha a cara e olha
para o terreno.
ISABEL
Éder!
Escute! Débora é a sua última e única esperança! Ela tem poder de parar isso,
Éder!
Josafe olha para eles.
ISABEL
Você
precisa deixar esse orgulho de lado!
ÉDER
Você pode
ir!...
ISABEL
Não irei.
ÉDER
Vá, Isabel!
ISABEL
Não!!!
Éder olha para ela.
ÉDER
Vamos
juntos, então.
ISABEL
Também não.
Quando eu queria ir, você nem cogitou a possibilidade. Agora vá você, e só
você!
Nada
confortável, mas desesperado com o que estão fazendo com o terreno, Éder sai
apressado. Isabel olha feio para Josafe, mas se afasta e observa de longe.
CENA
17: INT. CAS DE ADÉLIA – COZINHA – DIA
Adélia mostra a Laila e Mireu o pó
acinzentado dentro de um grande saco de pano no chão da cozinha.
LAILA
Esse é o
tal ingrediente?
ADÉLIA
Sim...
MIREU
Deixe-me
ver uma coisa.
Mireu então pega um pote, enche-o
com o ingrediente, tampa-o e o coloca sobre a chama da tocha pendurada na
parede.
ADÉLIA
O que está
fazendo?
MIREU
Um teste.
Não demora muito e ouve-se um
estouro. A tampa voa e cai no chão, e um fumaceiro sai de dentro do pote.
LAILA
O que foi
isso?!
MIREU
Está
explicado o porquê das minhas flatulências e das de todos que comeram os bolos
e doces de vocês. O culpado é mesmo esse ingrediente esquisito.
ADÉLIA
E eu gastei
muito dinheiro com isso... Tenho vários sacos desses no estoque.
LAILA
Adélia,
francamente, hein!
Adélia respira fundo.
ADÉLIA
E ainda vou
ter que mudar todas as receitas novamente...
Laila
a olha com reprovação.
CENA
18: INT. CASA DE GADI E LAÍS – COZINHA – DIA
Gadi chega em casa e vai até a
esposa, na cozinha.
LAÍS
Gadi, meu
amor, que bom que você veio em casa...
GADI
Algum
problema?
Eles se beijam rapidamente.
LAÍS
Sim... Os
mesmos de que te contei. E agora você mesmo poderá ver...
GADI
(estranhando) Mostre.
Laís aponta e ele vê várias facas
de cortar carne espalhadas pelo balcão.
GADI
Você
encontrou assim?
Laís faz que sim.
GADI
E onde ela
está?
Gadi vira para onde Laís olha: lá
no canto da sala, Micaela brinca no chão.
GADI
Micaela,
filha... Venha aqui, por favor.
Micaela não parece gostar de ser chamada,
mas se levanta e vai até a cozinha.
GADI
Micaela... (apontando
as facas) Você sabe algo sobre isso?
Micaela mal olha para o balcão.
MICAELA
(baixinho) Não.
No mesmo instante a menina vira e
volta para onde estava brincando. Gadi olha para Laís.
LAÍS
Eu não
estou me sentindo nada bem com essas coisas todas, Gadi... Já tem dias,
assim...
Gadi
não sabe o que dizer. Apenas vira para a menina e a observa brincar.
CENA
19: EXT. CAMPO – PALMEIRA – DIA
Débora termina de atender um trio:
2 homens e uma mulher.
DÉBORA
Está bom
assim para vocês todos?
TRIO
Sim.
DÉBORA
Estando bom
para ambas as partes, vão e façam conforme combinamos. Que Deus os abençoe.
TRIO
Amém.
Eles se levantam, pegam na mão dela
e vão embora. Enquanto a próxima pessoa vem, Débora serve água em um copo e
toma. Porém, ela avista um homem que vem correndo. Franze a testa... O homem
passa pelo povo que espera ser atendido e não para, apesar dos gritos de protestos.
Débora se levanta, ela identifica
que o homem é Éder. Ele chega ali na tenda.
DÉBORA
Éder?...
Éder se joga ao chão e, com o rosto
em terra, se arrasta com os braços e as pernas até os pés de Débora, que o olha
sem entender.
DÉBORA
O que está
fazendo, Éder?!
Em prantos, Éder levanta a cabeça e
olha para ela.
ÉDER
Débora!...
Tenha misericórdia de mim!... Misericórdia, Débora!
DÉBORA
Éder,
levante-se!
Ela tenta levantá-lo, mas ele só
vai até ficar ajoelhado.
ÉDER
Me
ajude!... Me ajude!
DÉBORA
Éder, levante-se
agora!
Ele então finalmente põe-se de pé e
a olha.
DÉBORA
Explique o
que está acontecendo.
ÉDER
Josafe...
pagou homens para invadir meu terreno e destruir minhas coisas!... Não consigo
pará-los... Aquele terreno não é dele, como ele alega, Débora! Por favor, me
ajude... O terreno é tudo o que Isabel e eu temos! Tudo!...
Débora, controlando-se para não se
afligir, engole em seco e olha para o lado, onde está um dos seus servos:
faz-lhe um sinal chamando.
DÉBORA
(ao servo) Por favor,
cuide da tenda. Essa causa precisa ser resolvida no local...
SERVO
Sim,
senhora.
Débora olha para Éder.
DÉBORA
Vamos.
Os dois caminham. O povo a olha sem
entender.
DÉBORA
Meus
irmãos, por favor, esperem-me por um pouco de tempo apenas. A causa desse homem
é grave e urgente. Assim que voltar atenderei a todos.
E
vai com Éder.
CENA
20: EXT. DESERTO – DIA
Os 3 cavalos continuam a toda velocidade
pelo vasto deserto de Israel.
Aliã,
preso e com o rosto tampado, nada pode fazer. Elói, por sua vez, não tira os olhos
do horizonte... Ao seu ver, horizonte de glória.
CENA
21: EXT. BETEL – ARREDORES – DIA
Isabel, quase chorando de
desespero, olha dos homens que destroem as coisas do terreno para trás, onde vêm
Éder e Débora. Esperançosa, ela vira de vez para eles.
Débora, ao perceber o que os homens
estão fazendo, levanta o braço enquanto se aproxima.
DÉBORA
Parem!!!
Parem já o que estão fazendo!!!
Josafe e os homens olham para ela,
e se assustam ao ver de quem se trata. Todos largam as coisas que estavam
mexendo e apenas a olham. Isabel se junta ao marido e à prima e eles se
aproximam de Josafe.
Débora dá uma olhada nos estragos
feitos no terreno: árvores arrancadas, buracos, carroças quebradas, ferramentas
destruídas... Uma clara revolta em seu olhar. Ela então olha para Josafe.
DÉBORA
Josafe.
JOSAFE
Senhora...
DÉBORA
Você pagou
esses homens para fazerem tudo isso?
Josafe engole em seco.
JOSAFE
Sim... Em espigas,
mas sim...
DÉBORA
Com que
ordem?
JOSAFE
Senhora, me
perdoe... Mas, com todo o respeito... foi direito meu, pois esse terreno
pertence à minha família.
Um dos homens pagos por Josafe se
aproxima bravo.
HOMEM
(para Josafe) Se eu
soubesse que isso ia contra a juíza, nem teria vindo! Mesmo que me pagasse em
ouro!
DÉBORA
Prestem
atenção, pois faremos assim: eu me ajoelharei aqui e orarei ao Senhor. E, de
acordo com o que eu sentir em meu coração da parte de Deus, assim será feito. Pois
o que prevalece aqui não é a vontade de vocês, mas a de Deus.
Josafe e os homens ficam quietos.
Débora então cobre a cabeça,
ajoelha-se e fecha os olhos. Enquanto ela ora em silêncio, apenas com os lábios
se mexendo, Josafe e Éder se encaram... Os homens se afastam do terreno... E
Éder e Isabel trocam olhares um tanto preocupados...
Débora para de orar, mas continua
ajoelhada e de olhos fechados. Tensão entre Éder e Josafe...
Por fim, ela abre os olhos, põe-se
de pé e descobre a cabeça.
DÉBORA
Eu vi a
verdade sobre esse caso.
Éder, Isabel e Josafe a olham com
apreensão e expectativa.
DÉBORA
Esse
terreno não é da família de Josafe, e muito menos é seu.
JOSAFE
Senhora!...
É claro que é!
DÉBORA
Já foi. No
passado, o seu avô, quando ainda era dono desse pedaço de terra, o colocou em
uma disputa com um homem de Ramá, avô de Éder, e o perdeu.
De repente o semblante de Josafe é
tomado por um assombro.
JOSAFE
Como sa--
Temendo corroborar com o que ela
diz, Josafe se interrompe e se cala, mas todos já perceberam que ele concorda
que é verdade.
DÉBORA
E seu avô
lhe contou essa história, Josafe. Porém, você cresceu com o desejo de
reconquistar o terreno que ele havia perdido e, com um fundo de verdade, mas de
forma completamente injusta, tentou tomar o que pertencia legitimamente à linhagem
de Éder. Esse terreno pertence a Éder.
Éder respira aliviado, e Isabel o
abraça de lado. Josafe fica cabisbaixo.
DÉBORA
Por outro
lado, Josafe precisa. Sua família está em péssimas condições.
Por essa ele não esperava...
levanta o olhar para ela.
DÉBORA
Josafe, vá,
mude seu comportamento, arrependa-se, purifique-se, faça um sacrifício ao
Senhor, e então venha até mim, pois, em conjunto aos anciães do templo, conseguiremos
um pedaço de terra para você plantar o seu sustento.
Josafe deixa escapar um discreto
sorriso aliviado.
JOSAFE
Mesmo? A
senhora fará isso por mim?...
DÉBORA
Se fizer
tudo conforme eu disse, sim. Mas, após as primícias do Senhor, você deverá
pagar a Éder o equivalente ao prejuízo que os seus homens causaram aqui.
Ele fica um tanto constrangido.
JOSAFE
Tudo bem...
Obrigado, senhora.
DÉBORA
Não é bom
que haja ressentimentos e sentimentos ruins entre nós, os filhos de Deus. Portanto,
apertem a mão um do outro, perdoem-se e selem a paz com um abraço.
Meio sem jeito, Josafe se aproxima
de Éder que, incentivado por Isabel, também dá uma aproximada. Josafe estende a
mão... e Éder a segura. Um puxa o outro e eles se abraçam... Isabel,
emocionada, seca uma lágrima e sorri para Débora.
Por fim, Josafe faz um aceno
discreto para Débora e sai. Todos os homens que estavam no terreno,
arrependidos ou temerosos, passam por ela, pedem desculpas murmurando e vão
embora.
Por fim, ficam ali apenas Débora,
Éder e Isabel.
ÉDER
Débora...
Obrigado.
DÉBORA
Não
agradeça a mim, agradeça ao Senhor.
ÉDER
Mas você me
ajudou... Aceitou vir até aqui, orou a Deus... Mesmo... apesar de tudo.
DÉBORA
Eu jamais
me recusaria a ajudar alguém que precisasse.
ÉDER
Você me ajudou...
mesmo depois de tudo... que te fiz. Bom, obrigado... e me desculpe... por tudo.
Isabel solta um sorrisinho
contente.
ÉDER
Tenho com você
uma dívida eterna...
DÉBORA
Concentre-se
em ser o melhor... Como marido, como pai, como hebreu... Isso basta.
ISABEL
Agradeço,
minha prima.
DÉBORA
Bem...
Agora vou voltar, há muitos para atender na tenda. Até mais, Shalom.
ÉDER,
ISABEL
Shalom.
Débora os deixa e vai embora. Isabel
e Éder se olham com um sorriso.
ÉDER
Ela é uma
juíza e tanto...
Isabel
ri.
CENA
22: INT. PALÁCIO – SALA DO TRONO – NOITE
O dia passa e a noite cai.
O grande salão que é a sala do
trono está lotada de nobres e oficiais do reino. Comidas e bebidas são servidas
para todos os lados, e músicos e dançarinas ditam o tom da festa.
Ao lado do trono do rei está Sísera.
E Jabim, sentado em seu trono, observa com um sorriso empolgado dois soldados
trazerem da porta dos fundos o ancião Aliã, ainda com a cabeça coberta pelo
pano preto. Os convidados da festa são atraídos por essa movimentação.
Os soldados param diante do trono
e, mediante sinal de Jabim, viram Aliã para toda a sala e retiram o pano. Aliã,
assustado e confuso, olha para tudo aquilo sem entender... Mas mantém-se quieto.
As dançarinas param e a música diminui.
JABIM
Povo de
Hazor! Essa figura desprezível que vos apresento é aquele que os hebreus
admiram como seu sacerdote.
As pessoas riem e Aliã apenas os
olham. Jabim, empolgado, se levanta do trono.
JABIM
(descendo
as escadinhas) Lembram-se dos nossos suntuosos santuários, das
estátuas pomposas de nossos deuses, das vestes luxuosíssimas de nossos sumo
sacerdotes?! Pois é... (apontando) E os hebreus conseguem admirar isso aqui.
Jabim então mete um chute na costa
de Aliã, que cai de bruços. O povo gargalha e então começa a atirar coisas
nele: frutas, taças, pedaços de comida... Aliã mantém o rosto entre os braços
enquanto todo seu corpo é atingido pelas coisas do povo. Sísera observa com um
olhar de desprezo.
Jabim então dá a volta e fica parado
à frente de Aliã e de costa para o povo. Olha o ancião de cima para baixo. Aliã
tira o rosto de entre os braços e olha para cima, para Jabim.
JABIM
Na sua visão
sou um ser único de pé... Adore-me, sacerdote. Está no sangue dos hebreus adorarem
qualquer figura alta e sozinha.
Vários do povo riem, inclusive Sísera.
JABIM
Ou então
chame o seu Deus... Aliás, cadê Ele? Não falam com tanto orgulho de Seus feitos
maravilhosos? E não é você um servo Dele? Por que não te salva das minhas mãos?
ALIÃ
Se Deus
nada está fazendo para impedi-los... é porque, muito provavelmente... minha
missão está cumprida... e minha hora de sair desse mundo chegou...
Jabim ri. Então agarra Aliã pelos
braços e o levanta.
JABIM
Oh, meu
caro, nunca me diverti tanto! (fazendo um sinal) Servo!!!
Não demora muito e um servo se
aproxima carregando uma bandeja de prata sobre a qual está um punhal. Sob os
olhares levemente tensos de Aliã, ele pega a arma, examina-a e vira de costa
para Aliã e de frente para o povo.
JABIM
Nada nos
acontece e nada nos impede de brincar com você, sacerdote, pela razão de que não
há e nunca houve esse seu Deus único. Tudo o que sempre disseram são apenas
fantasias... Assim como todas as ilusões dos hebreus de se tornarem um reino de
verdade.
Jabim permanece de costa para Aliã.
ALIÃ
Eu não verei
esse momento... mas, muito em breve... você descobrirá, rei, que há Deus em
Israel... e saberá de Seus prodígios.
Jabim ri... Ele gargalha! Segura
firmemente o punhal e vira para trás de uma vez! Num golpe certeiro a arma é
cravada em Aliã, mas o grito que se ouve não é do ancião, e sim de Jabim, que
olha para cima e urra como um louco.
Aliã, agonizando com a arma cravada
em si, olha para o céu.
ALIÃ
Senhor!...
Me leve! Me leve, Senhor, me leve!
Jabim aperta ainda mais a lâmina, o
que faz com que Aliã desfaleça e caia para trás...
Morto.
O povo vibra e joga mais coisas no
corpo do ancião. Jabim grita com os braços para cima como se tivesse vencido
uma disputa.
Sísera desce as escadinhas e se aproxima
do rei.
SÍSERA
Senhor,
quer que eu leve o corpo daqui?
JABIM
Não! Deixe
aí mesmo! Vamos nos divertir mais um pouco!
SÍSERA
Certo. Peço
a sua permissão para sair, senhor. Preciso resolver um compromisso.
JABIM
Vá, vá!...
Jabim mal dá atenção para Sísera,
que faz uma reverência e sai atravessando o salão.
Jabim
continua vibrando com a multidão próximo ao corpo de Aliã...
CENA
23: INT. CASA DE DÉBORA – SALA – NOITE
Lapidote aguarda ansioso à mesa.
Então Débora vem de outro cômodo.
LAPIDOTE
E então,
meu amor?
Ela respira fundo.
DÉBORA
As regras
desceram...
Lapidote não consegue esconder a
decepção.
DÉBORA
Não foi
dessa vez.
LAPIDOTE
(pondo-se
de pé) Mas vamos continuar tentando, sem desistir.
DÉBORA
Claro, meu
amor. Desistir jamais.
Ele faz que sim. Então alguém bate
à porta.
LAPIDOTE
Vou ver.
Lapidote abre; é um dos servos do
templo.
SERVO
Senhor
Lapidote?
LAPIDOTE
Entre.
SERVO
Agradeço,
senhor. Vim apenas para informar a senhora Débora que o ancião Aliã está
desaparecido desde de dia.
Débora, de repente preocupada, se
aproxima.
DÉBORA
Desaparecido?!
SERVO
Não foi
visto em lugar algum, senhora.
Débora passa a mão pelo rosto.
DÉBORA
Bem...
Então realizem buscas. Homens à cavalo que cubram todo o entorno de Betel, até
além dos montes e morros. Será complicado fazer isso durante a noite, mas se
algo aconteceu, não podemos perder tempo.
SERVO
Sim, minha
senhora. Orientarei para que façam assim. Shalom.
DÉBORA
Shalom.
O servo sai e Débora e Lapidote se
entreolham um tanto aflitos.
DÉBORA
Eu vou
orar, Lapidote. Venha comigo?
LAPIDOTE
Claro!...
Eles
entram.
CENA
24: INT. CASA DE BARAQUE – QUARTO – NOITE
Baraque, Renê e Abinoão estão ao
redor da cama onde Sara está deitada, dormindo. Um curandeiro tira algumas
folhas da testa dela e olha para eles.
CURANDEIRO
Ela está em
choque... O ataque a deixou assustada demais.
BARAQUE
Senhor... Minha
esposa corre o risco de perder o bebê?...
O homem respira fundo.
CURANDEIRO
Temo que
sim... E devo dizer que ela também corre risco de vida.
O
semblante de Baraque cai e ele sai rápido para fora.
CENA
25: EXT. QUEDES – RUA – NOITE
Baraque sai da casa e vai para a
rua. Consternado, seus olhos marejam, e ele caminha por ali meio sem rumo.
BARAQUE
Senhor...
Veja o que aconteceu!... O que esses hazoritas fizeram à minha esposa... À
mulher que me deu em minha mocidade... Com risco... de perder nosso filho... e
de perder a própria vida também...
Baraque anda de um lado para o
outro.
BARAQUE
Senhor! Por
que as forças dos hazoritas insistem em prevalecer?! O Seu povo clamou tanto,
e ainda clama!... Minha família, Senhor, minha família tem tanta fé e
amor pela sua lei... E ainda assim... o Senhor deixou que isso nos
acontecesse...
Então ele para e olha para as
estrelas no céu.
BARAQUE
Se Débora é
a escolhida, por que ela não age?! Por que o Senhor não dá ordem a ela?! Por
que deixa o mal prevalecer e não salva o Seu povo?!
Ele continua a encarar o céu na
expectativa de uma resposta, ou algo assim...
BARAQUE
Diga-me, Senhor,
tenho sede de ouvir a Sua voz e entender o Seu querer, porque está difícil,
está muito difícil suportar tanta humilhação de um povo incircunciso e
idólatra! Um povo que zomba de Ti! Mostre-me um sinal, Senhor, um sinal de que
não nos abandou e que está conosco! Por favor, eu Te rogo, Senhor! Mostre-me!...
Quase desesperado, Baraque encara o
céu e espera...
Espera...
Mas nada acontece.
Frustrado, ele abaixa os braços e a
cabeça. Então vira e caminha cabisbaixo na direção da porta de casa.
Se ele olhasse para o céu naquele
momento veria surgindo, entre as outras, uma estrela – a mesma grande e
brilhante estrela do “sonho” de Débora. Baraque então abre a porta...
DEUS
Baraque.
Baraque paralisa e empalidece...
Então sua cabeça vira subitamente
para trás, para a rua, e, tremendo, ele volta ali.
Olha para todos os lados, não há
ninguém.
Então, receoso, olha para o céu... e
vê a grande estrela. Seus olhos se arregalam...
DEUS
Baraque.
Ele não aguenta. Completamente
impressionado, as pernas de Baraque tremem e ele cai de joelhos. Em seu
semblante contemplativo e extasiado para o céu, IMAGEM CONGELA
CONTINUA...
FADE OUT:
No antepenúltimo
capítulo:
Deus fala com Baraque. Jabim envia uma mensagem a Débora dizendo que está com
Aliã. E os ponteiros de um confronto começam a se alinhar.
Obrigado pelo seu comentário!