CAPÍTULO 47
(Últimos Capítulos)
uma novela de
FELIPE LIMA BORGES
livre adaptação do livro de Rute
Edição da Versão Reprise por
RAMON FERNANDES
EDIÇÃO:
Restante do Capítulo 63 + Parte do Capítulo 64 ORIGINAL (SEM CORTES)
CENA 1: INT. HOSPEDARIA – QUARTO DE TAMIRES – DIA
Tamires está terminando de se arrumar. Abimael, ainda deitado, desperta e nota-a.
ABIMAEL — Tamires?
Ela olha para ele.
ABIMAEL — Onde você vai?
TAMIRES — Se esqueceu? Hoje é o dia da vitória. Vou ao campo assistir Noemi morrendo. Dessa vez vai ser pra valer.
Abimael se ajeita na cama, olhando-a.
TAMIRES — Quero ser a última coisa que Noemi veja. Quero mostrar para ela que, no final de tudo, fui eu quem venceu.
Ela vai até ele.
TAMIRES — Quando eu voltar, serei outra Tamires. A melhor que já houve. Beijos.
Ela segura a cabeça dele e o beija.
TAMIRES — Tenha um bom dia, lindo.
ABIMAEL — Você também.
Abimael, deitado, observa Tamires ir para a porta, piscar feliz para ele e sair com os guardas.
CENA 2: EXT. BELÉM – PRAÇA – DIA
Enquanto todos aguardam a resposta de Neb, esse olha para o povo ao redor.
NEB — (murmurando) Você já tem muito, Boaz, e ainda quer mais? Rum, perdeu essa, meu caro.
BOAZ — E então, Neb? Estamos aguardando sua resposta.
Neb então põe-se de pé.
NEB — Muito bem! Já tenho minha decisão.
Todos ansiosos.
NEB — Eu redimirei.
Um desânimo parece cair sobre os ombros de Rute...
NOEMI — Calma, minha filha, calma... Não desanime, mantenha-se firme.
Rute olha para a sogra e para eles preocupadíssima...
RUTE — Eu não posso me casar com ele... Eu não gosto, eu não o conheço... Eu gosto... a senhora sabe de quem...
NOEMI — Clame ao Senhor, apenas faça isso.
Tani também tenta acalmar Rute e Josias olha para Neb com certa raiva. Os anciães, entendendo que o caso está encerrado, começam a se levantar, mas param ao ouvir Boaz falar.
BOAZ — Muito bem, muito bem.
Todos olham para ele.
BOAZ — Agora ajuntaremos os papéis, você o dinheiro e então a redimirá.
NEB — (contente) Naturalmente.
BOAZ — E, no dia em que fizer isso, tomar a terra da mão de Noemi, também tomará a mão de Rute, a moabita, mulher do falecido Malom, que não teve descendência.
De repente, o semblante de Neb cai bruscamente.
NEB — O quê?!
BOAZ — É isso mesmo, Neb. Não conhece a lei do remidor? Não sabe que o objetivo é dar continuidade à descendência do falecido, para que o mesmo não seja esquecido e para que a honra retorne à casa da família?
NEB — Ma-mas... Mas... eu...
Todos observam a confusão de Neb.
NEB — Boaz... Casar?!
BOAZ — Sim, casar.
O semblante de Neb começa a mudar, ele levanta a cabeça... faz careta... e espirra! Espirra de novo! E de novo! Alguns franzem o cenho, mas ele não para. Outra vez! E outra! E mais outra!
ANCIÃO — O que está acontecendo? Ei, Neb, você está bem?!
Neb espirra mais uma, e mais outra. Apoia-se na cadeira e continua a espirrar. Rute e Noemi se entreolham estranhando e Josias disfarça um riso. Neb então cai na cadeira e dá mais um espirro, mais forte e mais alto!
ANCIÃO — Meu Deus...
Neb então abana a mão no rosto.
NEB — Ah, ai...
ANCIÃO — Está passando mal?!
NEB — Estou... Ah... Água... Por favor, água...
Logo alguém traz um copo com água e ele bebe de uma só vez.
NEB — Ah!...
ANCIÃO — Melhorou?
Neb respira seguidas vezes.
NEB — Sim... Estou melhor... Quase morri... Ah... Senti a capa escura da morte roçando em minhas canelas... Ah... Ah... Estou melhor.
Todos trocam olhares de estranhezas. Os anciães conversam avidamente entre si.
BOAZ — Neb... Ainda pretende redimir Rute e a terra de Noemi?
Neb, jogado na cadeira, olha para elas, que o encaram. Então ele se ajeita na cadeira.
NEB — Não... Não poderei redimi-la... Não posso fazer isso...
O peso do desânimo parece sair dos ombros de Rute, mas ela se mantém discreta.
ANCIÃO — Por quê?
Neb parece buscar as palavras...
NEB — Para não prejudicar a minha herança... Se eu me casar, minha herança estará dividida.
ANCIÃO — Egoísmo, Neb? É o que me parece.
NEB — Não, não é...
E espirra mais uma vez.
ANCIÃO — É essa a verdade mesmo?
Neb olha para o Ancião.
NEB — Sim. (para Boaz) Redima você... Eu não poderei fazer.
Não se aguentando mais, Rute e Noemi sorriem.
NOEMI — Eu disse para você se aquietar, rum...
Rute ri.
RUTE — Ah, minha sogra...
Tani e Josias sorriem para elas.
ANCIÃO — (para Neb) Se não se lembrava da lei do remidor, não deve se lembrar do costume da sandália.
NEB — É... Não...
ANCIÃO — Pois bem. Quanto à remissões e contratos oficiais, para confirmar todo o negócio, o homem que abre mão de algo, nesse caso a remissão, deve pronunciar sua desistência, descalçar sua sandália e a dar ao outro, a outra parte no contrato. Isto serve como testemunho diante de Israel.
NEB — Certo, certo... Assuntos de lei, ah...
Neb então descalça um dos pés, pega a sandália, se aproxima de Boaz e eles se encaram por um instante.
NEB — Tome a terra e a viúva para você.
Então Neb entrega a sandália e Boaz a pega com respeito.
ANCIÃO — Muito bem. A partir de agora você não pode mais pisar na terra que recusou redimir.
Boaz então vira para todos ali.
BOAZ — Vocês são hoje testemunhas de que tomei tudo quanto foi de Elimeleque, e de Quiliom, e de Malom, da mão de Noemi.
Sorrindo, Noemi faz que sim.
BOAZ — Também são testemunhas de que me casarei com Rute, a moabita, para recuperar o nome do falecido, Malom, sobre a sua descendência. Para que seu nome não seja esquecido e arrancado de entre seus irmãos. Para que seu nome seja sempre lembrado entre seu povo e sua cidade natal.
Rute, mantendo o semblante feliz, tem os olhos marejados.
BOAZ — De tudo isso vocês são hoje testemunhas.
Então todos todos os anciães, mais Noemi, Rute, Tani, Josias e outros belemitas assistindo falam em uníssono.
TODOS — Somos testemunhas.
Junto a Boaz, o Ancião faz sinal para Rute, Noemi, Tani e Josias se aproximarem; assim eles fazem. Rute, abraçada por Noemi, encara feliz Boaz.
ANCIÃO — (para Boaz) Que o Senhor faça com que essa mulher, que entra na sua casa, seja como Raquel e Léia, que deram muitos filhos a Jacó, edificando, assim, a casa de Israel.
Rute sorri emocionada.
ANCIÃO — Boaz, meu filho... Que você seja ainda mais abençoado em Belém, e que seu nome tenha boa fama por toda essa terra! E que, por meio do filho que te der essa moça, sua casa seja como a casa de Perez, o filho que Tamar teve de Judá.
Feliz, Boaz faz um reverência com a cabeça.
BOAZ — Muito, muito obrigado, senhor. Vindo do senhor, vale muito. Obrigado.
O Ancião sorri.
ANCIÃO — Shalom.
TODOS — Shalom.
O Ancião então sai e se junta aos outros anciães, que também começam a ir.
Tani e Josias estão muito sorridentes, e Noemi, de braços dados com Rute, observa a troca de olhares dela com Boaz.
NOEMI — Agora poderão pensar no casamento.
Boaz olha para Noemi.
BOAZ — Sim... Finalmente.
Boaz e Rute, apaixonados, continuam a se encarar felizes e sorridentes.
Enquanto Rute, Boaz, Noemi, Tani e Josias estão felizes pelo resultado, o Ancião está de saída com os dez anciães. Mas para ao notar Neb sozinho, afastado de todos, cabisbaixo e com a mão na garganta. Observa-o por uns instantes...
Tocado pela cena, o Ancião faz sinal para os companheiros e se aproxima de Neb, que o olha curioso.
ANCIÃO — Neb... Está tudo bem?
Neb força um sorrisinho e faz que sim.
NEB — Sim, sim, senhor. Tudo bem.
E sai. Por alguns segundos o Ancião o observa se afastar pela praça... Então fala.
ANCIÃO — Até quando você quer levar essa vida?
Neb para. O Ancião o observa, esperando... Então Neb vira para ele.
CENA 3: INT. BELÉM - TEMPLO – PÁTIO – DIA
Vários anciães estão no pátio belemita. Andam, trabalham, escrevem, compõem, leem... Lado a lado, o Ancião e Neb caminham bem devagar por ali.
ANCIÃO — Agradeço por ter aceitado vir até aqui, Neb.
NEB — (fazendo que sim) Tudo bem, senhor. É um prazer... Nunca havia entrado aqui. Parece um mundo à parte da cidade.
ANCIÃO — Um mundo à parte trabalhando pela cidade. Pelo elo entre Deus e o povo.
Neb faz que sim sorrindo.
ANCIÃO — E então, meu filho? Eu notei o seu jeito lá na praça... Ficou assim por causa do caso?
Neb dá uma olhada para o Ancião, e continua normalmente.
NEB — Não... Na verdade, não. (respira fundo) Demorou, senhor, mas eu finalmente senti o sabor do desprezo.
ANCIÃO — Ora, então não tem a ver? Foi por não poder mais pisar na terra que recusou redimir?
NEB — Não, isso já é previsto pela lei, não é desprezo.
Continuam caminhando, e o Ancião o observa com atenção.
NEB — O desprezo que senti foi do povo.
ANCIÃO — Neb... Não se ofenda, vamos usar apenas a verdade... A verdade é que mais cedo ou mais tarde, o salário do pecado chega.
NEB — (um tanto aflito) Estou perdido... Não tenho mais o que fazer. Nem ir embora, pois não tenho expectativa em outros lugares.
O Ancião o olha com doçura.
ANCIÃO — Neb... É para essas pessoas que Deus está de braços abertos. Para que os pecadores se arrependam e voltem para Ele.
Neb para de andar.
NEB — (conturbado) Não, não dá... Não dá mais, senhor. Fiz coisas terríveis aos olhos de Deus. Roubei, trapaceei... levei vantagem injustamente... Fui rude, grosseiro com meus irmãos...
ANCIÃO — (paciente) Neb. Há tanta coisa pior...
NEB — Mas que não isentam essas, e o senhor sabe. Mas tem mais... Eu forniquei, senhor. Me deitei com mulher sem estar casado...
ANCIÃO — Ainda assim, Neb.
NEB — (ciente da gravidade) Eu gostei, senhor! Foi mais de uma vez e eu senti prazer em fazer isso!
ANCIÃO — Neb, diga-me... Quantas vezes na sua vida você reconheceu Deus como está fazendo agora?
Neb não pensa muito.
NEB — Nenhuma.
ANCIÃO — Pois bem. Essa é a chance da sua vida! A chance de mudar tudo, de se transformar e ter uma nova vida.
Neb olha para o Ancião.
NEB — O senhor... acha que isso é possível?
Sorrindo docemente, o Ancião faz que sim.
ANCIÃO — Basta você querer, e fazer de um puro e sincero coração.
Neb parece muito interessado com a oportunidade...
NEB — E... como eu posso começar isso?
ANCIÃO — Você já começou. Deu o primeiro passo, que é se arrepender. Agora pode ir pedir perdão a todos que julga necessário pedir.
Neb, com um sorriso nascendo, faz que sim mais energicamente.
NEB — Farei isso mesmo.
Feliz por Neb, o Ancião sorri.
NEB — Começarei pelo dono da hospedaria, com quem tenho uma rixa antiga.
ANCIÃO — Neb, mas preste atenção: não desista desse propósito! Se você tiver fé, nada lhe será impossível, tudo poderá alcançar. Mas precisa ter essa fé guardada no coração. E aí... até os montes poderá transportar.
Contente, Neb faz que sim.
ANCIÃO — A essa hora da manhã o dono da hospedaria vai colher frutas em seu pomar. Só de falar isso já fico com vontade de tomar os sucos de lá...
Eles riem.
ANCIÃO — Mas enfim. Você pode encontra-lo por lá. E não haverá muita gente, poderão conversar tranquilamente.
NEB — Sim. Eu sei onde fica, vou agora mesmo! Muito, muito, mas muito obrigado, senhor! Abriu minha mente, me fez enxergar o que meus olhos não conseguiam ver... Que Deus o abençoe!
ANCIÃO — Amém, meu filho. Amém.
Neb faz uma reverência com a cabeça e sai. Perto dali, atrás de um pilar, o Comandante observa o Ancião, que então vira para ele e faz sinal chamando-o; o Comandante se aproxima.
COMANDANTE — Senhor?
ANCIÃO — Já está na hora. Estão prontos?
COMANDANTE — Sim, senhor. Tudo pronto.
ANCIÃO — Pois então vamos.
Eles saem.
CENA 4: EXT. BELÉM – PRAÇA – DIA
Noemi, Rute, Boaz, Josias e Tani estão muito felizes ali na praça.
BOAZ — Finalmente encontrei a mulher virtuosa!
TANI — E Rute poderá ser feliz novamente!
NOEMI — Louvado seja o Senhor!
Todos sorridentes.
NOEMI — Bom, estou muito contente, a conversa está maravilhosa, mas agora vou dar uma volta, espairecer um pouco no campo. Shalom!
TODOS — Shalom.
Noemi sai. Enquanto caminha pela praça, nota o Ancião, passa encarando-o nos olhos e continua.
JOSIAS — E eu vou mexer nos preparativos para essa noite de festa. Vejo vocês mais tarde.
Josias sai.
TANI — E eu vou arrumar a casa, senhor Boaz. Shalom.
BOAZ, RUTE — Shalom, Tani.
Tani sorri para eles e sai. Ficam ali Rute e Boaz, sorrindo um para o outro.
BOAZ — Grande dia...
Rute faz que sim.
RUTE — Abençoado dia.
BOAZ — O nosso dia.
RUTE — (gostando) O nosso dia. Boaz... Não sabe como fiquei aliviada quando tudo se resolveu... Quando o contrato se firmou.
BOAZ — É da vontade de Deus a nossa união, Rute. Agora está confirmado.
RUTE — E por isso eu estou pulando de alegria por dentro!
Boaz sorri com isso.
BOAZ — Ouvir sua voz... é como ouvir uma música... (pequena pausa) Eu te amo, Rute.
O rosto de Rute enrubesce e ela o encara com brilho no olhar.
RUTE — Eu... Eu também te amo, Boaz.
Eles sorriem de orelha a orelha e pegam as mãos um do outro.
CENA 5: INT. PALÁCIO – SALA DO TRONO – DIA
O Capitão está diante do trono de Zylom.
ZYLOM — É inacreditável. Um ultraje! E eu tenho que me contentar com isso!
O Capitão permanece calado.
ZYLOM — Assassinam o Sumo Sacerdote de Moabe e morrem impunes! Rute, que deveria pagar pelo crime, consegue fugir!
CAPITÃO — Senhor, perdão, mas o caso é complexo--
ZYLOM — (interrompendo, ficando de pé) Não interessa!!! A verdade é que houve incompetência! Apenas isso, incompetência! Rute deveria estar aqui, pagando, e não solta por sabe-se lá onde! Incompetência de todos! Não conseguiram nada!!!
Frustrado, Zylom senta no trono.
ZYLOM — Você tem certeza que vasculhou toda a casa dessa Leila? Não deixou passar nenhum compartimento? Não sei o que faria se descobrisse que ela está escondida aqui mesmo, embaixo de nossos narizes!
CAPITÃO — Eu pessoalmente vasculhei tudo, soberano. Na casa só há Leila e sua filha.
ZYLOM — Rum.
Zylom, raivoso, fica pensativo. Mas então parece notar algo... estranha... franze o cenho... e olha para o Capitão.
ZYLOM — Você mencionou... filha?
CAPITÃO — Sim, meu senhor.
LEILA — Qual o nome dela?
CAPITÃO — Perdoe-me, rei, mas eu não sei lhe dizer.
ZYLOM — Qual a idade?!
CAPITÃO — Aparenta ter entre... 16 e 18.
Imediatamente Zylom põe-se de pé.
ZYLOM — Vá agora mesmo até lá! Imediatamente!
CAPITÃO — Qual é a missão, senhor?
ZYLOM — Saber o nome dessa garota.
O Capitão faz uma reverência com a cabeça e sai. Ansioso, Zylom o observa se afastar.
CENA 6: EXT. CASA DE LEILA – RUA – DIA
Em frente à loja de Leila, o Capitão conversa com o vizinho dela.
CAPITÃO — Diga de uma vez. Qual o nome da filha da sua vizinha Leila?
O homem olha do Capitão para a loja e de volta para o Capitão.
VIZINHO — É Aylla, meu senhor.
O Capitão parece levemente surpreso. Mantendo a postura militar, faz que sim e vira. Encara Leila e Aylla ali dentro da loja, que também o olham... e então sai. Mãe e filha se entreolham preocupadas e olham para o vizinho, que volta imediatamente para sua casa.
CENA 7: INT. PALÁCIO – SALA DO TRONO – DIA
CAPITÃO — Aylla.
Zylom fica de pé bruscamente.
ZYLOM — MALDITAS!!!
O Capitão mantém a postura.
ZYLOM — Malditas, mil vezes malditas!!! Me ludibriaram... bem embaixo do meu nariz!!!
CAPITÃO — Senhor, acalme-se... Isso pode não ajudar...
ZYLOM — (ignorando-o) É isso! Foi por isso que Faruk foi até lá! Esse era o motivo de sua presença! O Sumo Sacerdote deve ter descoberto que Rute e Orfa sequestraram Aylla e deve ter ido conferir isso!
CAPITÃO — Mas senhor... Se fosse assim, Faruk poderia ter lhe comunicado. É ainda tudo muito nebuloso...
ZYLOM — É por isso que precisamos arrancar o paradeiro de Rute daquela maldita Orfa!
CENA 8: EXT. BELÉM – ARREDORES – DIA
Enquanto prepara, junto a outros belemitas, as coisas da segunda noite de festa, Josias observa, um pouco distante dali, Neb e o dono conversando no pomar desse. Perto disso, no pomar público, Diana apanha frutas do chão enquanto Jurandir a segue, tentando falar com ela. Dali, Josias não ouve nada.
JURANDIR — Diana, você é minha filha! Me deve satisfação!
Diana não olha para o pai, apenas continua a pegar as frutas.
DIANA — Não sou mais sua filha. Já disse.
JURANDIR — Como ousa?!
Então ela olha para ele com olhar seríssimo.
DIANA — Vai me agredir também?
Jurandir, confuso e atrapalhado, encara a filha por alguns instantes.
JURANDIR — É claro que não! Não diga besteiras.
DIANA — Então me deixe em paz.
Perto dali, Neb acompanha o dono colhendo as frutas das árvores.
NEB — Senhor, é verdadeiro o meu arrependimento! Quero me desculpar com o senhor!
DONO — (colhendo) Não quero ouvir você, Neb! Da sua boca só saem mentiras, palavras de trapaça! E, se quer mesmo compensar todo o mal que me fez, então por que não seja com dinheiro? Ou por que não trabalha de graça para mim, ahn?! Isso você não quer, não é?!
Então Neb arranca uma bela fruta que o dono não notou e a oferece para ele.
NEB — Na verdade eu posso fazer isso sim.
O dono o olha surpreso, não esperava por essa resposta, e nem pela bela fruta que Neb lhe estende. Pega-a mas, nesse instante, ouve um barulho estranho... Ambos olham e, de entre as árvores, vários homens com vestes estranhas surgem e se aproximam rapidamente: mercadores de escravos.
MERCADOR 1 — Vejam, os belemitas. Podemos achar bons potenciais aqui.
Os homens sorriem satisfeitos e avançam. Jurandir, ao percebê-los, tenta proteger Diana ficando na frente dela.
JURANDIR — Fique atrás de mim, Diana! São mercadores de escravos!
Diana, confusa e assustada, olha para os homens se aproximando.
MERCADOR 1 — (apontando Jurandir) Podem pegar aquele e (apontando Neb) aquele outro. (apontando o dono) O velho também. Está forte, vai servir ainda.
Os outros mercadores avançam.
MERCADOR 1 — (apontando Diana) E ela. Estamos precisando de um novo alívio. Peguem-na também!
De longe, Josias nota a movimentação esquisita. Então saca sua espada e corre, corre o mais rápido que pode até lá!
Os mercadores dão um soco em Jurandir e o seguram. Outro pega Diana. Neb e o dono são segurados por mais outros. Raivoso e com a espada na mão, Josias vem à toda velocidade. Quando o mercador que segura Diana olha, Josias salta e mete-lhe um chute no peito; o homem voa para trás. Josias rola e põe-se de pé.
JOSIAS — Diana, corra! Vá!
Diana corre dali, mas para atrás de uma árvore, observando assustada. Jurandir tenta resistir, mas vai sendo levado. Mais perto de Josias, o dono e Neb se debatem em vão.
Então Josias segura firme sua espada e desfere um corte na costa de um mercador, que cai gritando. O outro, antes que possa reagir, é atingido no rosto pelo punhal da espada e cai com a mão no nariz. Josias desfere um golpe que corta a veste e o peito do terceiro mercador. Então corre até os homens que carregam Jurandir. Um o solta e, sem arma, tenta lutar com Josias, mas é derrotado ao ter o braço torcido e cair gritando de dor. Com facilidade, Josias chuta e soca os outros, liberando assim Jurandir. Nesse tempo, outros mercadores aparecem ali armados e voltam a segurar Neb e o dono.
JOSIAS — (para Jurandir) Corra, senhor!
Jurandir corre dali. Outros chegam e Josias os enfrenta à espada...
Mas são muitos. Logo um aproveita e mete-lhe o chute no peito; Josias é jogado para trás, bate em uma árvore e cai fraco.
Neb tenta se soltar com um movimento, mas leva um soco no nariz. Os mercadores agarram ele e o dono e, junto aos feridos por Josias, os leva para longe rapidamente. Caído ao pé da árvore, Josias os nota se distanciar. Então ele faz um tremendo esforço e põe-se de pé.
DIANA — (atrás da árvore) Josias!...
Josias olha para ela... e olha para eles indo embora... e corre atrás. Corre, corre, corre com a espada na mão! Mas um barulho agudo e TÁ! Uma flecha é cravada numa árvore ao seu lado. Ele olha bem para frente e vê dois mercadores arqueiros, em cima de carroças, apontando flechas para ele. Josias não corre. Os homens então amarram os pulsos de Neb e do dono... E as carroças começam a ir embora. O tempo todo, os arqueiros não abaixam seus arcos na direção de Josias, que é obrigado a apenas observá-los se distanciar.
JOSIAS — (com raiva) AAAHHH!!!
Josias volta para onde estão Diana e Jurandir, assustados. Aproxima-se... Olha Jurandir nos olhos... e para ali. Olha para Diana...
JOSIAS — Você está bem?
Diana, confusa, engole em seco e faz que sim.
JOSIAS — O senhor... Está bem?...
Jurandir o encara. Por alguns instantes, apenas o encara.
Finalmente olha para a filha... e de volta para Josias. De repente, ele agarra o pescoço de Josias e o abraça, apoiando a cabeça no ombro do rapaz. Diana, antes preocupada, observa surpresa e confusa. Josias, sem entender, leva devagar as mãos à costa de Jurandir e também o abraça.
Jurandir desaba a chorar.
Obrigado pelo seu comentário!