Capítulo
15
Cena 01 – Ônibus, Ruas de São Paulo [Interna/Noite]
(Betinha permanecia atordoada olhando
para o homem que acabara de lhe acordar).
BETINHA: Eu dormi demais... Que lugar é esse?
Onde eu estou?
RAFAEL: Desculpe, eu não queria te assustar.
É que essa é a última parada do trajeto desse ônibus. Eu vi você dormindo,
imaginei que estivesse perdida.
BETINHA: (Desespera-se) E eu estou! Que lugar
é esse? Onde eu vim parar, meu Deus? Eu não devia ter saído perambulando por
essa cidade que eu mal... (Betinha olha de novo para Rafael e perde a voz).
Música da cena: Anjos – Gabi Luthai
RAFAEL: Calma! Eu posso te ajudar, me diga onde você mora? Eu posso te guiar a
pegar um táxi ou até mesmo outro ônibus.
BETINHA: (Fica nervosa) Eu não sei, eu não sei... Eu sou nova na cidade e agora o
que eu vou fazer?
COBRADOR: Vocês precisam descer agora! (Orienta Rafael e Betinha a saírem do
ônibus).
RAFAEL: Vamos descer, eu vou te ajudar a chegar na sua casa sã e salva, eu te
garanto. (Estende a mão para Betinha).
BETINHA: (Olha para Rafael e para a mão dele, receosa se vai ou não com ele).
Cena 02 – Mansão Martins de Andrade
[Interna/Noite]
(A empregada traz um copo de água com
açúcar numa bandeja e se aproxima de Eva que está na sala, tentando
tranquilizar Luiza Helena).
LUIZA HELENA: Onde essa menina está? Onde ela se enfiou? Olha que horas
são e ela não chegou... Eu estou aflita, será que aconteceu alguma coisa com
ela? Eu tinha que ter impedido, ela nem conhece essa cidade, como pude deixa-la
sair por aí, sozinha?
EVA: (Pega o copo na bandeja e serve Luiza Helena) Tenha calma, senhora. Logo
a sua irmã entrará por aquela porta e nada terá acontecido. A senhora sabe como
são os jovens, fazem coisas sem pensar. Tome essa água com açúcar, a senhora
vai se sentir melhor.
LUIZA HELENA: (Bebe um pouco de água com açúcar).
EVA: A senhora quer que eu faça alguma coisa para ajudar? Ligue para alguém?
Quem sabe o Ângelo não nos ajuda?
LUIZA HELENA: Vamos esperar mais um pouco, não quero preocupar ninguém sem
ter certeza de que aconteceu alguma coisa. Se em duas horas a Betinha não
aparecer, eu vou mover céus e terras para encontrá-la e eu vou encontrá-la.
(Luiza Helena entrega o copo a Eva).
EVA: (Coloca o copo de volta na bandeja) Obrigada, pode se retirar! (Instrui
a empregada).
Cena 03 – Ruas de São Paulo
[Externa/Noite]
Música da cena: Fogo – Karin Hils
(Imagens aéreas apresenta a noite de
São Paulo e suas luzes. Maria Rita caminha pensativa pela rua onde faz ponto e
resolve falar com Caruso sobre seus objetivos futuros).
MARIA RITA: Caruso, eu posso falar com você? (Pergunta ao se aproximar).
CARUSO: (Vira-se para Maria Rita e a olha de cima à baixo) O que foi?
MARIA RITA: (Respira fundo e começa a falar) Sabe, eu estive pensando...
Eu já faço ponto aqui na rua faz alguns anos e o tempo vai passando, o
faturamento vai caindo e uma hora precisamos mudar de rumo.
CARUSO: E daí? O que eu tenho haver com isso?
MARIA RITA: (Toma coragem e resolve falar diretamente) Eu quero largar
essa vida, eu vou parar de me prostituir.
CARUSO: (Agarra Maria Rita pelo pescoço) Você não vai fazer isso! Aqui na minha
quebrada sou eu quem manda. Eu que decido quando você dá ou não para o gasto. O
que deu em você agora? É homem, não é?
MARIA RITA: (Se desvencilha de Caruso e se afasta) Não! Eu apenas estou
cansada dessa vida, é só isso.
CARUSO: Pense bem antes de mais nada, lembre-se que eu posso revelar o seu real
trabalho para toda a sua família. Já imaginou a chacota que seria da vida do
seu filho? Filho de uma rameira!
MARIA RITA: (Os olhos de Maria Rita se enchem de lágrimas) Não, por
favor não faça isso! Por tudo que há de mais sagrado, não conte nada para a
minha família. Eu não suportaria essa humilhação, minha família me
rejeitaria... Está bem, eu vou continuar aqui.
CARUSO: Ótimo, melhor assim. Pense bem antes de cometer uma burrada, lembre-se
sempre que você em minhas mãos e que eu posso acabar com você. (Caruso vai
embora e deixa Maria Rita amedrontada).
MARIA RITA: (Seca as lágrimas quando percebe que um carro buzinou para
ela e se aproxima do veículo para atender o cliente).
Cena 04 – Umbu-Cajá, Restaurante
Nordestino [Interna/Noite]
Música da cena: Anjos – Gabi Luthai
(Em meio aos clientes presentes no
restaurante de Zeca, Betinha e Rafael tomam um suco em uma das mesas).
RAFAEL: Bom, pelas coordenadas que você me deu...
Eu acho que já sei mais ou menos a região onde você mora. Se quiser, podemos
pegar um táxi e eu vou com você até lá para garantir que você chegou bem.
BETINHA: (Bebe mais um gole de suco) Não, não precisa se incomodar. Você já me
ajudou e muito, basta me mostrar onde fica o ponto de táxi aqui na Mooca e eu
chego em casa.
RAFAEL: Não senhora! Você acaba de chegar na cidade, vai que volta a se perder?
Prefiro te acompanhar para ter certeza de que você chegou bem.
BETINHA: Bom, eu já percebi que você não é de mudar de ideia facilmente. Fazer o
que, não é mesmo? Então vamos, porque conhecendo a minha irmã como eu conheço,
ela já deve ter chamado a polícia pensando que eu fui sequestrada.
RAFAEL: Eu sei bem como é isso, minha mãe é super protetora desse jeito. Eu vou
pedir a conta e nós já vamos. Zeca! (Pede a conta).
(Depois de acertarem a conta no
restaurante, Betinha e Rafael vão até a saída do restaurante).
BETINHA: Eu achei esse bairro tão fofo, gostei muito daqui! (Vira-se para
observar melhor).
RAFAEL: (Olha para Betinha de costas) Eu sou suspeito para falar daqui, moro
aqui desde que nasci.
DURANT: (Se aproxima com algumas sacolas de supermercado) Rafael, Rafael! Eu fui
até o supermercado, vou fazer aquela canja de galinha que você adora...
RAFAEL: Agora não vai dar, tio. Eu vou acompanhar essa moça até a casa dela e
depois eu volto.
DURANT: (Olha para Betinha que permanece de costas) E quem é essa moça?
BETINHA: (Vira-se ao ouvir a voz de Durant e sorri para ele).
RAFAEL: Betinha, esse é o meu tio Durant. Tio, essa é a Betinha.
DURANT: (Olha para Betinha impressionado).
BETINHA: Na verdade o meu nome é Roberta Miranda, mas para encurtar, pode me
chamar de Betinha. (Explica).
RAFAEL: (Percebe que Durant está olhando fixamente para Betinha) Tio, está tudo
bem?
DURANT: Não... É que... Vocês vão achar que eu estou ficando velho e maluco, mas
é que olhando para o seu rosto, senti a impressão de que já te conheço de algum
lugar.
BETINHA: Impossível! Eu acabei de chegar na cidade, me mudei fazem poucos dias.
DURANT: Ah, que maravilha. E de onde você é?
BETINHA: Eu sou de...
RAFAEL: (Interrompe Betinha) Já está tarde, é melhor irmos. Sua irmã deve estar
muito preocupada pelo andar das horas.
BETINHA: É verdade, vamos embora. Tchau Durant, foi um prazer te conhecer!
DURANT: Todo meu! Volte mais vezes e vá nos visitar, você será muito bem-vinda.
BETINHA: (Sorri) Pode deixar! Vamos? (Fala com Rafael).
(Betinha e Rafael seguem para o ponto
de táxi e Durant permanece parado olhando para os dois, ele ficara totalmente
impressionado com Betinha e principalmente com a sensação de que a conhecia de
algum lugar).
Cena 05 – Apartamento de Evandro
[Interna/Noite]
(Em seu apartamento, Evandro recebe
uma pizza e paga ao entregador. Em seguida, coloca a caixa sobre a mesa e
senta-se para comer).
EVANDRO: (Coloca uma fatia de pizza em um prato, mas antes que pudesse
experimentar, perde-se em seus pensamentos e relembra do momento em que Ângelo
entrou em sua sala com Luiza Helena) É, não posso negar que realmente ela é uma
mulher muito bonita, não é à toa que o cretino do Demétrio deixou tudo para
ela. Quem sabe eu não uno o útil ao agradável? (Sorri sarcasticamente enquanto
pensa em voz alta).
Cena 06 – Mansão Martins de Andrade
[Externa/Noite]
Música da cena: Anjos – Gabi Luthai
(O táxi estaciona em frente aos
portões da Mansão Martins de Andrade).
RAFAEL: Nossa, é aqui que você mora?
(Pergunta ao descer do táxi).
BETINHA: É sim, porque? (Questiona enquanto procura as chaves na bolsa).
RAFAEL: (Sorri) Porque o mundo é muito
pequeno, eu conheço as pessoas dessa casa, quer dizer, conhecia, ele morreu.
BETINHA: Ah sim, eu já entendi! É verdade,
você tem razão. Bom, agora eu gostaria de agradecer pela ajuda, nem sei como
posso te recompensar.
RAFAEL: Não precisa se preocupar com isso, a minha recompensa é que você está
bem. Agora posso voltar tranquilo!
(Luiza Helena e Eva correram ao
perceber que Betinha havia chegado e foram até o seu encontro na entrada da
casa).
LUIZA HELENA: (Abre o portão e abraça Betinha) Onde você se enfiou Roberta
Miranda? Você quase me matou do coração, eu pensei que tivesse acontecido
alguma coisa com você.
RAFAEL: (Olha para Betinha e Luiza Helena
juntas).
EVA: Graças a Deus tudo terminou bem!
LUIZA HELENA: Não vai me apresentar o seu novo amigo? (Questiona olhando
para Rafael).
BETINHA: Sim, claro! Esse é o Rafael, eu me perdi na cidade e ele fez a gentileza
de me ajudar a chegar em casa na mais perfeita segurança.
LUIZA HELENA: (Estende a mão para cumprimentar Rafael) Rafael, eu agradeço
imensamente por ter ajudado a minha irmã.
RAFAEL: (Aperta a mão de Luiza Helena) Vai parecer clichê falar isso, até porque
já ouvi isso hoje, mas é engraçado. O seu rosto é familiar, parece que já te vi
antes em algum lugar, só não sei dizer onde.
LUIZA HELENA: (Sorri para Rafael).
Cena 07 – Casa de Durant [Interna/Noite]
Música da cena: Fogo – Karin Hils
(As imagens da cidade de São Paulo
são mostradas do alto. Aeronaves sobrevoam o céu da cidade, pessoas transitam
pelas ruas, surge imagens do bairro da Mooca parando na fachada da casa de
Durant).
DURANT: (Serve um pouco de canja que havia preparado para Fernanda que estava
lhe fazendo companhia) Eu espero que goste, não é comida da alta sociedade, mas
eu fiz com carinho.
FERNANDA: (Olha para o prato empolgada) Quem foi que disse que eu não gosto de uma
boa canja? Eu não tenho o paladar tão refinado quanto você pensa, sou tão gente
como você. Além disso, está com uma cara ótima...
RAFAEL: (Abre a porta e entra dentro de casa) Cheirinho bom... Cheguei na hora
certa!
DURANT: Chegou mesmo... Vai lavar as mãos que eu já vou te servir!
RAFAEL: (Vai até a cozinha e lava as mãos. Ao voltar secando as mãos, beija a
cabeça de Fernanda antes de sentar na cadeira).
FERNANDA: Você demorou! Eu estava preocupada, pensei que pudesse ter acontecido
alguma coisa.
RAFAEL: (Pega uma torrada e prova da canja preparada por Durant) Nossa tio,
caprichou muito, tá ótima!
DURANT: E como foi, a menina conseguiu chegar bem em casa?
FERNANDA: (Olha para Rafael) Menina? Que menina?
RAFAEL: Hoje mais cedo eu encontrei uma moça perdida no ônibus, ela era nova
aqui na cidade e eu a ajudei a voltar para a casa dela.
FERNANDA: (Continua encarando Rafael) Sei...
RAFAEL: E aí é que está a grande coincidência, você não vai acreditar. O nome
dela é Betinha e ela está vivendo lá na mansão que era do seu tio.
FERNANDA: A irmã da esposa do meu tio?
RAFAEL: Ela mesma e sabe o mais engraçado disso tudo? Ela é muito parecida com
aquela mulher que o meu tio costuma pintar.
DURANT: Como disse? (Estranha o comentário de Rafael).
FERNANDA: Não liga Durant, o Rafael voltou muito animadinho da rua, só isso. Vamos
mudar de assunto? A sua canja está ótima e merece mais atenção! (Diz com uma
expressão séria).
Cena 08 – Mansão Martins de Andrade
[Externa/Noite]
Música da cena: Rock Roll And Lullaby
– Alexandre Poli
(Sentada em um banco de frente para
uma fonte, Luiza Helena estava com um olhar distante no jardim da Mansão).
EVA: Sem sono? (Pergunta ao se
aproximar).
LUIZA
HELENA: Dona Eva, eu
nem vi a senhora chegar... (Diz enquanto seca algumas lágrimas que haviam
escorrido pelo próprio rosto).
EVA: Eu te conheço pouco ainda, mas dá
para ver que é uma mulher forte. Só que por trás de toda essa fortaleza, eu
vejo dor e tristeza em seus olhos.
LUIZA
HELENA: Não, sabe o
que é? É que...
EVA: A senhora não precisa se explicar, como lhe disse, nós nos conhecemos
pouco e por mais que a senhora ainda não confie fielmente nas pessoas dessa
família, pode apostar que em mim, a senhora terá uma amiga. Estarei aqui para
quando quiser se abrir, desabafar... (Dá as duas mãos para Luiza Helena).
LUIZA HELENA: Muito obrigada, eu vou precisar mesmo de uma amiga nesse
lugar! (Estende as duas mãos e segura as de Eva).
Cena 09 – Apartamento de Glória
[Interna/Manhã]
Música da cena: Gloriosa – Glória
Groove
(A noite se vai e o dia amanhece,
pessoas se exercitam no Parque do Ibirapuera, as ruas da cidade estão
movimentadas, surge então o prédio onde Glória mora com os filhos).
FERNANDA: (Sentada à mesa na companhia do
irmão, Fernanda estranha a ausência de Glória) Minha mãe ainda não veio tomar
café, Juju?
JUDITH: (Coloca café na xícara de Thierry)
Não Fernandinha, a sua mãe até agora não saiu do quarto. Eu até bati na porta
do quarto dela, mas ela não respondeu.
FERNANDA: Esquisito! Eu vou dar uma passadinha
lá daqui a pouco.
THIERRY: Judith, será que não dá para você
preparar uns bacons para acompanhar esses ovos?
JUDITH: Bacon? Nessa casa? Só se eu tirar
daqui, ó! (Aponta para a cintura).
GLÓRIA: Que feira livre é essa na minha casa
uma hora dessas? (Questiona ao surgir na sala de estar do apartamento).
(Fernanda, Thierry e Judith olham
para Glória ao mesmo tempo e se surpreendem com sua elegância. De cabelos
soltos, Glória usava calça branca, uma blusa de seda preta e um blazer branco,
para completar seu look, seus últimos pares de sapato da Louis Vitton e bolsa
da Prada).
THIERRY: Nossa, coroa! Tá gata, hein? (Diz
olhando para a mãe).
FERNANDA: Para onde a senhora vai vestida
desse jeito?
GLÓRIA: (Se aproxima e toma um pouco de café
ainda de pé) Eu vou trabalhar!
(Surpreendidos, Fernanda, Thierry e
Judith questionam ao mesmo tempo completamente incrédulos).
FERNANDA: Trabalhar?
JUDITH: Trabalhar?
THIERRY: Trabalhar?
GLÓRIA: Exatamente! Vou cumprir a última vontade do meu querido irmão, a partir
de hoje eu assumo um cargo na revista. Ainda não sei se na diretoria ou
vice-presidência. A única coisa que eu tenho certeza é a de que não ficarei
assistindo de camarote aquela maltrapilha roubar os nossos bens. (Conclui).
JUDITH: A senhora quer comer alguma coisa? Eu posso...
GLÓRIA: (Interrompe a fala de Judith) Pode fazer o que, estrupício? Fritar ovos?
É só isso que você sabe fazer, já estou prestes a bater asas e cacarejar de
tanto ovo que tenho comido nos últimos tempos.
JUDITH: É o que tem! Sua vizinha parece a cozinha da xepa do BBB, dona Glória...
Só tem ovo e água!
GLÓRIA: Calada, estrupício. Não me faça perder a paciência e te jogar pela
janela.
JUDITH: (Recolhe alguns itens já utilizados na mesa e resolve voltar ao
trabalho) Eu vou para a minha cozinha que eu ganho mais.
GLÓRIA: Fernanda, você esteve em meu quarto mexendo em minhas coisas? Está tudo
revirado, mexeram nos meus cremes, roupas e joias.
JUDITH: (Fica desconfiada enquanto caminha de volta para a cozinha).
FERNANDA: Até parece! Eu não uso aquelas coisas e a senhora sabe muito bem disso.
GLÓRIA: (Pensa e rapidamente chega a uma conclusão, em seguida dispara um grito)
Estrupício!!!
Cena 10 – Açougue [Interna/Manhã]
Música da cena: Sampa – Caetano
Veloso
(Imagens das principais ruas do
bairro da Mooca são apresentadas, Francesca segue caminhando pelas ruas do
bairro de óculos escuros e sacola de feira. Em seguida, adentra no açougue).
FRANCESCA: Buongiorno, senhor Felício! Eu trouxe uma listinha aqui para
não esquecer, vim escolher pessoalmente a carne de primeira que só o senhor
vende, eu vou ficar responsável pelas comidinhas da festa do mio San Gennaro!
FELICIO: Bom dia, dona Francesca! Sim, sim, eu estou sabendo. Não se fala em
outra coisa nesse bairro a não ser na festa de São Januário. A senhora se
importaria em voltar depois? Sabe o que é? Eu prometi levar minha esposa na
casa dos parentes dela lá em Campinas e ela está torrando a minha paciência,
não parou de ligar.
FRANCESCA: Sei sim! Mas me deixa dar uma olhadinha? Io prometo que non
vou demorar, va bene?
FELICIO: Está bem, não demore muito. Estou terminando de atender os clientes que
estou na loja e em seguida eu fecho.
FRANCESCA: Belíssimo! Io já sei por onde é o caminho, non precisa se
preocupar!
(Francesca abre a porta e adentra no
extenso frigorífico. Em meio há tantos corredores de carne, ela praticamente
desaparece do campo de visão de quem olha externamente).
FRANCESCA: (Olha um grande pedaço de carne pendurado e ao se aproximar
para avaliar a qualidade da carne, alguém o puxa para o outro lado) Mas o que é
isso?
ZECA: Solta! Eu vi essa peça aqui primeiro!
FRANCESCA: Non... Non é possibile! Até aqui esse bode velho me
persegue? O que você está fazendo aqui, ordinário?
ZECA: O mesmo que você, carcamana! Vim escolher pessoalmente as melhores carnes
ou você esqueceu que eu também estou responsável pelas comidinhas da quermesse
da festa de São Januário? Eu vou fazer uns espetinhos que vão ficar de lamber
os beiços!
FRANCESCA: Pois então você vai fazer os seus churrasquinhos com carne
de rato, mas essa carne aqui você não leva. Io vou te impedir! (Puxa a peça de
carne para seu lado).
ZECA: Você e mais quantos? (Puxa a peça de carne para o lado contrário, o lado
onde ele está).
(Aos poucos o açougue vai esvaziando
e Felício se prepara para fechar a loja).
FELICIO: Juarez? Oh Juarez! (Chama o funcionário que trabalha para ele, enquanto
fecha o caixa).
JUAREZ: (Tira os fones de ouvido e se aproxima) Sim, pode dizer patrão!
FELICIO: Você não viu a dona Francesca? Ela foi lá dentro escolher umas carnes e
até agora não voltou. Vai até o frigorifico dar uma olhada, não quero fechar o
açougue e deixar ninguém preso aqui dentro.
JUAREZ: Sim senhor!
(Enquanto caminha em direção ao
depósito frigorifico, um grande espaço de baixa temperatura para armazenamento
das carnes, Juarez coloca novamente os fones de ouvido e aumenta o volume,
seguindo cantarolando).
JUAREZ: (Abre a porta do frigorifico e não
vê, muito menos ouve a discussão entre Zeca e Francesca por conta dos fones, em
seguida ele tranca o lugar).
(De volta ao salão de atendimento,
Felício se prepara para ir embora).
FELICIO: E então, ela estava lá?
JUAREZ: Não patrão, o lugar estava limpo.
FELICIO: Ela deve ter saído quando eu me
distraí atendendo os clientes. Bom, já que não tem mais ninguém, pode fechar.
Eu só volto amanhã... Bom descanso! (Felício sai do açougue e Juarez fecha a
porta do estabelecimento logo em seguida).
(No frigorifico, Francesca e Zeca
continuam trocando farpas).
ZECA: Solta essa carne, carcamana! Eu vim
essa peça primeiro, você não vai levar, tinhosa.
FRANCESCA: Quer apostar que io levo? Vou chamar o Seu Felício, com certeza
ele irá preferir atender uma cliente tão distinta como eu do que um bode velho
como o senhor. (Francesca dá as costas a Zeca e vai até a porta, ao tentar
abri-la, mesmo fazendo força, não consegue). Mas o que é isso? Será que tá
emperrada?
ZECA: (Percebe que Francesca não está conseguindo abrir a porta e vai até ela)
É sempre assim, brigona, mas não consegue abrir nem uma simples porta! (Força a
porta diversas vezes e não consegue abrir a porta).
FRANCESCA: Que foi? O homem das cavernas não consegue abrir uma
“simples porta”? (Ironiza).
ZECA: Você não percebeu ainda? Nós estamos trancados! Alguém trancou por
fora...
FRANCESCA: Como trancados? Claro que non... Non pode ser! (Francesca e
Zeca se olham e finalmente a ficha cai).
(Do lado de fora, ouvimos batidas na
porta e gritos de socorro, porém não há mais nenhum funcionário do açougue para
ajuda-los).
Cena 11 – Na Boca do Povo, Redação
[Interna/Manhã]
(Suzana, Ângelo e Luiza Helena
assistem uma modelo ser fotografada para uma matéria que será publicada na
revista).
LUIZA
HELENA: (Olha
encantada para o trabalho do fotografo e das modelos).
ÂNGELO: (Olha para Suzana) Você não está
pensando no que eu estou pensando está?
SUZANA: (Olha para ele e em seguida para
Luiza Helena) Acho que estou sim!
LUIZA
HELENA: (Olha para
os dois) O que foi, gente? Tem alguma coisa de errado?
ÂNGELO: Luiza Helena, não me interpreta mal, eu não quero que você mude nada da
sua essência, mas você não acha que deveria fazer umas compras, se vestir mais
adequadamente com a sua condição social e profissional? Uma mudança de
visual...
LUIZA HELENA: (Fica pensativa com a ideia) Mudar o visual? Tipo as roupas?
SUZANA: É! Dar um tapa no visu... Um corte no cabelo, uns reflexos ou
iluminações, algumas roupas mais modernas. Eu posso te ajudar nisso! Conheço
lojas e salões maravilhosos, com certeza você vai gostar.
LUIZA HELENA: Não sei... Nunca fiz essas coisas, nunca nem pisei num lugar
desses. Será? (Se questiona).
Cena 12 – Casa de Durant [Interna/Manhã]
(Durant está em seu ateliê pintando
quando ouve a campainha).
DURANT: Quem será? (Pergunta-se após afastar
o pincel da tela).
(Durant sai do ateliê que fica no
sótão de sua casa, em seguida desce a escada que fica na sala de estar para
abrir a porta).
DURANT: Já vai, eu estou indo! (Diz enquanto desce a escada apressadamente, em
seguida abre a porta).
BETINHA: Desculpe incomodar logo cedo! Eu queria agradecer pela ajuda na noite
passada. Perguntei a alguns vizinhos e eles me disseram que vocês moravam aqui.
Espero não estar atrapalhando! (Diz parada do lado de fora da casa).
DURANT: (Olha para Betinha fixamente).
A imagem foca em Durant olhando para
Betinha parada na porta de sua casa. A cena congela e vira uma capa de revista.
Obrigado pelo seu comentário!