Capítulo 04
Cena 01 - Campo [Externa/Noite]
[Ainda zonza com a queda, Ana Catarina tentava se recompor e não percebeu quando Antônio se aproximou.]
ANTÔNIO: - Pelo visto, vosmecê não anda a cavalo tão bem, como nada no rio! [Zombou enquanto tentava levantá-la].
ANA CATARINA: - Enquanto vosmecê, não tem nada melhor a não ser ficar me perseguindo onde quer que eu vá… Ai, minha cabeça! [Geme de dor].
ANTÔNIO: - Para sua sorte, o cavalo não estava indo tão rápido. Consegue levantar?
ANA CATARINA: - Eu acho que sim…
ANTÔNIO: - Então eu vou te levantar. No três… Vamos lá: um, dois… três! [Levanta Ana Catarina bruscamente, de forma que o corpo dos dois ficam bem próximos].
Música da cena: Amor Gitano - Beyoncé e Alejandro Fernández
ANA CATARINA: [Olha no fundo dos olhos de Antônio].
Cena 02 - Casarão D’ávilla (Sala de Jantar) [Interna/Noite]
[Gonçalo caminhava de lado para o outro na sala de estar, enquanto Carlota fingia se importar com Ana Catarina.]
GONÇALO: - Ela já deveria ter voltado. Ana Catarina sabe que eu não gosto que ela saia a essa hora. Mas também, que gênio!
CARLOTA: - Meu amor, vosmecê sabe como é a sua filha. Tenho certeza que apesar do gênio forte de Ana Catarina, ela não há de cometer um desatino. [Diz ao se aproximar de Gonçalo].
GONÇALO: - Tomara… Tomara! Se ela não voltar em uma hora, eu irei buscá-la nos quatros cantos desse engenho.
CARLOTA: [fala consigo mesma através do pensamento] - Tomara mesmo é que essa fedelha caia do cavalo e morra comida por bichos na floresta.
[Nesse momento, Maria Letícia e Rosaura retornam ao interior da casa.]
GONÇALO: - E então, alguma notícia da sua irmã?
MARIA LETÍCIA: - Infelizmente, não papai. Ana Catarina saiu galopando no Quixote de forma que eu não pude alcançá-la.
ROSAURA: - Sinhozinho Gonçalo, não tema pela menina. Eu a conheço, sei que ela vai voltar sã e salva, o senhor há de ver…
CARLOTA: [Observava a conversa, quando percebeu a presença de Idalina, escondida na sala de jantar. Notou então, que ela queria chamar sua atenção e resolveu ir até ela] - O que foi, estrupício? Por que estava me olhando dessa forma?
IDALINA: - Io sei de uma coisa, que a sinhá há de querer saber também…
CARLOTA: - Sabe? Então diga de uma vez, que eu não tenho tempo para conversa de escrava. Acaso acha que eu sou uma daquelas ciganas imundas que adivinham as coisas? [Diz em tom de reclamação].
IDALINA: - Io sei quem foi encher os ouvidos da menina Ana Catarina com aquela história…
CARLOTA: [Surpreende-se] - Sabe? E quem foi?
IDALINA: - Foi a metida da Rosaura!
CARLOTA: [Volta o olhar para a sala de estar e encara Rosaura] - Foi, é? Pois deixe estar, que eu vou acertar os ponteiros dessa negra linguaruda. Ela certamente há de aprender a não ouvir mais conversas alheias. [Conclui de forma fria].
Cena 03 - Campo [Externa/Noite]
Música da cena: Amor Gitano - Beyoncé e Alejandro Fernández
[Ana Catarina e Antônio continuavam se olhando, enquanto por um momento, ele pensava em voltar a beijá-la.]
ANA CATARINA: - De certo ele deve estar mancomunado com a mãe dele nesse plano de nos tirar do caminho, para ficarem com toda nossa fortuna… [Fala consigo mesma através do pensamento].
ANTÔNIO: [Aproxima-se para beijar Ana Catarina].
ANA CATARINA: [Afasta-se bruscamente] - Eu já estou melhor, será que vosmecê se incomoda em me acompanhar de volta ao engenho?
ANTÔNIO: - Claro que não, mas e o cavalo? Ele saiu em disparada, deve estar com a pata machucada.
ANA CATARINA: - Eu vou pedir ao capataz para vir procurá-lo assim que chegarmos lá. Vamos embora! [Conclui para sair andando logo em seguida].
ANTÔNIO: - Que mulher difícil, eu hein. Me espera! [Corre atrás de Ana Catarina para alcançá-la].
Cena 04 - Acampamento dos Ciganos [Externa/Noite]
Música da cena: Flor de Lis - Melim
[Com a transição de cenas, surge o acampamento dos ciganos. Isolado em um canto, Vicente não viu quando Madalena resolveu se aproximar dele.]
MADALENA: - Aí está você, o rei dos ciganos! [Diz ao se aproximar].
VICENTE: - Madalena, eu não vi vosmecê se aproximar… Estava distraído!
MADALENA: - Essa velha cigana não precisa de muitas moedas para adivinhar o motivo de vossa distração. Estás pensando no gadjó, não é?
VICENTE: - Eu não sei do que vosmecê está falando. Certamente deve ser a idade! [Sai andando bruscamente].
MADALENA: - Assim como certamente, vosmecê está relutando que o passado volta a bater em sua porta, não é Vicente? [Questiona em voz alta].
VICENTE: [Para de caminhar ao ouvir o que Madalena disse].
Cena 05 - Casarão D’ávilla (Cozinha) [Interna/Noite]
[Desconfiado, Zeferino adentrou na cozinha da casa grande acompanhado por Idalina.]
ZEFERINO: - Idalina disse que a sinhá está querendo falar comigo. O que vassuncê deseja?
CARLOTA: [Vira-se e encara Zeferino] - Eu quero que vosmecê leve a Rosaura para o tronco e lhe aplique uma lição. Vinte chibatadas e depois coloque salmoura nas feridas. Quero que essa infeliz sofra, assim ela há de aprender a não ouvir mais conversa alheia.
Cena 06 - Casarão D’ávilla (Pátio) [Externa/Noite]
[Catarina e Antônio caminhavam pela estrada que dava acesso à entrada do engenho, enquanto conversavam.]
ANTÔNIO: - Então, vosmecê não vai me explicar o motivo de estar andando a cavalo feito uma doidivana?
ANA CATARINA: - Eu não tenho porque dar satisfações sobre a minha vida, para um forasteiro.
ANTÔNIO: - Eu não sou um forasteiro, vosmecê fala como se eu fosse um qualquer, como se não fosse da família.
ANA CATARINA: - E não é mesmo… Vosmecê não é da minha família, é apenas o filho da mulher que por ventura, vem a ser a minha madrasta…
[Nesse momento, ouvimos Zeferino levar Rosaura aos gritos para o tronco.]
ROSAURA: - Mas eu não fiz nada, me solta Zeferino…
ZEFERINO: - Fez sim, vassuncê há de ter feito algo, se não a sinhá não estaria tão nervosa. Vou lhe ensinar a não ser mais língua solta! [Diz ao prender Rosaura no tronco].
ANA CATARINA: - Não se atreva a tocar nela, infeliz! [Grita ao se aproximar dos dois].
ZEFERINO: - A sinhazinha há de me desculpar, mas aqui io só cumpro ordens. Vou açoitar essa negra atrevida! [Ergue a mão com a chibata].
ANA CATARINA: [Coloca-se entre Zeferino e Rosaura] - Pois então, vosmecê vai ter que começar o açoite comigo. Quero ver quantas chibatadas se atreveria a me dar! [Dispara furiosa].
Cena 07 - Casarão D’ávilla (Pátio) [Externa/Noite]
[Rosaura chorava de desespero, enquanto Ana Catarina e Zeferino se encaravam.]
ZEFERINO: - É melhor a sinhazinha sair da frente e deixar io fazer o meu trabalho…
ANA CATARINA: - Isso não pode ser chamado de trabalho, Zeferino. Agredir e torturar uma pessoa, um dos seus… Você como negro, deveria ter vergonha de ser capitão do mato!
ANTÔNIO: - Não ouviu o que a moça disse? Solte já essa escrava, ou sou eu quem vai acertar as contas com vosmecê! [Diz ao chegar perto do tronco].
ZEFERINO: [Olha de lado para Antônio e em seguida sorri em tom de deboche] - É, negra Rosaura… Vassuncê não vai levar o que merece, porque está cheia de defensores, mas io e vassuncê vamos acertar nossas contas em breve, ah se vamo! [Diz ao soltar Rosaura].
ROSAURA: - Minha menina! [Abraça Ana Catarina, desconsolada].
ANA CATARINA: - Esse jagunço te machucou, Bá? Fala comigo!
ANTÔNIO: - Ela deve estar assustada. É melhor entrarmos, ela tomará uma água e há de se acalmar.
ANA CATARINA: - Ele tem razão, vamos entrar! [Fala enquanto ajuda Rosaura a caminhar].
Cena 08 - Acampamento dos ciganos [Interna/Noite]
[Após discutir com Madalena, Vicente adentrou em sua tenda completamente tomado pelas lembranças do passado.]
VICENTE: - Eu preciso apagar essa história da minha mente, preciso esquecer de uma vez por todas!
FLASHBACK
Há alguns anos atrás…
[Na cachoeira, Vicente e Carlota se encontram na juventude]
CARLOTA: - Vosmecê precisa largar dessa mulher e ficar comigo! [Grita ao se aproximar].
VICENTE: - Eu não posso fazer isso. Além disso, ela não é qualquer mulher e sabe muito bem disso. Nosso casamento foi arrumado quando ainda éramos crianças. Não posso voltar voltar atrás com a minha palavra. Eu vou ser rei dos ciganos! Porque vosmecê não larga tudo e vem pra cá? Se vosmecê vier, eu posso tentar convencer o meu povo a te aceitar e aí sim, quem sabe podemos ficar juntos! Eles precisam de mim, não posso fugir.
CARLOTA: - Eu não nasci para viver num acampamento e muito menos para dormir em tendas. Eu quero luxo e conforto… Ninguém pode gostar de viver como miserável, vosmecê só pode estar falando de brincadeira.
VICENTE: - Eu que não posso acreditar… Vosmecê chama o meu povo de miserável, mas se esquece que eu faço parte deles.
CARLOTA: - Pois então, vosmecê já tomou a sua decisão. Não vai me ver novamente. Nunca mais, entendeu? Nunca mais! [Grita].
FIM DO FLASHBACK
Cena 09 - Casarão D’ávilla (Sala de Estar) [Interna/Noite]
[Quando atravessaram a porta de entrada, Carlota não conseguia acreditar no que estava vendo.]
CARLOTA: - Mas o que significa isso? Essa negra deveria estar no açoite nesse exato momento. Eu vou arrancar a pele do Zeferino!
ANA CATARINA: - Disse corretamente, minha querida madrasta. “Era”, no passado… Por sorte, consegui evitar tamanha desfaçatez por parte do seu jagunço. Eu a proibo de fazer qualquer coisa contra a Rosaura, entendeu? [Diz enquanto apoia Rosaura ao lado de Antônio].
CARLOTA: [Sorri sarcasticamente] - Aqui as ordens que os escravos recebem são as minhas. Eu não as discuto com uma fedelha, vou chamar o Zeferino agora mesmo e vou mandar essa escrava de volta ao tronco!
ANA CATARINA: - Pois então vosmecê terá que me mandar junto. Vamos ver o que o meu pai, o Banqueiro Gonçalo D’ávilla acha da filha dele ser presa a um tronco e ser açoitada a mando da própria madrasta!
CARLOTA: - Pois vamos ver, então. Vou mandar o Zeferino arrastar a Rosaura de volta para o tronco e se você quiser fazer companhia, saiba que eu terei muito gosto…
ANTÔNIO: [Interrompe Carlota, surpreso com o seu tom] - Mamãe! Mas porque a senhora quer castigar tanto essa escrava? Que erro ela pode ter cometido que seja justificado com tanta violência?
CARLOTA: - É… é… [Fica sem saber o que responder].
ANA CATARINA: - Responda, Carlota. Por que quer mandar chicotear a Rosaura? [Questiona, percebendo que a madrasta se sente encurralada].
CARLOTA: - Está bem, vosmecês venceram. Não vou mais mandar açoitar a Rosaura, vamos esquecer tudo isso. Ponto! Pode ir, Rosaura… Vamos colocar uma pedra em cima de tudo isso!
ANA CATARINA: [Sorri ao perceber que a madrasta não falou a verdade] - Foi o que pensei. Vamos subir, Rosaura. Temos muito o que falar!
ANTÔNIO: - Vamos, eu ajudo vocês duas a subirem…
CARLOTA: [Observa os três subirem a escada e fica furiosa] - Fedelha imbecil… O que é seu está guardado e está vindo a galope, vosmecê não perde por esperar! [Fala consigo mesma].
Cena 10 - Casarão D’ávilla (Quarto de Ana Catarina) [Interna/Noite]
[Rosaura, Ana Catarina e Antônio caminharam pelo corredor do piso superior da casa e pararam em frente à porta do quarto da jovem.]
ANA CATARINA: - Nós agradecemos muito pela sua ajuda, Antônio. Você já pode se recolher, pode deixar que eu cuido da minha Bá.
ANTÔNIO: - Tem certeza? Vosmecês não precisam de mais nada?
ANA CATARINA: - Temos sim, pode ir. Muito obrigada!
ANTÔNIO: - Bem, eu estarei em meus aposentos. Se precisarem de mim, estarei à disposição. Com licença! [Diz ao sair].
ANA CATARINA: [Olha Antônio caminhar pelo corredor e em seguida adentrar em seu quarto].
ROSAURA: [Percebe o olhar de Ana Catarina] - Menina, menina… Eu conheço esse olhar!
ANA CATARINA: - Olhar? Que olhar, Bá? Não diga besteiras!
ROSAURA: - Eu te criei, menina. Te conheço como a palma da minha mão. Já percebi seus olhares para o filho da Dona Carlota. Tenha muito cuidado, ela é muito perigosa e não sabemos do que ela é capaz… Além disso, não sabemos se ela está usando o filho como comparsa. Tenha cuidado, menina!
[Nesse momento, Gonçalo sobe as escadas correndo e vai ao encontro de Ana Catarina.]
GONÇALO: - Filha, que bom que voltou. Eu estava te procurando, tive medo de que alguma coisa tivesse te acontecido! [Diz ao abraçar a filha].
ANA CATARINA: - Pode ficar tranquilo, meu pai. Não aconteceu nada comigo, como vê, eu estou bem.
GONÇALO: - Que bom que está bem, pois ainda precisamos conversar sobre o que aconteceu durante o jantar.
ANA CATARINA: [Encara Gonçalo].
Cena 11 - Pelotas [Externa/Manhã]
Música da cena: Vilarejo - Marisa Monte
[A noite se vai e o dia logo amanhece. O sol aparece iluminando os grandes campos de São José dos Vilarejos e conforme as cenas externas são apresentadas, surgem as ruas da cidade de Pelotas. Uma comitiva se aproxima e para em frente a um grande casarão.]
ESCRAVO: [Abre a porta da carruagem e um homem desce].
CONDE DE BURGOS: - Aqui estamos, de volta ao Brasil! [Diz ao observar a fachada da casa, após descer da carruagem].
Cena 12 - Cachoeira [Externa/Manhã]
[Sozinho, Antônio jogava pedras no rio para tentar passar o tempo.]
ANTÔNIO: [Observa a cachoeira, quando ouve passos e olha para trás] - Você veio! [Sorri ao falar].
ANA CATARINA: - Eu recebi o seu recado pela Rosaura. Pensei em não vir, mas depois do que vosmecê fez ontem, achei que seria muito injusto não vir. Bem, aqui estou eu! O que vosmecê quer?
ANTÔNIO - Eu queria muito te ver, ficar a sós. Eu não consigo parar de pensar em vosmecê desde que te conheci. [Diz ao se aproximar de Ana Catarina].
ANA CATARINA: - Antônio, isso não é certo…
ANTÔNIO: - Não é certo, porque? Nós não somos parentes, não temos o mesmo sangue. Ninguém pode impedir que a gente fique junto. Eu quero ficar com vosmecê e sei que também me quer, por que lutar contra isso?
Música da cena: Amor Gitano - Beyoncé ft. Alejandro Fernández
ANA CATARINA: [Olha para Antônio e em seguida o beija intensamente].
[A imagem congela com Ana Catarina caída e Antônio se beijando, surge um efeito de uma pintura envelhecida e o capítulo se encerra].
TRILHA SONORA OFICIAL
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