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LÁGRIMAS EM SILÊNCIO - Capítulo 01

 



Novela de Adélison Silva
 
Personagens deste capítulo

JANA
LAURA
GIOVANA
BEATRIZ
ELIETE
GENIVALDO
MOISÉS
PAULO
RAIMUNDA
RAVENA
REBECA
CÁSSIA
MACIEL

 



CENA 01/ EXT/ SALVADOR/ TARDE 

O cenário começa com um fim de tarde de sol que pinta o céu com tons alaranjados. Gaivotas voam sobre a Baía de Todos os Santos, enquanto jangadas de pescadores deslizam pelas águas calmas do mar. O letreiro "Salvador- BA, ano de 2005" surge delicadamente no canto inferior direito da tela, indicando o ano em que nossa história se inicia. As ruas movimentadas e coloridas da cidade exibem a vibração única dos baianos, e a música agitada de um trio de axé embala a atmosfera. Enquanto o plano sequência continua, a CAM se aproxima da fachada do Shopping Iguatemi. O movimento na entrada do shopping é intenso, com pessoas entrando e saindo, carregando sacolas e aproveitando a tarde para fazer compras e desfrutar de momentos de lazer. 

CORTA PARA:

aCENA 02/ EXT/ SHOPPING IGUATEMI/ TARDE 

O shopping está movimentado, com pessoas transitando de uma loja para outra. A CAM focaliza JANA, uma mulher de 30 anos, que caminha pelos corredores. Ela tem olhos castanhos expressivos e sobrancelhas bem definidas, sua pele morena clara e lábios carnudos. A CAM a segue, destacando os detalhes dos produtos da loja de artigos para bebês. Roupas, móveis, mantas e brinquedos. Jana para em frente à vitrine, os olhos brilhando de admiração e emoção. Sua mão acaricia suavemente sua barriga, como se pudesse sentir a presença de um futuro filho ali. A CAM faz um close nos olhos de Jana, que estão marejados. A cena termina com Jana decidindo entrar na loja, movendo-se com determinação e um brilho no olhar. 

FADE OUT 

CENA 03/ INT/ CASA DA JANA/ QUARTO DO CASAL/ TARDE 

FADE IN 

Jana está agora sentada na cama, segurando com ternura um sapatinho infantil em suas mãos, enquanto roupas de bebê estão delicadamente espalhadas ao seu redor. Nesse momento, PAULO, um homem de 37 anos, branco, olhos castanhos escuros, sobrancelhas espessas, cabelos escuros e cacheados se aproxima. 

PAULO:
(sem entender)
- Oxe meu amor! Mas que significa isso? Cê tá grávida, é?


Jana, com um sorriso radiante no rosto, ergueu os olhos para encontrar os de Paulo e respondeu com alegria na voz. 

JANA:

- Pois não é? Acho que sim. 

PAULO:

- Mas cê sabe, como? Já fez o exame ou teste de farmácia? 

JANA:

- Ainda não... Mas já sei que tô grávida, viu? Tô diferente, minha menstruação tá atrasada, tô enjoada, até meus peitos tão mais inchados. Tô com uma certeza danada de grande aqui dentro de mim. Eu sei que desta vez finalmente vou ser mãe. 

PAULO:

(preocupado)

- Oh meu amor, não quero te deixar agoniada. Mas... Cê já teve uma gravidez psicológica antes. Essa sua ansiedade em engravidar é tão grande que teu corpo acaba simulando algo que não existe. 

JANA:

(entristecendo)

- Cê acha, então, que não tô grávida? É isso? 

Paulo, com ternura nos olhos, se aproxima de Jana e passa a mão pelo o seu rosto. 

PAULO:

- Eu só acho que, primeiro, você tem que fazer um exame pra ter certeza. Antes de sair por aí comprando roupinha pra um bebê que pode nem existir. 

Jana se levanta da cama e vai até o espelho. Passa a mão em sua barriga, olhando-se no espelho com esperança. 

JANA:

(emocionada)

- Mas eu tenho certeza que agora ele existe, viu? E tá crescendo aqui, ó, dentro de mim. A Dra. Beatriz mesmo disse que tá tudo certinho comigo. Os exames não acusaram nada, tá tudo direitinho. Entende? 

PAULO:

- Venha cá! E essa doutora lhe falou o porquê que cê não engravidava? 

JANA:

- Coisa da mente, não sabe? Ela disse que a ansiedade atrapalha a vida de todo mundo. Sabe aquela história da mulher que passa anos tentando, e nada? Aí quando acham que não vai mais rolar, relaxam e engravidam? Pois, então, tudo psicológico...

(sorrindo)

- Prepara o coração, que o nosso pitizinho tá vindo, viu painho? 

PAULO:

(sorrindo enquanto se aproxima de Jana)

- Se isso for verdade, você vai me fazer o homem mais feliz do mundo. 

JANA:

- É verdade sim, meu amor. Pode acreditar nisso, viu? 

Paulo acaricia a barriga de Jana, selando o momento com um beijo apaixonado. As lágrimas de felicidade enchem os olhos de Jana, Paulo agacha e beija sua barriga.

 CORTA PARA: 

CENA 04/INT/ CASA DOS FERNANDES/ QUARTO DA GIOVANA/ TARDE 

O quarto de Giovana é um ambiente acolhedor, com paredes pintadas em tons suaves e prateleiras repletas de livros. Uma escrivaninha de madeira ocupa uma das paredes, cercada por pilhas de cadernos, canetas e marca-textos coloridos.  GIOVANA, uma jovem negra de 16 anos, está sentada em sua escrivaninha com seus cabelos crespos presos em um coque alto. Ela usa óculos e está imersa na leitura de um livro, totalmente concentrada em seus estudos. Seu pai, GENIVALDO, um homem branco de 52 anos com cabelos grisalhos, discretamente aparece na porta. Genivaldo sorri ao ver a dedicação da filha e adentra o quarto. Ele se aproxima da escrivaninha e delicadamente dá um beijo na cabeça de Giovana, demonstrando seu carinho e orgulho por sua determinação. 

GIOVANA:

- Oi, painho! 

Genivaldo estendendo-se para ver melhor o que Giovana estava estudando. 

GENIVALDO:

- Tá aí toda concentrada nos estudos, hein? 

GIOVANA:

(sorrindo)

- Tenho uma prova importante, meu pai. Não posso dar mole, não né? 

GENIVALDO:

- Isso mesmo, cê tá mais que certa. Painho tem um orgulho danado do cê, viu filha? E a sua mãe, ondé que tá? 

GIOVANA:

- Ela disse que foi pra igreja. Mainha o senhor já viu, né? Passa o dia inteirinho orando, mas parece que só enxerga o pecado dos outros. 

GENIVALDO:

(rindo)

- Sua mãe é daquelas que sentam em cima do próprio rabo e fala do rabo alheio, não sabe?

(se retirando)

- Bom, vou procurar alguma coisinha pra comer. Deixar cê aí nos seus estudos. 

Giovana olha para o pai com carinho e preocupação. 

GIOVANA:

- Oh meu pai, posso preparar algo para o senhor comer, viu? 

GENIVALDO:

- Carece não, minha linda. Eu me viro. Se concentre nos seus estudos, vá bem? 

Giovana assente, voltando sua atenção para os livros. 

GIOVANA:

- Vá bem, então. 

Genivaldo sai do quarto, deixando Giovana concentrada em seus estudos.

 

CENA 05/EXT/ PLANO GERAL/ TARDE 

A CAM abre a cena mostrando o famoso Elevador Lacerda, conectando a Cidade Alta à Cidade Baixa, onde o mar cintilante do Porto da Barra se estende ao longo da costa. Enquanto a cena se desenrola, o foco da CAM se desloca para um dos icônicos casarões coloridos do Pelourinho. À medida que a câmera continua sua trajetória, somos levados a uma sequência de imagens deslumbrantes da orla, destacando as praias paradisíacas de Itapuã, com suas águas cristalinas e areias douradas, e Ondina, onde os coqueiros adornam o calçadão. A cena corta para uma praça tranquila e arborizada, onde o som suave de pássaros cantando ecoa no ar.

 

CENA 06/EXT/ RUA/PRAÇA/ TARDE

ELIETE, uma mulher negra de 48 anos, caminha pela praça, vestindo um conjunto de saia e blusa longa em tons sóbrios de azul marinho, ambos com detalhes delicados em renda na barra e nas mangas. Seus sapatos pretos de salto baixo são clássicos e discretos. Seu cabelo crespo, cuidadosamente penteado e mantido em um coque firme. Em suas orelhas, Eliete usa pequenos brincos dourados, complementando o visual sem exageros. Ao seu lado está RAIMUNDA, sua melhor amiga. Raimunda exibe um estilo mais leve e descontraído. Vestindo um vestido midi de estampa floral com cores suaves, de mangas curtas, solto e fluído, proporcionando conforto nos dias quentes de Salvador. Seus cabelos lisos e longos estão presos em um rabo de cavalo alto, mantendo-os fora do rosto. Nos pés, Raimunda usa sandálias baixas de tiras, combinando com o estilo casual do seu vestido. As duas caminham lado a lado enquanto conversam. 


ELIETE:

- Minha enteada ainda tá nessa de querer ter filho, não sabe? Até simpatia a disgramada já fez. E aí, irmã Raimunda, senhora acha que tá certo? Se Deus não quer, como é que a gente vai lutar contra os desígnios do altíssimo? Me diga! 

RAIMUNDA:

- Ela nasceu seca, né irmã? Talvez tá pagando pelos pecados dos antepassados. Tem que aceitar o destino que Deus deu pra ela, né mermo? 

ELIETE:

- Nisso agora a senhora falou uma grande verdade. E eu sei muito bem de onde vem o pecado. Vem da mãe dela. O Genivaldo não gosta nem de tocar no assunto, pra ele a mulher já morreu e virou santa. Só Deus sabe da santa. Pois a verdade te digo agora, a mãe da Janaína já trabalhou num cabaré. Foi lá que o Genivaldo conheceu ela.

 

Raimunda para abruptamente e olha Eliete com incredulidade.

 

RAIMUNDA:

- Não me diga, irmã Eliete! 

ELIETE:

(firme)

- Pois digo sim, pois é a mais pura verdade. Agora cê que acha? De uma árvore podre pode nascer um fruto bom? Deus, na Sua infinita sabedoria, fez ela nascer seca pra não continuar a descendência de Sodoma e Gomorra.

 

Raimunda balança a cabeça, horrorizada.

 

RAIMUNDA:

- Misericórdia irmã Eliete! Fico até com dó desse povo quando Jesus voltar, viu? 

ELIETE:

(com arrogância)

- Não sinto dó nenhum. A Palavra de Deus é clara. O Filho do Homem vai voltar na glória do Pai, com os anjos Dele, viu? E e aí minha linda, vai pagar cada um de acordo com as suas obras. Nós estamos fazendo a nossa parte, né irmã Raimunda? Mas o que podemos fazer com aqueles que não nos ouve? 

 

CORTA PARA: 

CENA 07/EXT/ RUA/BROTAS/ ENTARDECER 

A transição da cena anterior ocorre suavemente à medida que a CAM se desloca pelas movimentadas ruas do bairro de Brotas. As fachadas coloridas das casas se intercalam com pequenos comércios locais, onde pessoas conversam animadamente e sorrisos são compartilhados. A CAM se aproxima da casa de Jana, que está localizada próxima ao famoso Dique do Tororó, um cartão postal da cidade. A música baiana ao fundo adiciona um toque especial à cena. A CAM percorre lentamente o caminho que leva à varanda da casa, onde uma rede balança suavemente, convidando ao relaxamento e contemplação. Através da janela entreaberta, é possível ver Jana...

 

CORTA PARA CENA SEGUINTE: 

CENA 08/ CASA DE JANA/ QUARTO DO CASAL/ NOITE 

Jana sai do banheiro com um exame de farmácia nas mãos e cabisbaixa. Seus ombros estão curvados e seus passos são lentos. Ela caminha em direção a Paulo, que aguarda ansiosamente o resultado, sentado na cama.

 

PAULO:

- E então, diga aí? Qual foi o resultado? 

JANA:

(entregando o teste)

- Deu negativo, tô grávida não.

 

Paulo pega o teste com cuidado e seu rosto reflete preocupação.

 

PAULO:

- Oh meu amor, não fique assim. Não foi dessa vez, mas vamos tentar de novo.

 

Jana deixa escapar um soluço e lágrimas começam a rolar pelo seu rosto.

 

JANA:

- Não é bem assim Paulo. Não vamos fazer de conta que é natural, porque não é, né? Eu já estou passando dos trinta, daqui a pouco vai ser tarde pra mim. Pra você tudo bem, você é homem, mas pra mim não. Entende?

 

Paulo se levanta da cama e envolve Jana em um abraço reconfortante.

 

PAULO:

- Eu te entendo, meu amor, sei que é difícil. Mas vamos manter a calma, Jana. Não se torture tanto com isso. Na hora certa vai acontecer.

 

Jana se afasta um pouco do abraço de Paulo, olhando-o nos olhos, suas lágrimas ainda escorre.

 

JANA:

- Isso não é nada justo, véi. Tantas mulheres por aí abortando, jogando seus filhos no lixo, tratando o fruto de seu ventre como um objeto descartável. E eu aqui, ó, desejando sentir minha barriga crescer, meu filho se mexendo dentro de mim. Fiz todos os exames, tá tudo certo, nego. Não entendo por que não consigo engravidar.

 

Paulo segura as mãos de Jana com ternura, buscando transmitir seu apoio.

 

PAULO:

- Deus sabe todas as coisas, meu amor. Na hora certa vai acontecer. Se você tiver que engravidar isso vai acontecer em seu tempo. Não se aperreias tanto com isso meu amor.

 

Jana solta um suspiro pesado, seus olhos vermelhos expressa tristeza e desespero.

 

JANA:

- Oxente, que tempo, Paulo? Já tem quase dez anos que tamos casados e eu ainda não consegui ter filhos. Será que cê não percebe isso? Já não tenho mais tempo não, moço.

 

PAULO:

- Eu sei o quanto cê deseja esse filho. Mas tente entender, eu não tenho culpa de nada não.

 

Jana para por um instante e olha séria para Paulo.

 

JANA:

- A Dra. Beatriz falou que o problema pode ser contigo, viu? Cê bem que deveria fazer os exames também, né?

 

Paulo solta a mão de Jana e se afasta, elevando o tom de voz.

 

PAULO:

- Não vou fazer exame nenhum. Imagina se vou ficar passando por constrangimento na frente de médico, man. 

JANA:

- Oxe, ó paí! Que constrangimento, me diga? Donde cê tirou isso? Já passei por constrangimentos muito piores e não tive resultados. Cê só precisa fornecer a amostra para eles realizarem o espermograma, só isso. É algo tão simples, nego. 

PAULO:

(com sarcasmo)

- Nossa, tudo muito simples, né mesmo? Imagina bem, eu lá batendo uma bronha na frente do médico. 

JANA:

- Deixa de ser careta, Paulo! Cê não vai fazer isso na frente de ninguém não, viu? Tem sala reservada pra esse tipo de coisa. Mas tá tudo certo, né? Eu pensei que esse sonho fosse nosso. Mas parece que cê não se importa muito. Né mesmo? Fazer o quê? 

PAULO:

(consolando)

- Oh meu amor, você sabe que não é isso. Claro que também quero ter esse filho. Poxa, também é o meu sonho ser pai. 

JANA:

- Então tenha a gentileza, nego, faça esse exame. Vamos tentar ter o nosso filho, Paulo. Hã?

 

Paulo passa a mão pela a cabeça e anda de um lado ao outro.

 

PAULO:

- É barril, viu? Quando cê enqueceta com uma coisa na cabeça, nada te tira, né Jana? 

JANA:

- Tira não! Nada tira. Eu quero ser mãe, sonhei com isso a minha vida toda, Paulo. Cê mais que ninguém sabe bem disso. 

PAULO:

- Tá certo! Cê tá certa, então, né? Pode marcar, viu? Eu vou lá punhetar pro médico.

 

Jana sorri diante do gesto de Paulo e o beija suavemente nos lábios. Seu corpo relaxa um pouco, a chama da esperança volta a brilhar em seus olhos.

 

JANA:

- Besta! Punhetar o quê, moço?





CENA 09/ EXT/ PLANO GERAL/ TIME-LAPSE 

Um time-lapse começa com uma vista aérea de Salvador à noite, mostrando as luzes da cidade brilhando como estrelas em meio à escuridão, destacando o Farol da Barra. Conforme o sol começa a se levantar no horizonte, os primeiros raios de luz se estendem pelo céu, pintando-o com uma paleta de cores alaranjadas e rosadas. As luzes artificiais começam a se apagar gradualmente, enquanto a natureza desperta para um novo dia. À medida que o dia avança, o time-lapse mostra a agitação da cidade durante o horário de pico, com carros se movendo rapidamente pelas ruas e pessoas indo e vindo em suas atividades diárias. Os bairros de Salvador exibem sua arquitetura histórica e colorida, enquanto as praias se enchem de banhistas e surfistas aproveitando o sol. A cena então corta para a entrada do "Colégio Estadual da Bahia" (Central). 

 

CENA 10/ EXT/ CENTRAL / PÁTIO/ DIA

A fachada do colégio exibe sua arquitetura clássica e imponente, enquanto os alunos começam a sair das salas de aula, animados e conversando entre si. O pátio do colégio fica movimentado com estudantes em seus uniformes escolares, alguns apressados para chegar em casa, outros relaxando com os amigos. Entre os alunos, destaca-se Giovana que caminha pelo pátio com a cabeça baixa, imersa em seus pensamentos. LAURA, uma colega de classe, de 17 anos, cabelos castanhos e caídos sobre os ombros, olhos claros, se aproxima rapidamente e começa a conversar com ela.

 

LAURA:

- E aí nega, como cê foi na prova?

 

Giovana ergue os olhos e seu rosto suaviza em um sorriso carinhoso ao cumprimentar Laura.

 

GIOVANA:

- Acho que fui bem, viu? Também tanto que estudei. 

LAURA:

(preocupada)

- Eu acho que não fui tão bem assim, não, viu? Também, mal tive tempo para estudar, véi. 

GIOVANA:

- E não teve tempo por que, hein? 

LAURA:

- Oxe, por que! Tive que trabalhar, né minha linda? Agora sou eu que me sustento. 

GIOVANA:

- Então cê realmente saiu de casa? 

LAURA:

- Não tinha condição nenhuma de eu continuar naquela casa, não moça. Painho é um brutamonte machista, que só sabe ridicularizar as mulheres. Mainha, pobre coitada aceita tudo em silêncio, porque ela acredita que as mulheres devem ser submissas aos homens. Ó paí, em pleno século vinte e um. 

GIOVANA:

- Já conheço bem essa novela. 

LAURA:

- Tenho paciência para esses absurdos mais não, viu? Se mainha quer viver submissa, que viva sozinha. Eu vou atrás da minha liberdade. Nasci para aguentar as ofensas de homem nenhum, não. 

GIOVANA:

- Oh Laura venha cá, me diga uma coisa. E onde cê tá morando agora, hein? 

LAURA:

- Tô morando na casa de uma amiga. É algo provisório, sabe. Ela é dona de uma boutique de roupa. Fico lá na loja a tarde e ela me paga uma porcentagem das peças que eu vendo. 

GIOVANA:

- Oh, Laura, cê tá lembrada que cê ainda é menor de idade, né mesmo? Seu pai ainda pode ir atrás do cê, viu? 

LAURA:

- Eu fujo, vou para um abrigo, me destrambelho por esse mundo. Mas me submeter às vontades de um misógino, isso eu não vou fazer, mais é nunca. Painho já me disse uma vez que se eu fugisse de casa, ele me desconsideraria como filha. Pois, bem então! Eu nunca o considerei como meu pai.

 

Laura começa a sentir-se mal, com náuseas, e seu rosto empalidece. Giovana percebe a mudança e imediatamente fica preocupada.

 

GIOVANA:

- Laura, que foi? Cê tá bem?

 

Laura tenta disfarçar o desconforto, mas sua expressão tensa revela seu mal-estar.

 

LAURA:

- Oxente! Leva a mal não, viu Giovana, mas tenho que ir embora.

 

Giovana segura o braço de Laura com carinho, demonstrando sua preocupação genuína.

 

GIOVANA:

- Mas que cê tem? Deixe que lhe ajudo. 

LAURA

- Né nada demais, não. Só foi um enjoo já tá passando. Acho que foi uma acarajé que comi ali na banca de Preta mais cedo. Oh nega, vou nessa, viu? Depois a gente se fala. 

GIOVANA:

- Vá bem, qualquer coisa me avisa, tá?

 

Laura sai apressada, deixando Giovana olhando com preocupação.

 

CORTA PARA: 

CENA 11/ PLANO GERAL/ DIA 

A CAM começa a se mover suavemente pelo pátio do colégio Central, capturando a movimentação dos alunos. Se eleva suavemente, capturando a paisagem urbana de Salvador. A cidade se revela com seus prédios históricos e modernos e sol brilhando no céu azul. Então se move para o horizonte, mostrando o mar tranquilo, barcos e jangadas navegam suavemente pelas águas. A medida que avança, a paisagem se transforma, revelando o bairro de Ondina. Coqueiros e palmeiras enfeitam as ruas, emoldurando as belas construções à beira-mar. Continua a percorrer a avenida à beira-mar, mostrando o movimento dos carros e das pessoas que passeiam pela orla, até se aproximar da clínica de fertilização Bio in Vitro. A fachada moderna e acolhedora da clínica é destaque, com uma placa elegante indicando o nome do local.

 

CORTA PARA: 

CENA 12/ INT/ CLÍNICA BIO IN VITRO/ RECEPÇÃO/ DIA 

A recepção da clínica é um ambiente agradável e bem iluminado, com paredes pintadas em tons suaves e uma decoração clean. Há um balcão de recepção com computadores, telefones e papéis organizados. CÁSSIA, uma mulher negra de 27 anos, e Jana estavam concentradas em suas tarefas quando BEATRIZ, a médica responsável, chegou.

 

BEATRIZ

- Bom dia, meninas! 

CÁSSIA

- Bom dia, doutora! 

JANA

- Bom dia!... Dra. Beatriz, posso conversar um tiquinho com a senhora?

 

Beatriz assentiu com um sorriso e indicou que seguissem até o consultório.

 

CORTA PARA CENA SEGUINTE: 

CENA 13/ INT/ CLÍNICA BIO IN VITRO/ SALA DA BEATRIZ/ DIA 

A sala da Dra. Beatriz é um ambiente aconchegante com tons suaves nas paredes, uma mesa de consulta no centro é cercada por cadeiras confortáveis. É iluminada por uma janela ampla, deixando entrar a cálida luz do sol. Beatriz, com um sorriso amável, acena para Jana, indicando que ela se acomode em uma das cadeiras. Jana segue a instrução, sentando-se. Beatriz se posiciona à sua frente, pronta para a conversa.

 

BEATRIZ:

- Então, Jana, diga aí! O que foi? 

JANA:

- Bem doutora... Eu conversei com o meu marido, sabe. E ele tá disposto a fazer todos os exames. E assim finalmente eu poder engravidar. 

BEATRIZ

- Isso é muito bom, viu? É fundamental que ambos estejam engajados nesse processo. Agora, traga ele aqui para que possamos dar continuidade aos procedimentos. E já você, viu Jana? Te digo logo, tente se controlar um pouco mais em relação à ansiedade. Isso só atrapalha. 

JANA:

- Eu vou me controlar, pode deixar. Pois então, doutora.  Posso pedir para o meu marido vir aqui hoje? 

BEATRIZ:

(pensativa)

- Isso vai depender de como tá a minha agenda, né mesmo? 

JANA:

- Por enquanto a sua agenda tá tranquila. Tem só uma paciente marcada. 

BEATRIZ:

- Tá certo, então. Peça para ele vir. Vamos resolver logo isso para que você finalmente possa ter o seu filho. 

JANA:

(comemorando)

- Muito obrigada, viu doutora! A senhora não sabe como eu anseio por isso. 

BEATRIZ:

- Oxe, e eu não sei? Ouço você falando vinte e quatro horas nesse filho tão desejado. 

JANA:

(sorrindo)

- Isso é verdade mesmo. Minha mente tá constantemente voltada para isso, sabe? 

 

Jana sai da sala vibrando de emoção.

 

CORTA PARA: 

CENA 14/ INT/ CASA DOS SIRQUEIRAS/ SALA DAS REFEIÇÕES/ TARDE

A sala de refeições na casa dos Sirqueiras é simples, com uma mesa grande ao centro rodeada por cadeiras. Decoração modesta, com alguns quadros contendo salmos nas paredes, evidenciando a devoção da família. MOISÉS, um homem de 45 anos, branco e alto, estava sentado à mesa, vestindo roupas sociais e com uma bíblia ao lado. Ele tinha uma aparência rude e era rigorosíssimo em questões morais, sendo um fanático religioso. Ao seu lado estava Raimunda, sua esposa, uma mulher submissa ao marido e temente a Deus. REBECA, uma menina de 7 anos, vivia no mundo da lua e tinha dificuldade em compreender as coisas, interpretando-as ao pé da letra. Moisés iniciou uma oração, todos abaixaram as cabeças. 

 

MOISÉS

(orando)

- Vamos agradecer a Deus por esse alimento que ele nos deu. Que Ele nos abençoe e nunca nos deixa faltar o alimento do corpo e da alma. E que ele dê o alimento que esse mundo precisa, que é a sua palavra. Pois assim está escrito, não só de pão viverá o homem mais de toda palavra que brota da boca de Deus. Que todos os pecadores se convertam e aceitam Jesus como o seu único salvador. Amém! 

RAIMUNDA

- Amém! 

REBECA

- Amém! 

RAIMUNDA

- Cê vai atrás da Laura, vai? 

MOISÉS

- Por enquanto não, viu? Deixa ela se iludir achando que o mundo é encantado como ela pinta. Assim como o filho pródigo, quando ela estiver comendo lavagens de porcos vai lembrar do conforto da casa do painho dela. E aí minha varoa, ela vai voltar com o rabinho entre as pernas. Não sabe? 

REBECA

(incrédula)

- Sério painho? Eu não sabia que Laura tem rabo. 

RAIMUNDA

- Rebeca minha filha, hora da refeição é hora sagrada, viu? Come a sua comidinha calada, tenha gentileza. 

REBECA

- Oxente mainha, mas se cês tão aí conversando!

 

Moisés olha severamente para Rebeca.

 

MOISÉS

- Isso é maneira de falar com a sua mainha, menina? Honra o teu pai e sua mãe para que os seus dias se prolonguem sobre a terra... E a culpa da rebeldia dessas meninas é sua, viu Raimunda? 

RAIMUNDA

- Minha? E cê quer que eu faça o que, meu varão? 

MOISÉS

- A mulher sábia edifica a sua casa, viu? Mas a tola a derruba com suas próprias mãos. Ensina modos para as suas filhas, façam elas andarem como mulheres corretas e não como meretrizes mostrando a metade do corpo. 

RAIMUNDA

- Mas né isso que eu faço, Moisés? Acontece que Laura se mistura com más companhias. 

MOISÉS

- Pois então tá educando a tua filha de forma errada.

(Moisés levanta da mesa e pega sua bíblia)

 - Terminei a minha refeição, tô indo pra igreja. Vou administrar aquele curso bíblico pros jovens. 

RAIMUNDA

- Tá certo, então. Mais tarde irei lá participar do culto. 

MOISÉS

(beijando Raimunda)

- Fica na paz do Senhor! 

RAIMUNDA

- Paz do Senhor. 

REBECA

(depois que Moisés sai)

- Fica triste não, viu mainha? Pois os humilhados serão assaltados! 

RAIMUNDA

- Valei meu Deus! Põe trava na boca dessa menina, Senhor!

 

 

CENA 15/ EXT/ PLANO GERAL 

O sol brilha sobre o Pelourinho e suas casas coloniais coloridas, enquanto as ondas beijam a areia da praia do Farol da Barra. O Mercado Modelo exibe a riqueza cultural da Bahia, e o Elevador Lacerda conecta a cidade alta e baixa. A passagem de dias é marcada pelo nascer e pôr do sol espetaculares. A Baía de Todos os Santos encanta com suas cores, e as ruas ganham vida com os ritmos dos tambores.

 

CORTA PARA: 

CENA 16/ CASA DOS FERNANDES/ SALA DE ESTAR/ TARDE 

Genivaldo está sentado no sofá da sala, Giovana entra visivelmente preocupada, com o celular na mão, tentando ligar para Laura. 

 

GENIVALDO

- Algum problema, minha filha? 

GIOVANA

- Sei não painho. Estou aqui tentando falar com a Laura e não consigo. 

GENIVALDO

- Mas aconteceu alguma coisa com ela? 

GIOVANA

- Tem um pá de dia que ela não aparece na escola, não sabe? E a Laura tem agido de forma estranha ultimamente, painho. Sei não, viu? Mas alguma coisa aconteceu. 

GENIVALDO

- Porque cê não vai até a casa dela, então? 

GIOVANA

- A Laura saiu de casa, meu pai. Disse que tá morando na casa de uma amiga. Sabe lá Deus quem é. Sei nem onde fica. 

GENIVALDO

- Ave Maria, mas ela ainda é tão jovem. Oh Giovana, essa menina já alcançou pelo menos a maior idade? 

GIOVANA

- Alcançou nada, faz dezoito agora no final do ano. E é com isso que ela tá contando, né? Ela me disse que não poderia mais viver na casa de um pai machista como o dela. Senhor que acha?

(ao telefone)

- Por favor, Laura, atende!

 

Giovana continua insistindo em ligar, mas sem obter resposta.

 

CORTA PARA: 

CENA 17/ INT/ CASA DA RAVENA/ QUARTO DA LAURA/ TARDE

A Casa da Ravena é um ambiente modesto, com paredes pintadas de branco e alguns pôsteres feministas decorando o espaço. No quarto da Laura, há uma cama de solteiro com lençóis desarrumados, indicando o desconforto e a agitação da personagem. RAVENA, uma mulher de 25 anos, cabelos curtos e tingidos. Ela veste uma camiseta preta com estampa de um punho cerrado, uma jaqueta jeans desgastada e calças pretas rasgadas. Sua postura é confiante e sua expressão facial demonstrava determinação. Ela entra no quarto segurando o celular de Laura, que tocou enquanto ela estava deitada na cama. Laura, por sua vez, está deitada na cama em posição fetal, com dores intensas. Ela parece frágil e vulnerável, sua expressão facial reflete seu desconforto e sofrimento.

 

RAVENA

- É a sua amiga, tá aqui que não para de ligar. 

LAURA

- Não quero falar com ninguém, não viu? O que não preciso agora é gente pra me dá lição de moral. 

RAVENA

- Não melhorou nada, né?

(colocando a mão na testa de Laura)

- Ó pai, ainda tá toda febril. 

LAURA

- O pior de tudo é essa cólica, véi. Parece que tão arrancando todos os meus órgãos pra fora. 

RAVENA

- E o sangramento como tá? 

LAURA

- Para por um instante, depois volta tudo de novo. Dá vontade de morrer. Se eu continuar assim, não tem jeito não, viu Ravena... Vou ter que ir para o hospital. 

RAVENA

- Sério mesmo, Laura? E quando chegar lá, cê vai dizer o que, hein? Me diga?

(com ironia)

- “Acontece doutor que me deram cytotec pra tomar, tô aqui sofrendo os efeitos colaterais”. Cê é de menor, acha que vai sobrar pra quem? 

LAURA

- Tô sofrendo, desgraça! Só quero uma maneira de parar essa dor. Será que não entende? 

RAVENA

- Oh minha linda, te entendo sim, viu? Conheço várias mulheres que tomaram e não sofreram tanto. Eu mesma já cheguei a tomar. Saiu tudo como uma menstruação nem deu pra perceber. Seu organismo deve ter reagido mal, né mesmo?... Agora cê entende a importância da nossa luta, né Laura? Precisamos fazer com que esse sofrimento pare, e que tenhamos atendimento digno nas unidades de saúde. Imagina aí, quantas meninas tão passando por essa situação que cê tá passando agora. 

LAURA

(com ódio)

- Tudo é culpa daquele canalha machista. Cadê ele aqui agora? Onde que ele tá, que não tá aqui do meu lado? 

RAVENA

- Oh Laura, cê realmente achou que ele ficaria ao seu lado? Oh meu amor, entenda uma coisa. Os homens vê as mulheres apenas como objetos sexuais. Quando a coisa arrocha mesmo, somos nós que carregamos o fardo sozinhas. É por isso que precisamos lutar contra essa sociedade machista. Entende agora?... Bem, vou ali procurar um remédio para melhorar a sua dor.

 

Ravena sai do quarto e Laura continua encolhida, sofrendo com as dores.

 

CORTA PARA: 

CENA 18/INT/ CLÍNICA BIO IN VITRO/ RECEPÇÃO/ TARDE 

Paulo e Jana estão sentados nas cadeiras de espera. Paulo de braços cruzados e cara fechada, Jana tentando animá-lo. 

 

JANA:

- Não fique assim, não meu amor. Existem outros meios, viu? 

PAULO:

- Que outros meios, Jana? Você me trocar por um homem de verdade, que seja capaz de te dá um filho? 

JANA

- Claro que não, oxe. Jamais faria isso. Eu lhe amo e é com cê que quero ter filhos. 

PAULO

- Cê não ouviu não, Jana? A médica foi bem clara, o meu problema é irreversível eu sou completamente estéril. Eu não sou capaz de dá os filhos que você quer. 

JANA

- Podemos fazer inseminação, né? Procuramos um doador que seja parecido contigo, tenha as suas características físicas.

 

Paulo salta da cadeira com repúdio.

 

PAULO

- Nunca! Onde já viu? Jamais vou admitir minha mulher carregando o filho de outro na barriga. 

JANA

- Isso é bobagem, Paulo. Nem nós nem o doador saberemos quem é quem. 

PAULO

(sentando-se novamente)

- Não, Jana. Isso seria uma tortura para mim. Eu não consigo admitir esse tipo de situação. Quando ver sua barriga crescendo, vou saber que não é meu filho que tá ali dentro. E quando nascer, terá as características suas e de outro homem que não sou eu. Será a mistura do seu DNA com o dele... Se cê quer tanto um filho, não precisamos fabricar mais crianças. Oh meu Deus tem tantas aí jogadas precisando de um lar. Podemos adotar. Hã? 

JANA

(entristecendo)

- É que sempre sonhei em sentir minha barriga crescer, não sabe? Vivenciar as contrações e todas as sensações de uma mulher grávida. Esse que sempre foi o meu sonho, Paulo. A adoção, por mais digna que seja não é a mesma coisa. 

PAULO

- Sinto muito por ouvir você dizer isso. Sabia? 

JANA

- Oh meu amor, me desculpe, viu? Tô aqui sendo egoísta, né mesmo? Realmente, cê tá certo, tem tantas crianças por aí precisando de um lar.

(se animando)

- E é isso que vamos fazer, iremos adotar. Eu quero uma menininha, sempre sonhei em ser mãe de menina. 

PAULO

- Agora sim. No fim vai ser a mesma coisa Jana, cê vai ver. Vamos adotar uma menina. Não quero nem imaginar minha mulher grávida de outro homem. 

CÁSSIA

(se aproximando)

- Com licença! Jana me desculpe, mas tô precisando muito da sua ajuda aqui na recepção. 

JANA

- Já tô indo, viu Cássia. Preciso voltar ao trabalho. 

PAULO

- Eu também preciso trabalhar, passei aqui mesmo só pra saber o resultado dos exames. Fica bem, tá? A gente vai ter a nossa filha. 

 

Os dois dão um beijo e Paulo sai.

 

CENA 19/ EXT/ PLANO GERAL 

A CAM começa com uma ampla vista de Salvador ao pôr do sol, mostrando a paisagem urbana da cidade e sua arquitetura histórica. Conforme a noite cai, a cidade se ilumina, revelando uma paisagem urbana vibrante. A câmera faz uma transição suave para a Praça da Piedade, onde está localizada a Igreja Cajado da Fé.

 

CENA 20/ EXT/ EM FRENTE A IGREJA CAJADO DA FÉ/ NOITE

Raimunda e Eliete estão conversando em frente à igreja, aguardando Moisés fechar as portas. Rebeca está sentada na calçada brincando com sua boneca. O local é uma pequena igreja de bairro, com uma fachada simples, iluminada por luzes suaves que destacam a placa com o nome "Cajado da Fé". Ao redor, algumas árvores e bancos de praça. 

 

RAIMUNDA

- Ando tão preocupada com Laura, irmã Eliete. Ela agora não tá atendendo mais as minhas ligações. Quando ligo, ela desliga na minha cara. E pior que Moisés me faz culpada por esse comportamento agressivo dela. 

ELIETE

- Olha irmã Raimunda, a senhora vai me desculpando, viu? Mas não posso negar que Pastor Moisés tem sua razão. Deus deu a mulher o poder de edificar uma casa. A mulher sabida sabe bem como fazer isso. Olha bem para Giovana, que doçura que é. Uma menina inteligente, estudiosa, recatada. Cê não ver Giovana com roupa curta. Mas é porque tô ali de olho... Infelizmente por causa do pai que é um desregrado, ela ainda não aceitou Jesus. Mas eu tenho fé, que ainda vou ver a minha filha ali, orando e jejuando como uma serva do Senhor. 

RAIMUNDA

- Amém, irmã Eliete! Era tudo o que eu mais queria que acontecesse com a Laura. 

ELIETE

- Então, jejue por isso, minha irmã. Satanás é astuto e tá procurando uma maneira de levar sua filha para o fogo. Nós, como mulheres guerreiras, arretadas devemos orar dia e noite pela conversão de nossos filhos. 

RAIMUNDA

- Oxente irmã Eliete, pois não tenho feito outra coisa. Não sabe? 

 

CORTA PARA: 

CENA 21/ EXT/ PONTO DE ÔNIBUS/ NOITE 

Jana e Cássia vêm andando e conversando até se aproximar da parada. 

 

JANA

- Infelizmente não vou poder engravidar, não Cássia. A Dra. Beatriz falou que o Paulo é completamente estéril, entende? Os seus espermatozoides não são maduros o suficiente para gerar uma criança. 

CÁSSIA

(afetuosa)

- Oh nega, imagino como isso deve ter lhe afetado. 

JANA

- Cê tem noção não, Cássia. Nunca vou poder ver a minha barriga crescer.

 (passando a mão na barriga)

- Nunca vou saber a sensação de ter um bebezinho crescendo aqui dentro de mim. 

CÁSSIA

- Mas venha cá! Inseminação, fora de cogitação, né? 

JANA

- Oxente menina, Paulo surta só em ouvir falar.

(se animando)

- Mas já decidimos que vamos adotar, viu. 

CÁSSIA

- Ó paí, que ideia maravilhosa. Essa é uma atitude nobre, hein Jana. Existem muitas crianças abandonadas nos abrigos precisando de um lar. 

JANA

- E eu não sei. Vou amar essa criança da mesma forma, como se ela tivesse saído daqui ó, de dentro de mim. 

CÁSSIA

- Oh minha linda, tenho certeza disso, viu.

(ao ver o ônibus se aproximando)

- Oh nega, meu ônibus já tá se aproximando ali.

(abraçando Jana)

- Cheiro, até amanhã, viu? 

JANA

- Cheiro! Que Deus lhe acompanhe.

 

Jana fica sozinha depois que Cássia vai embora. O ponto de ônibus está deserto, a única fonte de luz é uma lâmpada amarelada no alto do poste. O coaxar dos sapos e outros ruídos indistintos na escuridão, juntamente com a incerteza do que poderia surgir da mata, acelera os batimentos cardíacos de Jana. Ela reza, esperando que seu ônibus não demore. 

 

JANA

(falando sozinha)

- Oh meu Senhor do Bonfim, que o meu ônibus também não demore muito! 

 

Ao longe um homem encapuzado se aproxima. Com a mão no bolso e cabeça baixa. Jana abraça sua bolsa apertando-a contra o peito com medo de ser assaltada. Se trata de MACIEL, um homem de 20 anos que ao se aproximar da parada vai logo puxando conversa, mas Jana tenta se esquivar. 

 

MACIEL

- Tem horas, moça? 

JANA

- Tenho não, senhor. 

MACIEL

- Tu é muito linda, não sabe? 

JANA

(totalmente sem graça)

- Agradecida! 

MACIEL

- Casada? 

JANA

- Sou sim.

(mentindo)

- Meu marido é policial, ele já tá chegando, viu. Combinei dele vim aqui me buscar. 

MACIEL

- Tá certa! Aqui a noite é meio perigoso, né mesmo?

 

Maciel olha Jana de cima abaixo, o que a deixava bem constrangida. Ele olha para um lado e depois para o outro, e não vendo ninguém vai se aproximando ainda mais de Jana.

 

MACIEL

- Venha cá, que cê acha da gente se divertir um tiquinho antes do seu marido chegar?

 

Jana sente uma mistura de medo e desconforto à medida que Maciel se aproxima mais. Seu coração acelera e ela busca uma saída para aquela situação desconfortável.

 

JANA

(entregando a bolsa)

- Oh moço, pegue aqui pode levar minha bolsa, viu? Mas pelo o amor de Deus faz nada comigo não. 

MACIEL

(alisando os cabelos de Jana)

- Oxe, mas que isso? Quero nada de você não, minha linda. O que quero mesmo é você, meu bem. 

JANA

- Oh moço, se o senhor não afastar vou gritar, hein. 

MACIEL

- Grita não! Sabe porque? 

 

Maciel tapa a boca de Jana e a arrasta para dentro do matagal. Jana com a boca fechada não consegue gritar. Ele a atira no chão lhe ameaçando, enquanto já abaixa as suas calças. 

 

MACIEL

- Caladinha, bem quietinha que vamos vadiar um tiquinho. Tesão aqui é barril, cê toda delicinha tá me deixando doido.

 

Maciel arranca a calça de Jana com força e puxa sua calcinha. Ela fica tremendo de medo e completamente vulnerável. Ele tapa sua boca e a penetra com violência. Ela chora e aquilo lhe dava ainda mais prazer. Ao terminar, ele se afasta, mas antes arranca uma mexa do seu cabelo, passando-a pelo o seu corpo suado e a enfia em seu bolso. Ele veste a calça e rapidamente pega uma câmera fotográfica dentro da mochila e tira algumas fotos de Jana jogada ali no chão. Depois guarda tudo em sua mochila e sai correndo. Deixando ela ali deitada e nua da cintura para baixo.









 

 

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