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A Promessa - Capítulo 19


A Promessa
CAPÍTULO 19

webnovela de
FELIPE LIMA BORGES

escrita por
FELIPE LIMA BORGES

livre adaptação do livro de Rute

No capítulo anterior: Desesperada, Noemi desabafa com Tani sobre o que será de sua família. Elimeleque, Malom, Quiliom e Yuri constatam que não sobrou comida alguma na cidade. Maya revela para Iago e Tamires que está grávida. Ele pula de alegria, mas ela diz que não há motivo para comemorar, pois sem comida a criança não poderá se desenvolver em seu ventre. Orfa conta para Rute que Aylla foi comprada de um mercador na cidade. Irritado, Elimeleque questiona os belemitas e diz que eles não têm o direito de culpar Deus e acaba discutindo com Segismundo. Esse é interrogado por Tamires, que diz ter a solução para sobreviverem durante a fome.

FADE IN:

CENA 1: EXT. BELÉM – BECO – CREPÚSCULO

Tamires sorri para Segismundo.
SEGISMUNDO
Vamos, mulher, diga.
TAMIRES
A minha solução, que é o melhor que podemos fazer nesse momento, é criar um grupo de homens fortes e vigorosos, para que possamos apanhar qualquer resto que tenha sobrevivido a esses malditos raios. Ainda que estejam em posse de alguém.
SEGISMUNDO
Roubar.
TAMIRES
“Sobreviver” é a palavra.
SEGISMUNDO
Mas é óbvio que agora as pessoas começarão a roubar umas das outras, eu também vou.
TAMIRES
Sim, mas fazer isso em grupo é mais seguro. O povo está sensível... Ao ouvir falar desse grupo, terão medo. E sua fragilidade pode nos dar ainda mais vantagem. E caso surjam justiceiros que passem a nos caçar, se preciso for soltamos os menos valiosos para ser abocanhados e fugimos vivos.
Segismundo pensa enquanto ouve. Por fim, dado o seu semblante, parece interessado.
SEGISMUNDO
É uma boa ideia...
TAMIRES
Não, Segismundo. Ela é ótima! Até porque é nossa única saída se não quisermos desfalecer como estivéssemos no deserto.
SEGISMUNDO
Mas me diz uma coisa, mulher: por que veio me dizer tudo isso? Por que apresentar essa ideia a mim?
TAMIRES
Eu vi você se manifestar na praça há pouco. Combatendo as sandices do Elimeleque, se opondo a essas pessoas que acham que porque tem mais, são superiores a nós. Foi pouco, mas me identifiquei com suas ideias que me ficaram subentendidas. E, além de tudo, é óbvio que eu, sendo mulher, não posso fazer o que te propus. Porém--
SEGISMUNDO
(interrompendo) Agora vem o motivo.
TAMIRES
Sendo eu a autora da ideia, quero minha parte. Vou lucrar nessa história, também. Quero parte da comida e de qualquer coisa que nosso grupo conseguir. Os tempos difíceis estão apenas começando...
SEGISMUNDO
É justo.
TAMIRES
Comece a pensar em homens que poderíamos recrutar. Fortes, ágeis, que tenham familiaridade com a espada, de preferência com ideias contrárias às da turma de Elimeleque e que sejam de confiança absoluta. Eu já tenho um nome que praticamente se encaixa nisso tudo: Iago, marido de minha amiga com quem moro. E ele agora tem um motivo além para se juntar a nós. Mas trataremos dele depois.
SEGISMUNDO
Certo. Pensarei a respeito, mas já podemos considerar um confirmado: meu leal amigo Gael. Tenho certeza que aderirá à causa.
TAMIRES
Ótimo! Agora vá. Comece o quanto antes a formar nosso grupo.
ABERTURA

CENA 2: INT. TEMPLO – QUARTO DAS SACERDOTISAS – NOITE

Sentada de frente ao espelho, Rute se encara. Ela começa a tirar os apetrechos: do cabelo, os colares, os brincos, os anéis... Em seguida fica acariciando o cabelo. Então olha para Orfa, perto dali, já dormindo.
Momentos depois, já com vestido de dormir, Rute deita em sua cama e se ajeita.
FADE OUT:
FADE IN:
Um pouco de tempo passou e Rute, deitada, se mexe desconfortável. Vira para o outro lado, mas não está à vontade.
FADE OUT:
FADE IN:

CENA 3: FLASHBACK: EXT. PLANÍCIE DESÉRTICA – DIA

Estamos nas lembranças de Rute, de volta ao dia da batalha contra os amorreus. Os servos carregam o corpo da menina sacrificada. Seu olhar vazio, o sangue escorrendo na mesa de pedra, os moabitas vitoriosos comemorando...

CENA 4: INT. TEMPLO – QUARTO DAS SACERDOTISAS – NOITE

Incomodada, Rute vira para o outro lado, respira fundo e fecha os olhos tentando dormir.

CENA 5: EXT. BELÉM – BECO – NOITE

SEGISMUNDO
Antes que eu vá... Você ouviu Elimeleque dizer que vai embora de Belém com sua família antes que o dia de amanhã nasça. Podemos pegar o que deixarem pra trás.
TAMIRES
Não acho que eles deixarão alguma coisa. A fome vai ser gravíssima, qualquer grão fará diferença. Se alguma coisa sobrou naquela casa, estará partindo com eles. Vale lembrar que Elimeleque é um dos homens mais prósperos da cidade.
SEGISMUNDO
Você está querendo dizer o que eu acho que quer dizer?...
Tamires olha para os lados certificando-se de que ninguém vai ouvir.
TAMIRES
Nosso grupo pode alcançar a família de Elimeleque no deserto e tomar tudo.
SEGISMUNDO
Você parece sentir algo a mais por eles, algo diferente. Eu vejo no seu olhar... um ódio... E só pode ser pela mulher, a Noemi.
Pela expressão de Tamires, ele está certo.
TAMIRES
Noemi, uma sardenta, um ser desprezível, inferior, alcançou tudo que eu mais almejava quando eu almejava! (tremendo de raiva) Aquela coisa... devia estar nas cavernas com os leprosos!
Tamires cospe no chão e Segismundo permanece observando-a.
TAMIRES
Faça o serviço completo!
SEGISMUNDO
Matar a todos...
TAMIRES
Se você quiser não correr riscos, e quiser que o terror de nosso grupo se espalhe por aí e assim possamos sobreviver com um mínimo de dignidade, então terá que abandonar essa vidinha de belemita comum e virar um nômade. Pela prosperidade! Quando a crise passar, porque um dia ela vai passar, podemos nos estabelecer em outro lugar e recomeçar.
SEGISMUNDO
Pensando bem, você tem toda a razão.
TAMIRES
Portanto, é bom tratar de matar toda a família.
SEGISMUNDO
Certo.
TAMIRES
E que, de preferência, ela veja seu marido e seus filhos morrendo na sua frente. E só depois morra. Agonizando... lentamente...
Segismundo faz que sim devagar.
TAMIRES
Eu posso contar com você, Segismundo?
SEGISMUNDO
Sim.
TAMIRES
E chega de me chamar de “mulher”, eu não sou qualquer uma. Meu nome é Tamires. Tamires, para ficar claro.
SEGISMUNDO
Entendido, Tamires. Aqui nasce o nosso grupo.
Tamires e Segismundo apertam as mãos. Ela sorri satisfeita.

CENA 6: INT. CASA DE NOEMI – SALA – NOITE

Noemi, Elimeleque, Tani, Yuri, Malom e Quiliom entram em casa. Caminham tristes, abatidos. Noemi para e olha para todos os lados da sala.
NOEMI
Foi uma vida inteira aqui... Esses cantos, esses lugares... A cidade, tudo... Eu entendo as razões, Elimeleque, mas não será nada fácil pra mim abandonar tudo e ir pra um lugar qualquer, sem expectativa alguma...
ELIMELEQUE
A expectativa é uma vida sem a escassez de alimentos, meu amor.
NOEMI
E o que será do Malom e do Quiliom?...
Malom e Quiliom não sabem o que dizer. Elimeleque se aproxima da esposa e pega suas mãos.
ELIMELEQUE
Nós vamos recomeçar. Juntos.
NOEMI
Será, Elimeleque? Deus permitiu essa fome. Será mesmo que indo para outro lugar conseguiremos algo? Estaremos realmente livres dessa condenação?
ELIMELEQUE
Não sei... Não sei, meu amor. Mas nós precisamos tentar.
Tani se aproxima dos dois.
TANI
Eu não quero que vão, mas se irem, eu cuidarei de tudo, até que as coisas normalizem e vocês possam voltar. E creio que Yuri também.
YURI
Claro, sem dúvidas.
NOEMI
Venham conosco. Vamos juntos, então.
TANI
Noemi... Vocês são meus amigos, você é minha melhor amiga, mas eu não posso. Eu não quero, não concordo com isso... Sinto muito.
NOEMI
Eu entendo...
YURI
Eu preciso cuidar da minha família. E além disso não seria nada bom viajar com filho pequeno. Mas seja lá para onde forem, eu vou visita-los.
NOEMI
Serão sempre bem-vindos.
Yuri sorri.
YURI
Mas agora preciso ver como eles estão. Voltarei antes de vocês irem, para despedirmos. Shalom.
TODOS
Shalom.
Quiliom abre a porta e Yuri sai.
NOEMI
Tani, você me ajuda a arrumar as coisas?
TANI
Claro, vamos...
Noemi e Tani sobem a escada.
ELIMELEQUE
Eu vou preparar as ovelhas.
Elimeleque sai da casa e ficam ali apenas Malom e Quiliom.
MALOM
É, meu irmão, parece que não tem jeito, mesmo...
QUILIOM
Adeus, Belém...

CENA 7: INT. CASA DE IAGO – SALA – NOITE

Maya e Iago estão sentados, ela deitada no ombro do marido e chorando amargamente.
MAYA
Anos e anos de prosperidade nessa terra... (soluça) Tanto tempo em que isso poderia acontecer... (funga) Mas acontece justo quando eu alcanço a graça de ser mãe!... (chora)
IAGO
Oh, minha vida, eu vou dar um jeito. Se preciso for, irei até outros reinos atrás de comida. Farei o que for preciso pra cuidar de você.
A porta se abre e Tamires entra.
TAMIRES
Shalom.
IAGO
Tamires, e quanto àquela sua ideia, hein? Não vai falar nada sobre isso?
Tamires se aproxima para consolar Maya.
TAMIRES
Não se preocupem, não se aflijam. As coisas já estão se encaminhando. Muito em breve, minha amiga, não haverá mais razão para choro.
Tamires acaricia Maya e Iago a encara sem dizer anda.

CENA 8: INT. CASA DE NOEMI – SALA – NOTIE

A noite avança.
Na sala, Elimeleque, Malom e Quiliom desmontam alguns móveis e objetos. É quando alguém bate na porta.
MALOM
Quem será?
Elimeleque vai até à porta e a abre; é o Ancião.
ANCIÃO
Shalom, Elimeleque.
ELIMELEQUE
Ancião? Shalom. Que boa surpresa, vamos entrando...
O Ancião entra e Elimeleque fecha a porta.
ANCIÃO
Com licença. Eu pretendia falar lá mesmo, na praça, mas não quis parecer contra você e a favor desses rebeldes. Porém peço que não seja verdade que vocês vão embora de Belém. Logo os mais abençoados, os mais prósperos, os mais próximos dos mandamentos de Deus! Uma família tão querida!
ELIMELEQUE
Agradeço os elogios, Ancião, mas infelizmente é verdade. Já não existe prosperidade, e eu estou apenas cuidando da minha família.
ANCIÃO
Deus permitiu essa fome como consequência dos atos do povo. É um castigo para os hebreus. Ir para outro lugar não resolverá de nada, vocês serão hebreus do mesmo jeito! Dificilmente encontrarão prosperidade.
ELIMELEQUE
Senhor Ancião, eu peço perdão, mas não concordo com isso. Não é justo. Já que sempre fomos retos e obedientes, não merecemos passar por isso juntos aos transgressores. Já tomei minha decisão. Vamos embora de Belém antes da alvorada.
O Ancião não concorda...

CENA 9: EXT. BELÉM – BECOS – NOITE

Segismundo, seguido por GAEL (42 anos, alto e olhos claros), caminha furtivamente pelos becos.
GAEL
Um grupo de saqueadores?
SEGISMUNDO
Vamos precisar ser mais que isso, Gael. A cidade está um caos, o povo está desesperado, sem rumo... É necessária uma reação rápida de nossa parte, se quisermos sobreviver. Eles vão demorar a reagir, e quando isso finalmente acontecer, já será tarde.
Eles continuam andando de beco em beco.
GAEL
Entendo. Conheço vários homens com potencial para aceitar a proposta.
Segismundo para em um cruzamento, olha escondido para os dois lados e continua a andar com Gael.
SEGISMUNDO
Eu estarei à frente do grupo, liderarei os homens. E você, Gael, será meu imediato. Pois além de amigo, você é um homem leal, mais que qualquer um.
GAEL
E qual será a nossa identificação? Um grupo como esse precisa de um nome que grude na boca do povo, que os faça arrepiar só de ouvir.
SEGISMUNDO
Vamos abandonar a cidade, não teremos lugar fixo. Dormiremos ao relento, e quando tivermos sorte, em uma caverna. O mais óbvio, o mais aterrorizante aos ouvidos desses camponeses imbecis e ignorantes, é Caravana da Morte!
Os dois param de andar. Apesar da penumbra, Segismundo vê Gael aprovar com a cabeça. Segismundo sorri empolgado. IMAGEM CONGELA
CONTINUA...
FADE OUT:

No próximo capítulo: Tamires provoca Noemi quando eles estão indo embora, e Rute recebe uma visita inesperada no quarto.

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