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LÁGRIMAS EM SILÊNCIO - Capítulo 06

 





Novela de Adélison Silva 

Personagens deste capítulo

JANA
LAURA
GIOVANA
BEATRIZ
ELIETE
GENIVALDO
MOISÉS
RAVENA
CÁSSIA
MACIEL
JORGE
MAURÍCIO
RATO
VALDOMIRO

 
Participação Especial:
MULHER QUE SOCORRE JANA

aCENA 01/ EXT/ RUA/ CASA DE JANA/ CALÇADA/ DIA

O pesadelo parece retornar, enchendo Jana de medo, vergonha e angústia. Ela foi cedendo aos poucos, desabando no chão da calçada. Uma mulher que passa por ali, ao notar que algo está errado, se aproxima e oferece ajuda. 

MULHER

- Moça, a senhora tá bem? Precisa de ajuda? 

 

Jana, enfraquecida e desnorteada, não consegue responder e acaba desmaiando, deixando a mulher que a ajudava extremamente preocupada. 

 

MULHER

- Alguém acode aqui, por favor! Tem uma mulher desmaiada! 

 

Pessoas que passam pelo local se compadecem da situação e se aproximam para socorrer Jana. Alguns já com seus telefones nas mãos ligam para a ambulância. Maciel e Rato, que estão um pouco mais à frente, percebem a agitação e notam que algo está errado. 

 

MACIEL

- Oxe, mas o que tá acontecendo ali? 

RATO

- Parece que a dona desmaiou. 

MACIEL

- É melhor a gente ir lá ajudar, né não? 

RATO

- Deixe! Já tem gente demais lá. Vamo agora focar nos nossos queijos, viu. Presta atenção, nós vamo lá e vamo entregar mais mercadoria para aquele folgado. Mas vou lhe dá a letra, tá ouvindo Maciel? Não vai ser todos os queijos que vai ser recheado não. Se ele voltar a aloprar, o bagulho vai ficar louco. Tá me entendendo meu brother? 

MACIEL

- Tô ligado! Mas vê lá viu Rato, não quero problema respingando para o meu lado, não. Quero minha ficha limpa. 

RATO

- Olha que desgraça! Relaxa meu parceiro que vai dá tudo certo. Agora venha comigo!

 

Rato e Maciel seguem para a casa do cliente, enquanto a ambulância chega para socorrer Jana. Um tumulto de pessoas se forma ao redor dela, preocupadas com sua situação.

 

CENA 02/ INT/ BOUTIQUE DA RAVENA/ DIA 

Ravena está arrumando algumas roupas dentro da loja, Laura chega logo em seguida para surpresa da amiga.

 

RAVENA

(surpresa)

- Laura? O que cê tá fazendo aqui, não deveria tá no colégio? 

LAURA

- Eu preferi não ir hoje. Vou trabalhar em tempo integral pra compensar por ter lhe deixando na mão ontem. 

RAVENA

- Fez muito mal, não sabe. Não quero que cê fique faltando aula por conta do trabalho. 

LAURA:

- Tarde demais já faltei. Um dia só não fará mal. 

RAVENA

- O problema aqui não foi o fato de cê ter me deixado na mão ontem. O problema aqui é donde cê tava. 

LAURA

- O Maciel me ama Ravena, eu sinto isso. O que acontece que ele foi se enfiando no mundo das drogas, foi fazendo coisa errada e agora não consegue mais sair dessa. Mas tenho certeza, viu? Depois que a gente se casar e for morar junto as coisas vão mudar. 

RAVENA

(abismada)

- É o quê, Laura? Casar? É sério isso? Cê está pretendendo morar com esse cara? É isso mesmo que tô entendendo? 

LAURA

(decidida)

- Tô. E nem você e nem ninguém vai me fazer mudar de opinião, viu?... Poxa, sei que vou ser feliz, eu e Maciel temos uma conexão foda, difícil de explicar. A gente vai ser muito feliz, tenho certeza disso. 

RAVENA

- É triste ver cê jogar sua vida assim no lixo, e eu não poder fazer nada, viu. 

 

CENA 03/ INT/ CLÍNICA BIO IN VITRO/ RECEPÇÃO/ DIA 

Cássia estava terminando de organizar a agenda de Maurício, enquanto ele conversava com ela em frente ao balcão da recepção.

 

CÁSSIA

 – Agora pela manhã tem só essa paciente aí, a parte da tarde já tem duas marcadas. 

MAURÍCIO

- Ótimo! E o cineminha de hoje tá de pé? 

CÁSSIA

- Tá sim, é muito bom assistir um filminho com cê. 

MAURÍCIO

- Também tô gostando muito dos nossos programas. Sempre gostei de bons filmes, é bom saber que agora posso contar com a sua companhia. Né mesmo? 

CÁSSIA

- Pois é, mas hoje quero algo diferente. 

MAURÍCIO

(sem entender)

- Oxe! E diferente como? 

CÁSSIA

- Hoje quero um cinema em casa. O que cê acha? 

MAURÍCIO

- É... Pode ser, então. Diferente, gostei. Na minha casa, ou na sua? 

CÁSSIA

(jogando charme)

- Lá em casa mesmo. Eu comprei uns DVDs de uns filmes que nunca assisti. A gente escolhe um, faço uma pipoca, preparo um jantar. Vai ser algo mais aconchegante. 

MAURÍCIO

(sem jeito)

- Tá certo, certinho Cássia. A gente faz isso, então. 

 

Beatriz vai chegando bem eufórica e animada. 

 

BEATRIZ

(chegando)

- Bom dia, bom dia! 

CÁSSIA

- Bom dia Dra. Beatriz! 

MAURÍCIO

- Bom dia! Toda sorridente, sinal que a noite foi boa. 

BEATRIZ

- Eu sempre tô sorridente meu amor. Meu dia começa sempre bem, com auto astral lá em cima. E minha noite foi maravilhosa, dormi como um bebê. E Jana ondé que tá? 

CÁSSIA

- Até agora ainda não apareceu. 

BEATRIZ

- Liga pra ela depois e ver se tá tudo bem.

 (fazendo sinal juntando os dedos indicadores)

- E vocês dois, tô só observando viu. 

CÁSSIA

- Que isso doutora? Eu e Dr. Maurício somos só amigos. 

BEATRIZ

(sorrindo)

- Hunrum! Me enganam. 

MAURÍCIO

(se justificando)

- Beatriz, é verdade. Eu e Cássia somos apenas amigos. A gente sempre sai, mas pra assistir filme nada demais. Inclusive se cê quiser pode ir com a gente. Né mesmo Cássia?

 

Cássia arqueia a sobrancelha sem entender o porque que Maurício estendeu o convite a Beatriz.

 

CÁSSIA

(sem jeito)

- Sim, sinta se convidada. Vai ser um prazer. 

BEATRIZ

- Oh minha gente, te acalme! E daí se cês tão saindo ou não? Nosso tempo aqui na terra é curto, tem é que namorar mesmo. 

MAURÍCIO

(decepcionado)

- Tá certa, tem que namorar mesmo.

(saindo)

- Deixa eu cuidar do meu trabalho. 

 

Maurício sai sem graça e Cássia fica sem entender nada. 

 

BEATRIZ

- Menina, que deu nele? 

CÁSSIA

- Pois é, também não entendi nada. 

BEATRIZ

- Deixa pra lá. Como tá minha agenda? 

CÁSSIA

- Agora pela manhã tá tranquilo. Tem só um homem na sala de espera lhe aguardando. 

BEATRIZ

(estranhando)

- Um homem? Ave Maria! Qual o nome do paciente? 

CÁSSIA

- Ele não é paciente. Disse que é seu amigo. 

BEATRIZ

- Oh moça, mas que diacho de amigo é esse? Vou lá ver quem é esse amigo. 


PLANO SEQUÊNCIA: 

CENA 04/ INT/ CLÍNICA BIO IN VITRO/ SALA DE ESPERA/ DIA 

Beatriz vai até a sala de espera e se surpreende ao dar de cara com Jorge, que está sentado na poltrona, estalando os dedos enquanto folheava uma revista. Beatriz arregala os olhos e fica paralisada por um momento. 


BEATRIZ

- Não acredito! Mas que cê tá fazendo aqui? 

JORGE

(sorrindo)

- Folguei hoje, vim aqui lhe ver. 

BEATRIZ

- Mas cê é muito abusado. 

 

Jorge levanta da poltrona com um sorriso maroto no rosto, posicionou-se diante de Beatriz e, enquanto conversa, vai se aproximando cada vez mais dela. Ela recua lentamente. 

 

JORGE

- Sou abusado, sou indecente, sou isolente... 

 

Ele pega Beatriz pela cintura, fazendo-a arregalar os olhos. 

 

JORGE

- Mas sei bem que cê gosta. 

BEATRIZ

(com os braços encolhidos sobre o peito)

- Ui! Gente, mas que pegada! 

JORGE

- Eu não paro de pensar no cê. 

 

Jorge sem prestigiar começa a beija Beatriz, ela arregala os olhos como se estivesse apavorada, mas corresponde ao beijo. Depois de alguns momentos, Beatriz se afasta bruscamente e dá um tapa sonoro no rosto de Jorge, que fica atordoado. 

 

JORGE

(com a mão sobre o rosto)

- Au! Mas que desgraça! 

BEATRIZ

- Como ousa? 

 

Maurício, ao ouvir o barulho do tapa, sai correndo de sua sala. 

 

MAURÍCIO

- Tudo bem Beatriz? Esse cara tá te importunando, tá? 

BEATRIZ

- Tá tudo bem Maurício, muito obrigada! 

MAURÍCIO

- Tem certeza? Porque se cê quiser posso por ele pra fora. 

JORGE

(debochando)

- Rapaz, o bicho é brabo! 

 

Beatriz olha para Maurício e sorri, fazendo um gesto com as mãos para que ele voltasse para sua sala. 

 

BEATRIZ

- Maurício sei me defender, viu. Muito obrigada, tá tudo bem. Pode voltar para o seu serviço. A última coisa que quero é tumulto aqui na minha clínica. 

MAURÍCIO

- Vá bem, então. 

 

Maurício coça a cabeça, ainda um pouco perplexo, e volta para sua sala, deixando Beatriz e Jorge sozinhos na sala de espera. Beatriz olha para Jorge com uma expressão de desaprovação e aponta para a porta. 

 

BEATRIZ

- Esse aqui é o meu ambiente de trabalho, e sou uma mulher descente. Põe se daqui pra fora meu senhor. Deveria tá cuidando era do meu carro. Tá sabendo? 

JORGE

- Oxente mulher, mas seu carro já tá tudo certinho. Esqueceu que levou ele pra casa ontem? 

 

Beatriz para por um instante, pensativa, passando a mão pela testa com uma expressão constrangida. 

 

BEATRIZ

- Verdade. Sendo assim não tenho mais nada para resolver com o senhor. Quer fazer a gentileza de se retirar da minha clínica? 

JORGE

- Vou me retirar, sim. Por respeito ao seu ambiente de trabalho. Mas já sei o horário que cê sai, vou ficar de sentinela lá na frente da clínica te esperando. 

 

Jorge sai da sala de espera, dando uma última piscadela para Beatriz antes de sair pela porta. Beatriz fica de boca aberta, sem acreditar na ousadia dele. 

 

BEATRIZ

- Mas que abusado!

(se abanando com uma revista)

- E que pegada forte, hein painho! 

 

Jorge tinha tudo aquilo que Beatriz mais detestava em um homem. Machista, autoritário, abusado. No entanto, ele a atraía. O jeito brutamonte de Jorge desafiava Beatriz.




CENA 05/ INT/ HOSPITAL/ ENFERMARIA/ DIA

Jana estava deitada em uma cama hospitalar, com um soro sendo administrado em sua veia. Ao lado da cama, Genivaldo e Giovana estavam preocupados, olhando para Jana com expressões de apreensão.

 

JANA

- Oh gente, cês não deveriam ter se preocupado tanto. E ainda ter o trabalho de vir até aqui. 

GENIVALDO

- Como não deveríamos ter se preocupado, Jana? Cê passa mal, desmaia na rua e não quer que a gente se preocupe? 

GIOVANA

- Cê tá grávida, Jana. Tem que se cuidar, né? 

JANA

- Tô bem gente. O médico não falou que foi só a pressão que caiu? 

GENIVALDO

- Mesmo assim, no seu estado todo cuidado é pouco. 

JANA

- É que fiquei nervosa, foi isso. 

GIOVANA

- E ficou nervosa, por quê? 

JANA

- Eu vi ele. Eu tenho certeza que era ele. 

 

Genivaldo e Giovana se entreolham, confusos e preocupados. 

 

GENIVALDO

(sem entender)

- Ele quem filha? 

JANA

- O marginal que abusou de mim, meu pai. 

GIOVANA

- Ave Maria, Jana. Ele tava próximo à sua casa, é? 

JANA

- Estava na praça do outro lado da rua, ao lado do Tororó, juntamente com outro cara. Também não posso dar certeza absoluta que era ele, né mesmo? O que sei é que parecia muito. Na hora fiquei nervosa, fiquei sem ação. Quando acordei, já tava na ambulância. 

GENIVALDO

- Acho melhor cê voltar lá pra casa. Pelo menos nesse primeiro período de gravidez. 

JANA

- Não. Cês me desculpem, mas não tenho mais paciência pra lidar com Eliete. 

GIOVANA

- Então podemos fazer o seguinte, viu. Pego minhas coisas e vou lá pra sua casa ficar contigo. 

GENIVALDO

- Giovana, cê tem que se dedicar aos estudos. 

GIOVANA

- Mas vou me dedicar, meu pai. O ônibus que vai pro colégio passa na frente da casa de Jana. 

GENIVALDO

- Vá bem, então que assim seja. 

JANA

- Oh mana, cê é mesmo um amor! Vou amar lhe ter lá comigo. Agora vamos esperar esse soro terminar que tô doida pra ir pra casa.

 

 

Enquanto aguardavam, o silêncio pairava na enfermaria, interrompido apenas pelo som suave dos monitores e pelo ruído do soro gotejando. 

 

CENA 06/ INT/ LOJA DE QUEIJO/ DIA 

A loja de queijo de Valdomiro é pequena e simples, localizada em um beco do Calabar. Prateleiras de madeira alinhadas exibem diversos tipos de queijo, criando um ambiente rústico e convidativo. Ele mantém a fachada de um comerciante comum, enquanto usa sua loja para esconder os tabletes de cocaína que Rato trazia.

VALDOMIRO, é um homem de 56 anos, tem uma aparência robusta, com uma barba grisalha mal cuidada e olhos atentos. Veste um avental branco e manipula os queijos com destreza, demonstrando conhecimento e experiência no ramo. Rato está ao lado de Valdomiro, com uma postura confiante. Maciel, por sua vez, parece mais tenso e preocupado. 

 

VALDOMIRO

- Cês tão se arriscando muito. O combinado era um em cada dez queijos, isso pode chamar a atenção dos homem. 

RATO

- Foi só dessa vez, viu Seu Valdomiro. Era só para não perder cliente. Tá entendendo?. Esse cliente é meio enjoado mas paga bem. 

MACIEL

- Também já te falei que tô achando tudo isso arriscado. 

RATO

- Tu fica na tua e continua fazendo o seu trabalho. Porque quando a grana começa a cair em seu bolso, cê não acha ruim, né pae? 

VALDOMIRO

- Mas é só dessa vez, não podemos trocar os pés pelas mãos e colocar tudo a perder. 

RATO

- Sim, mas não é o que tô dizendo? Foi só dessa vez. Escutem... Tô fechando um negócio aí com um bacana, que vou dá ideia pro cês. Vai entrar uma grana alta. 

MACIEL

- Mas é suave né, não tô querendo encrenca pro meu lado não? 

RATO

(dando bronca)

- Mas que desgraça, man! Tô lhe estranhando Maciel, tu anda muito cabreiro. Qualé parça? Tu tá junto ou não tá, diga aí? 

MACIEL

- Tô. Claro que tô. Até mesmo porque tô precisando de grana. Né mesmo? 

RATO

- Então te liga meu brother. Continua fazendo o teu servicinho aí bonitinho. Tá sabendo? Que quando o negócio desenvolver a gente conversa. 

 

Rato está com a ideia de partir para algo mais arriscado, e expandir a venda de seus queijos. Mais produção, mais dinheiro entrando. Ele é ambicioso e quer se dá bem de qualquer forma. 

 

CENA 07/ EXT/ PANO GERAL 

A CAM se move suavemente pelo calçadão da Praia de Ondina, capturando a agitação de uma tarde ensolarada. Turistas e moradores locais passeiam pela orla, aproveitando o clima tropical. As ondas do mar quebram suavemente na areia dourada, enquanto as palmeiras balançam ao vento. Pessoas jogam vôlei de praia e crianças constroem castelos de areia. A cena muda, e a CAM se concentra na fachada da Clínica de Fertilização Bio in Vitro, localizada em um edifício a poucos passos da praia. A fachada é revestida de vidro, permitindo que a luz do sol brilhe suavemente no interior. Grandes vasos de plantas tropicais decoram a entrada, adicionando um toque de serenidade ao ambiente. 

 

CENA 08/ INT/ BOUTIQUE DA RAVENA/ TARDE 

Laura está atrás do balcão, finalizando uma venda, quando seu pai, Moisés, entra na loja. 

 

LAURA

(entregando uma sacola para a cliente)

- Aqui está! Muito obrigada e volte sempre, vamos ter o prazer enorme em atendê-la.

(ao ver o pai)

- O que o senhor tá fazendo aqui? 

 

Moisés entra com uma expressão séria e determinada no rosto, aproxima-se de Laura. 

 

MOISÉS

- Eu vim te levar pra casa, Laura. Não tá certo isso não viu. Seu lugar é lá em casa com sua família. 

LAURA

- Pois não vou! Deus me livre ter que conviver com os ensinamentos machistas e preconceituosos do senhor. 

MOISÉS

(se alterando)

- Olha aqui menina, não me faz perder a paciência contigo! 

LAURA

- E se perder a paciência senhor vai fazer o quê, pastor? Vai me bater?

 

Moisés olha ao redor e percebe que todos na loja estão observando a situação. 

 

MOISÉS

- Não! Oh filha eu vim aqui em nome do nosso Senhor Jesus, para ter uma conversa pacifica com cê. Eu sou seu pai, sou seu amigo. Oxe, cê me trata como se eu fosse um estranho. 

LAURA

- Por que é isso mesmo. Pra mim o senhor é um estranho. O que cê sabe sobre mim? Diga aí? 

 

Ravena, que está próxima, decide intervir, se aproximando dos dois. 

 

RAVENA

(colocando a mão no ombro de Laura)

- Laura, vai lá pra dentro e conversa com seu pai. 

MOISÉS

- Então que dizer que cê é a moça com quem minha filha tá convivendo? 

RAVENA

(estendendo a mão)

- Sou Ravena, prazer em conhecer o senhor. 

 

Moisés olha fixamente para a mão estendida de Ravena por um instante, hesita, mas acaba decidindo apertá-la. 

 

MOISÉS

- Que Deus tem misericórdia de sua alma. 

 

Moisés é do tipo que julga as pessoas pela aparência, e o estilo mais masculinizado de Ravena, com seus terninhos, gravatas e chapéus, fez com que Moisés a olhasse com desconfiança e preconceito. 

 

CENA 09/ INT/ CASA DOS FERNANDES/ SALA DE ESTAR/ TARDE 

Genivaldo e Giovana entram na sala de estar, visivelmente cansados. Eliete está sentada em uma poltrona, aguardando impacientemente. Não por preocupação, mas sim para saber o que aconteceu com Jana. Ela se levanta rapidamente da poltrona ao ver o marido e a filha chegarem. 

 

ELIETE

- Cês demoraram! O que foi que aconteceu com Janaína dessa vez? 

GENIVALDO

- Queda de pressão, normal por conta da gravidez. Mas ela já tá bem, só tomou um soro e voltou pra casa. 

GIOVANA

- Vou arrumar as minhas coisas. 

 

Eliete fica surpresa com a declaração de Giovana e questiona a sua intenção. 

 

ELIETE

- Oxente, e arrumar suas coisas pra quê? 

GENIVALDO

- Bem, Paulo voltou para o Mato Grosso para a casa dos pais dele. Ele a Jana parece que não tem mais volta. Sendo assim Jana achou melhor voltar para a casa dela. Então Giovana se prontificou em passar uma temporada com a irmã. 

GIOVANA

- Pois é, vai ser ótimo. Lá com Jana, eu poderei ajudá-la se for necessário. Estou indo arrumar minhas coisas então, viu? 

ELIETE

(autoritária)

- Te aquieta bem aí! Cê não vai pra lugar nenhum! Imagina se vou deixar minha filha conviver em um antro de perdição. 

GENIVALDO

- O que é agora? Que antro de perdição, mulher? Ela vai pra casa da irmã. 

ELIETE

- Uma desviada que separou do marido sabe lá Deus por que. Ela pode até enganar cês com essa história de estupro.  Mas a mim ela não engana, viu? Esse filho que ela tá esperando é de algum amante. E provavelmente ela vai enfiar ele dentro daquela casa. Minha filha não vai se misturar nessas orgias. 

GENIVALDO

- Pare de falar asneira, Eliete! E tenha mais respeito com minha filha. Vai lá arrumar suas coisas Giovana, que vou te levar na casa da sua irmã.

 

Giovana sai e vai arrumar suas coisas.

 

ELIETE

- No dia do juízo cê vai prestar contar por tá encaminhando a sua filha ao pecado. Aquela casa vai virar um antro, e nossa filha vai tá lá mergulhada naquele mar de pecado. 

GENIVALDO

- Deixe que com Deus eu me entendo depois. 

ELIETE

- Vá brincando Genivaldo, vá. Deus é justo! 

 

CENA 10/ INT/ BOUTIQUE DA RAVENA/ SALA A PARTE/ TARDE 

Moisés e Laura estão sentados em uma sala separada dentro da boutique de Ravena. O clima tenso era palpável, refletindo a divergência entre pai e filha. 

 

MOISÉS

- O que é que cê tanto quer Laura? Desde menina que cê queima nessa ambição desmedida. São as más companhias que te deixou desse jeito, né mesmo? Cê tá a cada dia se afastando mais da presença do Altíssimo. A verdade também seja dita, sua mãe também nunca soube educar direito cês. 

LAURA

- Não meu pai, foi o senhor que me deixou assim revoltada. É muito fácil pro senhor responsabilizar mainha por tudo, né? Oh minha gente! Só quero ser feliz, fazer o que eu gosto, sem repressão nenhuma. Só quero ter o direito de poder ser eu mesma.

 

Moisés respira fundo, buscando paciência para responder à filha. 

 

MOISÉS

- Cê tá muito iludida, filha. A felicidade não tá nas coisas que se acabam. Deus não nos ensinou a não cobiçar as coisas desse mundo? Jesus Cristo mesmo disse que não era desse mundo. Nós também não somos, viu. Quem somos nós senão a imagem e semelhança de Deus? 

LAURA

- O senhor pode não ser, mas eu sou. Eu sou de carne e osso. Só quero ser dona de mim, das minhas escolhas, vontades, desejos e, principalmente, do meu próprio corpo. Deus não pode me condenar por isso. 

 

Moisés olhou para Laura com uma mistura de tristeza e desaprovação, tentando encontrar uma maneira de se conectar com ela. 

 

MOISÉS

- Deus que tenha pena do cê e dessa sua ambição, filha. Volte pra casa, vá! Eu prometo ser mais tolerante e saber te ouvir mais. Cê tem uma família linda que te ama. Volte comigo! 

LAURA

- Isso seria lindo se fosse verdade. Mas nós dois sabemos que na prática é diferente do que na teoria, né meu pai? Eu não vou casar com nenhum filho de pastor da sua igreja. Quando eu me casar vai ser por amor, por que eu escolhi ficar com essa pessoa. 

MOISÉS

- Cê tá pretendendo casar, Laura?

(desconfiado)

- Cê e essa moça com quem cê tá dividindo a casa... Existe alguma coisa entre vocês? 

LAURA

(estranhando)

- É o que? Ravena? Não, claro que não. Donde que o senhor tirou essa ideia? A Ravena é apenas uma grande amiga minha.

 

Moisés respira fundo e se ajeita na cadeira, aliviado com a resposta, mas a tensão continua presente. 

 

MOISÉS

- Menos mal, né? 

LAURA

- Menos mal? Oxe, e se fosse verdade que mal teria nisso? É por esse motivo que sei que nós nunca vamos nos entender, tá sabendo? Falamos línguas diferentes. 

MOISÉS

- Minha filha não posso ir contra a palavra de Deus. Homem com homem e mulher com mulher não fazem filhos, isso vai contra a ordem natural das coisas. 

 

Laura se levanta, indicando que desejava encerrar a conversa e voltar para a loja. 

 

LAURA

- Se a conversa vai por esse rumo, eu prefiro nem ouvir, viu. Com licença, preciso voltar pra a loja. 

MOISÉS

- Deus que te ajude. Eu não consegui segurar você, que ele tenha misericórdia e te livra de todo mal. Eu tenho fé que um dia cê vai voltar, assim como fez o filho pródigo. E nesse dia eu vou tá lá de braços aberto te esperando. 

 

Moisés sai da sala, Laura para por um instante pensativa e sai logo em seguida. 

 

CENA 11/ EXT/ CLÍNICA BIO IN VITRO/ SAÍDA/ TARDE 

Beatriz sai da clínica e se depara com Jorge encostado em seu carro. Uma expressão de surpresa misturada com raiva aparece em seu rosto. 

 

BEATRIZ

- Não tô acreditando nisso! 

 

Jorge, com um sorriso irônico, mostra um prego enfiado no pneu do carro.

 

JORGE

- Acho que seu carro furou o pneu. 

BEATRIZ

- O quê?

(nervosa)

- Mas que porra, véi! Foi cê que fez isso! Que jogo baixo meu senhor. 

JORGE

(cínico)

- E pior que o estepe do seu carro acabou ficando lá na oficina. Não sabe? Mas se preocupe não, viu? Te dou uma carona, o meu assistente tá vindo pra arrumar o pneu do seu carro. 

BEATRIZ

(com ódio)

- Você é um grosseirão estúpido. Eu deveria chamar a polícia. Mas tenho uma ideia melhor. 

 

Jorge fica confuso sem entender o que ela pretendia fazer.  

 

JORGE

- O que vai fazer? 

 

Beatriz vai até o porta-malas do carro de Jorge, pega o estepe e o leva para o seu carro. 

 

JORGE

(segurando braço de Beatriz)

- Espere um pouco, não vou deixar cê fazer isso! 

BEATRIZ

- Não me rela! Fique longe de mim! Eu ainda não desisti da ideia de chamar a polícia. 

 

Jorge solta o braço dela, resmungando. 

 

JORGE

- Ó pai, que mulher mais bruta! 

 

Beatriz troca o pneu furado do seu carro com o estepe de Jorge. 

 

BEATRIZ

(limpando uma mão na outra)

- Prontinho! 

JORGE

- Olhe só, se sujou toda, viu. 

BEATRIZ

- Não importa. E pode ter certeza de que cê vai pagar por esse prejuízo. 

 

Beatriz entra em seu carro, mas antes de partir, lembra de algo importante. 

 

BEATRIZ

- Ah, quase me esqueci. 

 

Beatriz sai do carro, pega o prego e, com a ajuda de uma ferramenta, o enfiou no pneu do carro de Jorge. 

 

JORGE

(indignado)

- Mas que porra é essa? Cê ficou louca? 

BEATRIZ

- Quando seu assistente chegar, peça para ele trocar o seu pneu. Passe bem! 

 

Beatriz entra em seu carro, bate a porta e sai cantando pneu. Jorge fica encantado com a determinação bruta dela em resolver as coisas. 

 

JORGE

- Que mulher é essa, meu Deus? Ela tem que ser minha. 

 

CENA 12/ INT/ BOUTIQUE DA RAVENA/ TARDE 

Ravena e Laura estão em é ao lado do balcão de atendimento. As duas conversavam sobre a visita de Moisés.

 

RAVENA

- E então, como foi a conversa com o seu pai? 

LAURA

- A mesma ladainha de sempre, né? Eles me ver como se eu fosse a pecadora, a ovelha negra da família. Tão querendo que eu volte pra casa, mas isso eu já disse que não vai acontecer. Imagine bem se vou me submeter as rédeas impostas pelo o meu pai... Mas olhe, sabia que até estranhei? Painho foi manso, algo que não tô acostumado a ver. 

RAVENA

- Daqui a um mês cê estará fazendo dezoito anos, será dona de si. 

LAURA

- Oh menina, nem me lembre isso, viu? Nunca ansiei tanto por esses dezoito... Cê acredita que painho tava achando que eu e você temos um caso?

(rindo)

- Sem condições um negócio desses, né mesmo? Olhe o tamanho do absurdo. 

RAVENA

(sem graça)

- E porque seria sem condição, Laura? 

LAURA

- Oxente Ravena, por favor, né? Imagine eu e você juntas, nada a ver. 

RAVENA

- Já imaginei e achei que tem tudo a ver, sim. Mas pelo o que vejo, não tenho nenhuma chance, né mesmo? 

 

Nesse momento, uma revelação inesperada deixou Laura perplexa. Ravena sai decepcionada, enquanto Laura permanece parada, tentando assimilar o que acabara de ouvir da amiga.


CENA 13/ INT/ SUBÚRBIO/ LOJA DE QUEIJO/ DEPÓSITO/ TARDE 

Valdomiro e Maciel estão no depósito organizando os queijos. De repente, Rato entra visivelmente agitado. 

 

VALDOMIRO

- Põe os queijos recheados nessas caixas aí, o restante pode deixar nas prateleiras. Temos que saber distinguir bem na hora de entregar para o cliente. 

RATO

(entrando afoito)

- A polícia tá na frente da loja! 

VALDOMIRO

(estranhando)

- Ave Maria, man! A polícia aqui? Normalmente, eles não costumam vir aqui. 

MACIEL

(desesperado)

- Ó pai, véi! Sabia que isso iria dá merda! Que desgraça viu? Posso ser preso não. 

RATO

- Te aquiete cês dois e calem a boca! Presta atenção, dá um jeito de sumir com os queijos recheados. 

VALDOMIRO

- Maciel, pegue aqueles ali e coloque na caixa. 

RATO

- Vou voltar pra frente da loja e tentar distrair eles. 

 

Rato retorna para a frente da loja, enquanto Valdomiro e Maciel continuam organizando os queijos. 

 

MACIEL

(guardando os queijos na caixa)

- Que porra! Ondé que fui me meter! 

 VALDOMIRO

(apreensivo)

- Sujou, dá pra moitar esses queijos tudo não. Se a polícia entrar aqui, deu merda!





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