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INFERNO URBANO - CAPÍTULO 02

 


UMA NOVELA CRIADA E ESCRITA POR: WANDERSON ALBUQUERQUE
DIREÇÃO ARTÍSTICA: GUILHARDO ALMEIDA
PRODUÇÃO: MATHEUS ALMEIDA
EMISSORA: RANABLE WEBS

INFERNO URBANO – CAPÍTULO 02

CENA 01. DELEGACIA. SALA. INT. NOITE.

Patrícia está sentada em uma cadeira, enquanto olha para a parede branca. Ela mexe os dedos e respira fundo. A porta é escancarada por Capitão Vasconcelos que vai ao seu encontro e a beija.

CAP. VASCONCELOS – Você tá bem? Tem certeza?

PATRÍCIA – Eu estou melhor agora, apenas estarrecida com o que aconteceu.

CAP. VASCONCELOS (GRITA) – Filhos da puta!

Ele vai até a parede e esmurra. Patrícia vai em sua direção e o abraça.

PATRÍCIA – Eu estou bem, não precisa ficar assim. Eles não queriam me matar, afinal de contas.

CAP. VASCONCELOS – Como você pode ter tanta certeza disso, Patrícia? Bandido não atira pra matar.

PATRÍCIA – Exatamente. Não foram bandidos comuns, foram matadores de aluguel. Se eles quisessem realmente me matar, teriam atirado em todo carro, mas eles só atiraram na parte detrás do carro.

CAP. VASCONCELOS – O quê?

PATRÍCIA – Também fiquei confusa quando fiquei sabendo. Eles só queriam me dar um susto, mas não tem motivos, o único motivo para me darem esse sossega é apenas por eu ser sua esposa.

CAP. VASCONCELOS – Milicianos filhos da puta.

PATRÍCIA – Você acha?

CAP. VASCONCELOS – Não tenha dúvidas. Me escute, você vai prestar o depoimento, tudo certinho, eu vou precisar ir para uma operação daqui a pouco, enquanto isso, você não sai daqui, entendido?

PATRÍCIA – Você tem certeza que precisa ir nessa operação?

CAP. VASCONCELOS – Sim, eu preciso. Tenho certeza que os PMs vão fazer alguma merda.

Vasconcelos beija a testa de Patrícia que segura forte sua camisa.

PATRÍCIA – Eu te amo.

CORTA PARA:

CENA 02. COMPLEXO DO DESALENTO. CASA. SALA. INT. NOITE.

Açucena está assistindo televisão, enquanto Dandara verifica uns papéis sentada à uma mesa que está perto do sofá.

AÇUCENA – Fiquei sabendo que o Alberto vai reabrir o Centro. Isso é bom.

DANDARA – Sim, eu fui falar com o Jaguar, mãe.

AÇUCENA (ASSUSTADA) – Como é, Dandara?

DANDARA – Não sei o motivo do espanto, mãe. Eu precisava intervir. A senhora sabe muito bem que o Jaguar está querendo tomar conta da favela e alguém precisa pará-lo.

AÇUCENA – E você não é essa pessoa, minha filha. Já acho arriscado esse seu trabalho na ONG, falando das coisas que acontecem no Desalento. Isso é trabalho da polícia!

DANDARA (DEBOCHA) – Da polícia, mãe? Você acha mesmo que eles irão subir no Desalento para proteger as famílias que estão aqui? Boa parte deles são coniventes do que acontece no complexo. Já cansei de ver PMs subindo a favela e voltando com o sorriso de canto a outro, porque receberam propina dos traficantes.

AÇUCENA – Mas mexer com isso é perigoso, Dandara.

DANDARA – Não tenho medo de traficante, mãe. Tenho medo dos que moram lá embaixo, lá na cidade, porque eles são o real problema.

AÇUCENA – O que você falou para o Jaguar?

DANDARA – Eu pedi para que o centro fosse reaberto e ele aceitou, nada demais.

AÇUCENA – Algo que me diz que não foi só isso, Dandara. Cuidado, por favor, minha filha.

Dandara vai em direção a sua mãe e abraça e dá um beijo em sua bochecha.

DANDARA – Não precisa se preocupar, mãe. Estou lutando por cada morador do Desalento.

CORTA PARA:

CENA 03. RIO DE JANEIRO. BAIRRO DE JACAREPAGUÁ. NOITE.

SONOPLASTIA ON: MAL DE AMOR – TIM MAIA

As luzes dos postes dão o contraste da vida urbana. Na cena mostra diversas pessoas caminhando, outras brincando com seus filhos, enquanto os faróis dos carros tomam conta das avenidas. No alto, o contorno das montanhas entra em contraste com a luz da noite.

CORTA PARA:

CENA 04. APARTAMENTO DE LUXO. SALA DE JANTAR. INT. NOITE.

Há seis pessoas sentadas à mesa. Elas jantam tranquilamente.

MILTON – Olha só, não quero ver ninguém chegando tarde em casa, viu? Os seguranças vão estar com vocês, então, nada de gracinhas.

CARMEM – Isso mesmo. Ouçam o pai de vocês.

GUTO – Não esquenta, mãe. Nós só vamos para ver um pouco do baile, mas juro que voltaremos logo.

MILTON – Acho bom mesmo. Se perguntarem qualquer coisa, não digam o sobrenome de vocês, inventem, mas nunca fale o nome da nossa família, tranquilo?

CACAU – Pai, ninguém vai fazer nada contra a gente, tá? Fica tranquilo, por favor. O carro é blindado e os seguranças vão estar com a gente.

PITAYA – Falando nisso, já estamos atrasados.

Os três se levantam e se despedem dos pais.

AUZIRA – Esses meninos de hoje não tem jeito, né? Sair de casa para ir atrás de um baile funk?

CARMEM – Ah, Dona Auzira, mas sabemos bem que seu filho também não era flor que se cheire, hein? Eu vivia correndo atrás dele no barracão da União da Ilha.

MILTON – Mas que porra, sobrou pra mim?

AUZIRA – E você acha que eu não conheço essa criatura?

Carmem sente uma tontura e seu corpo pende para o lado, mas Milton levanta-se rápido e fica ao seu lado.

MILTON (PREOCUPADO) – Tá tudo bem, princesa?

CARMEM (PASSANDO A MÃO NO PEITO) – Não sei, uma angústia no peito, não sei explicar. Milton, por favor, não deixa nada acontecer com os nossos filhos.

MILTON – Não vai acontecer nada, tá bem? Os meninos estão muito bem protegidos.

Milton beija a testa de Carmem que o abraça fortemente.

ABERTURA

CENA 05. COMPLEXO DO DESALENTO. EXT. NOITE

Dois carros da polícia militar andam pelas ruas do Complexo. Moradores olham e cochicham entre si. Os policiais param o veículo e descem.

PEDRO – Temos que fazer o máximo possível para não entrar em confronto com ninguém, beleza?

Os outros policias assentem.

XAVIER – O que fazemos agora?

PEDRO – Vamos descer para o baile. Nada de levantar a arma para ninguém, eles vão estar armados com armamento pesado, então, não quero policial meu levando tiro de fuzil, entendidos?

POLICIAIS (CORO) – Sim, senhor!

Um barulho de som é ouvido ao norte do Complexo do Desalento. Alguns jovens passam pelos policiais.

XAVIER – Já sabemos pra onde ir.

CORTA PARA:

CENA 06. COMPLEXO DO DESALENTO. BAR DA GEANE. EXT. NOITE.

Geane observa os policiais subindo a ladeira e balança a cabeça negativamente.

GEANE – Vê se pode, Solange, os policiais resolveram baixar aqui bem no dia que tem baile. Pode ter certeza que isso não vai prestar.

Solange com um copo de cerveja na mão, observa os policiais.

SOLANGE – Mas vai ver que eles só vieram para conferir se tá tudo certinho, precisa ter medo não.

GEANE – Não estou com medo. Decretaram o toque de recolher, mas ninguém respeitou, sabe por quê? Porque essa comunidade virou uma verdadeira zona.

SOLANGE – Eu tô com medo, não vou mentir. O Jaguar vai surtar quando ficar sabendo que ninguém respeitou o toque de recolher.

GEANE – Mas veja só que bandido burro. Como que eles decretam toque de recolher, sendo que hoje tem baile? Olha, é cada coisa, hein?

Uma Hilux preta se aproxima em velocidade amena. Há em torno de cinco homens na carroceria portando metralhadoras e fuzis. Eles passam gritando e rindo.

GEANE (APREENSIVA) – Solange, vamos fechar o bar. Tô com um mal pressentimento.

Solange assente e adentra o bar e começa a falar com os clientes. Geane segura sua corrente com a imagem de Iemanjá.

GEANE – Por favor, Mãe, nos proteja.

CORTA PARA:

CENA 07. COMPLEXO DO DESALENTO. BAILE. INT. NOITE.

SONOPLASTIA ON: MC MARCINHO – RAP DO SOLITÁRIO

A música ecoa no ambiente. Pessoas dançando. É possível ver mãos levantadas no ritmo da música, em contraste, são vistas metralhadoras sendo estendidas. Pitaya, Cacau e Guto andam de mãos dadas.

PITAYA (GRITA) – Meu Deus, eu não consigo ver nada direito, a fumaça tá tomando conta.

GUTO (GRITA) – O importante é começar a sentir a batida da música e tá ótimo.

Guto pega Pitaya e Cacau para dançar. Eles começam a se envolver com a batida da música. Na parte superior do baile, Jaguar está sentado em um sofá com duas mulheres e seus capangas ao seu lado.

JAGUAR – Não quero saber de problema hoje. Já basta aquela vagabunda da Dandara ter atormentado meu juízo hoje. Tô pra brincadeira não.

PIABA – Calma, chefe.

JAGUAR – Calma é o caralho. O primeiro vacilão que buzinar meu ouvido vai levar no meio da testa pra geral ficar ligado.

Piaba percebe Guto, Pitaya e Cacau no centro da pista do baile. Ele arregala os olhos.

PIABA (ASSUSTADO) – Chefe, puta que pariu.

JAGUAR – Qual foi, mermão?

PIABA – Os filhos do Milton estão aqui.

JAGUAR – Quem porra é “Milton”?

PIABA – Milton, o bicheiro. Caralho.

JAGUAR (SURPRESO) – E por qual razão o Milton deixaria os filhos baixarem aqui? Você consegue ver se os moleques estão com seguranças.

PIABA (OLHA ATENTAMENTE)- Estou vendo dois homens grandes, provavelmente devem ser os seguranças.

JAGUAR – Menos mal! Faz o seguinte, não tira olho dos moleques. Não quero que aconteça nada com os filhos dele. (APRENSIVO)Se algo acontece com os filhos dele, vai todo mundo pra vala.

Jaguar apreensivo continua observando, enquanto a música estala de fundo.

CORTA PARA:

CENA 08. AVENIDAS DO RIO DE JANEIRO. NOITE.

Três viaturas do BOPE percorrem as avenidas do Rio de Janeiro em alta velocidade com as sirenes em aviso sua passagem. De dentro de uma das viaturas, Capitão Vasconcelos olha com ódio para a longa avenida.

CAP. VASCONCELOS – 03, quantos minutos até chegarmos no Desalento?

SOL. LUÍS – Cerca de dez minutos, senhor.

CAP. VASCONCELOS – Acelera essa porra.

O Soldado acelera o carro e começa a passar pelos carros que estão em sua frente.

CORTA PARA:

CENA 09. DELEGACIA. SALA. INT. NOITE.

O Delegado Miguel está sentado em sua cadeira de couro e olha para Patrícia que está com uma expressão séria.

MIGUEL – Bom, vamos começar. Primeiramente, como você está?

PATRÍCIA – Estou ótima, delegado. Será se podemos pular toda essa parte? Eu preciso dormir.

MIGUEL – Não posso te liberar sem antes colher o seu depoimento, Patrícia.

Miguel acena para o escrivão que fica apostos.

MIGUEL – Você em algum momento recebeu alguma ameaça?

PATRÍCIA (REVIRA OS OLHOS) – Delegado, vou ser sincera com o senhor, tá bem? O que aconteceu hoje não foi um atentado, mas sim, um verdadeiro susto. Eles não queriam me matar.

MIGUEL – Patrícia, entendo que esteja furiosa com a situação, mas eu sou o delegado aqui, ou seja, sou eu quem conduz esse depoimento.

PATRÍCIA – O senhor sabe que meu marido é capitão do Bope, não sabe? Se der uma olhada no meu carro, irá ver que ele está cheio de balas, mas não na parte da frente, somente atrás, logo não foi uma tentativa de assassinato.

Miguel observa Patrícia cautelosamente. Há um silêncio na sala.

MIGUEL – Pode sair.

PATRÍCIA – Obrigada.

Patrícia pega sua bolsa, abre a porta da sala e sai. Miguel está com o olhar apreensivo.

CORTA PARA:

CENA 10. DELEGACIA. EXT. NOITE.

Patrícia caminha até a rua e olha angustiada para os lados até que vê um táxi e o chama. Ela entra no veículo.

PATRÍCIA - Boa noite. Toca para o Desalento, por favor.

TAXISTA - Moça, não posso subir até o Desalento.

PATRÍCIA (SURPRESA) - O mais próximo que você conseguir me deixar, está ótimo. Pode cobrar mais caro, não tem problema.

O taxista olha pelo retrovisor e vê os olhos de Patrícia em desespero e balança a cabeça em afirmação.

CORTA PARA:

CENA 11. COMPLEXO DO DESALENTO. NOITE.

Policiais continuam subindo o complexo. Eles observam para todos os lados com cautela. A música vai ficando mais próxima deles.

CORTA PARA:

CENA 12. AVENIDAS DO RIO DE JANEIRO. NOITE.

O carro do BOPE continua cortando caminho pelo meio dos carros. O suor no rosto do Capitão Vasconcelos é visto. Ele engole seco.

CAP. VASCONCELOS - Mais rápido, porra!

O veículo ultrapassa um caminhão. É possível ver o complexo do Desalento no horizonte.

CORTA PARA:

CENA 13. COMPLEXO DO DESALENTO. BAILE. INT. NOITE.

SONOPLASTIA ON: VERMELHO - MC DALESTE

Pitaya, Guto e Cacau vão em direção ao bar, enquanto a música fica de fundo.

PITAYA - Não sei vocês, mas tô achando esse baile uma chatice, hein?

GUTO - Vou ter que concordar com a Pitaya, Cacau. Pensei que seria coisa de outro mundo, mas não tá legal.

CACAU - Calma, gente. Não é possível que vocês já querem ir embora, praticamente acabamos de chegar. Vamos fazer o seguinte, só mais cinco músicas.

GUTO - Depois vamos pra casa, tá? Não tô sentindo coisa boa.

CACAU - Isso porque você é um cagão, Guto. Está com medo de quê? Das armas? Você vê isso lá em casa todos os dias.

PITAYA - Acho que não se trata disso, Cacau.

GUTO - Só mais cinco músicas e vamos pra casa.

Cacau assente e ri. Ela vai em direção a pista e começa a dançar com um homem.

PITAYA (BALANÇANDO A CABEÇA NEGATIVAMENTE) - Ela não toma jeito. Se deixarmos ela fazer o que quiser, vamos para o limbo.

Guto continua olhando para a irmã que se diverte na pista.

CORTA PARA:

CENA 14. COMPLEXO DO DESALENTO. BAILE. EXT. NOITE.

Há uma intensa movimentação na entrada do baile. Homens com fuzis estão na frente fazendo a segurança. Os policiais chegam e vão em direção aos homens que fazem a guarnição.

MACAXEIRA - Qual foi, patrão? Vocês não podem entrar lá não.

Pedro que estava atrás do grupo de policiais, atravessa para falar com os traficantes.

PEDRO - Precisamos entrar. É uma ordem para verificar se não está acontecendo nada de errado aí dentro.

MACAXEIRA - Não posso deixar vocês entrarem. O combinado desde sempre é que os homi não passam daqui, tá ligado? Política da boa convivência, patrão.

Xavier toma a frente e vai em direção a Macaxeira. Eles ficam a centímetros de distancia.

XAVIER - Nós vamos entrar, entendeu? Acho bom você colaborar.

Piaba surge preocupado e intervém antes que algo pior aconteça.

PIABA - Posso saber o que tá acontecendo aqui?

MACAXEIRA - Os homi tão querendo entrar.

PIABA - O acordo não é esse, vocês tão ligados, né?

PEDRO - Se não está acontecendo nada lá dentro, não tem motivos para não permitirem nossa entrada.

PIABA - Beleza. Morô. Mas fiquem espertos, hein? Não temos medo de atirar em farda cinza não.

PEDRO (CONFRONTA) - Mas deveriam.

Eles se olham e confrontam com o olhar. Pedro e os demais policiais adentram o baile. Piaba e Macaxeira ficam olhando a entrada deles.

MACAXEIRA - Vai dar merda.

O olhar de Piaba está apreensivo.

CORTA PARA:

CENA 15. COMPLEXO DO DESALENTO. NOITE.

As viaturas do BOPE param na entrada do Complexo. Eles descem do veículo e colocam suas armas em suas mãos.

CAP. VASCONCELOS - Precisamos saber a real situação do que está acontecendo aqui hoje.

SOL. LUÍS - Aparentemente tudo tranquilo. Mas não eram para ter viaturas da polícia aqui?

CAP. VASCONCELOS (REVIRA OS OLHOS) - PM só faz merda. Vambora.

A equipe de operação do Capitão Vasconcelos acata a ordem e o seguem. Eles começam a subir o Complexo do Desalento.

CORTA PARA:

CENA 16. COMPLEXO DO DESALENTO. CASA. INT. NOITE.

Dandara está parada em frente a janela da sala. Ela observa o movimento da rua e vê o BOPE passando e estranha.

DANDARA - Estranho...

AÇUCENA - O quê minha filha?

DANDARA - O BOPE está subindo o Desalento. Isso não é um procedimento padrão. Com certeza vieram para amedontrar as famílias.

AÇUCENA - Será?

DANDARA - Todas as vezes que o BOPE sobe o morro, eles acabam deixando rastro de sangue.

Dandara fecha as cortinas da janela e vai em direção a porta. Ela tenta empurrar um móvel.

AÇUCENA - O que está fazendo?

DANDARA - Sem perguntas, mãe. Me ajuda aqui, por favor. Algo me diz que o Complexo hoje vai estar em chamas.

Açucena desesperada levanta-se do sofá e vai ajudar Dandara. Elas conseguem empurrar o móvel até a porta.

CORTA PARA:

CENA 17. COMPLEXO DO DESALENTO. NOITE.

O táxi para na entrada do Complexo do Desalento. Patrícia paga o taxista e desce do veículo.

TAXISTA - Moça, toma cuidado, por favor.

PATRÍCIA - Pode deixar. Obrigada!

O taxista assente e dá a ré com o carro e sai cortando pneu. Patrícia olha a imensidão do Complexo, respira fundo e começa a caminhar.

CORTA PARA:

CENA 18. CASA. QUARTO. INT. NOITE.

O prefeito Lopes está sentado na ponta da cama com a cabeça baixa. Sua esposa (45) de camisola surge e vai em sua direção. Ela senta-se no chão ao lado do marido.

LUCÍLIA - O que foi, meu amor?

PREF. LOPES - Lucília, eu vou ter que renunciar o cargo.

LUCÍLIA (SURPRESA)- Mas que brincadeira sem graça é essa?

PREF. LOPES (GRITA) - Não é brincadeira, Lucília! Você tem noção o que aconteceu comigo hoje?

O prefeito Lopes levanta-se e fica desesperado.

PREF. LOPES - Mandaram um crânio carbonizado em uma caixa pra mim como aviso.

LUCÍLIA (PERPLEXA) - Você tem que denunciar, Lopes. Isso não pode acontecer! É um crime grave, ainda mais você sendo o prefeito.

PREF. LOPES - Eles estão tentando me intimidar de todas as formas, não sei o que fazer mais.

LUCÍLIA - Você acha que é algum traficante?

PREF. LOPES (RI) - Traficante, Lucília? Isso é gente poderosa que não aceita que não passei para o lado deles e nem deixei eles fazerem o que queriam.

LUCÍLIA (VAI EM DIREÇÃO AO MARIDO)- E o que você vai fazer? Tem certeza que quer desistir?

PREF. LOPES - Meu medo é continuar e respingar em você ou no Enzo.

Lucília toca no rosto do marido e olha em seus olhos

LUCÍLIA - Não se preocupe com a gente. O que importa é o exemplo que você vai dar ao seu filho. Ele merece ter um pai que tenha coragem e enfrente os desafios de perto. Eu entendo que isso pode ser angustiante agora, mas vamos passar por isso juntos. Não deixe jamais que o medo vença, entendeu? Vamos ficar bem.

PREF. LOPES (RESPIRA FUNDO) - Não sei o que eu faria sem você.

LUCÍLIA - Vamos traçar a melhor estratégia, tá bem?

PREF. LOPES - Vou fazer uma coletiva de imprensa e vou anunciar o que fizeram comigo, não posso confiar na polícia, com certeza vai ter gente infiltrada lá e querendo barrar qualquer tipo de investigação.

LUCÍLIA - Eu tenho muito orgulho de quem você é, meu amor.

Eles se beijam levemente.

CORTA PARA:

CENA 19. COMPLEXO DO DESALENTO. NOITE.

SONOPLASTIA ON: HEAVEN AND HELL - BLACK SABBATH

O BOPE começa a entrar em vielas e se camuflar ao local. Eles analisam tudo com cautela. O Capitão Vasconcelos toma a frente e faz um gesto para os soldados seguirem.

Eles sobem uma escadaria que dá acesso para um pequeno parque. No local, há três homens armados com metralhadoras sentados em um banco cheirando pó.

Capitão Vasconcelos faz um sinal com a mão e em contagem regressiva eles vão para cima dos homens. Eles atiram em dois e deixam apenas um vivo que se jogou no chão.

CAP. VASCONCELOS (GRITA) - Perdeu, filho da puta. Se reagir vou dar um tiro de doze no meio da sua testa, seu arrombado.

O homem protege a cabeça com os dois braços.

Capitão Vasconcelos puxa o homem pela blusa e o coloca ajoelhado.

CAP. VASCONCELOS - Quem fornece essa merda para vocês? (APONTA PARA A COCAÍNA)

HOMEM - Eu só arrumei, chefe.

CAP. VASCONCELOS (DEBOCHA)- Só arrumou? Então das duas uma, ou você é o traficante dono do morro, ou você trabalha pra alguém, quem é o seu chefe?

HOMEM - Sei de nada não, chefe.

O Capitão Vasconcelos dá um tapa na cara do homem que o olha.

CAP. VASCONCELOS - Coloca ele no saco.

O soldado Luís pega um saco plástico no bolso e coloca na cabeça do homem. Eles começam a asfixiar.

CAP. VASCONCELOS (GRITA) - Se tiver culhão de verdade, vai me falar agora quem é o filho da puta que tá financiando toda essa merda.

Os soldados do BOPE apertam o saco fortemente. Sangue começa a escorrer da boca do homem. Eles tiram e o traficante dá uma respirada profunda.

CAP. VASCONCELOS - Vai me dizer, ou vai precisar que eu enfie aquele cabo de vassoura em você?

O homem assustado, respira de forma ofegante e puxa forças para falar algo.

HOMEM (OFEGANTE) - É... É o Jaguar... Ele está no baile.

CAP. VASCONCELOS - É assim que eu gosto. Levem ele.

CORTA PARA:

CENA 20. AEROPORTO INTERNACIONAL DO RIO DE JANEIRO. INT. NOITE.

SONOPLASTIA ON: BRASIL – GAL COSTA

Há movimentação de pessoas com malas. Uma mulher branca (60) está trajada com uma roupa elegante e uma bolsa ao seu lado. Seu olhar é penetrante. Ela vai de encontro com um homem de terno que segura uma placa “VICTORIA AGOSTINI

FELÍCIO – Senhora Victoria, a sua irmã pediu para que eu viesse te buscar.

VICTORIA (REVIRA OS OLHOS) – Ainda bem. Não posso nem imaginar em botar meus pés em um táxi no Rio de Janeiro, tenho amor a minha vida, afinal não se pode confiar em qualquer um, né? Vai que um desses motoristas é aliado ao tráfico e resolve me sequestrar. Nossa, mas eu morro se eu pisar meus pés em uma favela. (ELA SUSPIRA) Sabia que lá nos Estados Unidos sempre tem noticias falando sobre sequestros relâmpagos aqui no Brasil? (ELA RI EM DEBOCHE) Não sei como vocês chamam essa cidade de maravilhosa.

FELÍCIO (T) - Vou pegar as suas malas para irmos.

Victoria não responde e Felício pega as malas. Ela olha em direção a um banner que está escrito “RIO DE JANEIRO 40 GRAUS”. CLOSE NELE.

CORTA PARA:

CENA 21. MANSÃO AGOSTINI. SALA. INT. NOITE.

Felício abre a porta principal da sala e carrega suas malas. Isis está sentada em um sofá cor de rosa que ocupa boa parte do ambiente. Atrás do móvel, há um buffet com algumas garrafas de vinho. Victoria entra e Isis entusiasmada vai abraça-la.

ISIS (OLHA NOS OLHOS DE VICTORIA) – Minha irmã! Até que enfim você chegou. Comentei com a Alice e ela desacreditou quando eu disse que você realmente viria.

VICTORIA – Bom, sua filha parece ser a única lúcida da história, não é? (RISOS). (T) Nossa, mas como pode o Rio de Janeiro feder tanto?

Victoria vai até o buffet, pega um copo e uma garrafa de vinho e serve-se.

ISIS – Felício, pode subir com as malas da Victoria.

Felício assente e sobe as escadas com as malas.

ISIS – Mas me conta, como foi a viagem?

VICTORIA (ELA SENTA-SE NO SOFÁ)– Ah, foi um verdadeiro tormento. Acredita que não existia um voo sequer com conexão direta pra cá? Eu tive que parar em Brasília, esperei seis horas no aeroporto, porque parece que realmente nada funciona nesse país, logo em seguida, tive que esperar as minhas malas serem despachadas. Esse país tem um problema grave com entregas.

Isis também senta-se no sofá e observa a irmã.

VICTORIA – Você tem que agradecer muito a sua filha por eu ter vindo, se não fosse esse bendito casamento... (RESPIRA FUNDO) Ai, nem sei. Estou cansada e só quero tomar um bom banho quente e quem sabe ficar bêbada com um bom copo de vinho francês.

ISIS – O seu quarto já está preparado. Pedi que a camareira fosse cuidadosa.

VICTORIA (RECLAMA) – Como pode o Rio de Janeiro ter tanto turista, né? Cada lugar aqui fede a lixo, a pobre, nossa, realmente insustentável, Isis. Você deveria vir morar comigo no Hamptons, se bem que agora, parece que a gentalha dos Estados Unidos resolveu achar que tem dinheiro e começaram a alugar hotéis perto. Qualquer dia, eu me mudo. Enfim, vou dormir.

Isis ri e Victoria beija a testa da irmã e coloca o copo do drink no porta-copos em cima da mesa de centro. Ela começa a subir as escadas e Felício desce.

CORTA PARA:

CENA 22. COMPLEXO DO DESALENTO. BAILE. INT. NOITE.

Os policiais observam tudo com cautela. A música estala cada vez mais. Os fuzis anteriormente levantados, agora não aparecem. Jaguar de cima observa tudo.

JAGUAR – Se esses filhos da puta pensam que vão fazer o que querem na minha favela, estão enganados.

Jaguar dispara tiros e os policiais se armam prontamente. As pessoas começam a correr em direção a porta. Pedro observa o traficante que o olha de cima furioso.

PEDRO (GRITA PARA OS POLICIAIS) – Baixem as armas.

Os policiais assentem.

CENA 23. COMPLEXO DO DESALENTO. BECOS. NOITE.

O BOPE continua subindo os becos. Eles estão fortemente armados. Há uma tensão no ar. Capitão Vasconcelos está com um Fuzil T4 em mãos. O suor desce de sua testa. Ele ouve alguns gritos e vai em direção ao som.

CAP. VASCONCELOS (GRITA) – VAMBORA, PORRA!

CENA 24. COMPLEXO DO DESALENTO. CASA. INT. NOITE.

Dandara está com um terço em mãos e faz uma oração. Açucena está de joelhos também em oração.

DANDARA(PREOCUPADA) – Mãe, eu sinto que vai ter muito sangue derramado no complexo.

AÇUCENA – Minha filha, vamos orar para Deus e pedir a ele que proteja essa favela hoje.

Dandara vai em direção a janela e observa o movimento. Seu olhar é de aflição e apreensão.

CENA 25. COMPLEXO DO DESALENTO. BAILE. INT. NOITE.

O local está um caos. Há gritos e pessoas tentando sair, mas a porta é pequena. Há pessoas caídas no chão. Pedro sobe até o andar de cima e fica cara a cara com Jaguar.

JAGUAR – Quem é tu pra entrar no meu baile e amedrontar o povo de bem?

PEDRO – Povo de bem? Esses favelados aqui todos estão no lugar errado. Acha mesmo que são povo de bem?

JAGUAR – Já vi que o mauricinho metido a policial se acha especial, né? Cê pensa que é quem? (SE APROXIMA DE PEDRO) Você não passa de uma carniça que acha que é bom em algo, mas na verdade, eu mando em você, meu parceiro.

PEDRO (RI ALTO) – Escute bem o que eu vou dizer, pode anotar, eu vou dar um tiro bem no meio da sua testa, vai ser de doze que é para ninguém reconhecer...

Um tiro é disparado. Jaguar arregala os olhos. Close em Hércules que está segurando um revólver. Ele sorri de canto de boca.

HÉRCULES (GRITA) – VOLTEI, CARALHO!

A imagem congela no rosto de Hércules

FIM DO CAPÍTULO 02


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