CAPÍTULO 08
uma novela de
FELIPE LIMA BORGES
livre adaptação do livro de Rute
Edição da Versão Reprise por
RAMON FERNANDES
EDIÇÃO:
Capítulo 12 + Parte do Capítulo 13 ORIGINAL (SEM CORTES)
CENA 1: EXT. BELÉM – ARREDORES – NOITE
Elimeleque e Noemi – cada um em sua cadeira –, apesar do véu no rosto dela, se encaram apaixonados. Os dois grupos de homens abaixam as cadeiras e os noivos põe-se de pé. Olho no olho, eles se aproximam e viram para o Ancião. Atrás desse, na tenda, estão Nina, Absalom, Zaira, Neb e Tani.
ANCIÃO— (para os noivos) Aproximem-se.
Noemi e Elimeleque dão alguns passos e ficam de frente para o Ancião.
ANCIÃO— (a todos) Filhos de Israel! Povo de Belém! Estamos reunidos essa noite para testemunhar e celebrar a união de dois jovens que se conheceram, se amaram, e decidiram que viver juntos era o melhor para eles. Essa noite, Noemi e Elimeleque vão dar continuidade à obra de nosso Senhor, que se iniciou no Éden com o primeiro homem e a primeira mulher. Não era bom que o homem vivesse só... Também não é bom que Elimeleque viva só. Por isso Deus lhe deu Noemi por companheira. E por companheira entende-se ajudadora, amiga, protetora do lar, esposa fiel e amável. A Elimeleque cabe o cuidado, o respeito, o provento e todo seu entranhável amor.
Noemi e Elimeleque sorriem.
ANCIÃO— Por favor, o cálice.
Um rapaz pega uma taça em uma mesa ali perto, a enche de vinho e entrega para o Ancião.
ANCIÃO— Ao beberem o vinho, profiram as palavras.
O Ancião entrega o cálice a Elimeleque.
ELIMELEQUE— (para Noemi) De acordo com as leis de Moisés e Israel, você é consagrada a mim.
Elimeleque então toma o vinho olhando para Noemi. Por fim entrega a taça a ela.
NOEMI— (para Elimeleque) Eu pertenço ao meu amado, e o meu amado me pertence.
Noemi toma o restante do vinho, entrega para o Ancião, e o casal se encara com os olhos brilhando.
ANCIÃO— Agora a noiva dará sete voltas em torno do noivo, simbolizando a construção das paredes da casa em que habitarão.
Sorridente, Noemi circula Elimeleque. A cada vez que passa em sua frente, seus olhos se encontram apaixonados. Neb aperta as têmporas.
TANI— Algum problema, Neb?
NEB— Essas voltas me deixam tonto...
Noemi finalmente dá a sétima volta e para no lugar onde estava.
ANCIÃO— Agora eu declaro Elimeleque e Noemi, marido e esposa. Os noivos podem se beijar.
A multidão brada comemorando enquanto Elimeleque e Noemi se aproximam mais e trocam um beijo. Cereais e flores são jogados em suas cabeças. Afastada dali, Tamires observa a cerimônia com raiva e lágrimas nos olhos.
TAMIRES— (para si; fungando) Não faz mal... O tempo haverá de cuidar de você, Noemi...
Noemi e Elimeleque olham para as pessoas e levantam os braços para cima em comemoração.
CENA 2: INT. CASA DE NOEMI – QUARTO – NOITE
Quarto com poucas velas. Elimeleque carrega Noemi em seu colo. Ele a beija e a deita na cama, ficando por cima dela.
NOEMI— Eu te amo...
ELIMELEQUE— Eu te amo...
Eles se beijam apaixonadamente...
FADE OUT:
FADE IN:
CENA 3: INT. CASA DE NOEMI – QUARTO – DIA
Os raios de sol se espalham pelo quarto como que trazendo nova vida. Na cama, uma mulher se mexe até que acorda; ela abre os olhos. É NOEMI (42 anos, cabelos ondulados e sardas quase apagadas).
Noemi olha para o lado e vê seu marido já acordado. ELIMELEQUE (43 anos) sorri para ela.
NOEMI— Há quanto tempo está acordado?
ELIMELEQUE— O suficiente pra te admirar.
Noemi se ajeita e olha para ele.
NOEMI— Me admirar? Quando estou dormindo? Tem certeza que há o que ser admirado?
Elimeleque ri.
ELIMELEQUE— Toda a minha certeza. Do dia em que nos conhecemos até hoje, parece que sempre descubro um detalhe novo em você pra admirar.
Noemi sorri.
NOEMI— Você é tão bom pra mim, Elimeleque... 25 anos se passaram, mas o nosso amor só aumenta, só se solidifica mais e mais e mais... Você é o cumprimento da Promessa em minha vida.
ELIMELEQUE— Nosso amor cresceu tanto que transbordou e gerou dois bons frutos.
NOEMI— Por falar nisso, será que Malom e Quiliom já levantaram?
ELIMELEQUE— Dormindo não estão. O vigor que aqueles dois tem não permite que durmam por muito tempo depois de o sol nascer.
NOEMI— Não mesmo... Sabemos bem o que eles estão fazendo.
CENA 4: INT. CASA DE NOEMI – COZINHA – DIA
Furtivos, dois rapazes “assaltam” a comida da cozinha. MALOM (24 anos) pega os bolos e frutas, e QUILIOM (23 anos) se concentra nas bebidas.
MALOM— Rápido, Quiliom! A mãe e o pai devem descer a qualquer momento!
QUILIOM— Vai ser logo logo se você não fechar o bico, Malom! Humm, que suco perfeito!... É de tâmaras?
MALOM— Você precisa beber como um porco?! Olha a sujeira que está deixando!
QUILIOM— Shh! Come teus bolos que da minha sujeira eu cuido!
MALOM— Cuida? Igual cuida das espigas?! Então eles vão perceber no momento em que descerem!
QUILIOM— Ah, dá um tempo, Malom!
MALOM— (com um pedaço grande de pão na boca) Se apressa, Quiliom! Será possível?!
QUILIOM— Ah!!!
Nesse instante, sabendo da presença dos filhos, Noemi e Elimeleque descem as escadas. Malom e Quiliom arregalam os olhos e paralisam com o barulho.
NOEMI— (tranquila e indiferente) É impressão minha ou tem saqueadores na cozinha, Elimeleque?
ELIMELEQUE— Tem sim, meu amor, mas não se preocupe. Vou pegar minha espada e dar um jeito nesses ladrões--
Elimeleque se interrompe propositalmente quando ele e a esposa pegam Malom e Quiliom, ainda paralisados, diante das comidas e bebidas.
ELIMELEQUE— --de comida. Parece que está mais pra porcos ladrões.
NOEMI— (a mão na cintura) Malom e Quiliom assaltando a cozinha. Por que não estou surpresa?
QUILIOM— Foi ideia do Malom!
MALOM— Seu mentiroso! Não é verdade, mãe! Quando cheguei ele já estava bebendo feito um rinoceronte seco! Só faltou beber o azeite!
NOEMI— E aí você resolveu fazer companhia atacando os bolos...
Malom gagueja e não responde.
NOEMI— Deem graças a Deus por esse vigor de vocês, meninos. Mas se continuarem a roubar comida dessa forma, seu pai não conseguirá nos sustentar. Uma família de 4 pessoas tendo despesa de uma de 10...
ELIMELEQUE— Mas deixa esses dois comigo, Noemi. Tem um trigal inteiro pra eles gastarem esse vigor todo. Vamos! Se arrumem que já vamos sair.
Acuados, Malom e Quiliom pegam uma porção para comer e beber e vão para a mesa da sala. No caminho estão seus pais. Elimeleque os intercepta e os abraça bem apertado. Noemi sorri.
ELIMELEQUE— Seus meninões! Meninões do meu coração!...
MALOM— A gente também te ama, pai...
QUILIOM— É, pai... Você e a mãe...
ELIMELEQUE— É bom ouvir isso. Muito bom. Mas agora se apressem, vamos, vamos!
Elimeleque os solta e eles sentam à mesa para comer. Sorrindo, Noemi observa os filhos. Malom sorri e pisca para ela. Noemi bagunça o cabelo dos dois e sai.
Minutos mais tarde, Elimeleque, Malom e Quiliom estão à porta, prontos para ir trabalhar.
ELIMELEQUE— Pegaram tudo?
MALOM— Eu peguei, não sei o Quiliom.
QUILIOM— O esquecido falando de mim.
ELIMELEQUE— Chega de conversa e vamos. Temos muito o que fazer pra manter a prosperidade de nossa casa e dessa cidade.
Elimeleque vira para Noemi e a beija.
ELIMELEQUE— Fique com Deus, meu amor. Eu te amo.
NOEMI— Que Deus abençoe o dia de vocês.
MALOM— Shalom, minha mãe.
QUILIOM— Shalom, mãe.
Noemi beija os filhos.
NOEMI— Shalom, meus filhos, Shalom! Juízo! Obedeça, o pai de vocês. E veem se prestem atenção nas moças que servem água ao invés de ficarem com peraltices. Quem sabe não arranjam uma boa esposa.
QUILIOM— Ih, Malom, você ouviu?
MALOM— Ouvi. O que temos que fazer?
MALOM E QUILIOM— Shalom e até mais!
Os dois saem sob o olhar de reprovação de Noemi. Elimeleque a beija novamente e vai. Noemi os observa se distanciar... Por fim, fecha a porta. Com um semblante alegre ela vai até à mesa e senta. Olha para o alto.
NOEMI— Obrigada, Senhor, por essa família maravilhosa que me deste. (sorrindo) Obrigada.
CENA 5: EXT. BELÉM – TRIGAL – DIA
Elimeleque, Malom e Quiliom chegam ao campo. À frente e para os lados, o vasto trigal estende-se majestosamente. Alguns homens já trabalham nas espigas e mulheres estão de prontidão para servir água.
ELIMELEQUE— Eu vou falar com Yuri. Tratem de se preparar para o trabalho.
Em outra parte do trigal, YURI (45 anos) analisa uma tabuleta em sua mão. Elimeleque chega ali.
ELIMELEQUE— Shalom, Yuri!
YURI— Elimeleque! Shalom, meu amigo.
Eles se abraçam.
ELIMELEQUE— Que ânimo, hein Yuri. Não errei mesmo na escolha do meu administrador.
YURI— Números e trigo... Que combinação poderia ser melhor que essa? Me diz!
Eles riem.
YURI— Você ri mas é verdade, viu Elimeleque? Estamos vivendo a melhor época, é a melhor safra dos últimos tempos! Essa verdadeiramente é a Terra Prometida! Veja só essa prévia!
Yuri mostra a tabuleta para Elimeleque, que sorri.
ELIMELEQUE— Mas isso é incrível!
YURI— Não estou dizendo?! Estou quase terminando o relatório final, ainda hoje devo lhe entregar. Mas não há dúvidas de que estamos mais próximos que nunca!
ELIMELEQUE— Ótimo, Yuri! Ficarei no aguardo.
CENA 6: EXT. BELÉM – RUA – DIA
Noemi caminha observando os produtos nas barracas. Uma delas expõe deuses de pedra. O vendedor falar qualquer coisa oferecendo e ela faz que não e continua a andar. É quando encontra TANI (43 anos).
TANI— Noemi! Finalmente uma alma de fé nessa Belém!...
NOEMI— Mas o que foi, Tani? Por que esse alívio todo?
TANI— A cidade está um horror, Noemi. Vindo pra cá encontrei pelo menos três belemitas adorando ídolos de pedra em plena rua. E o povo age como se aquilo fosse algo normal! Ver você aqui e agora foi como encontrar um limpo no curral.
NOEMI— Eu percebi a mesma coisa que você, assim que pisei o pé pra fora de casa. Infelizmente o povo está se depravando, e se afastando cada vez mais dos mandamentos de Deus.
CENA 7: EXT. BELÉM – TRIGAL – DIA
Elimeleque anda por ali olhando para todos os lados.
ELIMELEQUE— Onde estarão esses dois?...
Ele continua a procurar. Perto dali, Malom e Quiliom sentados em uma goiabeira, consumindo os frutos.
MALOM— Ih, Quiliom, olha aí...
Elimeleque se aproxima da goiabeira nervoso.
ELIMELEQUE— Mas será possível?! Eu não os mandei se preparar pra trabalhar? Vamos, desçam já daí!
Malom e Quiliom pulam da goiabeira.
ELIMELEQUE— Vamos! Já está mais que na hora dos dois amadurecerem. E casarem! Uma mulher deve dar jeito em vocês. Ah, se dá!...
Malom e Quiliom trocam olhares.
CENA 8: IN. CASA DE NOEMI – SALA – DIA
Noemi e Tani entram em casa.
TANI— Até chegar na sua casa é um alívio, Noemi! Não sei onde o povo dessa cidade vai parar...
NOEMI— Me bate uma coisa ruim... (respira fundo) Morro de tristeza vendo-os nessa situação.
TANI— Como podem agir assim quando Deus mais nos abençoa?...
NOEMI— Por que não oramos, Tani? Será mais proveitoso que ficarmos reclamando.
TANI— Tem toda razão. Vamos!
Imediatamente elas ajoelham e fecham os olhos.
NOEMI— Senhor, Deus de Abraão, Isaque e Jacó... Eis aqui as Tuas servas, que não são modelos a serem seguidas e tampouco tem tal pretensão. Mas nossos corações muito se entristecem ao ver a situação do Teu povo. Viraram as costas para Ti, Senhor. Trocaram o Teu amor e a Tua benevolência pela frieza de ídolos que tem boca, mas não falam, tem narizes, mas não sentem cheiro algum, tem ouvidos, mas não escutam e tem olhos, mas não veem um palmo à sua frente. Senhor, ilumine esse povo. Mostra-lhes o caminho novamente, para que não se percam no lamaçal da idolatria, e possam, juntos, voltar à luz da santidade e da promessa que fizestes a Abraão. Que a voz da razão seja a única a ser ouvida nessas ruas. Amém.
TANI— Amém.
Elas abrem os olhos. Se olham... Então levantem e sentam.
TANI— O quê, Noemi?...
NOEMI— Talvez devamos fazer mais que só orar...
TANI— O que acha que podemos fazer a mais?
NOEMI— Alertá-los.
Tani faz que sim.
TANI— Ótima ideia, Noemi.
CENA 9: EXT. BELÉM – TRIGAL – DIA
Durante seus afazeres, Elimeleque nota alguns trabalhadores conversando ente si. Parece haver uma anormalidade na postura dos homens. Não apenas um ou dois casos isolados, mas vários ao longo do dia. Elimeleque sempre olha de longe, mas não faz nada, apenas fica pensativo.
Mais tarde, ele vê dois homens, com o mesmo tom de anormalidade, falando com Yuri. Após irem embora, Elimeleque se aproxima de seu administrador.
ELIMELEQUE— Yuri...
YURI— Sim?
ELIMELEQUE— Eu percebi uma estranheza no jeito daqueles dois homens falarem com você... É algo com que eu deva me preocupar?
YURI— Não, não. São apenas rumores...
ELIMELEQUE— Que rumores?
YURI— De outros campos perdendo trigo. Ou então com a contagem muito abaixo do normal. Já se fala por aí até em praga.
ELIMELEQUE— Mas como isso é possível? É o melhor ano de muitos...
YURI— Rumores, Elimeleque. Como eu te disse. Não há nada confirmado.
ELIMELEQUE— Eu vou esperar o relatório.
O restante do dia passa.
CENA 10: EXT. BELÉM – TRIGAL – PÔR DO SOL
Malom e Quiliom guardam seus pertences. Perto dali, Elimeleque faz o mesmo. Da direção do pôr do sol vem Yuri. Parece haver um leve desespero em seu semblante.
YURI— Elimeleque... Preciso falar com você.
ELIMELEQUE— Claro, o que foi? Já tem o relatório final?
YURI— Sim, e já adianto que os resultados não são nada animadores.
Elimeleque olha sério para Yuri.
ELIMELEQUE— O que quer dizer?
YURI— Lembra dos rumores de que falei?
ELIMELEQUE— Claro.
YURI— Não são apenas rumores, claramente algo está acontecendo. E independente do que for, atingiu nosso campo também.
Elimeleque franze o cenho, preocupadíssimo.
ELIMELEQUE— Deixe-me ver o relatório.
Elimeleque pega a tabuleta e seu semblante de preocupação só piora. Malom e Quiliom estranham e ficam intrigados.
QUILIOM— O que será que isso significa?
MALOM— Pelo que estão falando, parece que estamos à beira de uma crise...
Close em Elimeleque preocupado.
CENA 11: INT. CASA DE NOEMI – SALA – NOITE
Sentados à mesa, Noemi, Elimeleque, Malom e Quiliom jantam. Elimeleque está sério e quieto, e mantém o olhar em seu prato. Malom e Quiliom parecem incomodados. Noemi nota o comportamento deles.
NOEMI— Elimeleque...
Ele olha para a esposa já temendo que terá que contar.
NOEMI— O que está acontecendo?... Por que vocês todos estão assim? Foi algo que aconteceu no campo?
ELIMELEQUE— Na verdade, sim... Segundo o relatório de Yuri, uma parte de nossas espigas se perdeu...
NOEMI— Como se perdeu? Quanto?...
ELIMELEQUE— São números consideráveis, Noemi. E não é apenas no nosso campo. Já há alguns dias se fala em perdas...
NOEMI— Uma praga...
ELIMELEQUE— Não temos certeza. Amanhã vou conferir essa parcela perdida pessoalmente.
NOEMI— Amanhã eu também vou sair. Combinei com Tani de ir anunciar nas ruas o arrependimento que nosso povo precisa ter. Essa situação, esse afastamento, deuses de pedra em cada esquina... está ficando insustentável.
ELIMELEQUE— Esse povo é duro, meu amor. Você e Tani, tomem cuidado ao fazer isso.
QUILIOM— Mãe, você acha que essa praga pode ter a ver com essas coisas que o povo vem fazendo?
NOEMI— Faz todo sentido, Quiliom. Toda vez que nosso povo virou as costas para Deus e O traiu, o resultado não foi nada bom. Nossa história está aí para não mentirmos.
Elimeleque faz que sim. Malom e Quiliom preocupados.
CENA 12: INT. CASA DE NOEMI – QUARTO DE MALOM E QUILIOM – NOITE
Duas camas. Quiliom deitado em uma e Malom preparando a sua para deitar.
QUILIOM— Sabe no que eu estava pensando, Malom?
MALOM— Em sucos, vinhos? Leite com mel?
QUILIOM— Pare de ser inconveniente, estou falando sério.
MALOM— O quê? No que é que você estava pensando, Quiliom?
QUILIOM— Nessa história que o pai e a mãe vivem martelando, que nós temos que casar, que já passou do tempo...
MALOM— E o que que tem? Sempre concordamos que está é longe de chegar o tempo.
QUILIOM— Será?...
MALOM— (deitando na cama) Iiihhh... Que conversa é essa, meu irmão?
QUILIOM— Pensa só, Malom. Todos os nossos amigos da nossa idade já se casaram, alguns estão a algumas luas de ser pai. E enquanto estivermos aqui, a mãe e o pai vão continuar insistindo.
MALOM— E desde quando você está se importando com isso?
QUILIOM— Não é que estou me importando, mas talvez seja o melhor. Olha, vamos fazer o seguinte: amanhã, no campo, vamos dar uma boa olhada nas moças.
MALOM— E para que isso? Já conhecemos todas, nós as vemos todos os dias.
QUILIOM— Mas podemos ver algo diferente se estivermos atentos. Algo que sempre escapa à nossa visão rotineira. O que me diz?
MALOM— O que foi que você bebeu, hein?
QUILIOM— Para, Malom, já disse que estou falando sério!
Malom respira fundo.
MALOM— Tudo bem. Mas não garanto nada. É sem compromisso!
Quiliom sorri e faz que sim.
CENA 13: INT. CASA DE NOEMI – QUARTO DE NOEMI – NOITE
Elimeleque sentado e escorado na cabeceira da cama, e Noemi deitada com a cabeça em seus braços. Pensativa, ela mantém o olhar fixo no nada. Elimeleque idem, mas preocupado. Logo ele sai de seu transe e nota o olhar sem rumo da esposa.
ELIMELEQUE— O trigo é o meu motivo de pensamentos perdidos, mas qual será o da minha bela esposa?
Noemi volta ao presente e olha para Elimeleque.
NOEMI— E por que é que o trigo também não poderia ser o meu motivo? Não seríamos todos prejudicados?
ELIMELEQUE— Tem razão.
NOEMI— Apesar disso, nesse momento não estou pensando em um provável futuro sombrio, mas no passado. Com saudades...
ELIMELEQUE— Que passado?...
NOEMI— Nosso tempo de mocidade... Parece que as coisas eram tão mais fáceis...
ELIMELEQUE— Essa prosperidade que vínhamos tendo era de desde aquela época, não é?
NOEMI— Desde antes. O povo tinha suas rebeldias, mas não era como hoje. Parece que hoje perdeu-se a noção do que é certo e errado. Está tudo valendo...
ELIMELEQUE— É triste...
NOEMI— Muito, mas não é só isso. Naquele tempo tinha minha mãe com sua doçura, meu pai com sua firmeza, mas dono de um coração enorme... A Zaira, minha melhor amiga antes de conhecer a Tani...
ELIMELEQUE— Uma grande mulher a Zaira. E ainda teve participação importante na nossa união.
NOEMI— Claro, você vivia se fazendo de difícil às minhas investidas, queria recusar todos os meus convites...
ELIMELEQUE— Ah eu, né? Era eu que fazia isso, né Noemi?
Elimeleque faz cócegas em Noemi, que ri se contorcendo.
NOEMI— Ai, para, Elimeleque... Para, ai!...
Elimeleque para.
ELIMELEQUE— Eu que era cheio de caprichos, né?
Rindo, Noemi se ajeita e olha para ele.
NOEMI— Você me desculpa?... Por ter dificultado sua vida?
Elimeleque a encara, até que começa a rir.
NOEMI— O que foi? Por que está rindo, Elimeleque?!
ELIMELEQUE— 25 anos depois você vem se desculpar...
NOEMI— Tsc, ah...
Rindo, Elimeleque a puxa para si e a abraça. Beija sua cabeça.
ELIMELEQUE— Não há o que desculpar. As coisas aconteceram exatamente como tinham que acontecer.
Ainda com ar jovial, Elimeleque acaricia a cabeça de Noemi em seu peito.
CENA 14: EXT. BELÉM – TRIGAL – DIA
Chega o dia seguinte.
Vários belemitas trabalham nas espigas. Elimeleque passa por eles e se aproxima de Yuri.
ELIMELEQUE— Shalom, Yuri.
YURI— Shalom, meu amigo.
ELIMELEQUE— E então? Me leve até às espigas atingidas, por favor.
YURI— (um tanto abatido) Vem comigo.
Elimeleque acompanha Yuri até a algumas dezenas de metros dali, onde as espigas, escuras, estão esparramadas pelo chão.
ELIMELEQUE— Meu Deus...
Elimeleque agacha e toca uma das espigas escuras, que esfarela na ponta de seus dedos. Nisso, IMAGEM CONGELA.
Obrigado pelo seu comentário!