CAPÍTULO 33
uma novela de
FELIPE LIMA BORGES
livre adaptação do livro de Rute
Edição da Versão Reprise por
RAMON FERNANDES
EDIÇÃO:
Restante do Capítulo 47 + Parte do Capítulo 48 ORIGINAL (SEM CORTES)
CENA 1: INT. CASA DE LEILA – LOJA – DIA
Noemi vem da rua e entra na loja, onde Leila e Aylla estão arrumando as coisas.
NOEMI — Shalom...
LEILA — Shalom, Noemi. Que boa visita...
AYLLA — Shalom, senhora Noemi.
NOEMI — Leila, chegou mensagem de Belém?
LEILA — Ainda não, Noemi...
NOEMI — Hum... Tani deve estar muito ocupada.
LEILA — Fico muito feliz de saber que Israel está saindo da crise. Deus teve piedade de Seu povo.
Um pouco desconfortável, Noemi faz que sim educadamente.
NOEMI — Era um povo duro, injusto... mas Deus teve piedade.
Leila a observa, percebendo as entrelinhas.
NOEMI — Há muito tempo penso na possibilidade de voltar para Belém, mas não sei... Malom e Quiliom estabeleceram suas vidas aqui, eu estou envelhecendo e já me acostumei... Talvez nunca saia daqui.
LEILA — Mesmo?...
NOEMI — Sim... Mesmo sendo um dos últimos pedidos de Elimeleque. Não podemos fazer cegamente tudo o que pedem aqueles que estão à beira de partir... Se fosse assim, eu ainda acreditaria na Promessa, que houve uma...
AYLLA — E não houve?
NOEMI — Mas é claro que não. Leila nunca te contou?
Aylla olha para Leila, que não olha Noemi diretamente.
NOEMI — Na certa eu tropecei e bati a cabeça naquele dia... Lembro que me desequilibrei e caí. Sei lá o que aconteceu, mas o que não aconteceu foi um anjo descer da glória do céu apenas para me prometer o amor.
Leila e Aylla não dizem nada.
NOEMI — Enfim, muito obrigada, vocês duas... Só queria mesmo saber se chegou alguma mensagem.
Nesse momento, Orfa e Quiliom chegam ali e eles se cumprimentam. Noemi beija o filho e a nora.
NOEMI — Já vou, tenho compras para fazer ainda. Shalom!
TODOS — Shalom.
Noemi vai embora. Orfa e Quiliom se acomodam.
LEILA — Fiquei tão triste quando soube dessa desilusão da Noemi...
QUILIOM — Em relação à Promessa? Eu entendo minha mãe. Talvez não tenha acontecido mesmo. Minha mãe sofria muito quando era jovem, por conta das pessoas que viam com maus olhos as sardas que ela tinha. Deve ter criado essa história de anjo como... como uma forma de se livrar... desses problemas, não sei... algo assim. Deve ter sido tudo fruto de sua imaginação.
LEILA — Não gosto dessa ideia.
AYLLA — Nem eu.
Quiliom dá de ombros e Orfa respira fundo.
CENA 2: EXT. MOABE – CAMPO – DIA
No campo estão Rute e Malom. Enquanto ele prepara uma porção de terra, ela termina de beber água e encara o horizonte, na direção de Israel.
RUTE — Malom... Quando nós viajaremos?
MALOM — Não entendo.
Ele para e a olha.
RUTE — Quando você vai me levar para conhecer sua terra, a Terra Prometida? Quando vou ter a oportunidade de ver seus irmãos, os outros hebreus, outros filhos de Deus?
MALOM — Não sei...
RUTE — Vamos planejar, meu amor. Vamos visitar sua cidade natal e outros lugares que for possível...
MALOM — Eu sempre me imaginei voltando para Belém com minha família completa. Segurando um filho no colo. Mostrando para ele onde seu pai nasceu e foi criado.
Rute não diz nada, se abate um pouco. Malom percebe.
MALOM — (se aproximando) Oh, meu amor, me perdoe! Me perdoe, Rute!... Eu não pensei para falar.
RUTE — Tudo bem, Malom. Eu entendo.
Ele segura o rosto dela com delicadeza.
MALOM — Eu prometo que um dia nós vamos lá.
Rute sorri e faz que sim.
CENA 3: EXT. BELÉM – TRIGAL – DIA
Animado, Boaz caminha pelo seu trigal saudando a todos.
BOAZ — Shalom! Shalom! Shalom!
Ele se aproxima de uma tenda sem as paredes, onde há uma mesa com vasos de água e pergaminhos com o controle da plantação. Ali está, entre outros, Josias (36 anos, loiro).
BOAZ — O Senhor seja convosco!
TODOS — O Senhor te abençoe!
Sorrindo, Boaz se aproxima de Josias e o abraça.
BOAZ — Shalom!
JOSIAS — Shalom, Boaz! Shalom!
BOAZ — Quem está mais feliz, han? Você ou eu?!
JOSIAS — Que abundância, meu amigo!
Josias bate no peito de Boaz e eles riem felizes.
BOAZ — Isso sim é a terra que Deus prometeu a Abraão!
JOSIAS — Tudo conforme seus pais acreditavam. O povo está feliz, reconciliado com o Senhor, o trigo ótimo, a cevada nem se fala!... Aliás, ótima ideia a sua de plantarmos também cevada. Tenho certeza que Salmon e Raabe se orgulhariam.
BOAZ — Obrigado, meu amigo!
Sorrindo, Boaz abraça Josias.
CENA 4: EXT. DESERTO – DIA
Conforme o dia passa, Iago, em vestes comuns, cavalga a toda velocidade pelo deserto. Em determinado lugar, encontra alguém no caminho e pede informação. A pessoa aponta... e ele toma a direção. O sol vai descendo pela abóboda celeste...
CENA 5: INT. TEMPLO – SANTUÁRIO – ENTARDECER
Faruk e seu servo conversam em tom baixo.
FARUK — Então será assim: vamos até lá, pegamos a garota, a levamos para fora, a sedamos com esse líquido e a trazemos para cá. Se preciso, matamos a dona da loja.
SERVO — Senhor, peço que repense o plano... Por favor, use soldados. Contrate alguns, compre seu silêncio...
FARUK — Não, já disse. É arriscado mais gente sabendo.
O servo continua preocupado.
CENA 6: INT. CASA DE LEILA – SALA – NOITE
Noemi, Rute, Malom, Orfa, Quiliom e Leila estão sentados à mesa. Aylla está no balcão, mexendo em algo.
LEILA — Eu nem pretendia fazer nada. Até preferiria que meu aniversário passasse batido, mas a Aylla insistiu e preparou o jantar para comemorar. Nem eu me lembrava que já era dia.
AYLLA — Se o rei, que é quem é, faz a cidade toda comemorar seu aniversário, por que a bondosa, doce e guerreira Leila não poderia comemorar com os amigos?
Eles riem.
MALOM — O cheiro está instigante...
LEILA — Vamos ver, Aylla. Mostre o que preparou.
Aylla traz o prato e o coloca na mesa.
AYLLA — Carne de caça ao molho de vinho com um toque de ervas amargas, e pão com pedaços de tâmara e cobertura de mel silvestre.
MALOM, QUILIOM — Uau!
CENA 7: EXT. BELÉM – PRAÇA – RUA – NOITE
Josias compra algo de um vendedor que já está guardando suas mercadorias.
JOSIAS — Obrigado.
Josias vira para ir embora quando vê, se aproximando da praça, uma carroça com duas pessoas: um homem e uma mulher. Ao vê-los, ele paralisa. Sua boca se abre... Os dois não o percebem. Olham para os lados, como se procurassem por onde ir. Então Josias, ainda impressionado, se aproxima aos poucos. Vai andando, andando, cada vez mais maravilhado... A mulher finalmente olha para ele e também se impressiona. Seu semblante é de surpresa. Josias para próximo à carroça.
JOSIAS — (sorrindo) Diana?!
Ela sorri.
DIANA — Josias?!
Eles se encaram. O homem, pai dela, finalmente percebe Josias. Ao vê-lo, fecha o semblante, bravo.
CENA 8: INT. CASA DE SEGISMUNDO – SALA – NOITE
Tamires está sentada à mesa. Segismundo chega ali e se senta.
SEGISMUNDO — Pois bem, Tamires. Conte qual é o seu plano para retornar a Belém sem ter que se disfarçar.
TAMIRES — Bom... é simples: eu me entrego e faço um acordo que consista na denúncia do paradeiro de um grande nosso em troca de me inocentarem.
SEGISMUNDO — Um grande?
TAMIRES — Na verdade um pequeno. Algum idiota que cair na minha oferta e se passar por grande.
SEGISMUNDO — E o que eu ganho nisso?
TAMIRES — Uma vez que eu esteja lá, inocentada e livre, posso abrir caminho para o seu retorno. Para que sejam feitos outros acordos.
SEGISMUNDO — Não sei. Não consigo sentir um futuro promissor para mim nesse seu plano. Acho que está improvisando.
TAMIRES — E daí se é improviso, Segismundo?! O importante é funcionar!
SEGISMUNDO — É, mas eu não tenho muito interesse em sair daqui da vila. Faça o que você quiser, Tamires. Use os pequenos que bem quiser.
TAMIRES — Rum. Tenha uma boa noite, Segismundo.
Tamires se levanta e vai embora. No mesmo instante Gael chega ali.
GAEL — Era Tamires?
SEGISMUNDO — A própria. Sempre com a cabeça envolta em planos...
GAEL — E Iago, Segismundo? Não o vi...
SEGISMUNDO — Iago saiu para tirar um tempo. Visitar uns parentes, algo assim... Enfim.
GAEL — Hum...
Gael fica um tanto preocupado.
CENA 9: EXT. MOABE – RUA – NOITE
Faruk e seu servo vem descendo a rua escura. Pouco depois, Faruk acha a loja de Leila.
FARUK — Ali. (aperta os lábios de raiva) É nessa coisa que chamam de casa que Aylla está.
O servo olha, um tanto nervoso.
FARUK — Está preparado?
O servo então respira bem fundo, ajeita os braços e franze o cenho.
SERVO — Estou.
Faruk sorri de canto de boca.
CENA 10: EXT. DESERTO - NOITE
Iago cavalga. Cruza o deserto iluminado apenas pela Lua. Em determinado momento ele para... e desce do cavalo. Olha para frente, se aproxima... Vai até o início da descida do terreno e para. Mais à frente lá embaixo, uma grande cidade. A iluminação à fogo das casas e das ruas é visível dali.
IAGO — Hebrom...
Então ele pega o pergaminho de sua veste e vai para o outro lado do paredão rochoso ao lado. Lá, encontra a entrada de uma caverna e se aproxima. Dentro, quase nada de luz. Franze o cenho e se aproxima mais. Entra...
CENA 11: INT. CAVERNA – NOITE
Iago entra devagar.
IAGO — Olá...
Ele vê, logo à frente, o que parece ser um cômodo do qual vem uma fraca luz. Aperta os olhos, tentando distinguir... Uma cabeça aparece! Ele para. É uma mulher. Toda sua silhueta surge ali e ela o encara.
IAGO — Olá... Você é... a feiticeira desse pergaminho?
Ela olha o pergaminho e sorri.
FEITICEIRA — Posso ser o que você quiser, desde que pague por isso.
Ele faz que sim.
IAGO — Pensei que seria mais perto de Hebrom.
FEITICEIRA — Entre, venha.
Iago se aproxima do cômodo fracamente iluminado e entra.
FEITICEIRA — Eu gostaria sim de estar mais próxima da cidade, mas o povo não vê com bons olhos uma feiticeira.
IAGO — Eu não quero feitiço algum. Quero o que está nesse pergaminho.
FEITICEIRA — E qual é o seu motivo?
A mulher começa a preparar coisas. Iago dá uma olhada nos frascos e objetos esquisitos que há ali.
IAGO — Há cerca de 10 anos minha esposa foi assassinada brutalmente, e eu desconfio que me sabotaram momentos antes do crime, pois, quando já não havia o que fazer, acordei em um lugar em que não me lembro de ter entrado.
FEITICEIRA — Um bar.
IAGO — Uma hospedaria... mas que fazia as vezes de bar.
FEITICEIRA — Sei. Já vi muitos casos assim.
IAGO — E você... pode me ajudar? Pode me fazer recuperar as lembranças daquele dia maldito?
FEITICEIRA — Sim, mas sem a sua ajuda minhas habilidades serão em vão. Você precisará deitar e relaxar. Temos que acessar as lembranças mais profundas de sua mente. Está preparado?
Iago respira fundo.
IAGO — Há 10 anos eu estou preparado.
FEITICEIRA — Deite aí. Ahn, antes, uma parte do pagamento...
Iago faz que sim e tira várias moedas do bolso e a entrega, que conta e guarda.
FEITICEIRA — Muito bem, deite.
Iago deita em uma cama estreita.
FEITICEIRA — Agora feche os olhos. Vou passar esse preparado de ervas em volta das suas narinas. Será um cheiro esquisito no início, mas depois ficará agradável.
Ela pega um pote em que amassa, com um pequeno pilão, o preparado. Então começa a passa-lo no rosto de Iago, em volta das narinas.
FEITICEIRA — Feche os olhos...
Ela continua...
CENA 12: EXT. BELÉM – PRAÇA – RUA – NOITE
Josias, alegre, encara Diana (25 anos) na carroça. O pai (55 anos) dela, ao lado, olha bravo para os dois. Josias se aproxima mais.
JOSIAS — Diana?! É você mesma?! Depois de todo esse tempo...
DIANA — Josias... Nós soubemos da grande bênção que Belém alcançou, e resolvemos vir para cá...
Josias sorri. Então olha para o pai dela.
JOSIAS — Ahn, senhor Jurandir, por favor, me perdoe... Shalom! Seja bem-vindo a Belém.
Jurandir continua carrancudo.
JURANDIR — Saia do caminho para que possamos passar.
DIANA — Pai!... Seja educado, nós precisamos da ajuda deles...
JURANDIR — Não preciso da ajuda de nenhum membro dessa família.
Diana revira os olhos.
DIANA — Josias, por favor, onde fica a hospedaria da cidade?
JOSIAS — Oh sim. Basta seguirem por essa rua aqui. Lá na frente, depois daquela--
JURANDIR — (interrompendo) Diana! Você é surda?! Não preciso da ajuda de alguém dessa família! Chega de conversa, vamos! Vamos!
Ele mexe as rédeas e o cavalo começa a andar. A carroça vira. Tristes, Josias e Diana se encaram e ela vai se afastando. Lá na frente, ela olha para trás, apenas para vê-lo, mas seu pai fala algo rispidamente e ela vira de novo. Josias respira fundo.
CENA 13: INT. CASA DE LEILA – SALA – NOITE
NOEMI — Parabéns, Aylla. Está tudo delicioso.
AYLLA — (sorrindo) Obrigada, senhora Noemi.
ORFA — Tenho certeza que Quiliom amou esse molho de vinho na carne.
QUILIOM — (de boca cheia) Uhum!...
RUTE — Aylla, me diga como que você deixa a carne nessa consistência... Hum!... Eu sempre tento fazer assim lá em casa, mas nunca fica desse jeito.
AYLLA — Bom, pode ser que seja porque eu coloco um pouco de limão por cima antes de assar... Será que é isso?
RUTE — Interessante... Vou tentar fazer assim.
MALOM — Pode ser amanhã?
Eles riem.
RUTE — Nem terminou de comer essa e já está pensando na próxima, meu amor...
QUILIOM — Podemos estender as comemorações do aniversário da Leila, igual faz o rei.
LEILA — Isso porque eu nem queria comemorar...
Riem.
NOEMI — Vocês estão querendo explorar a Aylla, coitada...
AYLLA — Ah, mas amanhã não seria eu, não. Malom e Quiliom podem ir para a cozinha.
ORFA — Boa ideia, Aylla!
RUTE — Aprovado!
LEILA — Seria interessante!
NOEMI — As mulheres descansam e os homens trabalham.
MALOM — Não gostei da ideia.
QUILIOM — Cozinha não é coisa para homens... Nós não levamos jeito. Temos a mão pesada.
RUTE — Só para comer que levam jeito, não é?
ORFA — Beber, no caso de Quiliom.
Eles riem.
NOEMI — E muito!
QUILIOM — Até a senhora, minha mãe?
De repente, um barulho.
ORFA — Que foi isso?
Eles olham para dentro da casa e para a direção da rua.
LEILA — Não deve ser nada.
MALOM — Me passa aquele pedaço por favor, Quiliom.
QUILIOM — Esse não. Eu já estava de olho nele. Fique com esse aqui...
NOEMI — Ah, meninos...
Então o mesmo barulho, mais alto. Eles param.
RUTE — De novo!...
ORFA — Parece ter vindo de dentro da casa...
AYLLA — (se levantando) Vou ver o que é.
MALOM — Aylla, não quer que eu veja?
AYLLA — Eu vejo, já estou indo...
Ela entra em outro cômodo da casa.
ORFA — Ah, essas coisas me deixam apreensivas...
LEILA — Não deve ser nada. Talvez seja algum bicho de telhado que passa derrubando tudo.
De repente, um grito! Todos se assustam e se levantam de uma vez, desajeitadamente.
RUTE — O que é isso?!
LEILA — Aylla! Cadê você?!
Leila vai imediatamente por onde Aylla foi, mas é surpreendida pelo servo de Faruk com Aylla presa em seus braços. Ele mantém uma espada no pescoço da garota.
LEILA — O que é isso, o que está acontecendo?!
Noemi, os filhos e as noras olham confusos para o homem. Aylla está aflita.
MALOM — Quem é você?!
SERVO — Não interessa! Todo mundo para trás! Para trás!
Eles se afastam um pouco.
LEILA — (chorando) O que vai fazer com a minha filha?!...
SERVO — Vou sair com ela por onde entrei. Todo mundo fica bem quietinho aqui! Se vierem atrás, eu arranco a cabeça dela!!!
Leila chora mais. O servo então começa a voltar de costas, segurando Aylla e mantendo a espada em seu pescoço. Ele então some no outro cômodo. Eles começam a ir atrás, devagar e silenciosos. Malom, no entanto, vai pela loja, para o lado de fora.
CENA 14: EXT. CASA DE LEILA – RUA – NOITE
Abaixado sob uma janela da casa, Faruk aguarda. Ouve um barulho de dentro e olha pela janela: seu servo se aproxima com Aylla.
AYLLA — Me solta, me largue!
SERVO — Shh!!!
Faruk se levanta e ajuda o servo a passar com Aylla de refém. Noemi, Rute, Orfa, Quiliom e Leila chegam no cômodo da janela, mas não identificam Faruk no lado de fora. Malom coloca sua cabeça para fora da loja e espia: vê Faruk.
MALOM — (sussurrando) Maldito!
Faruk pega seu punhal, assume Aylla e coloca a arma no pescoço dela. O servo guarda sua espada.
FARUK — Vá conferir o caminho. E pegue o arco, está naquele beco. Pode ser necessário na subida para o templo.
Dentro, Rute franze o cenho ao ouvir a voz. Aperta os olhos e identifica Faruk.
RUTE — Meu Deus... Meu Deus, Meu Deus, é Faruk!... (começa a chorar) Faruk está com Aylla!
Eles ficam aflitos.
AYLLA — Eu lembro de você!... Faruk!
FARUK — Não se preocupe, minha querida, vai ficar tudo bem.
AYLLA — Então me solte e tire esse punhal do meu pescoço!
FARUK — Infelizmente isso é necessário. Não posso deixar você escapar. Graças a você, me tornarei o que sempre estive destinado a ser: o maior, mais rico e mais influente sacerdote que esse mundo já teve.
Logo ali à frente, o servo faz um sinal indicando o caminho livre.
FARUK — Vamos.
Faruk começa a ir arrastando Aylla e sem tirar a lâmina da pele dela. Malom então sai da loja sorrateiramente, pega um vaso ali no canto e vai atrás. Faruk continua. Malom se aproxima... Os outros saem na janela e olham. Observam apreensivos. Com passos silenciosos, Malom dá uma corridinha e quebra o vaso na cabeça de Faruk, que cai. Aylla aproveita para se soltar de seus braços.
MALOM — Corra, Aylla!
Aylla volta para a janela e eles a ajudam a entrar. Na rua acima, o servo volta segurando o arco. Para ao perceber Malom se aproximando de Faruk, que com a cabeça ensanguentada, tenta se levantar. O servo então pega uma flecha, coloca no arco e mira; atira. O tiro é certeiro! Malom é atingido no peito e cai.
RUTE — MALOOOOOOMMM!!!
Noemi arregala os olhos e trava. Chocadas, Leila, Orfa e Aylla tapam a boca. Quiliom, conturbado, pula da janela e corre até o irmão, caído.
QUILIOM — Malom! Malom!!! Irmão!!!
Rute grita da janela e Orfa a segura para não pular. Aylla, no entanto, pula e se aproxima dos dois. Faruk está se levantando. Malom, caído, olha para Aylla.
MALOM — Não!... Aylla, volte!... Volte...
De longe, o servo assiste. Faruk, segurando seu punhal, se prepara.
FARUK — Deuses! Deuses do céu, da terra, do fogo e do ar!
Contra a recomendação de Quiliom, Malom se levanta.
FARUK — (apontando Aylla) Ela!!! É o melhor que vocês podem ter!!!
Faruk então ergue o braço e tenta atingir Aylla com o punhal. Mas Malom bloqueia o golpe, toma o punhal da mão dele e finca na barriga de Faruk.
Todos ali se assustam. O servo, de longe, abre a boca, surpreso.
Faruk cai de joelhos. Olha para cima, para Aylla... e vai perdendo as forças... um pouco de sangue sai pela sua boca... e ele cai aos pés de Aylla, que se afasta assustada. Perdido, mas raivoso, o servo imediatamente pega outra flecha e mira Malom.
QUILIOM — Malom, cuidado!
Quiliom puxa Malom e eles caem. A flecha passa direto. Quiliom olha para o servo com fúria. Então pega o punhal fincado em Faruk e se levanta para ir até ele que, rapidamente, atira outra flecha. Quiliom é atingido na lateral e cai de joelhos. Rute e Orfa gritam. Noemi, ainda em choque, mal reage. Leila tenta segurá-las para não irem para fora.
Com dificuldade e muita dor, Quiliom se levanta e corre o máximo que consegue. O servo atira de novo, mas erra. Com medo, ele abandona o arco e corre por uma rua. Quiliom chega ali e toma a mesma rua.
CENA 15: EXT. MOABE – RUAS – NOITE
Quiliom, ferido e gemendo de dor, vira de rua em rua, de beco em beco... Olha para lá, para cá... Nada. Continua.
Então ele sai em um beco apertado, mas sem saída. Percebendo que ali não leva para lugar algum, intenta voltar, mas para. Parece ter percebido algo. Então se aproxima de um grande vaso e, atrás dele, vê o servo, encolhido e segurando sua espada tremendo.
QUILIOM — Desgraçado!...
Quiliom se aproxima com raiva e levanta o homem. Coloca-o na parede, de pé, e arranca a espada de sua mão.
SERVO — Por favor!...
QUILIOM — Você tentou matar o meu irmão!... Ele pode estar morto agora!
SERVO — Por favor!...
QUILIOM — Pelo sangue dele!
Quiliom crava a espada no servo, que berra de dor! Então crava também o punhal, e o homem perde a voz. Quiliom o joga no chão, onde ele cospe sangue até desfalecer. Quiliom vai embora.
CENA 16: EXT. CASA DE LEILA – RUA – NOITE
Rute, sobre Malom, chora desesperada. Noemi, ao lado, tenta fazer algo, mas treme muito. Leila, Aylla e Orfa choram. Todos elas se assustam quando Quiliom, quase se desequilibrando, chega ali.
QUILIOM — Ahh!...
Quiliom se aproxima e cai ao lado do irmão.
NOEMI — Meus filhos, meus filhos!... Meus filhos!...
Apesar de quase desfalecido, Malom olha para Quiliom, ao seu lado.
MALOM — Foi uma honra... lutar com você, irmão.
Quiliom, apesar da imensa dor, vira o rosto para ele. Malom força um sorriso dolorido. Quiliom começa a chorar... E o semblante de Malom paralisa...
NOEMI — Malom! Malom, Malom, Malom!!! Meu filho, Malom! Fala comigo, meu filho!!! Malom!!!
Rute desaba a chorar silenciosamente sobre a cabeça do marido. Orfa se aproxima de Quiliom e o abraça no chão.
QUILIOM — Orfa... Meu amor... Me ajude... a deitar... no seu colo...
Com as lágrimas brotando de seus olhos, Orfa rapidamente se senta no chão e coloca a cabeça de Quiliom em sua perna. Quiliom então olha para todos. Leila, Aylla, Rute e Noemi. E olha para cima, para Orfa.
AYLLA — Vou atrás de ajuda!
QUILIOM — Não!... Por favor... Fiquem aqui... Deixem eu vê-los...
Noemi, nada recuperada do falecimento de Malom, olha para Quiliom. Rute, em prantos, fica ao lado dela.
QUILIOM — Obrigado... a vocês... por me permitirem esse momento...
Quiliom então vira a cabeça devagarinho para o lado e adormece.
ORFA — Nããão, Quiliom!!!
Orfa desaba sobre o rosto do marido. Noemi vai até ali e tenta abraçar o filho também!
O tempo passa...
Rute, sentada no chão da rua, chora amargamente enquanto acaricia o rosto de Malom. Orfa passa a mão no cabelo de Quiliom, molhado pelas suas muitas lágrimas. Noemi, entre os dois filhos, mantém as mãos nos rostos dos dois e chora compulsivamente. Leila e Aylla se revezam, tentando consolar aquelas mulheres. Nisso, IMAGEM CONGELA