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Débora - Capítulo 23


Débora
CAPÍTULO 23

uma novela de
FELIPE LIMA BORGES

escrita por
FELIPE LIMA BORGES

baseada nos capítulos 3 a 5 do livro de Juízes

 No capítulo anterior: Débora diz a Lapidote que ouviu a voz e ela parecia estar no quarto. Adélia fala à irmã Laila sobre a loja e, para convencê-la, diz que muitos moços podem vir ali, o que facilitaria elas arranjarem um casamento; Laila diz que pensará na ideia. Na cama, Hanna pede a ajuda de Sísera com suas dívidas, e ele diz que conversarão sobre isso depois. Débora conta para Aliã sobre seus sonhos e a voz, e o ancião, além de revelar alegria ao imaginá-la em um cargo de destaque na nação, recomenda que ela busque ao Senhor e tente usar seu dom para ouvir qual é a vontade de Deus para ela. Sísera pergunta a Jabim se o projeto com as crianças não é uma tarefa arriscada, vide que crias são o que motivam qualquer ser vivo. Jabim diz que Sísera é o Capitão e o manda garantir o sucesso do projeto sem atrasos. Débora vai até a palmeira e ora a Deus pedindo para que Ele a faça entender qual é a Sua vontade para a vida dela. Depois ela declama uma poesia melancólica, ao que é flagrada por um soldado. Esse a provoca sobre a existência de Deus e ainda a agride dizendo que Deus não foi rápido o suficiente para protege-la. Quando vai embora, Débora encontra sua prima Isabel, que reclama do marido Éder. Uma mulher com seu filho as encontra e implora a Débora que descubra qual é a enfermidade do menino. Débora segura o pequeno e ora. Por fim diz que ele tem uma grave enfermidade no sangue e que se ela, com fé, fizer um chá com o mato recolhido ali perto e der ao filho, a enfermidade sairá de vez. Apesar de estranhar, a mulher confia e vai embora. Jaziel, Éder e outros trabalhadores falam sobre o desaparecimento de crianças. Então todos avistam uma fumaça escura atrás dos morros e Jaziel desconfia ser em um vilarejo. Ao visitar uma obra, Sísera flagra um trabalhador hebreu tentando fugir para procurar seu filho, que ele desconfia estar em posse dos hazoritas. Furioso, Sísera bate no homem até encher as mãos de sangue e manda os soldados queimarem o corpo; Sísera vai embora dali.
FADE IN:

CENA 1: EXT. PALÁCIO – FRENTE – DIA
Um grupo de 5 moças é guiado por um servo da rua até a imponente entrada do palácio de Hazor. Todas estão impressionadas com as altas paredes, os adornos e o grande portão, mas uma delas, de olhar mais seguro, se limita a uma breve observação com um sutil brilho de desprezo.
SERVO
Esperem aqui.
As moças param e o servo se aproxima dos guardas do portão. Enquanto as 4 se mexem e se entreolham apreensivas, a outra permanece estática.

CENA 2: FLASHBACK: INT. CASA DE NAJARA – SALA – DIA
Na antiga casa de Najara, onde ela está comendo, entra o Capitão SÍSERA (35 anos) apressado.
SÍSERA
Mãe! Mãe, a senhora não vai acreditar!
NAJARA
O quê? Notícia boa ou ruim?
SÍSERA
Eu a encontrei. Depois de todos esses anos finalmente descobri o paradeiro de Nira.
Najara para de comer na mesma hora e encara Sísera.
Pouco depois, eles saem apressados de casa.

CENA 3: EXT. PALÁCIO – FRENTE – DIA
Mediante a autorização dos guardas e a abertura do portão, o servo faz sinal para as moças e todas adentram o palácio. Enquanto os olhos das 4 brilham, a moça diferente permanece aparentemente focada.
Caminham pelos pátios...

CENA 4: FLASHBACK: INT. DESERTO - CASA DE NIRA – DIA
No meio do nada, com apenas algumas poucas vegetações no fundo - onde há também um poço -, há uma pequena casa sem adorno algum.
Dentro, NIRA (38 anos) olha pela janela com os olhos arregalados. Vê um cavalo puxando um carro de ferro onde estão Sísera, conduzindo, e Najara.
NIRA
Não é possível!...
DARDA
O que a senhora está vendo, mamãe?
Nira não esboça reação. DARDA (10 anos) continua sentada no chão com os seus brinquedos.
DARDA
Mãe?
Nira finalmente sai da janela e olha para a filha. Aproxima-se rapidamente.
NIRA
Darda, minha filha, a mãe precisa que você faça uma coisa. Uma coisa muito importante.
DARDA
O quê?...
NIRA
A mamãe precisa que você corra daqui o mais rápido que puder. Fuja. Vá para o oásis depois da duna e se esconda lá. Espere um tempo e então corra para as cidades, para os vilarejos, e peça ajuda de alguém.
DARDA
Mas por quê, mãe? A senhora não vem comigo?
Nira olha para a direção da janela e, aflita, de volta para a filha.
NIRA
Não... Não poderei estar com você, minha filha... Você vai precisar se virar. Vai precisar cuidar de você até que alguém faça isso por mim.
O som dos cascos do cavalo aumentam.
DARDA
Mas mãe, por--
NIRA
(interrompendo) Filha, apenas me ouça. Quando você crescer e for uma moça, quero que vá atrás de Najara e Sísera, o Capitão do reino de Hazor. Guarde bem esses nomes, Darda. Najara e seu filho Sísera, o Capitão. Quais são os nomes?!
DARDA
Najara... e Sísera... o Capitão.
NIRA
Isso, filha. Quando for moça, vá atrás deles e vingue o sangue de seu pai e de sua mãe. Você precisa fazer isso, Darda. Foi essa mulher quem matou o seu pai. Destrua toda a família dela, Darda. Faça vingança e honre o sangue do seu pai e o meu.
Darda começa a chorar.
NIRA
Jure, minha filha! Jure, Darda, que você nos vingará e acabará com Najara e Sísera!
Darda chora...
NIRA
Jure!
DARDA
Eu juro!...
NIRA
Ótimo! Agora vá! Corra! Vamos, Darda, corra! Para o oásis! Vai!!!
Darda pula no pescoço da mãe e a abraça. Nira, desesperada, deixa lágrimas de angústia escorrerem pelo seu rosto. Mas logo solta a filha e a empurra.
NIRA
VAI!!! CORRA!!!
Darda corre para a porta e dispara pela areia. Do outro lado, o carro de ferro chega ao fundo da casa e para. Ali dentro, Nira já espera pelo pior. Najara e Sísera descem e, com cuidado e olhando pelas janelas, se aproximam da porta de entrada. Ele segura sua espada e ela o seu punhal. Lá adiante, temendo ser vista, Darda se joga na areia e espera as duas figuras entrarem em casa.
Quando ela vê que eles entraram, se levanta e corre desesperada.
Dentro de casa, Nira encara os recém-chegados, que a olham com um leve sorriso no rosto.

CENA 5: INT. PALÁCIO – CORREDORES – DIA
DARDA (20 anos) caminha obstinada entre as moças, que seguem o servo. Viram de corredor em corredor e as 4 se encantam a todo instante. Darda, por sua vez, tem o foco à sua frente.

CENA 6: FLASHBACK: INT. DESERRTO - CASA DE NIRA – DIA
Najara se aproxima devagar de Nira.
NAJARA
Finalmente eu te achei, vagabunda...
Nira apenas a encara.
NAJARA
Pensou que escaparia? Que se deitaria com o meu marido, desonraria o meu casamento e sairia impune?
NIRA
Junto com o amor da minha vida enganei o idiota do seu marido e você também. Para a mãe do Capitão, a senhora demorou muito para encontrar uma simples plebeia, hein...
Com raiva, Sísera avança contra Nira, mas Najara o interrompe.
NAJARA
Não, Sísera. Ela é minha.
Najara, segurando seu punhal, avança em Nira e aperta seu pescoço.
NAJARA
Você fala demais para uma cobra do deserto.
Nira tenta respirar, mas a mão de Najara é firme em seu pescoço.
NIRA
(com dificuldade) Velha... desgraçada... Espero... que morra... agonizando...
Furiosa, Najara finca o punhal em Nira, que tosse... Tosse até amolecer e desabar no chão.
Najara observa o corpo com desprezo no olhar. Cospe e sai dali; Sísera a segue.

CENA 7: FLASHBACK: EXT. DESERTO – CASA – DIA
Najara e Sísera saem de casa.
SÍSERA
Ela tem um filho. Ou filha. Os brinquedos...
NAJARA
Deve ter fugido. Não vai aguentar muito tempo no deserto, é apenas uma criança. (olha para Sísera) Estou satisfeita, meu filho. Cumpri minha missão, matei aquela canalha. Agora estou em paz. Vamos embora.
Eles voltam para o carro de ferro.

CENA 8: FLASHBACK: EXT. DESERTO – OÁSIS – DIA
Não muito longe dali, do outro lado de uma duna de areia, há um oásis verde com um lago cristalino no centro.
Enfiada em um buraco embaixo de uma árvore caída, a pequena Darda chora copiosamente de pavor e tristeza.

CENA 9: INT. DESERTO – CORREDOR – DIA
O servo leva as moças até uma grande porta de madeira nobre, onde um guarda faz a segurança. Darda observa os detalhes da porta.
SERVO
(para a guarda) Trago comigo as candidatas à nova serva da senhora Najara.
GUARDA
Entrem.
O guarda abre a porta.
DARDA
(murmurando) Finalmente chegou a hora.
Os olhos das moças brilham diante da casa do Capitão.
DARDA
(murmurando) Vingarei a senhora e o pai, mamãe. Najara e Sísera pagarão caro pelo que nos fizeram.
SERVO
Disse alguma coisa, moça?
DARDA
Não... Só estou encantada... É muito luxo...
SERVO
Contenha-se. Vamos, entrem.
Darda, só agora com um genuíno brilho no ar, segue as moças e entra.



CENA 10: INT. SAPATARIA DE LAPIDOTE – DIA
Débora chega ali.
LAPIDOTE
Meu amor...
DÉBORA
Shalom.
Eles trocam um beijo.
LAPIDOTE
E então? Foi ao templo? Falou com o ancião?
DÉBORA
Sim, falei. Aliã me recomendou a tentar usar o dom que tenho e que uso para ajudar o povo... e a buscar ao Senhor. Fui até a palmeira orar... mas ainda não senti nenhuma resposta da parte do Senhor.
LAPIDOTE
Continue a buscar, meu amor. Eu vou te ajudar em oração também.
DÉBORA
(sorrindo) Obrigada. Porém... eu preciso te contar uma coisa, Lapidote.
LAPIDOTE
Pode dizer...
DÉBORA
A verdade... é que eu sinto que a minha missão... seja lá qual for... não é aqui.
Ele franze a testa.
LAPIDOTE
E por “aqui” você quer dizer Betel?...
DÉBORA
Sim.
LAPIDOTE
E isso.. foi Deus quem colocou em seu coração?
DÉBORA
Não. Não foi. É a minha mente tentando entender tudo o que está acontecendo...
LAPIDOTE
Mas por que não aqui, Débora?
Antes que ela possa responder, a mulher que buscou Débora no campo chega ali.
MULHER
Shalom! Com licença!...
LAPIDOTE
(levantando) Shalom! Claro, entre, senhora.
MULHER
(emocionada) Eu só gostaria de agradecer à sua esposa, senhor Lapidote. Orei ao Senhor, fiz o chá e dei ao meu filho... (chorando) Ele disse que a dor passou na hora!...
Débora sorri, se aproxima e a abraça.
MULHER
Obrigada, senhora! Obrigada!
DÉBORA
Agradeça ao Senhor. Foi Ele quem salvou o seu menino.
MULHER
A senhora... verdadeiramente tem o dom de Deus.
DÉBORA
Obrigada.
MULHER
Vou indo... Preciso anunciar a todos essa maravilha! Shalom!
DÉBORA, LAPIDOTE
Shalom!
A mulher vai embora. Débora, emocionada, encara a rua. Lapidote se aproxima e fica de frente para ela.
LAPIDOTE
E ainda acha que a sua missão não é aqui?
Débora respira fundo, não sabe o que dizer.
LAPIDOTE
Isso está crescendo... Muitos já sabem sobre o seu dom, meu amor.
Débora olha do marido para a rua. Fica pensativa...

CENA 11: EXT. BETEL – PRAÇA – DIA
Caminhando pela praça, Isabel escuta a voz de Adélia por ali anunciando seus doces e bolos.
ADÉLIA
Doces de tâmaras, cremes de uva, bolos de mel! Olha o doce! Receita da Adélia! O único com uma pitadinha de amor! Olha o doce! Bolos! Cremes!
Apesar da voz alta, Isabel não consegue encontrar Adélia por conta do número de pessoas andando para lá e para cá. Vai para um lado, para o outro... E a voz de Adélia continua.
De repente, quando Isabel vira, trompa em Adélia e o cesto com os produtos, que não estava preso ao pescoço, cai.
ISABEL, ADÉLIA
Ai!
ISABEL
Meu Deus!
Chateada, Adélia encara suas coisas no chão.
ADÉLIA
Isso que dá querer aliviar a nuca!
ISABEL
Por favor, me desculpe, moça! Não foi minha intenção, eu não fiz por mal! Me desculpe!
ADÉLIA
Sempre pensei que meus bolos e doces um dia iam cair por causa dos meus dedos nervosos, mas acabou que nem mesmo fui eu...
ISABEL
(recolhendo tudo) Não se preocupe, eu lhe pagarei o valor de tudo que tiver estragado.
ADÉLIA
Não... Não, não. Você é que não deve se preocupar. Meus doces são feitos para espantar tudo de ruim que estivermos sentindo. São feitos para a gente ficar bem e ter um dia bom.
Isabel segura o cesto com os doces que recolheu.
ADÉLIA
Eu vou comer um e ficarei bem, você vai ver.
ISABEL
Mas aí ficará no prejuízo...
ADÉLIA
Não há prejuízo algum em meu dia ficar melhor.
Isabel então pega um dos doces e oferece a Adélia.
ADÉLIA
Não, não, esse não. Esse é pra quando a mãe, nervosa, dá uns berros e a gente fica querendo ter raiva. Descobri essa receita quando minha saudosa mãezinha soltou os cães pra cima de mim. (rindo) Até as panelas de barro voaram na minha cabeça... Bons tempos. Que minha mãezinha descanse em paz.
Estranhando, Isabel pega outro doce e oferece.
ISABEL
Esse?
ADÉLIA
(com um olhar peralta) Não, esse também não, senhora. Esse é para aqueles nossos dias, sabe? A senhora é mulher, eu também... Tudo bem que ainda sou moça e a senhora casada, mas todas nós passamos por aqueles dias. E garanto que uma mordida nisso aqui alivia tudo. As mulheres amam! Só não adoram porque adorar é só a Deus, não é, senhora? Mas elas são loucas por esse! Eu já até sei quando cada cliente vem buscar. E elas levam aos montes! É um sucesso!
Isabel devolve o doce ao cesto e Adélia pega o correto; come.
ADÉLIA
Hummm... Não é porque fui eu que fiz não, mas... que negócio gostoso!!!
ISABEL
Você está melhor?...
ADÉLIA
Nem me lembro do que aconteceu!!!
ISABEL
Bom, então me dê um desse, por favor...
Adélia pega outro e dá a Isabel.
ADÉLIA
Esse a senhora não precisa pagar. Pode levar. (sorrindo) É cortesia. Gostei da senhora. Mas só dessa vez, hein... (ri) Preciso de dinheiro... A senhora sabe como é. Os hazoritas já pegam quase tudo...
ISABEL
Bem... Muito obrigada, Adélia.
ADÉLIA
Tenha um bom dia, senhora. Shalom!
ISABEL
Shalom...
Adélia então sai por entre a multidão anunciando seus produtos. Isabel fica ali. Morde o doce e, impressionada, saboreia.

CENA 12: INT. FORTALEZA – CORREDOR – DIA
A Fortaleza trata-se de uma comprida edificação no meio do deserto. Seus muros altos são vigiados todo o tempo por dezenas de soldados.
Sísera deixa na entrada seus homens que o escoltam e toma o corredor até o fim, onde há uma grade. Um soldado a destranca, abre e ele passa. A partir dali, ao longo de toda a extensão, há várias portas dos dois lados do corredor.
Logo à frente há um homem esperando por Sísera. Ele é alto, seus músculos são grandes e definidos e seu cabelo é curtíssimo. Porém seu rosto não é de todo visível, já que uma máscara branca cobre sua boca e nariz, parte do rosto, as orelhas e é presa atrás da cabeça. De perto nota-se que não trata-se de uma máscara de pano, mas algo mais sólido e volumoso, talvez um material que outrora fosse uma massa, e que secou. O que ninguém entende é como ele respira com aquilo. Suas vestes não são de um soldado, tampouco de um guerreiro, já que não carrega espada alguma. Está mais para um lutador cuja arma é seu próprio corpo. Seu nome é BOGOTAI (45 anos).
SÍSERA
(chegando ali) Primeiro Oficial.
BOGOTAI
(fazendo uma reverência com a cabeça) Meu Capitão.
SÍSERA
Bogotai, como estão as coisas por aqui?
BOGOTAI
Tudo anda conforme o planejado e o previsto, senhor. 8 de cada 10 vermezinhos hebreus estão se mostrando aptos e, portanto, valiosos. Servirão bem ao reino.
Sísera faz que sim e abre a porta ao lado deles. Ali dentro, uma pequena cela, pouco mais de uma dezena de meninos olham para eles amuados e tristes.
SÍSERA
Estes são os reprovados?
BOGOTAI
(soturno) Sim. (pequena pausa) Terminarei com eles.
Sísera faz que sim.
SÍSERA
Pois então faça.
BOGOTAI
Obrigado pela oportunidade, Capitão.
Sísera dá um sorriso mínimo para Bogotai, que entra devagar na cela. A última coisa que Sísera vê antes da porta se fechar vagarosamente são os olhares de temor das crianças diante da presença de Bogotai.
Sísera vai embora.

CENA 13: INT. SAPATARIA DE LAPIDOTE – DIA
Mais tarde, no final do dia...
Débora e Lapidote estão mexendo no conserto de sapatos.
DÉBORA
(rindo) Estou fazendo certo?
Lapidote olha.
LAPIDOTE
Uau... Sim! É só dar uma arrumadinha nesse lado... isso, um pouco mais pra cá... Perfeito.
Eles sorriem um para o outro, se abraçam e trocam um beijo.
LAPIDOTE
Você se daria bem como sapateira, hein...
DÉBORA
(sorrindo) Prometo pensar nisso.
Lapidote ri e Jaziel chega ali.
JAZIEL
Shalom!
LAPIDOTE
Shalom.
DÉBORA
Shalom, Jaziel. E esse semblante, o que quer tanto dizer?
JAZIEL
É, você acertou, Débora. Quero muito dizer mesmo, porque o que eu vi me deixou preocupado.
LAPIDOTE
Do que está falando?
JAZIEL
Hoje, mais cedo... Lá no campo... Nós vimos uma grande fumaça escura saindo de trás dos morros, para aquele lado.
DÉBORA
Fumaça escura?!
JAZIEL
Sim... Os hazoritas não deixaram nem conversamos direito sobre isso. Mas eu tenho certeza de que foi coisa deles. O que me deixou preocupado foi a possibilidade de ser naquele vilarejo, o mais próximo daqui. A leste.
DÉBORA
Meu Senhor...
JAZIEL
Eu vim para pedir a vocês que me acompanhem nessa noite. Pretendo ir até lá averiguar o que aconteceu.
LAPIDOTE
Ir até lá, Jaziel?! O portão é vigiado! Trancado e vigiado...
JAZIEL
É só usarmos a passagem secreta no muro que a Débora e eu usamos todos os dias para treinarmos antes do amanhecer.
LAPIDOTE
Ah!... Claro...
DÉBORA
Achei que você não queria mais saber de nada disso, Jaziel. Pensei que queria ir embora de Betel.
JAZIEL
É... Eu quero mesmo sair em viagem, mas... Tenho conhecidos naquele vilarejo. Preciso muito ir ver o que aconteceu, se estão bem...
Débora e Lapidote respiram fundo.
DÉBORA
Muito bem. Vamos até lá na madrugada, antes do amanhecer.
Jaziel, contente, faz que sim, mas Lapidote fica preocupado.

CENA 14: INT. PALÁCIO – SALA DO TRONO – PÔR DO SOL
Sísera fala com Jabim, esse sentado em seu trono.
SÍSERA
O método de Bogotai está sendo muito sujo, meu senhor. É muito trabalhoso limpar tudo depois... Acredito que o Primeiro Oficial seria mais útil em campo. Ele coloca mesmo medo e terror nos hebreus.
JABIM
(rindo) Em qualquer um.
Sísera faz que sim sorrindo.
JABIM
Mas então o que sugere para a Fortaleza, Capitão?
SÍSERA
Talvez possamos colocar mulheres para administrarem.
JABIM
Mulheres?! Eu ouvi bem?! O que deu em você, Sísera?!
SÍSERA
Escravas hebreias serão mais discretas com o projeto, meu senhor.
JABIM
Elas podem é piorar tudo! Espalhar a notícia entre os seus!
SÍSERA
Basta que as coloquemos trabalhando e morando na Fortaleza. Viverão separadas de suas famílias e amigos. Jamais terão chance de contar o que fazem lá.
Jabim sorri, ele gostou...
JABIM
Pois execute isso imediatamente.
SÍSERA
(reverenciando) Como queira, meu senhor.
Sísera sai.    

CENA 15: INT. CASA DE ÉDER – SALA – DIA
Enquanto prepara a comida, Isabel ouve Éder, de pé, reclamando. Seu filho MIREU (17 anos) ouve, impaciente, o falatório do pai.
ÉDER
Não dá pra ficar tranquilo, a gente não pode mais se dar a esse luxo! O mal, o perigo está em todos os lugares! Nos galhos de uma árvore, na porta de casa, nas ruas! Mireu precisa entender isso! Colocar na cabeça que somos escravos e não valemos nada para esses malditos hazoritas! Não dá pra viver solto por aí desse jeito!
MIREU
Eu já sou bem grande, pai. Não vou sacrificar meus passeios com a Laila por causa dos hazoritas. Já tiram tudo de nós! Isso não deixarei me tirarem.
ÉDER
Quem é essa Laila?
ISABEL
Irmã da Adélia, a doceira.
ÉDER
Ê povo que gosta de andar...
ISABEL
Qual é o problema, Éder?
ÉDER
Você não me escuta, Isabel?! Não houve o que estão dizendo?!
ISABEL
Os supostos sequestros de que estão falando, se estiverem mesmo acontecendo, são distantes, lá para as fronteiras do norte. E são crianças os desaparecidos. Mireu é um rapaz, Éder. Praticamente um homem!
MIREU
É o que estou tentando dizer!
ÉDER
Palavra de homem de verdade não vale mais nada, mesmo. Mulher e filho querendo saber mais que o pai! Francamente...
Inconformado, Éder balança a cabeça negativamente.
MIREU
Eu sei me defender, pai.
ÉDER
E não está certo esse negócio de muita amizade com mulher. Já conheci gente assim... Não é bom!
MIREU
Bem, com licença.
ÉDER
Onde você vai?
Mireu respira fundo.
MIREU
Ver minha amiga.
Éder aperta as têmporas com as pontas dos dedos.
ÉDER
Tome cuidado. Se algum hazorita quiser te prender sem motivos, grite e corra.
Mireu revira os olhos.
MIREU
Shalom.
ISABEL, ÉDER
Shalom.
ISABEL
Até parece que isso salvaria alguém de ser preso.
ÉDER
Exato, Isabel! É por isso mesmo que não tem que ficar saindo por aí, principalmente se for à noite!
Isabel, pensando em algo, engole em seco e olha para o marido.
ISABEL
Aquele negócio que você disse de amizade entre homem e mulher.. de você ter conhecido gente daquele jeito... Minha prima, não é? Se referiu à Debora, não foi?
Éder parece gaguejar.
ÉDER
Que Débora o quê!...
E vai embora. Ao bater a porta, Isabel fica ali, sozinha, pensativa e um tanto incomodada.

CENA 16: INT. PALÁCIO – CASA – DIA
Sísera chega em casa e dá de cara com Najara avaliando com o olhar cada uma das moças candidatas à serva.
SÍSERA
Quem são essas?...
Elas ficam um tanto apreensivas com a presença do Capitão... Menos Darda, que aguça os sentidos, apesar de não olhar para Sísera.
NAJARA
Essas são as candidatas à vaga de serva.
SÍSERA
(colocando a espada na mesa) Mais uma? Nem sabia de vaga.
NAJARA
“Mais uma”... Até parece que você não sabe que estou precisando, Sísera. Eloá e Danilo na cozinha, Ártis na limpeza, a outra... É muito pouco para nobres como nós. (Sísera olha para cada uma das moças) E olha que estou atrás de apenas mais uma. A casa é grande, são muitas coisas para se organizar aqui. Você não sabe porque não entende nada disso. Claro, é seu direito ter tudo pronto, não teria como entender mesmo.
Sísera olha um pouco mais de tempo para Darda, que permanece com o olhar fixo para frente. No entanto, em seu íntimo, é como se olhasse diretamente nos olhos de Sísera.
SÍSERA
Tanto faz. (respira fundo) Vim mais cedo, vou subir e descansar pra poder sair à noite.
Sísera bebe o conteúdo de uma taça ali e vai para outro cômodo.
SÍSERA
(irônico) Que vença a melhor.
E some. Najara olha para as moças. Devagar, Darda respira fundo.

CENA 17: EXT. CASA DE ADÉLIA – FRENTE – NOITE
O resto do dia passa e a noite cai.
Na frente da casa de Adélia estão Laila e Mireu conversando.
LAILA
Seu pai fica preocupado assim, mas ele tem um pouco de razão. Já não basta nos escravizarem dia após dia e ainda resolvem roubar nossas crianças...
MIREU
Pra mim isso não faz muito sentido. Por que os hazoritas temeriam nos contar, revelar que são eles mesmos que estão envolvidos nos desaparecimentos?
LAILA
Pode ser algum cuidado para não tentarmos investigarmos em oculto.
Mireu parece pensar em algo.
MIREU
Laila, você imagina como deve ser uma vida sem ser escravo?
Laila franze a testa para ele.
LAILA
Não... Desde que nascemos nosso povo já era escravo, então... A Adélia nasceu antes dos hazoritas nos escravizarem, mas mesmo assim não tem nenhuma lembrança dos dias de liberdade.
MIREU
Você acha que o Deus de que alguns do povo falam... O tal Deus de Israel... Acha que Ele se esqueceu de nós?
Laila olha para o lado e balança a cabeça.
LAILA
Não sei nem o que pensar sobre isso, Mireu. Mas o fato é que estamos servindo pagãos incircuncisos de sol a sol.
Adélia chega ali.
ADÉLIA
Mireu! Shalom!
MIREU
Shalom, Adélia.
ADÉLIA
E irmãzinha!
LAILA
Shalom, Adélia.
ADÉLIA
Fiquem à vontade. Vou entrar e preparar mais alguns bolinhos.
Eles fazem que sim.
ADÉLIA
Mireu? Está bem, menino?
MIREU
Sim, estou sim, Laila.
ADÉLIA
Porque se não estiver eu tenho o bolinho certo pra você, hein...
MIREU
(rindo) Não se preocupe, eu estou bem.
ADÉLIA
Então está certo.
Adélia sorri e entra na casa.    

CENA 18: INT. CASA DO AMOR – SALÃO – DIA
Em suas vestes casuais, Sísera entra no salão. As mesas estão cheias de homens bebendo e rindo alegremente. No centro, em cima de um palco, dançarinas fazem a alegria daqueles que ficam aos seus pés apreciando-as.
Antes de encontrar uma mesa, Sísera passa pelo soldado GADI (30 anos), que está saindo.
SÍSERA
Gadi?!
GADI
Meu Capitão.
SÍSERA
Já está indo embora, homem?
GADI
Infelizmente, meu senhor. Estou um tanto desanimado...
SÍSERA
Mas ainda é cedo.
GADI
Eu realmente estou mal, senhor. Acredito que preciso de uma boa noite de sono. (pequena pausa) Com sua licença.
Sísera faz que sim.
SÍSERA
Tenha um bom descanso.
GADI
Obrigado, senhor.
Gadi continua saindo, mas paralisa ao notar o olhar de uma das dançarinas... Como que preso a um encanto, ele não tira seus olhos dos dela, que dança exalando sensualidade.
Gadi não move um único músculo. Para ele é como se tudo ao redor desaparecesse e restasse apenas a dançarina, seu palco e as luzes exibindo o movimento de seus braços, o balançar de seu quadril, o dançar suave de seus cachos...
Vendo-o naquele estado, ela sorri e se aproxima dançando. Há algo entre eles, um clima diferente naquela troca de olhares...
DANÇARINA
Acho que sou invisível...
Gadi, confuso, balança a cabeça negativamente...
GADI
(sorrindo) Não entendi...
DANÇARINA
O soldado parece estar apreciando um céu forrado de estrelas...
Ele sorri.
GADI
Talvez... a estrela que aprecio não esteja no céu.
Enquanto continua a dançar, ela deixa escapar um bonito sorriso...

CENA 19: INT. CASA DO AMOR – QUARTO – NOITE
Gadi e a dançarina caem na cama e se agarram com extrema intensidade. Seus corpos se movimentam um no outro numa sintonia altíssima...

CENA 20: INT. PALÁCIO – CASA – SALA – NOITE
Najara vem de outro cômodo e para na frente de Darda e as outras candidatas à serva.
NAJARA
Como estão?
Algumas sorriem tímidas e outras murmuram que bem... Darda olha para Najara.
DARDA
Estou bem, senhora.
Najara, sorrindo ocasionalmente, a olha por alguns segundos... Depois desvia o olhar.
NAJARA
Agora vocês se recolherão e dormirão. A partir de amanhã começarão a ser avaliadas. Somente uma poderá ser a nova serva da casa do Capitão de Hazor. Sigam por aquele corredor que a serva as guiará para seu quarto. Tenham uma boa noite.
DARDA
Boa noite.
Outras murmuram. Enquanto elas vão para o corredor, Najara encara Darda e, sozinha ali, levanta uma sobrancelha.

CENA 21: EXT. BETEL – RUAS – NOITE
A noite avança e a madrugada chega.
Débora, Lapidote e Jaziel caminham silenciosamente pela rua vazia. Ao chegarem à muralha, eles param. Olham para a direção do portão, mas não há ninguém olhando para ali, além de eles estarem em uma área mais sombreada.
LAPIDOTE
Por onde passaremos? Cadê a passagem de vocês?
DÉBORA
Jaziel, abra-a.
Jaziel então avança e, ao pé da muralha, tira pedaços de madeiras e restos de materiais velhos, até que surge ali um pequeno círculo escuro, a passagem secreta de Débora e Jaziel.
DÉBORA
(para Lapidote) É um pouco apertado, meu amor...
LAPIDOTE
Não tem problema.
Débora sorri e, após Jaziel passar, ela vai. Lapidote por fim também passa.
Do outro lado, eles avançam para a escuridão dos campos ao redor.

CENA 22: EXT. BETEL – ARREDORES – NOITE
Os 3 continuam a caminhar. Passam pelo pequeno acampamento dos soldados hazoritas em absoluto silêncio... e prosseguem.

CENA 23: EXT. CAMPO – ALVORADA
O tempo passa e eles avançam, cada vez mais distantes de Betel...
O sol começa a despontar atrás das montanhas.

CENA 24: EXT. VILAREJO – DIA
Até que finalmente param ao darem de frente com um amontoado de destroços acinzentados: o vilarejo de que Jaziel tanto falou... queimado... em ruínas... e alguns corpos espalhados.
DÉBORA
Meu Deus!...
Jaziel, atordoado, corre até lá e os outros o seguem.
JAZIEL
Malditos... Miseráveis!... Malditos!!!
LAPIDOTE
Por que fizeram isso?! O que aconteceu aqui?!
Os 3 olham subitamente para o lado quando notam um movimento: caído entre os escombros e com a perna ensanguentada, um velho homem tosse com dificuldade. Débora, Lapidote e Jaziel correm até ele.
DÉBORA
Senhor, o que aconteceu?! Está bem?!
LAPIDOTE
Me ajudem a remover essa pedra!
Débora apoia a perna do homem enquanto Lapidote e Jaziel removem uma pedra de cima dela.
HOMEM
Obrigado! Argh!... Graças a Deus... Obrigado... Obrigado...
DÉBORA
Senhor... Somos de Betel...
JAZIEL
Vimos a fumaça... Viemos às escondidas ver o que aconteceu.
Débora e Lapidote ajudam o homem a se sentar.
HOMEM
Obrigado... Sim... Eles acabaram com o nosso vilarejo... Com o nosso povo...
LAPIDOTE
Por quê?!
O homem fecha os olhos com pesar... Ainda sente muita dor...
HOMEM
Os hazoritas...
JAZIEL
São sempre eles.
HOMEM
Levaram nossas crianças... Disseram que, em proporção, aqui é onde mais havia delas.
Débora presta muita atenção...
HOMEM
Mas isso foi demais para nós... O povo se rebelou. Houve luta... Apesar da nossa garra, não havia como derrota-los... São os hazoritas, afinal... Eles mataram a todos. (olhando os destroços e os corpos ao redor) Foi uma chacina... Somente eu consegui sobreviver porque uma parede caiu em cima de mim... e devem ter pensado que eu estava morto.
De repente, outro barulho, dessa vez atrás, do lugar de onde os 3 vieram. Todos olham e avistam 2 soldados hazoritas, que também param ao notá-los. Um dos soldados é o que, no campo, esbofeteou Débora duas vezes.
SOLDADO 1
Mas o que é isso?!
Débora e Jaziel ficam de pé enquanto Lapidote continua apoiando o homem.
SOLDADO 2
Hebreus... São de Betel. Conheço aquela ali.
SOLDADO 1
Eles não deviam estar aqui... Descobriram sobre o vilarejo!
SOLDADO 2
Isso é simples de se resolver: todos morrem.
Os dois soldados então sacam suas espadas e se aproximam devagar dos 4. Débora, no entanto, nota, perto dela, uma espada caída entre os destroços. Então vai calmamente até lá, se abaixa, pega-a e olha para os soldados. Segura a espada firmemente pelo cabo e se posiciona, pronta para lutar.
DÉBORA
Hoje não.
Os soldados param e franzem a testa. No semblante determinado de Débora, IMAGEM CONGELA
CONTINUA...
FADE OUT:


No próximo capítulo: Débora é duramente provada em seu primeiro grande desafio. Sísera visita o quarto das candidatas à serva. E, em Quedes, Sama tenta salvar a si e a sua filha dos hazoritas que capturam hebreias para serem levadas à Fortaleza.



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